sexta-feira,26 abril 2024
ColunaCorporate LawArbitragem tributária traz equilíbrio à ordem econômica

Arbitragem tributária traz equilíbrio à ordem econômica

O processo tributário é apresentado através de duas modalidades,  administrativo e judicial, formas de resolução dos conflitos existentes entre o Estado e o contribuinte.

Nesse sentido, o processo se revela na prática através da imposição estatal, favorecendo o ente público no conflito entre o seu interesse e a liberdade individual do contribuinte, e, portanto, configurando uma relação de eterno amor e ódio, por este motivo Aliomar Baleeiro (1905-1978), um dos maiores estudiosos do direito tributário do século XX nos ensina, em seu livro “Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar”: “o tributo é vetusta e fiel sombra do poder político há mais de 20 séculos”.

Posto isso, surge um imenso problema na dinâmica litigiosa entre o poder público, aquele que busca a todo custo arrecadar tributos e os contribuintes, fadados a cumprir as obrigações tributárias: o Estado julgador não age com a neutralidade devida em função da regular tramitação processual, utilizando de suas armas legislativa (o Estado cria a lei), executiva (o Estado arrecada os tributos de modo impositivo) e julgadora (o Estado julga as demandas processuais, sejam elas na esfera judicial ou administrativa), criando, em última análise, um cenário propenso ao benefício dos interesses do Estado em obter receita, soterrando qualquer possibilidade de defesa efetiva do contribuinte.

Portanto, o processo tributário precisa ser revisitado para, fundado por uma conduta interpretativa e coerente com a técnica jurídica, não violar qualquer espécie de direito fundamental do contribuinte em razão do poder preponderante do Estado.

Corroborando a uma solução sistêmica ao problema apresentado, devemos refletir a respeito do quão vulnerável o contribuinte se apresenta na lide tributária, tendo suas garantias processuais usurpadas pelo ideário arrecadatório.

Diante deste quadro, teremos três espécies de vulnerabilidade: a) a material (pois o Estado é aquele que cria a lei cuja qual origina o tributo); b) a formal (nesse âmbito o Estado possui uma tecnologia muito maior que os contribuintes no tocante a arrecadação dos tributos, não deixando margem para qualquer questionamento a respeito da veracidade obrigacional em torno dos valores cobrados); c) a processual (o Estado é juiz de sua própria causa).

Não há dúvidas que o processo tributário (administrativo e judicial) deve zelar pelo princípio da isonomia e equidade, o primeiro estipulando a paridade de armas durante a lide, o segundo medindo caso a caso em prol do equilíbrio moral angariado pelo princípio da primazia do interesse público sobre o particular em face das garantias fundamentais elencadas pela Constituição da República: pequenas e médias empresas precisam desse resguardo para sobreviverem às imposições fiscais do Estado após a crise sanitária provocada pela pandemia da Covid-19.

Importante lembrar que o poder executivo da União e dos estados federados despendeu uma gama de recursos consideráveis para auxiliar pessoas físicas e jurídicas durante o ano de 2020, devendo tal subsídio, em alguma medida, se estender ao ano de 2021. Desta maneira, os cofres públicos ficam desabastecidos, sendo certo a atenção vindoura do poder público à arrecadação quando do agravamento da crise.

Contudo, essa arrecadação não pode vir acompanhada de negligência processual no âmbito tributário, haja vista a fragilidade das empresas e pessoas naturais em razão da crise.

Diante do panorama apresentado, a arbitragem tributária encontra terreno fértil para proporcionar o equilíbrio necessário entre o interesse público e as necessidades privadas, além de produzir maior segurança jurídica no âmbito processual, trazendo efetivo equilíbrio à ordem econômica.

Portanto, ao falarmos da arbitragem tributária, não estamos pensando em fórmula mágica que proporcionará a solução de todos os problemas apresentados até aqui, no entanto, o instituto da arbitragem, muito além de produzir um esvaziamento do Judiciário das demandas fiscais (o Conselho Nacional de Justiça apontou em seu relatório intitulado “Justiça em Números 2020”, que em cada 100 processos de Execuções Fiscais em trâmite no ano de 2019,  apenas 13  foram solucionados), terá a força de construir a sonhada justiça fiscal, importante para a gradativa e qualitativa melhora no ambiente negocial brasileiro, impulsionando as inovações trazidas pela Lei da Liberdade Econômica (LEI Nº 13.874/2019), sem esquecer dos princípios estampados no Art. 170, caput da Constituição da República, no que tange aos pilares da ordem econômica brasileira: a livre-iniciativa e a valorização do trabalho humano.

Necessário ponderar que a legislação existente já resguarda a efetivação da autocomposição, através do disposto no caput do Art. 165 do Código de Processo Civil, sendo os tribunais responsáveis pelo incentivo a uma conduta de criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos, bem como no desenvolvimento de campanhas destinadas ao estímulo da autocomposição.

A arbitragem tributária, tal como o instituto arbitral aos conflitos de ordem privada (Lei 9.307/1996), não diz respeito a um terceiro agente na relação conflituosa a analisar e julgar o caso, mas à verdadeira autocomposição, onde o árbitro estimulará a pacificação do conflito entre o Estado e o ente privado através da técnica jurídica. Referido cenário também é aplicado na administração pública para resolver conflitos que versem a respeito de direitos patrimoniais disponíveis (Lei 13.129/2015, art. 1º), ou seja, aqueles que não dizem respeito à proteção dos interesses da coletividade.

Ademais, a justiça fiscal a ser produzida pela arbitragem tributária poderá equilibrar o ambiente negocial presente, pois com o correto manejo dos litígios, os entes privados, principalmente as empresas, poderão o aplicar a contratos, estabelecendo cláusulas arbitrais, facilitando as transações internacionais, igualmente na obtenção para aportes de investidores, demonstrando maior segurança jurídica e diminuindo o risco Brasil.

Desta maneira, haverá o incrementando do instituto da elisão fiscal e expurgo da evasão fiscal, sendo certo que essa postura produzirá ao Estado um âmbito arrecadatório mais producente, bem como motivará outras abordagens do poder público à obtenção de receita sem a cogitação da famigerada majoração de tributos, ou criação de novas hipóteses de incidência, em resumo, motivará a redução da sonegação fiscal.

Embora a pandemia provocada pela Covid-19 tenha trazido ao Brasil diversos problemas a serem fruto de amplo debate e acuradas formas de resolução, a arbitragem tributária se mostra ideal para proporcionar às relações negociais auspicioso conjunto de oportunidades.

Por fim, os poderes da República se movimentam à implementação do instituto arbitral, vide os projetos legislativos, Lei n° 4257 de 2019 e Lei n° 4468 de 2020, tramitando, atualmente, no Senado Federal. Esse movimento legislativo poderá acabar com o “carnaval tributário”, expressão cunhada pelo saudoso tributarista Alfredo Augusto Becker (1928-1986), direcionando o país à isonomia dos conflitos fiscais, entretanto é fundamental que o cidadão permaneça atento a esta inovação procedimental trazida pelas demandas da Economia Digital (efetividade, desburocratização e celeridade), pois a aplicação correta da arbitragem tributária também dependerá de sua postura combativa, originando ambiente distante do complexo, improdutivo e turbulento oceano fiscal contemporâneo.

Advogado. Membro efetivo da Comissão de Direito Tributário e da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial, ambas da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo.

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