sexta-feira,29 março 2024
TribunaisInformativo nº 959 do STF

Informativo nº 959 do STF

Informativo nº 959 do STF – data de divulgação: 11 a 15 de novembro 2019.

SUMÁRIO
1ª Turma
Cabimento de reclamação e precedente de repercussão geral – 2
Prescrição de delito e fixação de competência – 2
Cumulação de títulos de magistério e aplicação retroativa de nova interpretação de norma administrativa – 2
TCU: decadência e suspensão de pagamentos de contratos – 3
Plano Real: Nota do Tesouro Nacional e índice de correção – 2
Redução de alíquota de Imposto de Importação e dever de indenizar
2ª Turma
Dupla persecução penal em âmbito internacional
Duração de sustentação oral e nulidade

 

PRIMEIRA TURMA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL – RECLAMAÇÃO

Cabimento de reclamação e precedente de repercussão geral – 2 –

A erronia na observância de pronunciamento do Supremo Tribunal Federal (STF) formalizado, em recurso extraordinário, sob o ângulo da repercussão geral, enseja, esgotada a jurisdição na origem considerado o julgamento de agravo, o acesso àquela Corte mediante a reclamação.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão monocrática que julgou procedente reclamação. A decisão reclamada cassou o acórdão do Superior Tribunal de Justiça que desproveu o agravo protocolado contra o trancamento do recurso extraordinário, e determinou a sua remessa ao STF para apreciação (Informativo 904).

Rcl 26874 AgR/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12.11.2019. (Rcl-26874)

DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA

Prescrição de delito e fixação de competência – 2 –

O habeas corpus não é sede processual adequada para discussão sobre a correta fixação da competência, bem como sobre a existência de transnacionalidade do delito imputado.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a agravo regimental em habeas corpus no qual se sustentava que a prescrição da pretensão punitiva em relação a delito que fundamenta a atração da competência da Justiça Federal – no caso, evasão de divisas – ensejaria o deslocamento da competência para a Justiça estadual (Informativo 939).

Vencido o ministro Marco Aurélio, que votou pelo provimento do agravo para que o writ tenha sequência. Segundo o ministro, o habeas corpus deve ser julgado pelo Colegiado, não sendo observável o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, nem o Código de Processo Civil, no que autorizam o relator a indeferir, liminarmente, a impetração.

HC 151881 AgR/SP, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 12.11.2019. (RE-151881)

DIREITO ADMINISTRATIVO – CONCURSO PÚBLICO

Cumulação de títulos de magistério e aplicação retroativa de nova interpretação de norma administrativa – 2 –

A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em mandados de segurança impetrados contra decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, em procedimento de controle administrativo, determinou a comissão de concurso público que afastasse a possibilidade do cômputo acumulado de títulos alusivos ao exercício do magistério superior com e sem prévio concurso público de admissão. Além disso, o órgão estabeleceu que fosse considerado, na hipótese, apenas o título de maior pontuação apresentado pelos candidatos e republicada a lista final de classificação (Informativo 955).

Os impetrantes sustentavam que o CNJ teria dado nova interpretação a normas relativas ao concurso público, sendo inviável sua aplicação retroativa.

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes. A seu ver, ao contrário do que alegado pelos impetrantes, não há comprovação de que o CNJ tenha efetivamente surpreendido os candidatos com qualquer mudança de entendimento.

Segundo o ministro, os documentos juntados aos autos demonstram que, ainda em 2016, houve pronunciamento do Plenário do CNJ sobre a validade do concurso em questão, quando também assentada a impossibilidade de acumulação de títulos de exercício de magistério decorrentes de vínculos diversos. No ato ora coator, essa interpretação foi reiterada, inclusive, com o registro de que o entendimento no sentido da impossibilidade de acumulação fora fixado antes da divulgação do resultado da fase de títulos do mencionado certame.

Dessa maneira, concluiu não haver ilegalidade praticada pelo CNJ.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem para assentar a insubsistência do pronunciamento do CNJ e a possibilidade da cumulação da pontuação dos títulos.

MS 35992/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.11.2019. (MS-35992)
MS 36218/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.11.2019. (MS-36218)

DIREITO CONSTITUCIONAL – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

TCU: decadência e suspensão de pagamentos de contratos – 3 –

Em conclusão de julgamento, a Primeira Turma negou provimento a agravo regimental interposto de decisão que denegou a ordem em mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União (TCU) (Informativos 922 e 943).

