sexta-feira,29 março 2024
ColunaCorporate LawComércio eletrônico e a incidência fiscal à luz da Economia Digital

Comércio eletrônico e a incidência fiscal à luz da Economia Digital

Introdução

Ainda há muito a ser discutido sobre como será o mundo quando a crise tribusanitária que o assola passar, contudo uma coisa é certa: o comércio eletrônico será um dos baluartes da Economia Digital; ciclo econômico sem retrocesso, afinal não se pode olvidar o avanço da tecnologia 5G, bem como da inteligência artificial e robotização. Todavia, o Estado de Direito da República Federativa do Brasil ainda precisa trilhar largos passos para se posicionar corretamente em razão da boa aplicação fiscal ao fomento da atividade econômica hodierna.

Desta forma, buscamos refletir com o objetivo de produzir uma análise versando sobre a nuance estrutural do Estado de Direito em prol de uma regular conduta de arrecadação. Outrossim, alertamos os empresários a buscarem o máximo grau de previsibilidade possível, evitando dissabores arrecadatórios motivados pela incorreta incidência tributária ao comércio eletrônico, assim como um planejamento estratégico às regras matrizes de incidência que poderão ser constituídas em futuro  próximo. A mensagem deve ser única: a ciência jurídica tem a função de ser o farol a iluminar os portos acinzentados do mar repleto de decisões politicas imprecisas e desfavoráveis à dialética obrigatória entre Estado e Empresa.

A realidade jurídica e globalização

O mundo social é um reflexo do mundo natural, pois possui suas leis, seus dogmas e sua postura frente ao emaranhado caótico fomentador do acaso. Nesse jaez os gregos possuíam inteira razão ao supor, através de suas tragédias um cosmos regado pela frieza ao nada: para os gregos o universo era regido pelo acaso, e, portanto até mesmo os Deuses poderiam possuir um final trágico. Vide o próprio final de Cronos ao ser destruído pelos seus filhos ao comando de Zeus.

Nesse sentido, a realidade jurídica se impõe ao universo social como balizadora de sentido, segurança e coerência entre as relações. Todavia, não há realidade jurídica sem a esfera fática da vida cuja qual irá revelar os aspectos do real: elementos de fundação do caminhar humano pela história. Esse movimento possibilita um processo de adaptação da lógica jurídica à conduta exposta em sua frente: o direito possui a natureza de correr atrás dos fatos, já os fatos se expressam na frente do direito sem qualquer pudor ou sacramento, pois seus comandos repletos de crueza e imparcialidade laçam à realidade jurídica notas que precisam ser ordenadas para a composição do acorde intitulado ordenamento jurídico.

Diante deste quadro, o ordenamento jurídico posto passa a incidir na vida dos indivíduos, criando uma condição inédita para a adequação da realidade natural à realidade jurídica: os indivíduos inseridos na realidade natural precisam obedecer aos comandos dispostos pela realidade jurídica através de seu ordenamento, sem o questionamento prévio de veracidade da regra, pois ela, sendo jurídica, já comporta uma veracidade intrínseca proveniente da gama de fatos lançados pela realidade natural a priori, portanto, a incidência da regra jurídica é indiferente à intencionalidade das pessoas, principalmente quando os seus resultantes decantam em atos de infringência.

Vejamos, se um motorista passa pela rua acima da velocidade permitida e, igualmente, infringe o sinal vermelho do semáforo, automaticamente ele estará quebrando a regra cuja qual dispõe sobre o comportamento ao trânsito; nesse caso a consequência lógica será a sanção; contudo acrescentamos um elemento do fato natural, demonstrando que o motorista cometeu tais infrações devido ao estado de desespero motivado pelo nascimento de seu filho: sua mulher dava a luz ao seu filho dentro do carro e o “réu” partia em alta velocidade rumo ao hospital mais próximo; esse fato natural não justifica o erro para a realidade jurídica, pois ele só deixará do sofrer a sanção se houver outra regra jurídica que verse a respeito de excludente, nesse ponto a própria excludente será fruto de uma realidade natural apresentada anteriormente à constituição da regra jurídica, fundamentada pela ideia onde o ser humano pode ser acometido por situações de desespero motivadas por circunstâncias, moralmente, plausíveis. Ora, mesmo a excludente só será possível em caso de positivação do fato natural à realidade jurídica, caso contrario abrir-se-ia um debate, contudo esse debate não poderia, em um primeiro momento, excluir a sanção.

