sábado, 27/julho/2024
ArtigosDesconsideração da Personalidade Jurídica no Código Civil

Desconsideração da Personalidade Jurídica no Código Civil

Por Vitória Arêdes*


Segundo Gonçalves (2015, p. 218): “pessoas jurídicas são entidades a que a lei confere personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direito e obrigações”. Desta maneira, podemos afirmar que essa personalidade é distinta da de cada um de seus membros. Não se confundindo assim, o patrimônio da pessoa jurídica com a da pessoa natural, respeitando deste modo o Princípio da Autonomia Patrimonial.

Em muitos casos, o sócio utiliza da personalidade jurídica para cometer abusos como, desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Visando coibir tais atos, foi criado o instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica. Tal teoria permite que o juiz consiga avançar até aos bens particulares dos sócios por dívidas contraídas pela pessoa jurídica. De acordo com Cristiano Chaves de Faria entende-se que:

A desconsideração da personalidade jurídica significa, essencialmente, o descumprimento episódico (eventual), pelo Poder Judiciário, da personalidade autônoma de uma pessoa jurídica, com o propósito de permitir que seus sócios respondam com seu patrimônio pessoal pelos atos abusivos ou fraudulentos praticados sob o véu societário.” (FARIAS, 2014, p. 452).

O instituto supracitado está previsto no artigo 50 do Código Civil, como podemos ver a seguir:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

De acordo com a doutrina e a jurisprudência, para efeito da desconsideração a teoria adotada no artigo 50 é a “teoria maior”. Ela diz que basta comprovar a fraude e o abuso, para que o juiz possa ignorar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas (GONÇALVES, 2015). Então, exige-se o requisito específico do abuso caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.

Segundo Gonçalves (2015), a teoria maior divide-se em duas:

  1. objetiva: que é caracterizada pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou quando evidenciada a confusão patrimonial;
  2. subjetiva: que somente é possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade, salvo em situações específicas previstas em leis especiais.

Quanto a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, o juiz não pode aplicar a teoria senão por meio de ação judicial própria movida pelo credor da sociedade contra os sócios, na qual se tenha demonstrado o uso fraudulento ou abusivo do princípio da autonomia patrimonial (COELHO, 2003, p. 43).

A jurisprudência tem reconhecido o abuso de personalidade no processo de execução quando não encontra bens do devedor e se estiver presente as suspeitas que autorizem tal alegação.  Assim, o juiz pode requerer o arresto diretamente nos bens do sócio. Para melhor exemplificar, vejamos a jurisprudência abaixo:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL. REQUISITOS. PENHORA. BENS. INEXISTÊNCIA. CONFUSÃO PATRIMONIAL. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. A jurisprudência de ambas as Turmas que compõem a Segunda Seção reconhece a possibilidade de direcionar a execução para os bens dos sócios da empresa-executada desde que presente o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, na forma do art. 50 do Código Civil. Precedentes. 2. O Tribunal local concluiu pelo abuso da personalidade jurídica da sociedade executada, caracterizado pela confusão patrimonial e pelas tentativas frustradas de localizar bens em nome da empresa. Assim, sendo certo que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial, considera os fatos tais como delineados pelo acórdão recorrido, não há como rever esse entendimento, diante do óbice da Súmula 7/STJ. Precedentes. 3. Como incidente processual, a desconsideração da personalidade jurídica dispensa a citação dos sócios, que podem dispor de instrumentos processuais outros adequados a esse desiderato. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido.

(STJ – AgRg no REsp: 1459843 MS 2014/0143126-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 23/10/2014, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/11/2014)

Tendo em vista os aspectos que foram abordados, podemos concluir que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica visa proteger as relações de obrigações dos sócios. Fazendo assim que o princípio da Autonomia Patrimonial não seja utilizado para prejudicar terceiros. Vale ressaltar sua importância para melhor efetivação de direitos no que concerne ao direito privado e de suas implicações.


Referências Bibliográficas:

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. v. 1.

FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de direito civil.10. ed. Salvador: JusPodivm, 2014.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 2.

STJ – AgRg no REsp: 1459843 MS 2014/0143126-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 23/10/2014, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/11/2014.

 

*Vitória Arêdes, colaborou com nosso site por meio de publicação de conteúdo. Ela é acadêmica de Direito, Pesquisadora Bolsista na Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce (Fadivale) e Estagiária na Procuradoria Geral do Município de Governador Valadares-MG. Futura advogada. Amante de séries jurídicas.

 
envie-artigo-pj

 | Website

Você pode enviar seu artigo para ser publicado. Leia a página COLABORE e saiba mais.

Receba artigos e notícias do Megajurídico no seu Telegram e fique por dentro de tudo! Basta acessar o canal: https://t.me/megajuridico.
spot_img

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Mais do(a) autor(a)

Most Read

Seja colunista

Faça parte do time seleto de especialistas que escrevem sobre o direito no Megajuridico®.

Últimas

- Publicidade -