Na espécie, o relator do processo no TCU concedeu medida cautelar para determinar ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao BNDES Participações S.A. (BNDESPAR) e à Agência Especial de Financiamento Industrial (Finame) a suspensão temporária dos pagamentos dos contratos de confissão de dívida celebrados com a Fundação de Assistência e Previdência Social do BNDES (Fapes) até a deliberação definitiva sobre a questão.

A Fapes (impetrante) sustentava ser inviável, em face do art. 54 da Lei 9.784/1999 (1), a pretensão de invalidar contratos de confissão de dívida firmados em 2002 e 2004, por meio de processo administrativo iniciado em 23.11.2016. Ademais, alegava que o TCU não tem a prerrogativa de, diretamente, sustar ou anular contratos. Apontava ofensa ao art. 71, IX, X e § 1º, da Constituição Federal (CF); ao art. 45, § 2º, da Lei 8.443/1992 e ao art. 54 da Lei 9.784/1999.

Inicialmente, o Colegiado afastou a decadência administrativa, haja vista a inaplicabilidade do prazo decadencial quinquenal, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, para regular a atuação da autoridade impetrada em processo de tomada de contas, regido pela Lei 8.443/1992, que consubstancia norma especial. No ponto, citou precedentes do STF: MS 25.641; MS 33.414 AgR; MS 26.297 AgR.

Aduziu que o ato impugnado no mandado de segurança foi proferido em representação que pode ser convertida em tomada de contas especial, circunstância a conjurar, por si só, a pretendida aplicação linear do disposto no art. 54 da Lei 9.784/1999.

Ressaltou que, ao contrário do que sustenta a Fapes, a tese chancelada pelo STF nos precedentes mencionados não foi meramente a da ausência de “decadência intercorrente”, mas a de que o prazo decadencial para anulação de atos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, não se aplica aos processos de tomada de contas.

A compreensão de que o prazo decadencial quinquenal é impróprio para regular a atuação da Corte de Contas em processo que pode resultar na apuração de prejuízo ao erário e na correlata imputação de débito aos responsáveis é consentânea com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE 852.475 (Tema 897 da repercussão geral), em que assentada a seguinte tese: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”.

Frisou, ainda, que o estágio primitivo das apurações conduzidas pela autoridade impetrada não autoriza descartar a configuração de flagrante inconstitucionalidade nos contratos de confissão de dívida, a qual, se demonstrada, poderá afastar o prazo decadencial da Lei 9.784/1999. O TCU poderá se pronunciar sobre a compatibilidade dos contratos de confissão de dívida com o previsto no art. 202, § 3º, da CF (2) somente após a fixação de todos os parâmetros de índole fática — a análise da efetiva existência dos débitos reconhecidos pelos patrocinadores da Fapes (BNDES, BNDESPAR e Finame) e, em caso positivo, da data dos respectivos fatos geradores, bem como da natureza das contribuições vertidas em decorrência dos contratos de confissão de dívida, o que não pode ser feito em mandado de segurança. Asseverou que não há de se falar em “inconstitucionalidade flagrante presumida” e registrou o aceno da autoridade impetrada no sentido de que mesmo a demarcação das datas dos fatos geradores das dívidas em período anterior à EC 20/1998 não é suficiente, por si, para elidir a regra da paridade contributiva. Isso porque, na espécie, os contratos de confissão de dívida somente foram celebrados após o prazo previsto nos arts. 5º e 6º da referida emenda (3).

Além disso, mesmo que se admitisse a submissão do TCU aos ditames do art. 54 da Lei 9.784/1999, a etapa embrionária das apurações empreendidas não autorizaria juízo antecipado sobre a configuração da decadência, ante a possível identificação de má-fé ou de medida impugnativa apta a impedir o decurso do prazo decadencial (Lei 9.784/1999, art. 54, caput, parte final, e § 2º, respectivamente).

A Turma esclareceu não se estar a presumir a má-fé. Na decisão agravada, consta apenas que a má-fé, ou a adoção de medida impugnativa apta a impedir o decurso do prazo decadencial, poderá ser evidenciada pelo TCU quando do julgamento definitivo da representação. Isso também impede o enquadramento linear do ato como eivado de ilegalidade ou abuso de poder com a liquidez e a certeza exigidas em sede mandamental.

Não vislumbrou direito líquido e certo à incidência do prazo quinquenal, considerados os precedentes do STF que: (a) não admitem a submissão de processo de tomada de contas especial ao estabelecido no art. 54 da Lei 9.784/1999; (b) afastam a aplicação desse dispositivo legal se evidenciada flagrante inconstitucionalidade; e (c) asseveram a possibilidade de apuração de má-fé e a de indicação de medida impugnativa ao longo do processo administrativo.

