sexta-feira, 26/julho/2024
ArtigosITCMD: inconstitucionalidade da diferenciação de alíquota em razão do grau de parentesco

ITCMD: inconstitucionalidade da diferenciação de alíquota em razão do grau de parentesco

Não é novidade para os contribuintes as inúmeras ilegalidades constantes nas legislações que regulamentam a cobrança de tributos, sejam elas federais, estaduais ou municipais.

A legislação do Estado de Santa Catarina que regulamenta a cobrança do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD é um bom exemplo a ser citado, visto que existem vários dispositivos passíveis de discussão.

Poucos contribuintes têm conhecimento, mas o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina reconheceu, em novembro de 2020, a inconstitucionalidade do artigo 9º, inciso V, da Lei Estadual nº 13.136/2004, o qual dispõe:

Art. 9º As alíquotas para a cobrança do imposto são:
(…)
V – oito por cento sobre a base de cálculo, quando:
o sucessor for:
1) parente colateral; ou
2) herdeiro testamentário ou legatário, que não tiver relação de parentesco com o de cujus; e
b) o donatário ou cessionário:
1) for parente colateral; ou
2) não tiver relação de parentesco com o doador ou cedente.

Segundo o entendimento da Corte, a aplicação de alíquota diferente em razão da inexistência de parentesco com o sucessor ou donatário viola o princípio da capacidade contribuitiva.

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. ART. 9º, V, DA LEI ESTADUAL N. 13.136/2004. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE BENS E DIREITOS – ITCMD. NORMA QUE APLICA MAIOR ALÍQUOTA DO TRIBUTO EM RAZÃO DO GRAU DE PARENTESCO COM O DE CUJUS. PROGRESSIVIDADE. CRITÉRIO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO COM A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 145, § 1º, DA CF. JURISPRUDÊNCIA DO STF PACÍFICA NESSE SENTIDO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. ARGUIÇÃO PROCEDENTE.
“[…] Embora constitucional, a adoção de alíquotas progressivas para o ITCD confronta com o princípio da capacidade contributiva a utilização do grau de parentesco como critério de fixação da progressividade” (RE 555511 AgR, Rela. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, j. 5/8/2020).
(TJSC, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível (Órgão Especial) n. 0000542-77.2020.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Órgão Especial, j. 18-11-2020).

Em seu voto, nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade acima citada, o Desembargador Relator Sérgio Roberto Baasch Luz, deixa claro que não se está em discussão a progressividade da alíquota, mas sim a utilização do critério relacionado ao parentesco constante especificamente no inciso V, do artigo 9º, da Lei Estadual nº 13.136/2004.

Importante citar que o Supremo Tribunal Federal também já se manifestou acerca da temática. Veja-se:

DIREITO TRIBUTÁRIO. ITCD. CONSTITUCIONALIDADE DA PROGRESSIVIDADE DA ALÍQUOTA. PAR METRO. GRAU DE PARENTESCO. CRITÉRIO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO COM A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. CONSON NCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TR NSITO. REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA. PROCEDIMENTO VEDADO NA INST NCIA EXTRAORDINÁRIA. AGRAVO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. O entendimento da Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. Embora constitucional, a adoção de alíquotas progressivas para o ITCD confronta com o princípio da capacidade contributiva a utilização do grau de parentesco como critério de fixação da progressividade. 2. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 3. Agravo interno conhecido e não provido (RE 555511 AgR-segundo, Relator(a): Rosa Weber, Primeira Turma, j. 5/8/2020) (grifou-se).

Embora tenha ocorrido o reconhecimento da inconstitucionalidade tanto pelo TJSC quanto pelo STF, a Fazenda Pública Estadual continua exigindo o pagamento do percentual de 8% (oito por cento) caso o contribuinte seja parente colateral ou não possua grau de parentesco com o falecido ou doador.

Logo, a única forma de obter a redução da alíquota é ingressando com ação judicial em face do fisco.

Vale ressaltar que, dependendo do valor do patrimônio, a diferença de valores recolhidos aos cofres públicos pode ser significativa, haja vista que as alíquotas progressivas variam de 1% (um por cento) a 7% (sete por cento), enquanto quem não for parente colateral ou não possuir grau de parentesco com o falecido ou com o doador sempre recolherá o ITCMD com alíquota de 8% (oito por cento), independentemente do valor dos bens ou direitos.

Por exemplo, na doação de um imóvel avaliado em R$ 100.000,00 (cem mil reais), caso ocorresse de pai para filho, a alíquota aplicada se basearia tão somente no valor do bem, aplicando-se, progressivamente, as alíquotas de 1% (um por cento) a 5% (cinco por cento):

Até R$ 20.000 (1%) = R$ 200,00
De R$ 20.000,00 até R$ 50.000,00 (3%) = 900,00
De R$ 50.000,00 até R$ 100.000,00 (5%) = R$ 2.500,00
TOTAL ITCMD A SER PAGO: R$ 3.600,00

Já se essa mesma doação fosse feita entre dois irmãos (parentes colaterais) a alíquota seria de 8% (oito por cento), o que resultaria no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a serem recolhidos aos cofres públicos. Ou seja, o contribuinte efetuaria, na prática, o recolhimento de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais) a mais do que o efetivamente devido.

Veja-se que o segundo caso levou em conta tão somente o grau de parentesco entre as partes, sem considerar o valor do bem imóvel, não havendo, portanto, a aplicação da alíquota progressiva como no primeiro caso.

Portanto, é de suma importância a verificação da legalidade da exigência do fisco, tendo em vista que há grandes chances de ocorrer uma cobrança indevida ou de valores incorretos.

Por fim, destaca-se que a legislação de outros Estados que utilize como critério para diferenciação das alíquotas a relação de parentesco, também é considerada inconstitucional.

Marcos Roberto Hasse
Hasse Advocacia

Graduado em direito na FURB – Universidade Regional de Blumenau/SC em (1995). Pós Graduado em Direito Tributário e Processual Tributário (2002), pela UNIVILLE –Universidade da Região de Joinville/SC. Advogado atuante nas matérias de Direito Civil, Tributário, Previdenciário, Trabalhista e Ambiental. Foi professor na UNERJ – Universidade Regional de Jaraguá do Sul/SC, hoje Católica de Santa Catarina.

Receba artigos e notícias do Megajurídico no seu Telegram e fique por dentro de tudo! Basta acessar o canal: https://t.me/megajuridico.
spot_img

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Mais do(a) autor(a)

Most Read

Seja colunista

Faça parte do time seleto de especialistas que escrevem sobre o direito no Megajuridico®.

Últimas

- Publicidade -