sexta-feira,19 abril 2024
ColunaElite PenalUma breve análise da Lei Antiterrorismo: Lei 13.260/2016

Uma breve análise da Lei Antiterrorismo: Lei 13.260/2016

Consoante dispõe o art. 1º da Lei 8.072/90, são considerados hediondos os seguintes crimes, consumados ou tentados: homicídio, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente; homicídio qualificado; lesão corporal dolosa de natureza gravíssima e seguida de morte, quando praticadas contra autoridade ou agente de segurança pública e seus familiares; latrocínio; extorsão qualificada pela morte; extorsão mediante sequestro e na forma qualificada; estupro; estupro de vulnerável; epidemia com resultado morte; falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais; e favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança, adolescente ou vulnerável. São os chamados crimes hediondos próprios, cujo rol é taxativo, cabendo, portanto, ao legislador constitucional enumerá-lo, nos termos do art. 5º XLIII da Constituição Federal.

Nada obstante a relação trazida pelo art. 1º da Lei dos Crimes Hediondos, existem ainda os denominados crimes hediondos equiparados: tortura, tráfico de drogas e terrorismo, também previstos na Constituição. Porém, ao contrário do que já acontecia com os crimes de tortura e tráfico de drogas, regulamentados pelas Leis nº 9.455/97 e nº 11.343/2006, respectivamente, inexistia no ordenamento jurídico nacional lei específica regulamentando o crime de tortura, deixando assim um espaço vazio a ser ocupado.

Tal lacuna foi preenchida pela Lei 13.260 de 16 de março de 2016, que regulamentou o disposto no inciso XLIII, do art. 5º da Carta Magna, disciplinando o terrorismo, tratando das disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista.

Nesse passo, o art. 2º, caput, define como terrorismo a prática, por um ou mais indivíduos, de qualquer ato terrorista, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. O § 1º, do art. 2º, define nos incisos I, IV e V (os incisos II e III foram vetados), em que consistem os atos de terrorismo:

I – usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;

IV – sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;

V – atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa.

Nessas hipóteses, a pena cominada é de reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência.

Importa observar que o § 2º diferencia os atos terroristas dos atos praticados durante manifestações, não caracterizando terrorismo as condutas individuais ou coletivas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais. A parte final do referido parágrafo, no entanto, destaca que não haverá prejuízo da tipificação penal contida em lei.

Além de definir o que é terrorismo e tipificar os seus atos, a Lei 12.360/2016 traz em seu corpo a tipificação de outros crimes. Vejamos:

O art. 3º tipifica a conduta de promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista, cuja pena será de reclusão, de cinco a oito anos, e multa.

O art. 5º tipifica a conduta de realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito. Nessa hipótese, a pena cominada será a mesma aplicada ao delito consumado, porém diminuída de um quarto até a metade. Na forma do § 1º, incorrerá nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos terroristas:

I – recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade; ou

II – fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade.

Em tais hipóteses, quando a conduta não envolver treinamento ou viagem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, a pena será a correspondente ao delito consumado, diminuída de metade a dois terços (§ 2º). Todavia, cabe ressaltar que o art. 10 torna possível a aplicação da desistência voluntária e do arrependimento eficaz em favor do réu, consoante se extrai da sua redação:

 “Mesmo antes de iniciada a execução do crime de terrorismo, na hipótese do art. 5º desta Lei, aplicam-se as disposições do art. 15 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal”.

O art. 6º tipifica a conduta de receber, prover, oferecer, obter, guardar, manter em depósito, solicitar, investir, de qualquer modo, direta ou indiretamente, recursos, ativos, bens, direitos, valores ou serviços de qualquer natureza, para o planejamento, a preparação ou a execução dos crimes previstos de terrorismo. A pena cominada é de reclusão, de quinze a trinta anos. Preconiza o parágrafo único que incorrerá na mesma pena quem oferecer ou receber, obtiver, guardar, mantiver em depósito, solicitar, investir ou de qualquer modo contribuir para a obtenção de ativo, bem ou recurso financeiro, com a finalidade de financiar, total ou parcialmente, pessoa, grupo de pessoas, associação, entidade, organização criminosa que tenha como atividade principal ou secundária, mesmo em caráter eventual, a prática dos crimes tipificados na lei em análise.