Isso posto, vem à lume o cenário da globalização, aspecto estruturante do que se cunhou denominar como Economia Digital: a globalização surge através de dois fatores preponderantes: a) a tecnologia e b) a dinamização do trabalho decorrente da queda entre as fronteiras regionais do mundo.

O cenário posto pela globalização trouxe à baila a figura do negócio eletrônico, modificando conceitos, procedimentos, cautelas, materiais, logística, e tudo no tocante à comunicação entre os agentes globais: o mundo torna-se cada vez mais digital, transações que eram realizadas através de uma burocracia pautada na morosidade, agora dão espaço para a celeridade proveniente de comandos instantâneos, algo que podemos denominar de “e-life” (vida eletrônica).

Assim, o negócio eletrônico possibilita o surgimento do comércio eletrônico, sendo este consequente lógico ao mundo da vida cotidiana das transações comerciais virtuais: o mundo se alarga para a expansão do capitalismo, agora em sua forma digital, ao mesmo tempo se encolhe para o sentido de fronteira e de delimitação espacial aos agentes da vida civil.

Nesse tom a professora Elidie Palma Bifano nos orienta através do estudo realizado em sua tese “negócio eletrônico e o sistema tributário brasileiro”: “a tecnologia informacional (informação, processamento e comunicação) é a matéria-prima da chamada Revolução da Informação e da construção da sociedade da informação. Tecnologia, neste contexto, deve ser entendida, consoante Harvey Brooks e Daniel Bell, citados por Manuel Castells, como o uso do conhecimento cientifico para especificar as vias de se fazerem coisas de maneira reproduzível. A informação e comunicação circulam em redes de mídia, mediante fluxos incorporados à estrutura e linguagem dessas redes; é evidente, para o analista da sociedade, que ela vem sendo transformada e organizada em torno desses fluxos. A tecnologia da informação está transformando os conceitos de espaço e tempo, conceitos esses perseguidos pelos homens desde sempre; na era da informação o tempo se desvincula de qualquer referência (torna-se intemporal ou não cronológico na expressão de Castells), pois os fluxos ligam todos os homens em qualquer parte do mundo onde eles estejam. Estar on-line ou em tempo real significa afastar todo e qualquer elemento de referência. O mesmo se passa com o espaço: é possível, estando no espaço virtual, estar em qualquer território onde a rede esteja, sem sair de casa”. [BIFANO, Elidie Palma. O Negócio Eletrônico e o Sistema Tributário Brasileiro. Editora Quartier Latim. Ano 2004. Pag. 76].

Portanto, a realidade jurídica precisa conjurar, como se fosse um processo alquímico, ferramentas de suporte à realidade natural emanada do universo econômico, pois é o seu dever preservar a coerência entre as transações, não olvidando, hodiernamente, de qualquer postura negocial impulsionada pela Economia Digital.

Inovação, mercado e comércio eletrônico

A reunião de fatores para compor a realidade jurídica em razão da correta aplicação dos anseios da Economia Digital às transações contemporâneas, espraia na conclusão lógica de uma agenda econômica ornada pela inovação.

O termo “inovação” se popularizou na literatura econômica através do economista Joseph Schumpeter (1883-1950) em seu livro “Teoria do Desenvolvimento Econômico” publicado em 1912. Para o austríaco, o termo “inovação” não se reduz pura e simplesmente àquilo que é novo ou a alguma novidade vendável. Muito mais do que isto, a “inovação” é o principal mecanismo pelo qual o capitalismo se desenvolve, nesse sentido a postura do capitalismo se motiva pelas inovações engendradas no próprio ceio do sistema econômico vigente, produzindo ferramentas expansionistas que darão o sentido à postura das transações entre os agendes de mercado.

