sexta-feira,26 abril 2024
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Sócio Oculto e Responsabilidade Trabalhista.

Coordenadora: Ana Claudia Martins Pantaleão

Olá leitores!

Hoje, vamos conversar sobre a figura do sócio oculto, suas bases legais e como o instituto foi apropriado na seara trabalhista para justificar a responsabilização deste sócio para dívidas trabalhistas reconhecidas judicialmente.

1. Sócio participante, oculto ou de fato e a sociedade em conta de participação.

Em termos de direito empresarial, existe um modelo de engenharia contratual empresarial conhecido como sociedade em conta de participação, que se concretiza pelo compromisso contratual firmado entre uma pessoa que deseja realizar investimento em um empreendimento, mas não deseja integrar o seu quadro societário; e o titular do empreendimento, que aceita receber esse investimento e se compromete, conforme contrato, aos resultados prometidos em troca.

Este contrato de natureza empresarial tem previsão expressa no artigo 991 do Código Civil e, nele as pessoas acima recebem seus nomes legais: a) o investidor recebe o nome de sócio participante (ou oculto); b) o empresário recebe o nome de sócio ostensivo.

E, nisto, surge um ponto importante: apesar de receber o nome de sociedade em conta de participação, não se trata de pessoa jurídica empresarial e, como se trata de um contrato de natureza típico, mas não de constituição de pessoa jurídica, ele é despedido de forma específica, e, por isso, poderá ser firmado de modo escrito ou verbal, não necessitando que tal avença seja levada a registro perante a Junta Comercial correspondente, por certo que não é daqueles que não estão entre os atos que o empresário regular deve averbar a margem de seu registro empresarial.

Assim, trata-se de um contrato que estabelece obrigações apenas e tão somente entre o empresário (sócio ostensivo) e o investidor (sócio participante).

Neste sentido, o sócio oculto (participante) é um sócio de fato, posto que ele é responsável pelo aporte de capital no empreendimento, na forma de investimento; já o sócio ostensivo tem o papel de ser o verdadeiro e único administrador da gestão e imagem do empreendimento, atuando em nome próprio ou através de sociedade empresária típica, por exemplo.

É o sócio ostensivo que assumirá, portanto, as obrigações perante terceiros e somente ele é responsável pelos atos que praticar na administração do empreendimento, conforme previsto no parágrafo único do artigo 991 do Código Civil.

No mesmo passo, de definição das responsabilidades, o sócio participante tem o dever de não participar da gestão do negócio, conforme previsto no parágrafo único do artigo 993 do Código Civil.

Se respeitados esses elementos, repita-se, a avença é válida e o sócio participante será considerado irresponsável pelas obrigações assumidas na gestão do empreendimento pelo sócio ostensivo.

Por fim, uma curiosidade: o instituto se presta tanto para atividades econômicas empresariais como também aquelas de natureza civil, por aplicação analógica.

Assim, podemos resumir as seguintes características que auxiliam no entendimento, em resumo, da regularidade da atividade de investimento:

• necessidade de bilateralidade contratual, em que duas pessoas, em posições opostos, comungam de interesse e agem em conjunto, ocupando os papéis de sócio ostensivo e participante, com todas as responsabilidades assumidas pelo primeiro, nos termos do artigo 991 do Código Civil;
• ausência de personalidade jurídica, por se tratar de contrato empresarial e não de sociedade empresária típica (não forma personalidade jurídica);
• tem como finalidade o investimento em atividade econômica, podendo ser de natureza empresarial ou civil;
• ausência de forma típica, adotandos aqui a liberdade contratual, podendo a sociedade de fato ter sua existência provado, por todos os meios admitidos em direito, conforme previsto no artigo 992 do Código Civil.

Outra curiosidade: sob a ótica do fisco, existe a exigência de registro do investimento no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), conforme Instrução Normativa RFB Nº 2119/2022, mas, como se disse, sem obrigação de registro perante as Juntas Comerciais.

2. Sócio participante, oculto ou de fato e sua responsabilização civil.

Apesar de haver uma irresponsabilidade civil do sócio oculto ou participante pelos atos de gestão, a legislação civil indica uma situação em que ele responderá pelas obrigações assumidas pelo negócio, perante terceiros, nos termos do artigo 993 do Código Civil.

Isto ocorre quando o sócio participante começa a operar o empreendimento ao lado do sócio ostensivo, ou seja, quando ele sai da posição de mero investidor e passa a gerir o empreendimento cujo investimento é titular.

Nesta situação, o legislador indica que o sócio participante, em verdade, assume posição dominante no plano do negócio e do empreendimento e, por isso, deve assumir a responsabilidade consequente por suas ações como administrador de fato do empreendimento.