Noutro passo, o Colegiado rejeitou a apontada ofensa ao art. 71, § 1º, da CF (4). Embora o TCU não possa, diretamente, sem prévia submissão da matéria ao Congresso Nacional, determinar a sustação ou a anulação de contrato, pode determinar às unidades fiscalizadas que adotem medidas voltadas à anulação de ajustes contratuais, com base no art. 71, IX, da CF (5). Ademais, as atribuições constitucionais conferidas ao TCU pressupõem a outorga de poder geral de cautela àquele órgão. Ambas as prerrogativas conduzem ao reconhecimento da legitimidade do ato impugnado e afastam a configuração de ilegalidade ou de abuso de poder.

Se a autoridade impetrada pode vir a determinar que o BNDES, o BNDESPAR e a Finame anulem os contratos de confissão de dívida, atrelado a essa possível determinação está o poder geral de cautela de impor a suspensão dos repasses mensais decorrentes dessas avenças, como forma de assegurar o próprio resultado útil da futura manifestação da Corte de Contas.

Por fim, a possibilidade de o TCU impor a indisponibilidade de bens contempla a prerrogativa de decretar a indisponibilidade de créditos devidos pelos aludidos patrocinadores, como decorrência do contrato de confissão de dívida.

(1) Lei 9.784/1999: “Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. § 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.”
(2) CF: “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (…) § 3º É vedado o aporte de recursos a entidade de previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e outras entidades públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá exceder a do segurado.”
(3) EC 20/1998: “Art. 5º O disposto no art. 202, § 3º, da Constituição Federal, quanto à exigência de paridade entre a contribuição da patrocinadora e a contribuição do segurado, terá vigência no prazo de dois anos a partir da publicação desta Emenda, ou, caso ocorra antes, na data de publicação da lei complementar a que se refere o § 4º do mesmo artigo. Art. 6º As entidades fechadas de previdência privada patrocinadas por entidades públicas, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, deverão rever, no prazo de dois anos, a contar da publicação desta Emenda, seus planos de benefícios e serviços, de modo a ajustá-los atuarialmente a seus ativos, sob pena de intervenção, sendo seus dirigentes e os de suas respectivas patrocinadoras responsáveis civil e criminalmente pelo descumprimento do disposto neste artigo.”
(4) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (…) § 1º No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis.”
(5) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (…) IX – assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade;”

MS 35038 AgR/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 12.11.2019. (MS-35038)

DIREITO FINANCEIRO – DÍVIDA PÚBLICA

Plano Real: Nota do Tesouro Nacional e índice de correção – 2 –

É constitucional o art. 38 (1) da Lei 8.880/1994, não importando a aplicação imediata desse dispositivo violação do art. 5º, XXXVI (2), da Constituição Federal (CF).

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a incidência da norma de correção monetária prevista no art. 38 da Lei 8.880/1994 a negócio jurídico formalizado antes da sua vigência (Informativo 904).

No caso, as partes pactuaram Notas do Tesouro Nacional (NTN), com vencimento em 1º.11.1994, fixando o Índice Geral de Preços de Mercado (IGPM) como indexador de atualização do valor nominal. O tribunal de origem, ao reformar a decisão do juízo, afastou o critério de correção monetária determinado e consignou a aplicabilidade do art. 38 da Lei 8.880/1994, norma superveniente.

A Turma afirmou que o Plenário, ao julgar a ADPF 77, concluiu pela constitucionalidade do referido dispositivo legal.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deu provimento ao recurso para restabelecer o entendimento contido na sentença, que utilizou o IGPM previsto na Lei 8.249/1991. Para o ministro, se as NTNs foram contratadas de acordo com a legislação da época, tem-se como configurado ato jurídico perfeito a revelar relação jurídica projetada no tempo.

(1) Lei 8.880/1994: “Art. 38. O cálculo dos índices de correção monetária, no mês em que se verificar a emissão do Real de que trata o art. 3º desta lei, bem como no mês subseqüente, tomará por base preços em Real, o equivalente em URV dos preços em cruzeiros reais, e os preços nominados ou convertidos em URV dos meses imediatamente anteriores, segundo critérios estabelecidos em lei. Parágrafo Único. Observado o disposto no parágrafo único do art. 7º, é nula de pleno direito e não surtirá nenhum efeito a aplicação de índice, para fins de correção monetária, calculado de forma diferente da estabelecida no caput deste artigo.”
(2) CF: “Art. 5º: (…) XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

RE 307108/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.11.2019. (RE-307108)

DIREITO ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Redução de alíquota de Imposto de Importação e dever de indenizar –

A Primeira Turma iniciou julgamento de agravo interno em recurso extraordinário com agravo em que se discute a responsabilidade da União pelos prejuízos supostamente causados a indústria de brinquedos nacional pela redução do imposto de importação de brinquedos na década de 1990.