É imprescindível ao mercado estabelecer um cenário de real fomento ao ganho de capital, para tanto ele precisará, através da ordem jurídica, fazer valer o empenho dos agentes em beneficio da customização espacial projetada pelo comércio eletrônico. É nessa toada que versa Bifano: “o fenômeno da integração internacional, provocado pelo avanço tecnológico e pelo rompimento de todas e quaisquer barreiras culturais e sociais, nos leva a um conceito que os cientistas sociais e economistas, estudiosos da matéria, designaram por globalização e que a de ser avaliado com um pouco mais de profundidade, especialmente no que tange às mudanças que pode acarretar na estrutura do Estado, representando, para muitos, uma verdadeira ameaça. A partir de agora adentramos na grande discussão que pretende definir se, de alguma forma, o processo informacional e de globalização que se apresenta, de fato, põe em risco a identidade das sociedades, a soberania dos Estados e, portanto, as várias manifestações dessa soberania, inclusive o poder de tributar”. [BIFANO, Elidie Palma. O Negócio Eletrônico e o Sistema Tributário Brasileiro. Editora Quartier Latim. Ano 2004. Pag. 77].

Depreende-se ser o capitalismo sistema adaptativo às disposições do mundo fático, muito mais célere que o universo jurídico, a seara econômica consegue absorver a necessidade individual humana e formatar um produto cujo qual a satisfaça. Desta maneira, verificamos que a estrutura econômica irá ditar as regras para a realidade jurídica produzir, através de seu cabedal lógico, as ferramentas corretas ao bom uso dos particulares.

Uma vez implementada a inovação e auferido o lucro extra pelo empreendedor, os demais empresários passam, então, a compreender melhor o novo cenário e traçam alternavas de reação ao estimulo inicial, tornando possível o surgimento de novos estabelecimentos na tentativa de oferecer algo similar ao que foi inovado e, com isto, apropriarem-se de partes do lucro extra: todos desejam elaborar o mesmo modelo de negócio com base nos postulados já ratificados pelo mercado e assegurados pela realidade jurídica, neste viés surge o negócio eletrônico que dará vazão as transações empreendidas pelo comércio eletrônico em todo o mundo.  Sem olvidar, trazemos a profundidade de Schumpeter para enriquecer a exposição: “não se deve esse caráter evolutivo do processo capitalista apenas ao fato de que a vida econômica transcorre em um meio natural e social que se modifica e que, em virtude dessa mesma transformação, altera a situação econômica. […] Tampouco esse caráter evolutivo se deve a um aumento quase automático da população e do capital, nem às variações do sistema monetário, do qual se pode dizer exatamente o mesmo que se aplica ao processo capitalista. O impulso fundamental que põe e mantém em funcionamento a máquina capitalista procede dos novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização industrial criadas pela empresa capitalista”.[SCHUMPETER, J. A. Capitalismo, socialismo e democracia. New York: Harper and Brothers, 1961. Pag. 110].

Sintetizando: o surgimento de uma nova ordem circunstancial proporciona aos agentes do mercado, juntamente com o Estado um processo de adequação ao novo modelo de negócio posto: enquanto os particulares buscam compreender e aplicar as novas ferramentas à obtenção de lucro e elevação do faturamento de seu negócio, o Estado, por sua vez, precisa correr contra o tempo para lançar ao palco as normas adequadas em razão da obtenção de receita através da atividade econômica posta, e, em derradeiro usar da realidade jurídica para tributar em beneficio do bem público. Contudo, o aspecto arrecadatório do Estado precisa estar em consonância com a lógica exposta pela realidade jurídica e toda a sua tradição história, politica, econômica e social, caso contrario ele criará, das duas uma: a) um grande Leviatã opressor da atividade econômica vigente, degringolando-se posteriormente através da baixa arrecadação: se o Estado não souber tributar corretamente ele solapa os agentes proliferadores de pecúnia, e, ao fazer isso, acarreta à sua própria ruina, pois ele não terá como suprir a falta de receita, entrando, consequentemente em recessão; b) se anulará em razão da atividade econômica (laissez-faire), gerando, em última análise, uma escassez de recursos tão grande que não poderá cumprir com as garantias constitucionais, acarretando, em segundo plano, o completo esvaziamento da atividade econômica e desvalorização do trabalho humano, haja vista, ficar a mercê da globalização: ao passo que as empresas ganham força, elas passam a alocar seus investimentos e capital no exterior, minando, por completo, qualquer possibilidade de elevação do Índice de Desenvolvimento Humano de seu país de origem.

