quinta-feira, 25/julho/2024
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Limbo trabalhista e previdenciário – o que fazer?

Coordenação: Francieli Scheffer H.

 

Cessado o pagamento do benefício previdenciário, em decorrência da alta médica atestada pelo perito da Previdência, a suspensão do contrato de emprego se extingue, voltando este a produzir seus regulares efeitos. Essa é a interpretação que se extrai do conteúdo da Súmula nº 440 e da OJ nº 375 da SDI-I do TST:

Súmula nº 440 do TST
AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RECONHECIMENTO DO DIREITO À MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE OU DE ASSISTÊNCIA MÉDICA – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez.

OJ nº 375 da SDI-I.
AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. CONTAGEM. (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010)
A suspensão do contrato de trabalho, em virtude da percepção do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, não impede a fluência da prescrição quinquenal, ressalvada a hipótese de absoluta impossibilidade de acesso ao Judiciário.

 

Neste passo, com o término da suspensão contratual, em decorrência da alta médica atestada pela Previdência, compete ao trabalhador retornar ao trabalho. Essa é a diretriz que se extrai da Súmula nº 160 do TST, não obstante tratar de benefício pontual (aposentadoria por invalidez):

Súmula nº 160 do TST
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
Cancelada a aposentadoria por invalidez, mesmo após cinco anos, o trabalhador terá direito de retornar ao emprego, facultado, porém, ao empregador, indenizá-lo na forma da lei.

 

Com efeito, a partir da alta médica atestada pelo órgão previdenciário o empregado assume o dever de retornar ao trabalho.

Ademais, torna-se necessário que o trabalhador se submeta a exame a ser realizado pelo médico da empresa em observância ao regramento estabelecido no art. 168 da CLT, caput e §2º, reproduzidos abaixo:

Art. 168 – Será obrigatório exame médico, por conta do empregador, nas condições estabelecidas neste artigo e nas instruções complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho: (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
I – a admissão;
II – na demissão;
III – periodicamente.
§ 2º – Outros exames complementares poderão ser exigidos, a critério médico, para apuração da capacidade ou aptidão física e mental do empregado para a função que deva exercer.

Em que pese tratar-se de auxílio-doença acidentário, importa destacar no julgado abaixo qual é o comportamento que o Poder Judiciário espera do empregador após a cessação do benefício previdenciário:

EMENTA: CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-ACIDENTÁRIO. PERÍODO NO QUAL O OBREIRO POSTULA PELAS VIAS ADMINISTRATIVA E JUDICIAL A MANUTENÇÃO DE BENEFÍCIOS JUNTO À PREVIDENCIA SOCIAL. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE SALARIOS E DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. LIMBO JURÍDICO.
Cessado o benefício previdenciário, a empresa tem obrigação de convocar o trabalhador para o exame médico, de modo a aferir a existência de aptidão laborativa, e, a partir de então, convocar o trabalhador para retorno ao posto de trabalho, adaptando-o, se necessário, em função compatível com sua capacidade física naquele momento. E, em caso de constatação de incapacidade laborativa total, é obrigação da empresa encaminhar o empregado novamente ao INSS, diligenciando, junto ao órgão previdenciário, para que o auxílio-doença seja prorrogado. In casu, não obstante o atestado de saúde ocupacional ter declarado a inaptidão da trabalhadora, a ré tinha ciência de que a obreira foi considerada apta pelo Órgão Previdenciário, além de ter sido aprovada em programa de reabilitação profissional, e deixou de convocar a empregada para o trabalho, o que inclui a readaptação, permitindo, assim, que durante o período de postulação de novo benefício junto ao Órgão Previdenciário e, posteriormente, na via judicial, a reclamante permanecesse, por quase 3 anos, em espécie de limbo jurídico, sem salário e sem perceber o benefício previdenciário. Esta conduta omissiva empresária importou na transferência para a empregada do ônus exclusivo de discutir, nas vias administrativa e judicial, possível inaptidão laborativa, o que afronta princípios constitucionais da valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana, fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º da CF/88), notadamente em casos em que o afastamento do empregado decorreu de acidente do trabalho. Assim, o comportamento da ré autoriza concluir que ela concordou com as ausências no período de postulação junto ao órgão previdenciário e na via judicial, devendo se responsabilizar, por conseguinte, pelo pagamento dos salários e demais benefícios do período de afastamento, sob pena de se relegar a trabalhadora a um limbo, sem proteção jurídica. Vistos os autos, relatado e discutido o recurso ordinário interposto contra decisão proferida pelo douto juízo da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, em que figuram como recorrente Conservadora Cidade LTDA. e como recorrido Aparecida Maria Braga. (TRT 3ª Região – 01688-2014-112-03-00-0 RO – 1ª Turma – RELATORA: JUÍZA CONVOCADA ANGELA CASTILHO ROGEDO RIBEIRO – Publicação: 24.02.2016) (grifos acrescidos)