No caso, o acórdão recorrido decidiu que a possibilidade de alteração da alíquota do imposto de importação por ato do poder público, como instrumento de política economia, não gera direito à indenização por se caracterizar como ato legislativo, com efeito geral e abstrato. Isso porque seria inerente à política econômica a possibilidade de alteração para atender a circunstâncias internas e externas, como é inerente ao risco empresarial a necessidade de adaptação a tais mudanças. Não haveria, dessa forma, direito subjetivo à manutenção de determinada política econômica, desde que estabelecida genericamente e sem compromisso de sua permanência por determinado prazo. Ademais, não haveria afronta ao princípio da boa-fé ou quebra de confiança a legitimar a expectativa sólida no sentido de manutenção das alíquotas do imposto de importação. Portanto, não se configuraria a responsabilidade civil do Estado pelos prejuízos resultantes da queda dos níveis de venda dos produtos nacionais.

A ministra Rosa Weber (relatora) asseverou que o entendimento da corte de origem não divergiu da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal (STF) (RE 225.655 e RE 224.285).

Compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no acórdão de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário.

O tribunal de origem se lastreou na prova produzida para firmar seu convencimento no sentido da inviabilidade de ser atribuída à conduta da ré – comissiva ou omissiva – a responsabilidade pelos danos patrimoniais eventualmente sofridos pela autora.

Assim, somente mediante o revolvimento do quadro fático delineado seria possível aferir a ocorrência de eventual afronta aos preceitos constitucionais invocados no recurso extraordinário.

Considerou, por essa razão, inadmissível o recurso extraordinário, em face do óbice do Enunciado 279 da Súmula do STF: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”.

Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos.

ARE 1175599 AgR/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 12.11.2019. (ARE-1175599)

SEGUNDA TURMA

DIREITO PENAL – APLICAÇÃO DA LEI PENAL

Dupla persecução penal em âmbito internacional –

A Segunda Turma concedeu a ordem em habeas corpus para determinar o trancamento de ação penal movida contra o paciente, denunciado pela suposta prática do crime de lavagem de capitais, em razão de haver transferido dinheiro oriundo de tráfico de drogas da Suíça para o Brasil, utilizando-se de contrato de fachada para dar aparência de licitude aos ativos em solo brasileiro.

No caso, o paciente já teria sido processado e julgado na Suíça pelos mesmos fatos, o que culminou em condenação transitada em julgado e cômputo de período de encarceramento de caráter preventivo como execução antecipada da pena naquele Estado.

De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o fato de o crime também ter sido cometido no Brasil, uma vez que a execução e os efeitos da lavagem de dinheiro ocorreram em território nacional, permite a persecução penal pela justiça brasileira, independentemente de outra condenação no exterior. Dessa forma, adota-se o princípio da territorialidade, nos termos do art. 5º do Código Penal (CP) (1), segundo o qual aplica-se a lei brasileira a qualquer crime cometido no Brasil.

Inicialmente, a Turma reconheceu que os fatos apreciados pela justiça brasileira são coincidentes com os já analisados pelo Estado suíço.

Ademais, apontou que a redação do art. 5º do CP contém a ressalva de que devem ser observados convenções, tratados e regras de direito internacional. Desse modo, deve-se cotejar a redação dos arts. 5º, 6º e 8º do CP (2) com o que dispõe a Lei 13.445/2017 (Lei de Migração), a qual elenca o rol de casos em que o Estado brasileiro não concede extradição, notadamente o disposto no art. 82, V (3). O art, 100, caput, (4) do mesmo diploma legal exige a observância do princípio do ne bis in idem.

A proteção ao indivíduo selada por esses dispositivos é muito cara ao direito brasileiro. Revela-se evidente garantia contra nova persecução penal pelos mesmos fatos, de modo a se consagrar a proibição de dupla persecução penal também entre países, no âmbito internacional.

Por outro lado, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), assentou-se o status normativo supralegal aos tratados internacionais de direitos humanos, ou seja, abaixo da Constituição, mas acima das leis infraconstitucionais.