Sistema tributário: estrutura jurídica, indução e elisão fiscal

Através do versado até aqui se constata a importância da correta tributação para proporcionar o equilíbrio econômico, social e político do país, no entanto, a realização deste projeto perfaz a necessidade de politicas públicas que fomentem as ferramentas de indução da atividade econômica, evitando a possibilidade de evasão fiscal e construindo os pilares para um correto planejamento tributário em prol da elisão fiscal. Desta maneira o Estado possui papel ímpar em formatar uma estrutura jurídica que dará azo à norma expositora de regra matriz de incidência, abraçando o fato da vida natural e injetando nele o aspecto fiscal.

Comparativamente verificamos que os Estados Unidos da América também buscam formatar uma politica fiscal coerente ao comércio eletrônico, pois as demandas da Economia Digital modificam o aspecto espacial do tributo, e, consequentemente gera um déficit na receita de seus entes federados. O Poder Legislativo Federal americano há quase duas décadas vem se preocupando em não deixar a rede digital uma zona livre de tributação, mas de aproximá-la o máximo possível à tributação aplicada ao comércio físico tradicional, de modo a impedir a formação de um mercado de concorrência desleal.

Outrossim, a União Europeia, de forma bastante simplista, se caracteriza, ao seu aspecto aduaneiro, por um modelo de integração regional marcado pela supressão das restrições tarifárias entre os membros do bloco, formando uma área de livre comércio, além da adoção de uma tarifa externa comum. Assim, no comércio entre os países membros do bloco não existem barreiras alfandegárias, como, por exemplo, o imposto de importação e, em relação aos não membros, os países membros devem adotar a mesma política fiscal.

Destarte, configura-se na União Europeia o IVA (Imposto Sobre o Valor Acrescentado), nesse passo se verifica que a maior vantagem do IVA que o levou a ser adotado como o principal imposto na base de consumo da União Europeia é a sua neutralidade. Essa característica se manifesta de duas formas: a) o IVA é neutro em relação à estrutura das etapas de uma cadeia de produção e circulação, na medida em que não incentiva a integração vertical das empresas e a consequente concentração do mercado e perda de eficiência da produção e b) a neutralidade do ponto de vista do mercado internacional: se o bem for exportado no meio da sua cadeia de produção e circulação, ele será facilmente desonerado de todo o tributo pago até aquela etapa, de modo que não se opera uma bitributação e o produto exportado concorre em paridade com produtos nacionais do país importador. Essas características nascem com o aspecto da não cumulatividade engendrada ao IVA.

Noutro giro, devemos aprender com os exemplos, supra, para agregar a qualidade arrecadatória brasileira. Mister trazer à baila ser o cenário  proposto pelo comércio eletrônico testemunha de uma constante a longo prazo, haja vista a facilidade com que os negócios eletrônicos proporcionam frente a momentos de crise aguda, como a presenciada pela crise sanitária que atinge o mundo no ano de 2020, bem como as demandas da Economia Digital que não poderão ser freadas.

Nesse passo, a complexidade do sistema tributário brasileiro pode ser dirimida através da boa aplicação da incidência tributária no tocante aos bens e serviços, ou seja, a base de consumo, onde se verificam, principalmente, o imposto sobre produto industrializado de competência federal, o imposto sobre circulação de mercadorias e serviços de competência estadual e o imposto sobre serviços de qualquer natureza de competência municipal.

Diante do desafio, o Estado precisa estruturar seu ordenamento tributário para construir a agenda de incidência fiscal ao comercio eletrônico, motivado, em um primeiro momento, pela analise da origem e destino que o negócio eletrônico terá, além, da aferição da potencialidade fiscal de cada estado-membro e município da federação. Óbvio ser esse um trabalho  árduo, mas é de fundamental importância para o fim da guerra fiscal motivada pelo ICMS, ao  mesmo passo ser importante sinal de adequação da ordem econômica brasileira à Economia Digital.

