quarta-feira, 8/maio/2024
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Crise Empresarial – Parte 2: A Recuperação Judicial

Olá leitores do MegaJurídico! Como estão? Dando seguimento à série que iniciamos sobre Crise Empresarial, trazemos agora um texto sobre Recuperação Judicial de Empresas – sempre de maneira fácil e descomplicada.

Como dissemos anteriormente, o intuito da nova lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/05) é buscar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, para manter a fonte produtora, os empregos e o interesse dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Portanto, apesar de se tratar de procedimento mais formal e com mais detalhes, a intenção sempre será trazer a empresa de volta do “buraco” em que ela se enfiou.

Ok! Mas, se eu tenho uma empresa e ela está endividada, como eu posso saber se posso/devo entrar com a Recuperação Judicial ou não?

Vamos ver?

A Recuperação Judicial

 

Requisitos

Para o empresário-devedor buscar a recuperação judicial ele deve preencher todos estes requisitos, cumulativamente:

1) exerça regularmente a atividade empresarial por mais de 2 anos; (não se aplica para empresas irregulares ou sociedades de fato)

2) não ter obtido concessão de recuperação judicial há pelo menos 5 anos;

3) não ter obtido concessão de recuperação especial para microempresa ou empresa de pequeno porte há pelo menos 5 anos;

4) não ser falido (se foi no passado, que no presente esteja reabilitado com sentença declarando extintas suas responsabilidades);

5) não ter sido condenado por crimes concursais/falimentares (crimes previstos na Lei n. 11.101/2005).

 

O Procedimento

Possuindo os requisitos acima, o empresário-devedor deverá ingressar com um pedido de recuperação na justiça (uma ação comum), que deve ser proposta no local do principal estabelecimento econômico do devedor (não necessariamente no local da sede da empresa), contendo a petição inicial, os seguintes documentos e informações:

1) exposição das causas da crise econômico-financeira;

2) relação completa dos credores;

3) relação dos empregados e débitos pendentes;

4) extratos bancários atualizados;

5) certidões de cartórios de protesto;

6) relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores;

7) certidão de regularidade no Registro Público de Empresas Mercantis – Junta Comercial;

8) relação das ações judiciais em que for parte (autor e réu);

9) demonstrações contábeis dos 3 últimos exercícios;

10) demonstrações contábeis levantadas exclusivamente para este pedido, compreendendo balanço patrimonial, demonstrações de resultados etc.

Estando os documentos em ordem, o juiz determina o prosseguimento da ação e, no mesmo ato:

1) nomeará um administrador judicial (que será explicado em um tópico abaixo);

2) ordenará a suspensão das ações e execuções em curso contra o devedor (menos aquelas que demandarem quantia ilíquida, as ações trabalhistas e as de natureza fiscal) pelo prazo máximo de 180 dias;

3) determinará a expedição de edital com:

(i) resumo do pedido,

(ii) relação de credores,

(iii) advertência sobre os prazos para habilitações de créditos, e

(iv) alerta quanto ao prazo para os credores apresentarem objeções (oposição, obstáculo, impedimento, contestação) ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor em 30 dias.

4) determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais; e

5) determinará a intimação do Ministério Público e a comunicação das Fazendas Públicas dos locais em que funcionem o estabelecimento.

A partir daí, o devedor tem o prazo de 60 dias para apresentar um plano de recuperação viável e pormenorizado (existem empresas especializadas que elaboram esses planos) e uma avaliação completa do ativo e do passivo da empresa.

 

O Plano

No plano, o empresário pode propor diversos meios para evitar a falência. A lei enumera alguns, porém a criatividade do empresário pode criar outros, dependendo da situação (mas obviamente este outro meio deve respeitar os critérios da boa-fé, as normas de ordem pública e os bons costumes):

1) concessão de prazos e condições especiais (p. ex., descontos) para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;

2) transformação, cisão, fusão ou incorporação da sociedade;

3) trespasse ou arrendamento do estabelecimento;

4) venda parcial dos bens;

5) redução salarial, compensação de horas e redução de jornada (mediante acordo ou convenção coletiva);

6) administração compartilhada;

7) usufruto da empresa (que pode ser feito por meio da formação de uma cooperativa dos trabalhadores que irá gerir o negócio);

8) alteração do controle acionário;

9) constituição de sociedade de credores;

10) aumento de capital social;

11) emissão de valores mobiliários etc.

Apesar de todos esses meios, existem alguns limites para a concessão de prazos de pagamento no plano:

  • os créditos trabalhistas e decorrente de acidente de trabalho não podem ser prorrogados para prazo superior a uma ano
  • os salários dos empregados que estiverem vencidos a mais de três meses devem ser pagos em até 30 dias no máximo (tendo como teto o valor de 05 salários mínimos por funcionário).

Apresentado o plano e não feita nenhuma objeção pelos credores, será acompanhado pelo juiz e pelo administrador judicial até seu total cumprimento pelo prazo de 02 anos – chamado de prazo de supervisão judicial da recuperação.

O empresário-devedor permanece na administração dos bens da empresa, mesmo após a homologação do plano, mas ele não poderá mais alienar bens ou direitos dela sem a autorização do juiz ou do Comitê de Credores (órgão facultativo e fiscalizatório composto de 03 representantes: 01 dos trabalhadores, 01 dos credores de direitos reais e privilégios especiais e 01 dos credores quirografários e de privilégios especiais – se não houver quem faz esse papel é o administrador judicial).

