sábado,20 abril 2024
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Quem é Empresário?

O título desse texto pode parecer uma pergunta ingênua, mas é digno de inúmeros capítulos de livros sobre a qualificação do empresário. O que é ser empresário, quem é empresário e por aí vai.

Assim, o presente texto é a primeira parte de três sobre a introdução no estudo do Direito Empresarial de forma prática e simplificada. Dessa forma, primeiramente, vamos dizer sobre quem é o empresário. Segundo quais as espécies de empresário e, por fim, tecer comentários sobre os enquadramentos societários mais comuns no Brasil.

Ainda, importante dizer que não entraremos no mérito sobre os requisitos civis de capacidade para ser empresário e as pessoas legalmente impedidas de exercer atividade empresarial, mas, tão somente, sobre a caracterização ou não da pessoa que exerce atividade econômica como empresária.

Pois bem, no Brasil, atualmente, não há como interpretar de outra forma quem é e quem não é empresário, a leitura do artigo 966 do Código Civil é simples: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.”.

Em seguida, o parágrafo único do citado artigo complementa o conceito dizendo: “Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”.

Lido isso, temos que para caracterizar uma pessoa como empresário ela precisa cumprir basicamente com três elementos. Primeiramente, exercer atividade econômica; segundo, de forma organizada; e terceiro, exercê-la profissionalmente. (NEGRÃO, 2020, pg. 75)

De forma rápida e resumida, podemos dizer que “exercer atividade econômica” é a produção e circulação de bens ou serviços dirigida ao mercado em geral . A organização diz respeito aos meios de produção e/ou preparação para viabilizar a exploração da atividade econômica, sendo na opinião de muitos doutrinadores, a qual me filio, de suma importância para caracterizar ou não a pessoa como empresária; e terceiro, a “profissionalidade” que está ligada a habitualidade e repetição da exploração da atividade econômica (MARTINS, 2017, p. 82), ou seja, “viver disso”.

Ademais, importante destacar que esses elementos trazidos pela lei não sãos suficientes para a caracterização do empresário, há outros elementos indispensáveis para esta caracterização sobre o conceito de empresário e empresa no código civil brasileiro. (SZTAJN, 2006).

Nessa linha de raciocínio  trazemos primeiramente a assunção do risco pela exploração de atividade econômica . Aqui alguns doutrinadores falam em exercer a atividade econômica em nome próprio, ou seja, assumir integralmente todos os riscos inerentes a exploração de atividade econômica.

Desse modo, caso a pessoa que exerça profissionalmente atividade econômica organizada para a produção e/ou a circulação de bens ou serviços, mas não assuma os riscos do negócio, ela se qualificará tão somente como um funcionário, mandatário ou qualquer outra coisa, mas não como empresário.

Por exemplo, veja o que diz o artigo 3º da CLT: “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”.

Podemos constatar, guardada as devidas proporções, que há uma pequena similaridade com o conceito de empresário do artigo 966 do Código Civil e o empregado do artigo 3º da CLT. Ambos, em tese, exercem atividade empresarial, a diferença é que o empregado a exerce sob a dependência do empregador, ou seja, presta um serviço em nome deste, sem assumir nenhum risco e mediante salário, enquanto o empregador exerce a atividade em nome próprio assumindo todos os riscos do negócio e sem salário.

Portanto, o empregado não assume os riscos na exploração da atividade econômica, ou seja, cabe a ele cumprir com a função para a qual foi contratado. Entretanto, o negócio dando lucro ou não, o empregado faz jus ao seu salário (TOMAZETTE, 2017, pg. 82).

Ainda, importante destacar que o risco é inerente à exploração de atividade econômica, como bem leciona a Doutora Sztajn (2006):

Sempre se disse que a atividade empresária é de risco, ou melhor, que o risco é econômico, que pode ter resultados positivos, ou não, lucros ou prejuízos. Não se considera que pode haver resultado zero, nem lucro nem prejuízo, hipótese que também está incluída na noção de risco, de álea quanto ao resultado econômico desejado ou esperado.

Sendo assim, exercer atividade econômica assumindo todos os riscos é uma característica do empresário, a qual o diferencia das pessoas que apenas prestam um serviço a mando de outra.

Para fechar o conceito do que é ser empresário, temos mais um elemento indispensável e lógico, mas às vezes não dito, a busca pelo lucro. A pessoa que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, assumindo os riscos da atividade, porém não almejando lucro, não é empresário . É, por exemplo, filantropo entre outras coisas.

Aliás, importante frisar que não há a necessidade de verificar o lucro na exploração da atividade econômica, mas tão somente a intenção de auferir o lucro (MARTINS, 2017).

Dito isso, percebemos que o “empresário” está ligado à prática e/ou exploração de uma atividade, um fazer algo de forma profissional, habitual, visando o lucro e assumindo todos os riscos de tal atividade.

Portanto, ser empresário está mais ligado ao “fazer” do que ao “ser”. Nesse sentido “A empresa é uma atividade e, como tal, deve ter um sujeito que a exerça, o titular da atividade (o empresário). ” (TOMAZETTE, 2017, pg. 79).