Nestes termos, o sócio oculto, então, passa a ser considerado sócio, para todos os fins, de uma sociedade irregular (ou em comum) e, por definição legal do artigo 987 c/c 989c/c 988 c/c 990, todos, do Código Civil, todos, juntos, respondem pelas dívidas contraídas em nome da sociedade, com seu próprio patrimônio, por serem eles sócios titulares em comum.

Neste passo, a descaracterização da sociedade em conta de participação, pela atuação ostensiva do sócio participante, faz com que surja para todos o dever de formalização da sociedade empresarial (pessoa jurídica) e, consequentemente, enquanto não regularizada, essas pessoas não gozaram a chamada separação patrimonial que diferencia o patrimônio particular dos sócios do patrimônio da sociedade.

E aqui, entenda-se: quando o sócio participante perde esta qualidade, é porque ele assumiu, como se disse, um papel de administrador societário.

Veja-se que, tanto o administrador societário quanto o sócio oculto não respondem pessoalmente pelas obrigações assumidas em nome da sociedade. Contudo, tal e qual o sócio participante, caso o administrador societário atue de forma culposa (artigo 1.016 do Código Civil), poderá responder com todos os seus bens particulares, tanto perante a sociedade como perante terceiros prejudicados.

Isto ocorre pela aplicação da teoria do abuso do exercício de direito ao caso dos administradores e, logo, segue a mesma lógica da responsabilidade do sócio que deixa de ser apenas participante.

Vale ressaltar que a responsabilidade do administrador por excesso é pessoal, exceto quando age ilicitamente em conjunto com outros, caso esse em que a responsabilidade será solidária e, aqui, ambos (administradores e sócio que deixa de ser participantes) terão o mesmo trato jurídico.

3. Sócio participante, oculto ou de fato e sua responsabilização trabalhista e o IDPJ.

Como vimos, nos termos do artigo. 991 do Código Civil, caberá ao sócio ostensivo praticar os atos de gestão e administração do empreendimento, e só a ele caberá tal papel; e, enquanto o sócio oculto nada assumir em nome do empreendimento, terá a preservação de seu patrimônio particular.

Contudo, se atuar de modo ostensivo, o sócio oculto passará a ter responsabilidade trabalhista pelas dívidas por ventura incorridas pelo empreendimento.

Deste modo, sempre que alguém se apresente como sócio oculto, mas tenha para si a atribuição de atos típicos de gestão do empreendimento, inclusive contratação de funcionários, gestão financeira, responsabilidade perante terceiros, restará configurada a quebra da pessoa jurídica e atrairá para si a qualidade de sócio, especialmente pelos poderes de administração.

Isso configura, assim, situação que a área trabalhista tomou para si como de atuação do sócio participante no objeto da atividade constitutiva do objeto social, por analogia, para explicar possíveis fraudes aos credores.

Assim, essa forma de atuação desvirtua a utilização das sociedades (constituídas através de pessoa jurídica) na medida em que prevê expressamente que a gerência da atividade constitutiva do objeto social por pessoa que não é sua administradora constituída.

Neste passo, entendeu-se que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica da empresa e a responsabilização dos respectivos sócios e ex-sócios pelas dívidas contraídas pela sociedade com fundamento nos artigos 28 do CDC, 50 e 1.032 do CC, tornou-se o meio hábil para buscar a inclusão formal dessa pessoa que, sem ser sócio ou administrador societário formal, atua como tal e assume em nome da sociedade as obrigações perante terceiros, especialmente, as trabalhistas.

Neste passo, um ponto deve ser esclarecido: a responsabilização solidária de sócio dito oculto ou de fato em demanda trabalhista, sob o tema da participação societária oculta reclama prova robusta de sua efetiva participação na gestão diária da empresa, seja na gestão, representação ou mesmo no suporte financeiro do empreendimento.

E, para encerrar, deixo os seguintes exemplos de meios de prova para a configuração da qualidade de sócio oculto ou gestor de fato: a) procuração para movimentação bancária; b) atos de gestão de administração societária típicos de sócio; e c) atos de alienação patrimonial de bens da sociedade.

É isto.
Até já.

Advogado na COMPESA. Consultor Jurídico em Governança Corporativa. Professor de Cursos Jurídicos e de Pós-Graduação (Grupo Ser Educacional, UNINABUCO, UNINASSAU, ESA/OAB/PE). Mestre em Direito pela UNICAP. Pós-Graduado em Direitos Humanos pela UNICAP. Secretário da Comissão Comissão de Combate à Publicidade e Propaganda Irregulares da Advocacia na OAB/PE. Membro do IAP/PE. Membro da Comissão de Direito à Cidade na OAB/PE. Membro da Comissão Especial de Advocacia Estatal na OAB/PE.

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1 COMENTÁRIO

  1. A Sociedade em conta de participação coloca os empregados como Sócio. O NCC/2002, não contemplou mais admite a contribuição com serviços como é o caso da indústria de alimentos mau desempenho no nordeste

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