terça-feira,23 abril 2024
ColunaAdministrativoTeoria da cegueira deliberada no Direito Administrativo

Teoria da cegueira deliberada no Direito Administrativo

Olá amigos! Firmes e fortes nos estudos? Hoje estudaremos uma teoria que talvez você já tenha tomado conhecimento ao estudar Direito Penal, mas que já é reconhecido  no âmbito do Direito Administrativo, trata-se da “Teoria da cegueira deliberada“. Então, vamos ao tema!

teoria da cegueira deliberada no direito administrativo

Teoria da Cegueira deliberada

Antes de tudo, vamos entender o que vem a ser a teoria em questão. Tal teoria, teve início nos Estados Unidos por ocasião do caso In re Aimster Copyright Litigation, que será detalhado adiante. Foi acolhida pelo Direito brasileiro inicialmente no âmbito penal. Ganhou enorme repercussão quando mencionada nos autos da Ação Penal 470, popularmente conhecida como Mensalão, mas em outras ocasiões no Direito Penal brasileiro, já havia sido invocada.

A Suprema Corte dos Estados Unidos foi a responsável pela criação da Teoria da Cegueira Deliberada. Pode ser que ao estudar a respeito, se depare com ouras nomenclaturas que usadas para abordar a mesma teoria. Alguns preferem chama-la de Willful Blindness Doctrine (Doutrina da cegueira intencional), Ostrich Instructions (instruções de avestruz), Conscious Avoidance Doctrine (doutrina do ato de ignorância consciente), “Teoria das Instruções da Avestruz”. Em verdade, exitem numerosas denominações, todas buscam o mesmo objetivo.

Para bem ilustrar, certamente você já ouviu falar que alguém ”fingiu-se de João sem braço”, não é mesmo? Ou ainda, ”fulano se fez de bobo”. Pois bem, tal doutrina tem por objetivo punir o agente delituoso que ”fecha os olhos” diante de um ilícito, ou seja, aquele que  finge não enxergar a ilicitude da procedência de bens, direitos e valores com o intuito de auferir vantagens. Eis o motivo da comparação com o avestruz, o animal enterra sua cabeça na terra e não vê o que acontece ao redor. De semelhante modo, o agente delituoso  para não tomar conhecimento da natureza ou extensão do seu ilícito, ele simplesmente usa artifícios simula um desconhecimento a respeito do crime por ele praticado. Desta feita, pode-se afirmar que, para que a Teoria da Cegueira Deliberada seja aplicada de forma justa, é imprescindível que o agente tenha conhecimento da alta probabilidade determinado bem, algum direito ou pecúnia sejam provenientes de crimes e que o agente tenha agido de modo indiferente a esse conhecimento. De forma justa e coerente, a Teoria da Cegueira Deliberada busca punir o agente que se coloca, intencionalmente, em estado de desconhecimento ou ignorância, para não conhecer detalhadamente as circunstâncias fáticas de uma situação suspeita, grosso modo, busca punir o agente que ”se faz de bobo”.

Como já mencionado, a Teoria da cegueira deliberada teve sua origem na Suprema Corte dos Estados Unidos, no chamado caso In re Aimster Copyright Litigation, que envolvia uma disputa sobre violação de direitos autorais. Nessa decisão, a Corte firmou o entendimento no sentido de que o acusado não poderia alegar em sua defesa que não tinha conhecimento sobre a violação dos direitos autorais nos arquivos disponibilizados por ele, conforme se depreende do seguinte trecho da decisão:

“Nós também rejeitamos o argumento de Aimster no sentido de que o recurso de criptografia do serviço oferecido por Aimster o impedia de saber quais músicas estavam sendo copiadas pelos usuários de seu sistema. Dessa forma, não pode prosperar a alegação de que ele não tinha o conhecimento da atividade ilícita, o que é uma exigência para a responsabilização pela conduta de contribuir para a infração de direitos autorais. Cegueira voluntária é o conhecimento(…)é a situação em que o agente, sabendo ou suspeitando fortemente que ele está envolvido em negócios escusos ou ilícitos, toma medidas para se certificar que ele não vai adquirir o pleno conhecimento ou a exata natureza das transações realizadas para um intuito criminoso. Restou estabelecido que o esforço deliberado para evitar o conhecimento da ilicitude é tudo que a lei exige para estabelecer a culpa do acusado. Restou estabelecido que não querer saber porque se suspeita, pode ser, se não for o mesmo estado de espírito, o mesmo que a prática de uma conduta culposa. O acusado deliberadamente isola-se da transação de drogas real para que pudesse negar o conhecimento da transação ilícita, o que fez, por vezes, ao se afastar da entrega efetiva da droga(…)O acusado não pode fugir as suas responsabilidades pela manobra, não pode sustentar a alegação de que o software de criptografia o impede de ter conhecimento da violação de direitos autorais, que ele fortemente suspeita que ocorre (…) suspeita essa de que todos os usuários do seu serviço são, de fato, infratores de direitos autorais”

Teoria da cegueira deliberada aplicada no âmbito do Direito administrativo:

No âmbito do Direito Administrativo, destacaremos a  Apelação nº 0009252-56.2010.8.26.0073 do TJSP, pela primeira vez o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo aplicou a Teoria da cegueira deliberada aplicando à ilícito administrativo

Na ocasião, a 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça condenou o ex-prefeito de Avaré Joselyr Benedito Silvestre e um instituto por improbidade administrativa. O motivo foi a constatação de superfaturamento na contratação de serviços médicos para plantões nos prontos-socorros municipais.

De acordo com ação civil pública ajuizada pela Promotoria, Silvestre celebrou com a entidade termo de parceria para prestação de serviços médicos em plantões nos prontos-socorros do município. A empresa foi contratada sem realização de licitação e por valor muito superior em relação ao contrato anterior. Condenados o político à perda da função pública e o instituto a pagar multa, entre outras cominações, os réus recorreram.

O desembargador João Batista Morato Rebouças de Carvalho manteve a procedência da ação de primeira instância. “Em relação ao ilícito administrativo praticado neste caso concreto, perfeitamente adequada a aplicação da Teoria da Cegueira Deliberada, na medida em que os corréus fingiram não perceber o superfaturamento praticado com a nova contratação por intermédio de Termo de Parceria, com objetivo único de lesar o patrimônio público, não havendo agora como se beneficiarem da própria torpeza”, afirmou o relator em voto

A turma julgadora, da qual participaram os desembargadores Décio de Moura Notarangeli e Oswaldo Luiz Palu, votou de forma unânime.

A aplicação de tal teoria, ainda não está pacificada nos tribunais brasileiros no que tange ao Direito Administrativo, contudo, sua aplicação ganha espaço paulatinamente. Frisa-se que para que a teoria da cegueira deliberada possa ser corretamente aplicada, deve haver voluntariedade e intenção de se manter na ignorância, quando há possibilidade de se obter o conhecimento.

Este foi mais um tema super interessante que pode ser cobrado em provas de concursos públicos, então, continue estudando e vamos seguir Gabaritando Administrativo!

 

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