O art. 7º define as causas de aumento de pena previstas para os crimes previstos na Lei Antiterrorismo:

“Salvo quando for elementar da prática de qualquer crime previsto nesta Lei, se de algum deles resultar lesão corporal grave, aumenta-se a pena de um terço, se resultar morte, aumenta-se a pena da metade”.

Não custa lembrar que a elementar é o fator que integra a definição básica de uma infração penal.

Indo além, todos os crimes tipificados na Lei 13.260/2016 são considerados praticados contra o interesse da União. Desse modo, a competência para a investigação criminal, em sede de inquérito policial pertence à Polícia Federal. Já o processamento e julgamento dos referidos delitos é de competência da Justiça Federal, como determina o inciso IV do art. 109 da CF.

Na seara processual penal, a Lei Antiterrorismo traz ainda importantes aspectos, sobretudo em relação às medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou em nome de pessoas interpostas, quando aqueles sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes de terrorismo. Tais medidas têm como finalidade preservar o valor dos bens sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção (alienação antecipada, prevista no § 1º); reparação dos danos causados pela ação do infrator, pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal (§ 4º).

Todavia, se comprovados lícitos quanto à origem e destinação, esses bens, direitos e valores serão liberados por determinação judicial, total ou parcialmente, mantendo-se, porém, a constrição daqueles necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal (§ 2º). Frise-se que não será conhecido o pedido de liberação sem o comparecimento pessoal do acusado ou da pessoa interposta a que se refere o caput do art. 12, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo do disposto no § 1º, conforme estabelece o § 3º.

Nos termos do art. 13, o juiz poderá nomear administradores para os bens, direitos ou valores sujeitos a medidas assecuratórias, desde que ouvido o Parquet e as circunstâncias o permitam. Os administradores poderão ser pessoas físicas ou jurídicas (remuneradas), e a administração se dará mediante termo de compromisso e prestação de contas.

Impende salientar que nos termos do art. 15, tais medidas assecuratórias poderão ser determinadas pelo juiz, por solicitação de autoridade estrangeira competente, na hipótese de existência de tratado ou convenção internacional, em razão de crimes de terrorismo praticados no estrangeiro. De acordo com o que dispõe o § 1º do art. 15, havendo reciprocidade do governo do país da autoridade solicitante, aplica-se o disposto no caput, independentemente de tratado ou convenção internacional. Porém, inexistindo tratado ou convenção, os bens, direitos ou valores sujeitos a medidas assecuratórias por solicitação de autoridade estrangeira competente ou os recursos provenientes da sua alienação serão repartidos entre o Estado requerente e o Brasil, na proporção de metade, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé (§ 2º).

A investigação, processo e julgamento dos crimes aqui tratados serão reguladas pelas disposições da Lei nº 12.850, de 2 agosto de 2013 (Organizações Criminosas), a qual também define as organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo legalmente definidos. Aplicam-se também a estes crimes as disposições da Lei nº 8.072/90.

Finalmente, os crimes previstos na Lei Antiterrorismo passam a integrar o rol dos delitos sujeitos à decretação de prisão temporária, descrito no inciso III do art. 1º da Lei 7.960/1989 (Prisão Temporária), o qual passa a vigorar acrescido da alínea “p”.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940: Código Penal

_______. Lei 13,260, de 16 de março de 2016.

_______. Lei 12.850, de 02 de agosto de 2013.

_______. Lei 8.072, de 25 de julho de 1990.

_______. Lei 7.960, de 21 de dezembro de 1989.

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