Já no parágrafo único do artigo 966 do Código Civil, como dito acima, “não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”.

A dúvida aqui fica entorno do que é elemento de empresa, havendo, inclusive, diferentes conceitos da doutrina para tal. Entretanto, entende-se elemento de empresa como sendo a organização, citada aqui como um dos três elementos essencial para a caracterização da pessoa como empresário.

Assim, temos que o profissional que exerce primordialmente atividade intelectual, científica literária ou artística para o seu sustento, de forma “simples” e direta ao seu consumidor e/ou cliente, não é empresário.

Já se esse mesmo profissional organiza a produção/atividade, contrata, fiscaliza e remunera o trabalho de outras pessoas que fazem parte da cadeia de produção de bens ou prestação de um serviço, nesse caso, teremos a caracterização do elemento de empresa e, assim, o profissional do parágrafo único do 966 passa a ser empresário. (SCHREIBER, 2019, p. 1348)

Complementando temos o enunciado nº 194 da III Jornada de Direito Civil: “Os profissionais liberais não são considerados empresários, salvo se a organização dos fatores de produção for mais importante que a atividade pessoal desenvolvida.

Para ilustrar a transformação do profissional do parágrafo único do 966 em empresário, usamos o exemplo clássico do médico, trazido pela doutora Rachel Sztajn (2006, p. 201, apud SYLVIO MARCONDES MACHADO, 1977, p. 11):

Parece um exemplo bem claro a posição do médico, o que quando opera ou faz diagnóstico, ou dá a terapêutica, está prestando um serviço resultante de sua atividade intelectual, e por isso não é empresário. Entretanto, se ele organiza fatores da produção, isto é, une capital, trabalho de outros médicos, enfermeiros, ajudantes, etc., e se utiliza de imóvel e equipamentos para a instalação de um hospital, então o hospital é empresa e o dono ou titular desse hospital…, será considerado empresário porque está, realmente, organizando os fatores da produção, para produzir serviços.

Desta feita, o que realmente define a pessoa como empresaria é a organização, digo, a iniciativa de organizar, conforme preceitua o Dr. Fabio Ulhoa Coelho (2019, p. 132): “Empresário é a pessoa que toma a iniciativa de organizar uma atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços. ”.

Desse modo, organizar deve ser entendido como “administrar”, em outras palavras, agregar, reunir, pesquisar, contratar, gerenciar etc. O empresário não é somente quem explora atividade econômica, mas principalmente quem a organiza. (TOMAZETTE, p. 80).

Assim podemos dizer que organização é o que o parágrafo único do artigo 966 chamas de elemento de empresa. A organização pressupõe um afastamento da pessoalidade no exercício da profissão, ou seja, do atendimento pessoal ao cliente.

Quando a função de organizar está à frente da função de atender pessoalmente, o profissional passa a gerenciar/administrar o negócio, delegando o atendimento do cliente a um terceiro que foi contratado para prestar tal atendimento.

Logo, empresário é a pessoa que organiza todos os elementos necessários para explorar determinada atividade empresarial, visando acima de tudo o lucro e assumindo todos os riscos decorrentes do negócio, independentemente se a sua atividade é intelectual ou não, podendo responder ilimitadamente, subsidiariamente ou solidariamente sobre os danos que causar enquanto explora atividade econômica, como será demostrado no próximo texto.

 


REFERÊNCIAS

Negrão, Ricardo, Comercial e de empresa: teoria geral da empresa e direito societário / Ricardo Negrão. – Coleção Curso de direito volume 1 – 16. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

Tomazette, Marlon, Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito societário, v. 1 / Marlon Tomazette. – 8. ed. rev. e atual. – São Paulo: Atlas, 2017.

Martins, Fran. Curso de direito comercial / Atual. Carlos Henrique Abrão – 40. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.

Coelho, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume 1 [livro eletrônico]: direito de empresa / Fábio Ulhoa Coelho. – 23. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.

Alcantara, Silvano Alves. Direito empresarial e direito do consumidor [Livro eletrônico]/ Silvano Alvez Alcantara, Curitiba: InterSaberes, 2017.

García-Gutiérrez Fernández, Carlos; Fernández Guadaño, Josefina El empresario individual: situación actual y propuestas de actuación futuras CIRIEC-España, Revista de Economía Pública, Social y Cooperativa, núm. 52, agosto, 2005, pp. 201- 217.

SZTAJN, R.. Notas sobre o conceito de empresário e empresa no Código Civil brasileiro. Pensar (UNIFOR), v. 11, p. 192-202, 2006.

Código Civil comentado – doutrina e jurisprudência / Anderson Schreiber … [et al.]. – Rio de Janeiro: Forense, 2019.

FEDERAL, Conselho da justiça. Enunciado VI. Jornada de Direito Civil. Disponível em https://www.cjf.jus.br/enunciados/%20enunciado/374. Acessado em 03 de maio de 2021.

< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm >. Acesso em: maio 2021. BRASIL.

< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm >. Acesso em: maio 2021. BRASIL.

 

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