sábado, 27/julho/2024
ArtigosOs Direitos Sociais e a Judicialização Contemporânea

Os Direitos Sociais e a Judicialização Contemporânea

Por Araújo Neto*

O ordenamento jurídico brasileiro enfrenta uma dicotomia que há tempos se tornou pertinente na seara constitucional: o abismo existente entre o rol de normas que preveem garantias sociais do individuo e a sua real efetivação, seja esta por políticas públicas ou não. É preciso que o tema seja tratado com reflexão e colocado
como relevante nas pautas legislativas, uma vez que tais direitos são requisitos imprescindíveis para uma vida digna.
Mas, afinal, o que são Direitos Sociais? Como assevera Dirley da Cunha Júnior:

São posições jurídicas que credenciam o indivíduo a exigir do estado uma postura ativa, no sentido de que este coloque à disposição daquele, prestações de natureza jurídica ou material, consideradas necessárias para implementar as condições fáticas que permitam o efetivo exercício das liberdades fundamentais e que possibilitam realizar a igualização de situações sociais desiguais, proporcionando melhores condições de vida aos desprovidos de recursos materiais.

Ou seja, são prerrogativas que incubem aos indivíduos o direito de exigir do Estado ações que garantam a concretização dos Direitos Sociais.

Descriminados no art. 6º da Constituição Federal, o qual aduz que “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados“, percebe-se que eles são de fundamental relevância, seja na doutrina ou
na própria Carta Magna.

Todavia, no ordenamento jurídico brasileiro inexistem políticas públicas que assegurem a máxima de tais direitos. Seja pela omissão do legislador ou ainda pela declaração de impossibilidade por parte do Poder Executivo, os indivíduos tornam-se alheios aos seus próprios direitos e recorrem ao Poder Judiciário e à sua função típica a
fim de que alcancem a corporificação desses direitos, em face à inércia do Estado para a consecução dos mesmos. A ingerência e a falta de planejamento por parte da Administração Pública são outros empecilhos encontrados no nosso ordenamento, tornando nítido o descaso do Estado para com os cidadãos.

Desta feita, qual seria o impedimento formal encontrado pelo Estado na execução de políticas públicas que concretizem tais direitos? Antes de responder a essa pergunta, deve-se primar pelo entendimento do que sejam essas políticas. Entende-se por Políticas Públicas os conjuntos de programas, ações e atividades desenvolvidas pelo
Estado diretamente ou indiretamente, com a participação de entes públicos ou privados, que visam assegurar determinado direito de cidadania, de forma difusa ou para determinado seguimento social, cultural, étnico ou econômico. Elas correspondem a direitos assegurados constitucionalmente ou que se afirmam graças ao reconhecimento
por parte da sociedade e/ou pelos poderes públicos enquanto novos direitos das pessoas, comunidades, coisas ou outros bens materiais ou imateriais.

Assim, como qualquer ato da administração pública, essas políticas envolvem planejamento e orçamento de recursos estatais e é nesse ensejo que o Estado se mune da abstenção para a efetivação desses direitos. Noutras palavras, ele faz uso do Instituto da Reserva do Possível e encontra nessa brecha formal a possibilidade de
sobressair licitamente da sua incumbência em regrar os Direitos Sociais.

Torna-se, a cada dia, mais comum, ações em que o Poder Judiciário obriga o Poder Executivo a realizar ações prestacionais que materializam as prerrogativas do indivíduo e a isso denominamos de Judicialização dos Direitos Socia is. Como alvo de discussões entre os colegiados legislativos, executivos e judiciários, deve-se ponderar e
questionar se este é o melhor caminho: obrigar, de fato, o poder executivo a concretizar
essas políticas é o melhor caminho?

Como os recursos financeiros do Estado são limitados, percebe-se que há um impedimento formal sobre essa corporização de direitos. Assim, uma vez sendo impossível a realização integral desses direitos, é incoerente que o Poder Judiciário obrigue o Estado à consecução daqueles. Diante da multiplicidade de direitos a ser
realizada em contraponto a ausência de recursos suficientes para tal, não há alternativa senão atribuir ao Legislativo e ao Executivo a tarefa de instituir políticas públicas estabelecendo prioridades. Sem dúvida, a esses Poderes políticos, através de critérios razoáveis e considerando as reservas orçamentárias, incumbe as definições de quais necessidades serão atendidas com primazia.

Assim, de fato a Judicialização dos Direitos Sociais é fundamental para que a execução integral desses direitos seja atendida, servindo como força motriz. Todavia, se todas os direitos só se materializarem por meio de Ações Civis Públicas, mais cedo ou mais tarde, o Estado novamente irá se abster dessa realização, alegando falta de
recursos e impossibilidade de execução.

Então, o melhor caminho é lutar para que os poderes Legislativo e Executivo fomentem a prática de criação de políticas públicas efetivas que assegurem tal prerrogativa individual: a de que seus direitos – sociais ou não – sejam de fato seus.


REFERÊNCIAS:

CUNHA JUNIOR, Dirley da. A efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais e a Reserva do Possível. Leituras Complementares de Direito Constitucional: Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. 3. ed., Salvador: Editora Juspodivm, p. 349-395, 2008. Material da 4ª aula da disciplina Teoria Geral dos Direitos e Garantias Fundamentais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito do Estado –UNIDERP/REDELFG.

RIZZI, Ângela Onzi. Ação civil pública: instrumento para a concretização de direitos sociais?. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3971, 16 maio 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/28018>. Acesso em: 25 nov. 2014.

 

 

*Manoel Franscisco Araújo Neto é acadêmico de direito na UESPI.

envie-artigo-pj

 | Website

Você pode enviar seu artigo para ser publicado. Leia a página COLABORE e saiba mais.

Receba artigos e notícias do Megajurídico no seu Telegram e fique por dentro de tudo! Basta acessar o canal: https://t.me/megajuridico.
spot_img

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Mais do(a) autor(a)

Most Read

Seja colunista

Faça parte do time seleto de especialistas que escrevem sobre o direito no Megajuridico®.

Últimas

- Publicidade -