Com efeito, na eventualidade de o empregado não retornar ao trabalho no prazo de 30 dias após a cessação do benefício previdenciário ou não justificar o motivo que obstou o seu retorno, haverá presunção de abandono de emprego. Essa é a orientação que se observa no teor da súmula nº 32 do TST:

Súmula nº 32 do TST
ABANDONO DE EMPREGO (nova redação) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.

 

Importa frisar que a constatação do abandono demanda a prova robusta do elemento objetivo (ausência continuada por 30 dias) e do elemento subjetivo (intenção do empregado em deixar o trabalho).

Portanto, o fato de o trabalhador ter sido considerado apto, com a subsequente cessação do benefício previdenciário, constitui elemento que extingue o período de suspensão contratual. O fato de o trabalhador ajuizar ação previdenciária na justiça comum não altera essa conclusão.

Contudo, é preciso destacar a possibilidade de a alta promovida pela Previdência não ser compatível com o resultado do exame realizado pelo médico do trabalho da empresa ou particular (contratado pelo trabalhador), e os reflexos desse fato no contrato de emprego.

É importante destacar eventuais situações e reflexos que podem decorrer do seguinte fato: capacidade do trabalhador atestada pela Previdência (e cessação de benefício previdenciário) ao mesmo tempo em que a sua incapacidade é aferida por intermédio de médico do trabalho da empresa ou particular do trabalhador.

Como é sabido, o afastamento do empregado por motivo de saúde, quando inferior a 15 dias, deve ser suportado pela própria empresa. Se, no entanto, o afastamento exceder esse prazo, a partir do décimo sexto dia caberá ao INSS, mediante perícia médica para atestar a incapacidade para o trabalho, a concessão do auxílio-doença.

Enquanto o empregado estiver recebendo esse benefício, seu contrato de trabalho permanecerá suspenso, nos termos do art. 476 da CLT: “em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo de benefício”.

Coloca-se, no entanto, a questão de como proceder quando o médico do trabalho da empresa entende pela incapacidade de retorno do empregado, mas o INSS concede alta ao afastado e, mesmo havendo recurso administrativo ou ajuizamento de ação de natureza previdenciária na justiça comum, o pagamento do benefício é interrompido. Isso tem sido bastante comum nos casos de aplicação da chamada “alta programada”, política do órgão previdenciário para reduzir o número de beneficiários do auxílio-doença.

Em tais situações de divergências entre o INSS e o médico da empresa quanto à capacidade de trabalho, vislumbramos algumas alternativas e caberá à empresa, diante de cada caso, optar pela mais conveniente e viável.

Dentre as alternativas possíveis, a primeira delas é, quando a empresa tomar ciência da alta médica, intimar o empregado, por meio de um ato convocatório formal, para exercer a mesma função ou, na impossibilidade desta, uma função compatível com suas limitações de saúde, caso do trabalho restrito.