 

A Assembleia Geral de Credores

Por ordem do juiz da ação de recuperação judicial será formada a assembleia geral de credores, porém, no geral, em suas atribuições ela é soberana, não podendo o juiz se sobrepor às suas decisões, salvo em casos de comprovada fraude e violação do ordenamento jurídico quanto às normas de ordem pública.

Ela é composta pelos credores das seguintes classes: credores trabalhistas, acidentários, com garantias reais, privilegiados (geral e especial), quirografários, subordinados e aqueles enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte (LRF, art. 41).

Cabe à assembleia a:

1) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor;

2) constituição do comitê de credores e escolha de seus membros;

3) o nome do gestor judicial (que é um profissional escolhido para gerir a empresa quando o devedor é afastado por motivo de crime, dolo, fraude, simulação, negativa de apresentar informações, dilapidação do patrimônio da empresa etc.);

4) qualquer matéria de interesse dos credores etc.

 

O Administrador Judicial

Quem é o administrador judicial? Ele nada mais é do que um auxiliar qualificado do juiz. Ele não é representante de nenhum dos credores, nem do devedor. Deve ser escolhido pelo juiz e para exercer o cargo deve ser um profissional idôneo, preferencialmente um advogado, economista, administrador de empresas, ou até uma empresa especializada em “administrar empresas” judicialmente.

Seus honorários são fixados pelo juiz, porém, não podem passar de 5% do valor devido aos credores na recuperação. Quando autorizado pelo juiz, ele pode também contratar mais pessoas para auxiliá-lo em seu trabalho. No caso de microempresas e empresas de pequeno porte, a remuneração do administrador judicial fica limitada a 2%.

Suas atribuições são:

1) enviar correspondência aos credores comunicando sobre o processo;

2) fornecer informações aos credores;

3) consolidar o quadro-geral dos credores

4) fiscalizar as atividades do devedor e o cumprimento do plano de recuperação;

5) requerer a falência no caso de o devedor descumprir suas obrigações;

6) apresentar relatórios ao juiz.

 

Convolação da Recuperação Judicial em falência

Quando o processo de recuperação judicial é frustrado, ele pode se transformar em processo de falência, por determinação do juiz.

Isso acontece nos seguintes casos:

1) por determinação da assembleia geral de credores

2) não for apresentado o plano de recuperação no prazo de 60 dias.

3) a assembleia geral de credores rejeitar o plano de recuperação.

4) houver o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano de recuperação, durante o período de 2 anos (após esses 02 anos, caso o devedor descumpra as obrigações, os credores podem também pedir a falência da empresa utilizando a decisão do juiz que deferiu a recuperação, pois ela é um título executivo judicial. Mas se trataria de ação autônoma).

Todos os atos de administração, oneração, alienação ou endividamento realizados no curso do processo da recuperação judicial são considerados válidos para a falência. Os créditos que foram habilitados na recuperação são também considerados habilitados no juízo universal da falência.

Outro fato importante é que, como um benefício aos credores que acreditaram na recuperação da empresa e continuaram a fornecer para ela neste período, caso ela venha a passar pelo processo de falência, seus créditos com a empresa devedora, serão considerados extraconcursais, ou seja, serão pagos antes dos créditos concursais (créditos que deram origem à falência – exemplo: créditos trabalhistas, com garantia real etc).

No mesmo sentido, os créditos quirografários sujeitos à recuperação judicial (geralmente um dos últimos a serem pagos) pertencentes a fornecedores de bens ou serviços que continuaram a provê-los normalmente após o pedido de recuperação judicial terão privilégio geral de recebimento em caso de decretação de falência, no limite do valor dos bens ou serviços fornecidos durante o período da recuperação.


 

Bem, estes foram alguns detalhes que mais se destacam na recuperação judicial.

Este tema é cheio de minúcias e a jurisprudência é muito rica em decisões, já que cada empresa possui suas particularidades e história próprias (segundo informações do SERASA EXPERIAN [1] , no ano de 2015 houveram 1287 pedidos de recuperação judicial requeridos no Brasil).

Aguardo vocês na próxima postagem, agora sobre a falência.

Abraços a todos!!


Referências Bibliográficas:

Prática Empresarial / Elisabete Vido ; coordenação Marco Antonio Araújo Jr., Darlan Barroso. – 5.ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.

Direito empresarial sistematizado : doutrina, jurisprudência e prática / Tarcisio Teixeira. – 5. ed. – São Paulo : Saraiva, 2016.

 

[1] Disponível em: https://www.serasaexperian.com.br/release/indicadores/falencias_concordatas.htm

Advogado. Diretor Jurídico e de Relações Institucionais da Câmara Municipal de Salto de Pirapora/SP. Pós-graduado em Direito Contratual e em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito. Entusiasta da Mediação e da Arbitragem (pública e privada).

Dyego Freitas
Dyego Freitas
Advogado. Diretor Jurídico e de Relações Institucionais da Câmara Municipal de Salto de Pirapora/SP. Pós-graduado em Direito Contratual e em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito. Entusiasta da Mediação e da Arbitragem (pública e privada).
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