Portanto, consagrou-se que o controle de convencionalidade pode ser realizado sobre as leis infraconstitucionais. Assim, o CP deve ser aplicado em conformidade com os direitos assegurados na Convenção Americana de Direitos Humanos e com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.

Em relação à proibição de dupla persecução penal, tais diplomas o fazem de forma expressa (CADH, art. 8.4; PIDCP, art. 14.7) (5).

O STF já teve a oportunidade de se manifestar a respeito dessas regras, e, ao fazê-lo obstou o prosseguimento de processo penal quanto a fatos já julgados por jurisdição diversa (Ext 1.223).

Assim, o exercício do controle de convencionalidade, tendo por paradigmas os dispositivos do art. 14.7, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e do art. 8.4, da Convenção Americana de Direitos Humanos, determina a vedação à dupla persecução penal, ainda que em jurisdições de países distintos.

Por sua vez, o art. 8º do CP deve ser lido em conformidade com os preceitos convencionais e a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), vedando-se a dupla persecução penal por idênticos fatos.

Por fim, a vedação à dupla persecução penal em âmbito internacional deve ser ponderada com a soberania dos Estados e com as obrigações processuais positivas impostas pela CIDH.

Em casos de violação de tais deveres de investigação e persecução efetiva, o julgamento em país estrangeiro pode ser considerado ilegítimo, como em precedentes em que a própria CIDH determinou a reabertura de investigações em processos de Estados que não verificaram devidamente situações de violações de direitos humanos.

Portanto, se houver a devida comprovação de que o julgamento em outro país sobre os mesmos fatos não se realizou de modo justo e legítimo, desrespeitando obrigações processuais positivas, a vedação de dupla persecução pode ser eventualmente ponderada para complementação em persecução interna.

Contudo, neste caso concreto, não há qualquer elemento que indique dúvida sobre a legitimidade da persecução penal e da punição imposta em processo penal na Suíça por idênticos fatos ao agora denunciado no Brasil. Dessa forma, a proibição de dupla persecução deve ser respeitada de modo integral, nos termos constitucionais e convencionais.

(1) CP: “Art. 5º. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.”
(2) CP: “Art. 6º. Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Art. 8º. A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.”
(3) Lei 13.445/2017: “Art. 82. Não se concederá a extradição quando: (…) V – o extraditando estiver respondendo a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;”
(4) Lei 13.445/2017: “Art. 100. Nas hipóteses em que couber solicitação de extradição executória, a autoridade competente poderá solicitar ou autorizar a transferência de execução da pena, desde que observado o princípio do non bis in idem.”
(5) CADH, art. 8.4: “O acusado absolvido por sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos”; PIDCP, art. 14.7: “Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os procedimentos penais de cada país”.

HC 171118/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 12.11.2019. (HC-171118)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – NULIDADES E RECURSOS EM GERAL

Duração de sustentação oral e nulidade –

A Segunda Turma iniciou julgamento de agravo regimental em habeas corpus no qual se sustenta a ocorrência de nulidade absoluta, consistente na suposta ausência de defesa do agravante quando de seu julgamento e condenação perante o Tribunal do Júri.

No caso, o Ministério Público proferiu sustentação oral perante o conselho de sentença por uma hora e meia e, ao final, requereu a absolvição do acusado. Ato contínuo, a defesa técnica nomeada pelo ora agravante requereu igualmente a absolvição, em manifestação que durou três minutos.

De acordo com a impetração, cabe ao magistrado declarar o réu indefeso ainda que ele tenha mantido o mesmo patrono após o julgamento que culminou em sua condenação, e que a sustentação oral, de duração tão pequena, não consubstanciou defesa mínima, efetiva ou substancial.

A ministra Cármen Lúcia (relatora), ao negar provimento ao recurso, destacou que o agravante foi acompanhado pela sua defesa na sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri realizada na origem, tendo reiterado o mandato conferido ao seu defensor na interposição da apelação.

Além disso, no caso, não houve ausência de defesa, de modo que descabe cogitar de nulidade absoluta. Assim, se houve nulidade, foi apenas relativa, a qual depende da demonstração de efetivo prejuízo, o que não ocorreu.

Não se pode classificar como insatisfatória a atuação do advogado, que exerceu a defesa de acordo com a estratégia que considerou melhor no caso. Nesse sentido, a sustentação oral mais sucinta pode funcionar em benefício da defesa.

O ministro Edson Fachin acompanhou a relatora.

Em seguida, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos.

HC 164535 AgR/RJ, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 12.11.2019. (HC-164535)

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