O Superior Tribunal de Justiça buscou através do REsp nº 1.439.753, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, da Primeira Turma, julgado em 06 de novembro de 2014, fomentar a reflexão a cerca da tributação do comércio eletrônico, possuindo como material de análise discussão a respeito da incidência de ISS:

“TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS. COLETA DE MATERIAL. UNIDADES DIVERSAS. LOCAL DO ESTABELECIMENTO PRESTADOR. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Discussão a respeito da definição do sujeito ativo do ISS quando a coleta do material biológico dá-se em unidade do laboratório estabelecida em município distinto daquele onde ocorre a efetiva análise clínica.  2. “A municipalidade competente para realizar a cobrança do ISS é a do local do estabelecimento prestador dos serviços. Considera-se como tal a localidade em que há uma unidade econômica ou profissional, isto é, onde a atividade é desenvolvida, independentemente de ser formalmente considerada com sede ou filial da pessoa jurídica” (REsp 1.160.253/MG, Rel. Min. CASTRO MEIRA, Segunda Turma, DJe de 19/8/10).  3. Na clássica lição de Geraldo Ataliba, “cada fato imponível é um todo uno (unitário) e incindível e determina o nascimento de uma obrigação tributária” (Hipótese de Incidência Tributária. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 73).  4. O ISS recai sobre a prestação de serviços de qualquer natureza realizada de forma onerosa a terceiros. Se o contribuinte colhe material do cliente em unidade situada em determinado município e realiza a análise clínica em outro, o ISS é devido ao primeiro município, em que estabelecida a relação jurídico-tributária, e incide sobre a totalidade do preço do serviço pago, não havendo falar em fracionamento, à míngua da impossibilidade técnica de se dividir ou decompor o fato imponível.  5. A remessa do material biológico entre unidades do mesmo contribuinte não constitui fato gerador do tributo, à míngua de relação jurídico-tributária com terceiros ou onerosidade. A hipótese se assemelha, no que lhe for cabível, ao enunciado da Súmula 166/STJ, verbis: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de uma para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”.  6. Recurso especial conhecido e não provido. [BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial – REsp nº 1.439.753. Relator(a): Min. Arnaldo Esteves Lima. Primeira Turma, julgado em 06 de novembro de 2014, publicado em 12 de dezembro de 2014].

Notoriamente se estabelece à problemática envolvendo o comércio eletrônico, agregando o debate acerca da indução, pois ao cumprir com a agenda de mercado, o Estado brasileiro pode, ao mesmo tempo, realizar um fluxo de indução à atividade econômica que promoverá o desenvolvimento nacional.

Um ordenamento tributário para ser equânime deve respeitar a capacidade econômica do contribuinte, ao tempo que não se esqueça do princípio do mínimo existencial. Este princípio se faz necessário no que diz respeito à proteção de seus direitos fundamentais, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, conforme dispõe o art. 7º, inciso IV, da Constituição da Republica. Em tempo, uma ferramenta econômica para se chegar a este ideal, é verificada através da curva de Laffler, desenvolvida pelo economista norte-americano Arthur Laffler (1979), onde nos diz que o aumento das alíquotas pode gerar consequente anulação de arrecadação de receita, por outro lado, a diminuição drástica das alíquotas produzirá o mesmo efeito. Então qual seria a melhor conduta razoável? Ela estaria no que Aristóteles (385 a.c – 323 a.c) estipulou como ponto médio: a teoria nos diz que a partir de um determinado ponto da curva (nível de tributação), a elevação das alíquotas dos tributos produz efeito inverso, isto é, a arrecadação reduz, proporcionalmente, pelo esgotamento da capacidade contributiva. Portanto, se verifica a necessidade inconteste de uma eficácia do pacto federativo em razão da correta incidência tributária ao comércio eletrônico, sanando os erros cometidos ao longo dos últimos anos no tocante a uma guerra fiscal motivada, única e exclusivamente, pela péssima gestão fiscal do Estado em propor uma norma geral (lei complementar em matéria tributária conforme preceitua o Art. 146, inciso III da Constituição da Republica), fato que pacificaria o conflito, contudo a constatação é clara: a União ainda prefere ornar discussões politicas, ao invés de discussões estruturais.

