quinta-feira,18 abril 2024
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Magistrado constata advocacia predatória e advogado terá que indenizar banco no valor de 30 mil reais

Atualmente, muito se tem falado acerca da advocacia predatória, que embora seja um termo relativamente novo, a prática em si não é, haja vista que trata-se do ajuizamento de ações em massa oriundas de dados dos consumidores que acabam vazando, onde são utilizadas petições totalmente padronizadas e sem fundamento jurídico, já que as teses são genéricas, inexistindo portanto, qualquer litigio, e consequentemente, razões para judicialização das demandas.

Como se não bastasse isso, tais ações são propostas muitas das vezes sem os autores sequer terem conhecimento, visto que muitos causídicos acabam falsificando assinaturas em procurações quando obtém acesso aos dados dos consumidores, isso quando não os procuram com o argumento de que possuem direito à valores depositados em contas judiciais e que para levantamento dos valores, estes precisam lhes conceder poderes para representa-los, persuadindo os assim, a conferirem suas assinaturas no instrumento procuratório.

Denota-se que, esta conduta além de totalmente ilegal, por serem repletas de irregularidades que vão desde a captura irregular de clientela pelos advogados, até a configuração de crimes de falsidade documental e até mesmo de estelionato, também acarreta em prejuízos para as partes, já que os advogados envolvidos com esta prática visam tão somente obter proveito econômico pessoal com as demandas à qualquer custo, utilizando-se da vulnerabilidade dos consumidores.

No caso em tela, o causídico ajuizou a ação em nome de A.F.G., aduzindo em síntese que, a parte era beneficiário do Regime Geral de Previdência Social, onde estava ocorrendo descontos em seu benefício que desconhecia, já que supostamente não havia contratado nenhum cartão de crédito consignado para ensejar os débitos, motivo pelo qual requereu a condenação do Banco ao pagamento da repetição do indébito, além de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,000.

Em sede de contestação, a Instituição Financeira enfatizou a legalidade do débito, bem como, o ajuizamento reiterado de ações pelo patrono da parte autora, onde as exordiais se assemelham por possuírem a mesmo relato fático (supostos pedidos de cancelamento de cartão de crédito através de notificação extrajudicial, onde o Banco quedou-se inerte), ocorrendo tão somente a alteração do nome dos autores e algumas vezes o número do contrato.

Subsequentemente, o magistrado da Vara Única da comarca de Ouroeste, interior de São Paulo, prolatou a sentença, onde iniciou discorrendo acerca da advocacia predatória, passando a relatar a conduta do patrono do autor, onde constatou que este havia distribuído na comarca 152 ações praticamente com a mesma causa de pedir, onde suspeitando da conduta, determinou que fosse diligenciado junto aos requerentes dos processos para esclarecer as circunstâncias da contratação, e vários deles confirmaram a inexistência de interesse de agir, informando inclusive que, foram procurados pelo advogado e seus representantes com documentação e procuração já prontas para assinatura para suposto recebimento de indenização judicial. Ao passar para a analise do mérito, asseverou que a presente deveria ser extinta sem resolução de mérito, por inexistir interesse de agir, diante da evidente falta de litígio real, pois o interesse, na verdade, sempre foi do advogado.

Ao final, já no dispositivo, extinguiu o feito sem resolução de mérito nos termos do artigo 485, inciso VI do CPC, condenando solidariamente, a parte autora e seu advogado ao pagamento das custas processuais no valor de R$ 3.000,00 e multa por litigância de má-fé no valor de R$ 5.000,00, condenando o causídico ao pagamento de indenização por danos morais ao Banco BMG, ora contestante. Além disso, o magistrado determinou que a OAB fosse oficiada para instaurar processo disciplinar para averiguar a conduta profissional do causídico; oficiou também, a policia civil para instaurar inquérito para investigar a conduta do causídico e de seus clientes por incorrerem crime de estelionato (nos termos do artigo 171 do Código Penal); determinou a expedição de oficio com o teor da sentença para a administração do fórum da comarca, para que os demais magistrados pudessem ter conhecimento da prática da advocacia predatória pelo advogado em comento.

Irresignado, o causídico opôs embargos declaratórios em nome do autor, os quais ainda não foram julgados, suscitando contradição na sentença proferida, sob o argumento de que o douto juízo havia solicitado a concessão do benefício da justiça gratuita sem critério adequado, quando havia apenas acostado nos autos a documentação que o próprio magistrado havia solicitado; que as 152 ações não eram idênticas e que eram fruto de seus 30 anos exercendo a advocacia; e que em que pese a determinação de oficiar a subseção da OAB de Ouroeste, esta sequer existe. Nos pedidos, requereu o acolhimento dos embargos para sanar as contradições e obscuridade, onde também requereu a desistência da ação, renunciando inclusive, o prazo recursal.

Imperioso destacar que, este tipo de conduta é bem corriqueira, onde os causídicos e a grande maioria de seus clientes, visam tão somente o enriquecimento ilícito, tendo como alvos principalmente instituições financeiras, empresas de telefonia e internet, grandes varejistas e concessionárias de energia elétrica.

Destarte, como o próprio magistrado salientou, a prática não só é punível na esfera administrativa pela OAB por ser totalmente antiética e violar expressamente o Código de Ética da entidade, configurando uma sanção gravíssima passível de exclusão do causídico do rol de inscritos, bem como, no âmbito penal, já que a conduta configura crime, sem contar na condenação também no âmbito cível, no que concerne pagamento de custas processuais, indenização por dano moral, honorários advocatícios e multa por litigância de má-fé. Deste modo, conclui-se que, a advocacia predatória além de prejudicar os requeridos, sobrecarrega o judiciário sem qualquer necessidade, já que as demandas na realidade são fictícias, como também de certa forma acaba comercializando e banalizando a Justiça. Assim, faz-se necessário atentar-se ao modus operandis empregado nos casos, principalmente com relação à distribuição de elevadas demandas pelo mesmo advogado e/ou sociedade de advogados com causas de pedir similares e petições genéricas, pois há grandes indícios desta prática.

Cinthya Machado

Advogada do Vigna Advogados Associados.

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