Nesse caso, se o trabalhador se recusar a retornar, poderá a empresa dispensá-lo e até alegar abandono de emprego, pois o recurso administrativo do INSS ou mesmo uma ação judicial não tem efeito suspensivo – exceto se expressamente deferido.

Essa conduta encontra respaldo nas seguintes decisões, destacando-se os trechos negritados:

RETORNO AO TRABALHO. ACIDENTE DO TRABALHO. Recurso através do qual era buscada a manutenção do benefício acidentário que é negado pelo INSS. Retorno ao emprego que deve ser assegurado pela empregadora, a qual arca com as obrigações decorrentes do contrato de emprego. Recurso não provido. (TRIBUNAL: 4ª Região – RO NUM: 00192.009/95-8 ANO: 1995 – RO – 1a. TURMA – 22-11-1999 – Relatora JUÍZA MAGDA BARROS BIAVASCHI).

JUSTA CAUSA. ABANDONO DE EMPREGO. É correta a justa causa aplicada a empregada que comparece ao trabalho muito depois de sua alta pelo INSS e ao indeferimento de seus recursos administrativos. Tal conduta não se justifica, sendo certo que não se pode exigir da empregada que espere, indefinidamente, pelo retorno de seus empregados (TRIBUNAL: 3ª Região, 1ª Turma, DECISÃO: 04/05/2009, RO – 00699-2008-142-03-00-7, DEJT DATA: 08-05-2009, RELATOR Manuel Cândido Rodrigues).

ALTA PREVIDENCIÁRIA – OPÇÃO DA EMPREGADA PELA INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS ADMINISTRATIVOS JUNTO AO INSS EM VEZ DE RETORNAR AO SERVIÇO – ABANDONO DE EMPREGO – NÃO-CONFIGURAÇÃO – A estabilidade provisória assegurada pelo art. 118 da Lei n. 8.213/91 tem como escopo a preservação do emprego, e não apenas o pagamento dos salários do período sem a correspondente prestação de serviços. Comprovando-se, porém, que o obreiro, apesar de não retornar ao serviço, interpôs diversos recursos administrativos junto ao INSS, com o conhecimento da empregadora, afasta-se a hipótese de abandono de emprego e, por conseguinte, a justa causa para o rompimento do pacto laboral, sobretudo quando não houve, por parte da empregadora, nenhum ato convocatório para que a empregada retornasse ao trabalho, sob pena de configurar-se a justa causa tipificada no art. 482, i, da CLT. Entende-se que, no lapso temporal decorrido entre a interposição dos recursos administrativos e a decisão final do INSS, não houve ânimo de abandonar o emprego, mas apenas de obter o reconhecimento da sua incapacidade laborativa e o consequente restabelecimento do benefício previdenciário. O comprovado desinteresse pelo retorno ao emprego, após o indeferimento dos recursos administrativos, equivale, in casu, a pedido de demissão tácito, sendo desprovida de fundamento a dispensa por abandono de emprego pretendida pela Reclamada (TRIBUNAL: 3ª Região, 1ª Turma, DECISÃO: 25 04 2005, RO – 01543-2004-067-03-00-8, DJMG DATA: 29-04-2005, RELATOR Juiz Antônio Gomes de Vasconcelos).

O importante é que a empresa envie um ato convocatório para o trabalho, a fim de que demonstre não consentir, ainda que tacitamente, com o afastamento do empregado. Pois, caso caracterizada tal concordância da empresa, esta assumirá a responsabilidade pela remuneração durante o período de afastamento, conforme exemplificam os julgados a seguir transcritos:

AFASTAMENTO – NEGATIVA DE AUXÍLIO-DOENÇA PELO INSS – INAPLICABILIDADE DA EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS – RESPONSABILIDADE DA EMPREGADAR – (…). Portanto, se a reclamante, apta para o trabalho de acordo com a decisão do INSS, permaneceu afastada por mais de dez meses, e retornou ao trabalho, sem qualquer penalidade, isto quer dizer que tinha a plena anuência do reclamado. Se o INSS tardou em julgar o recurso administrativo interposto, cumpria ao reclamado acatar a decisão primeira, retomando o curso normal do pacto laboral. Se, ao revés, ao seu talante, resolveu afastar a reclamante, quando podia obrigá-la a trabalhar, é óbvio que deve arcar com sua remuneração, já que a alteração contratual nociva aa empregada é expressamente vedada (art. 468 da CLT)” (TRIBUNAL: 3ª Região – DECISÃO: 23 04 2002 – RO NUM: 2832 – RO – 01710-2001-059-03-00 – Quinta Turma – DJMG DATA: 04-05-2002 PG: 19 – Relator Juiz Rogério Valle Ferreira).

AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA E ALTA MÉDICA IRREGULAR. RESPONSABILIDADE PREVIDENCIÁRIA 1. No caso de incapacidade laborativa a responsabilidade da empresa fica limitada ao pagamento dos primeiros quinze dias de afastamento, competindo ao órgão previdenciário pagar o auxílio-doença pelo restante do tempo que perdurar a incapacidade. 2. Se o órgão previdenciário, de forma equivocada, liberou o trabalhador para retorno ao trabalho e esse, por incapacidade laborativa, não conseguiu fazê-lo, permanece a situação suspensiva do contrato, não tendo a empregada obrigação de pagar salários no período de inatividade. 3. Comprovada que a situação incapacitante sobreviveu à alta médica, competirá ao INSS realizar o pagamento do auxílio-doença, pois a empregada não é responsável pela irregularidade. 4. Recurso não provido. 5. Decisão unânime (TRIBUNAL: 24ª Região, TP, ROPS – 1035-2005-002-24-00, DATA: 12/01/2006 DO-MS, Relator AMAURY RODRIGUES PINTO JÚNIOR).

A segunda alternativa, caso o empregado não tenha mesmo condições de exercer função alguma na empresa, é o médico do trabalho da empresa fornecer carta de encaminhamento com atestado de incapacidade para o trabalho e encaminhar o empregado para novo pedido de benefício junto ao INSS.

Além disso, é possível recorrer administrativamente perante o INSS ou ajuizar uma ação de concessão de benefício previdenciário na Justiça Federal, caso em que a saúde do empregado seria analisada por perito judicial, aumentando as chances de concessão de benefício.

Tais medidas, no entanto, não eximirão a empresa de remunerar o período de afastamento, caso concorde com esse afastamento e não convoque expressamente o empregado ao trabalho para uma mesma função ou outra compatível.

Outra alternativa, ainda, seria aguardar a decisão da ação judicial movida pelo empregado e, mediante um termo assinado, a empregadora se comprometer a pagar os salários do empregado até essa decisão e, caso o empregado receba o benefício retroativamente, deverá ressarcir a empresa dos valores que lhe foram pagos nesse período.

Não obstante existam algumas hipóteses para evitar a responsabilização e pagamento pelo empregador do período chamado “limbo trabalhista previdenciário” temos que a situação é complicada, pois o INSS ao dar alta ao trabalhador incapacitado exime-se de sua responsabilidade e o Judiciário, muitas vezes, tende a responsabilizar as empresas pelo pagamento dos salários, sobretudo se não há convocação para o trabalho.

Assim sendo, para evitar qualquer tipo de penalidade aumentada, como por exemplo danos morais, o prudente é convocar o trabalhador para o trabalho e caso ele não retorne ou alegue que está incapacitado, convocá-lo para avaliação junto ao médico do trabalho e/ou apresentação de documento que comprove sua incapacidade para retorno.

Não havendo comprovação pelo trabalhador ou este não comparecendo à avaliação junto ao médico do trabalho, caberá à empresa tomar as medidas cabíveis, conforme demonstrado neste artigo.

Advogada com 20 anos de experiência. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Mackenzie e em Administração e Direito do Terceiro Setor pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

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