sexta-feira,29 março 2024
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STJ: Possibilidade de penhora de bem de família para pagar dívida de empreitada parcial de obra

A dívida proveniente de contrato de empreitada para a construção – ainda que parcial – de imóvel residencial faz parte das exceções legais que permitem a penhora do bem de família.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que permitiu a penhora de terreno com casa em construção para o pagamento de duplicatas referentes à empreitada contratada para a obra.

Segundo o processo, uma empresa de pequeno porte ajuizou execução contra os proprietários do imóvel afirmando ser credora da quantia original de R$ 10.702, representada por três duplicatas vinculadas a contrato particular de construção por empreitada parcial de obra.

Após a penhora do terreno, com obra de alvenaria inacabada, os executados alegaram a sua impenhorabilidade, por ser o único imóvel do casal e, apesar de a casa estar em construção, destinar-se à residência da família.

O juízo de primeiro grau considerou possível a penhora, afirmando que a dívida de financiamento de material e mão de obra destinados à construção de moradia, decorrente de contrato de empreitada, enquadra-se na hipótese do inciso II do artigo 3º da Lei 8.009/1990. O TJRS confirmou a decisão.

Ao apresentar recurso ao STJ, os executados alegaram ser inviável dar interpretação extensiva à norma legal, além de sustentarem que o crédito resultante da aquisição de material de construção e mão de obra (empreitada) não é privilegiado, motivo pelo qual deveria ser afastada a penhora sobre o único imóvel do casal, considerado bem de família.

Segundo o relator, ministro Marco Buzzi, a Lei 8.009/1990 apresenta taxativamente as hipóteses autorizadoras da penhora do bem de família.

Ele explicou que o inciso II do artigo 3º ressalva ser possível a penhora quando há pedido do titular do crédito decorrente de financiamento, o que abarca operações de crédito destinadas à aquisição ou construção do imóvel residencial, podendo essas serem stricto sensu – decorrente de operação envolvendo uma financiadora – ou em sentido amplo – nas quais se incluem o contrato de compra e venda em prestações, o consórcio ou a empreitada com pagamento parcelado durante ou após a entrega da obra.

No caso analisado, de acordo com Buzzi, a dívida executada decorreu da inadimplência de valores relativos a contrato de empreitada para construção, ainda que parcial, de uma casa de alvenaria, com fornecimento de material e mão de obra.

Assim, segundo o ministro, não é possível dizer que está sendo feita uma interpretação extensiva das exceções descritas na lei, “vez que há subsunção da hipótese à exceção legal, considerando-se os limites e o conteúdo do instituto do financiamento, esse que, diferentemente do alegado pelos ora insurgentes, uma vez incontroversa a origem e a finalidade voltada para a edificação ou aquisição do bem, não fica adstrito a mútuos realizados por agente financeiro do Sistema Financeiro Habitacional”, observou.

De acordo com o ministro, a situação é peculiar, pois o terreno sobre o qual foi ou seria construída a casa é de propriedade do contratante, que se comprometeu, mediante contrato específico de empreitada global, a saldar a dívida contraída para a construção de sua moradia com recursos próprios, mediante pagamento parcelado, tendo deixado de pagar a obrigação.

“O ponto nodal é que o executado realizou com a construtora uma operação de crédito concomitante ao ajuste atinente à edificação, e quedou-se inadimplente para com o pagamento da dívida contraída, essa vinculada especificamente à construção de sua própria moradia, a atrair, nesses termos, a exceção à regra da impenhorabilidade referida pelo inciso II do artigo 3º da Lei 8.009/1990, pois aqui a execução é movida pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à edificação do próprio prédio, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”, explicou.

Ao negar provimento ao recurso especial, o ministro ressaltou que, se o bem de família pode ser penhorado para garantir a quitação da dívida contraída para sua aquisição/construção, não há como afastar a conclusão segundo a qual a operação de crédito/financiamento viabilizou a construção do imóvel, motivo pelo qual também é inafastável a possibilidade de sua penhora.

“Entendimento em outro sentido premiaria o comportamento contraditório do devedor e ensejaria o seu inegável enriquecimento indevido, causando insuperável prejuízo/dano ao prestador que, mediante prévio e regular ajuste, bancou com seus aportes a obra ou aquisição, somente concretizada pelo tomador valendo-se de recursos do primeiro” – concluiu o relator.

Confira ementa:

RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO DE DUPLICATAS REFERENTES A EMPREITADA DE CONSTRUÇÃO PARCIAL DA EDIFICAÇÃO – PENHORA DO PRÓPRIO IMÓVEL OBJETO DO CONTRATO DE EMPREITA – INCIDENTE DE IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA REJEITADO – IRRESIGNAÇÃO DOS EXECUTADOS – RECURSO DESPROVIDO.
Hipótese: Averiguar se o crédito oriundo de contrato de empreitada para a construção, ainda que parcial, de imóvel residencial, encontra-se salvaguardado nas exceções legais de impenhorabilidade do bem de família.
1. No caso, as instâncias ordinárias entenderam que a obrigação/dívida oriunda de financiamento de material e mão-de-obra destinados à construção de moradia, decorrente de contrato de empreitada, enquadra-se na hipótese prevista pelo inciso II do artigo 3º da Lei nº 8.009/90, não sendo oponível ao credor a impenhorabilidade resguardada ao bem de família.
2. Para os efeitos estabelecidos no dispositivo legal (inciso II do art. 3º da Lei nº 8.009/90), o financiamento referido pelo legislador abarca operações de crédito destinadas à
aquisição ou construção do imóvel residencial, podendo essas serem stricto sensu – decorrente de uma operação na qual a financiadora, mediante mútuo/empréstimo, fornece recursos para outra a fim de que essa possa executar benfeitorias ou aquisições específicas, segundo o previamente acordado – como aquelas em sentido amplo, nas quais se inclui o contrato de compra e venda em prestações, o consórcio ou a empreitada com pagamento parcelado durante ou após a entrega da obra, pois todas essas modalidades viabilizam a aquisição/construção do bem pelo tomador que não pode ou não deseja pagar o preço à vista.
3. Não há falar esteja sendo realizada uma interpretação extensiva das exceções legais descritas na norma, vez que há subsunção da hipótese à exceção legal, considerando-se os limites e o conteúdo do instituto do financiamento, esse que, diferentemente do alegado pelos ora insurgentes, uma vez incontroversa a origem e a finalidade voltada à edificação ou aquisição do bem, não fica adstrito a mútuos realizados por agente financeiro do SFH.
4. Entendimento em outro sentido premiaria o comportamento contraditório do devedor e ensejaria o seu inegável enriquecimento indevido, causando insuperável prejuízo/dano ao prestador que, mediante prévio e regular ajuste, bancou com seus aportes a obra ou aquisição somente concretizada pelo tomador valendo-se de recursos do primeiro.
5. Recurso Especial desprovido.
(STJ – Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – REsp 1.221.372 – RS. Rel. Min. Marco Buzzi. Data do julgamento: 15 de outubro de 2019. DJe: 21/10/2019)

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