As empresas que utilizam do negócio eletrônico como modelo negocial, não podem descuidar do correto planejamento tributário para suportar a carga fiscal atinente, seja ela desprovida de lógica jurídica, fator que enseja discussão litigiosa na esfera administrativa ou judicial por meio do processo tributário, ou da carga fiscal vindoura, pois cedo ou tarde o Estado brasileiro precisará descortinar os empecilhos à tributação do comércio eletrônico, inclusive para impulsionar a sua balança comercial, ponto fulcral para o manejo estratégico de recuperação econômica. Tudo isso fomenta o projeto de elisão fiscal em detrimento da evasão fiscal, pois a elisão promove o PIB (Produto Interno Bruto), igualmente torna a empresa competitiva no mercado, sem solapar a atividade econômica e consequentemente toda a sociedade com o cerceamento da obtenção de receita pública.

Considerações finais

O mundo empresarial é marcado pela constante incerteza que pauta seu orçamento futuro, é sabido por todos os empreendedores ser a sua balança patrimonial instável em razão de sua dependência ao faturamento que, em momentos de crise, é colocado em cheque através da vinculação com toda a conjuntura econômica circundante à empresa.

A elaboração de um planejamento para construir um mapa estratégico, devidamente, desenhado em prol das incertezas futuras é fundamental, pois embora o futuro pareça incerto, ele carrega em seu bojo grau de previsibilidade abstraído do comportamento econômico. Portanto, a Economia Digital realiza o comércio eletrônico como um de seus baluartes, e, nessa esteira é necessário ao empresário estar atento a conduta de arrecadação do Estado Fiscal.

Em tempo, o mapa estratégico para o correto planejamento tributário deverá seguir o passo a passo exposto abaixo: a) previsão e destino do faturamento; b) produtos e serviços contemplados; c) orçamento das despesas operacionais; d) previsão de aquisições de produtos e insumos; e) localização dos fornecedores; f) estimativa da margem de lucros.

Há um sinal de alerta piscando incessantemente no universo dos negócios eletrônicos. Esse alerta deve ser respeitado, pois como nos diz Silvio Crepaldi: “Do ponto de vista tributário, a empresa eficiente seria aquela que, por meio de atividade lícita, busca identificar, com a indispensável antecedência, a alternativa legal e tributária menos onerosa para atingir determinado objetivo negocial ou patrimonial. Não é demais lembrar que, do ponto de vista dos proprietários, constitui obrigação da alta administração da empresa planejar seus negócios com vistas a aumentar suas receitas e reduzir seus custos, inclusive os tributários.” [CRIPALDI, Silvio. Planejamento Tributário: teoria e prática. 3ª Edição. Editora Saraiva. Ano 2019. Pag. 38].

Na outra ponta o Estado de Direito precisa agir em benefício do bem comum, fomentando um processo de arrecadação coerente e cientifico para que a curva de Laffer se realize, desta maneira a atividade econômica poderá corroborar ao êxito da balança comercial, e, em derradeiro posicionar o Brasil a uma condição desejável em égide de políticas públicas cujas quais elevem o IDH brasileiro; resumindo: não há liberdade empresarial de mercado, sem a ordem estatal fundada pela realidade jurídica, ambas precisam dialeticamente caminhar na direção do ciclo econômico vigente.

 

Referência bibliográfica

BIFANO, Elidie Palma. O Negócio Eletrônico e o Sistema Tributário Brasileiro. Editora Quartier Latim. Ano 2004.

CRIPALDI, Silvio. Planejamento Tributário: teoria e prática. 3ª Edição. Editora Saraiva. Ano 2019.

FARIAS, José Eduardo. O direito na economia globalizada. 1ª Edição. Editora Malheiros. São Paulo. Ano 2004.

REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 5ª Edição. Editora Saraiva. Ano 2000.

SCHUMPETER, J. A. Capitalismo, socialismo e democracia. New York: Harper and Brothers. Ano 1961.

 

Advogado. Membro efetivo da Comissão de Direito Tributário e da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial, ambas da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo.

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