sexta-feira, 26/julho/2024
ColunaInovação JurídicaO aprimoramento da peça de contestação através da tecnologia

O aprimoramento da peça de contestação através da tecnologia

Desde a época da faculdade os operadores do direito são impingidos a escrever longas narrativas, as quais muitas vezes de tão extensas tornam a leitura cansativa e naturalmente fazem com que os interlocutores percam o foco e não entendam o seu objetivo final.

Petições iniciais extremamente longas e eivadas de narrativas que não se concatenam entre si ainda são comuns nos dias atuais. Até mesmo nos Juizados Especiais Cíveis criado sob o pilar da simplicidade e oralidade, sucumbe a esta celeuma, contribuindo para que os processos se arrastem por anos. Além do mais, a importância da combinação entre a narrativa e o conjunto probatório também deve passar pela simplificação da linguagem e exposição de ideias, pois o que se deve buscar é o convencimento do magistrado e não uma construção poética, pois o processo é um instrumento que objetiva a satisfação do bem material envolvido.

Deste modo os litígios que discutem indenizações materiais e morais em decorrência de cancelamento ou atraso de voos motivados pela má condição climática merecem atenção no tocante ao convencimento do magistrado, pois possuem em seu escopo narrativo uma deficiência hermenêutica acarretada pelo hiato presente entre as alegações da peça processual e a comprovação dos fatos através do conjunto de provas juntado pelas Companhias aéreas.

Assim ao utilizarmos as ferramentas processuais clássicas para a formatação de uma defesa, vem à tona a falta de compreensão do poder judiciário ao que realmente pretende as alegações das Companhias aéreas no que tange os casos de atraso ou cancelamento de voos em virtude de condições climáticas desfavoráveis, produzindo, consequentemente, uma série de sentenças procedentes e eventual proliferação de recursos de Apelação ou Inominado, contribuindo para o inchaço do judiciário, bem como prejuízo à efetividade dos princípios da cooperação processual e ampla defesa no âmbito da teoria geral da prova.

Isso posto, é sabido que as condições climáticas adversas fazem parte do ciclo natural da atmosfera em determinado local denominado como tempo atmosférico, ou seja, são os elementos climáticos que contextualizam a dinâmica do clima através da pressão atmosférica, temperatura, radiação solar e umidade presente, gerando, portanto, ambiente desfavorável à aviação civil operar.

Nesse sentido os atrasos e cancelamentos de voos são inevitáveis, principalmente porque as Companhias aéreas não podem colocar a integridade física de seus passageiros em risco, assumindo a continuidade do serviço, nos moldes inicialmente contratados, haja vista a Agência Nacional de Aviação (ANAC) estabelecer parâmetros que permitam a decolagem e a aterrissagem dos voos, preservando os fatores climáticos: a) grupo de visibilidade; b) grupo de nuvem; c) grupo de ventos; d) grupo de tempo. Alinhamento que produz consonância ao Art. 19, caput, do Código Brasileiro de Aeronáutica.

Portanto, ao ajuizar uma Ação de Indenização contra a Companhia aérea o consumidor se vê imbuído pela tentativa de reparar um dano causado durante o período de transtorno vivenciado pela frustrante experiência de atraso ou cancelamento de seu voo, contudo importante a compreensão que nesse recorte temporal de calamidade, apresentado pelo consumidor em sua petição inicial, se deve vislumbrar a força maior sobrevoando o cenário em apreço, conforme positivado pelo Código Civil que, quando devidamente comprovado, deve afastar a responsabilidade civil da Companhia aérea

Ademais, não há a supressão do conceito de hipossuficiência ao consumidor no intento de retirar a responsabilidade civil pelo eventual dano sofrido em razão da força maior, pois como bem ilustra a teoria do diálogo das fontes, complementação teórica trazida ao direito pátrio pela jurista Cláudia Lima Marques, há priorização da sistematização do direito privado vigente em uma sociedade pós-moderna extremamente plural no âmbito legislativo.

Nesse sentido, importa a utilização do Código Civil para uma análise proveitosa dos conflitos apresentados, pois analisando o litígio pela ótica da força maior,  não existirá ação ou omissão culposa da Companhia, características fundamentais para a incidência de sua responsabilização ao eventual prejuízo do consumidor, conforme assevera os artigos 393 e 737 do Código Civil, combinados com o Art. 256 do Código Brasileiro de Aeronáutica.

Ora, se conclui, portanto, que embora a possibilidade de análise da tese de afastamento da responsabilidade Civil das Companhias aéreas exista no que diz respeito a cancelamento e atraso de voos motivados por condições climáticas desfavoráveis, será imprescindível uma correta associação das alegações expostas na contestação e/ou recurso com o conjunto probatório arguido em primeira instância, demonstrando a veracidade do alegado, e, para que isso ocorra de maneira efetiva, a utilização do Visual Law ganha importância ímpar.

Afinal a demonstração de uma condição climática desfavorável é complexa ao entendimento dos tribunais, principalmente por se tratar de matéria que ultrapassa as fronteiras do direito, possuindo sua peculiaridade própria.

Importante lembrar que o Visual Law, ou Legal Design tem a função de preservar os princípios da economia processual, contraditório, cooperação processual e ampla defesa através da comunicação visual aplicada à técnica argumentativa jurídica, simplificando não apenas a compreensão das teses, mas principalmente, ajudando a esclarecer pontos fulcrais dos fatos concretos que originaram o litígio para o melhor julgamento do poder judiciário, zelando, sem sombra de dúvidas, à exarar uma sentença nos moldes do Art. 489, inciso § 1º, inciso IV do Código de Processo Civil, também presente no Art. 93, inciso IX da Constituição Federal, onde todos os pontos alegados pelas partes merecem a devida análise, imparcial, do juiz.

Portanto, há um ganho expressivo nos casos envolvendo cancelamento e atraso de voos em razão de condições climáticas desfavoráveis quando utilizado a ferramenta do Visual Law, principalmente por este ser um facilitador ao julgamento do magistrado e sua compreensão das imagens de satélite, mapas de geolocalização, códigos dos sistemas responsáveis pela decodificação dos dados climáticos aferidos no dia do evento, corroborando com uma demonstração completa da força maior ao caso concreto da lide, legitimando o afastamento da culpa das Companhias aéreas pelo evento danoso, e, concretizando a não incidência da responsabilização civil, caso realmente a comprovação do afastamento seja efetivada.

Desta maneira a tecnologia vai ganhando corpo na seara jurídica, facilitando a atuação dos operadores do direito e inserindo a realidade jurídica na Economia Digital, ponto fulcral para o aperfeiçoamento do judiciário em uma sociedade onde se deve equilibrar a velocidade posta pelo mercado e a qualidade advinda da alta cultura, pois ambas são importantes para erigir um cenário qualitativo em benefício da cidadania.

Advogado. Membro efetivo da Comissão de Direito Tributário e da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial, ambas da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo.

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