quarta-feira,27 março 2024
TribunaisSTJ: Comprador de imóvel não responde por honorários de sucumbência

STJ: Comprador de imóvel não responde por honorários de sucumbência

Comprador não responde por honorários de sucumbência arbitrados contra o antigo proprietário em ação de cobrança de cotas condominiais.


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que os honorários de sucumbência decorrentes de condenação em ação de cobrança de cotas condominiais não possuem natureza ambulatória (propter rem), ou seja, a obrigação de pagá-los não é transmitida para o comprador com a propriedade do imóvel.

O colegiado deu provimento ao recurso especial de uma sociedade para cancelar a alienação judicial eletrônica de imóvel adquirido por ela, cuja penhora havia sido determinada no curso da ação de cobrança de cotas condominiais movida contra o antigo proprietário.

Segundo informações do processo, a recorrente quitou os débitos condominiais devidos e peticionou, durante o cumprimento da sentença da ação de cobrança, pelo cancelamento do leilão eletrônico. No primeiro grau e no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o pedido foi indeferido, ao entendimento de que as verbas de sucumbência também deveriam ser quitadas, pois seguiriam a obrigação principal, estando vinculadas à pretensão de cobrança.

Ao STJ, a recorrente argumentou que os honorários advocatícios possuem natureza autônoma e não se confundem com a obrigação de pagar o condomínio. Afirmou que o acórdão do TJSP foi contraditório ao reconhecer que a verba de sucumbência não poderia ser exigida do comprador do imóvel – o qual não foi parte da ação de cobrança – e condicionar a suspensão da penhora ao pagamento dos honorários.

Obrigações ambulatórias

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que as obrigações ambulatórias “são aquelas que se vinculam à titularidade de um direito real, independentemente da manifestação de vontade do titular, e, por isso, são transmitidas a todos os que lhe sucedem em sua posição; são, pois, assumidas ‘por causa da coisa’ (propter rem)”.

Segundo ela, a compreensão extraída do artigo 1.345 do Código Civil é a de que as obrigações dos condôminos perante o condomínio são qualificadas como ambulatoriais, de modo que, “decorrendo as respectivas prestações da mera titularidade do direito real sobre imóvel, incidirão sobre a coisa e irão acompanhá-la em todas as suas mutações subjetivas”.

Ao citar a doutrina de Orlando Gomes, a ministra destacou que a obrigação de pagar os débitos em relação ao condomínio se transmite automaticamente, ainda que não seja essa a intenção do alienante e mesmo que o adquirente não queira assumi-la, constituindo um “vínculo jurídico pelo qual uma pessoa, embora substituível, fica adstrita a satisfazer uma prestação no interesse de outra”.

Interesse da coletividade

Em seu voto, a relatora ressaltou que o sentido dessa norma é fazer prevalecer o interesse da coletividade, permitindo que o condomínio receba, ainda que haja a transferência de titularidade do direito real sobre o imóvel, as despesas indispensáveis e inadiáveis para a manutenção da coisa comum.

“Daí se conclui que a obrigação de pagar as verbas de sucumbência, ainda que sejam elas decorrentes de sentença proferida em ação de cobrança de cotas condominiais, não pode ser qualificada como ambulatória (propter rem) e, portanto, não pode ser exigida do novo proprietário do imóvel sobre o qual recai o débito condominial”, disse a ministra.

Nancy Andrighi ressaltou que esse tipo de obrigação não está expressamente elencado no rol do artigo 1.345 do Código Civil, “até mesmo por não se prestar ao custeio de despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum”.

Além disso, segundo ela, o STJ já consolidou o entendimento de que os honorários de sucumbência constituem direito autônomo do advogado, de natureza remuneratória. “Trata-se, portanto, de dívida da parte vencida frente ao advogado da parte vencedora, totalmente desvinculada da relação jurídica estabelecida entre as partes da demanda”, explicou.

Confira Ementa:

 

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚM. 211/STJ. AÇÃO DE COBRANÇA DE COTAS CONDOMINIAIS. CONDENAÇÃO. ALIENAÇÃO DO IMÓVEL A TERCEIRO. PAGAMENTO DAS COTAS CONDOMINIAIS, MULTAS E JUROS MORATÓRIOS. OBRIGAÇÃO AMBULATÓRIA (PROPTER REM). VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. HIPÓTESE NÃO PREVISTA NO ART. 1.345 DO CC/02. HONORÁRIOS DEVIDOS PELO ALIENANTE. DIREITO AUTÔNOMO DO ADVOGADO DO CONDOMÍNIO. OBRIGAÇÃO QUE NÃO SE TRANSFERE AO ADQUIRENTE DO BEM. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO IMÓVEL CANCELADA. JULGAMENTO: CPC/73.
1. Ação de cobrança de cotas condominiais ajuizada em 24/08/2009, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 13/04/2015 e atribuído ao gabinete em 25/08/2016.
2. O propósito recursal é dizer se as verbas de sucumbência, decorrentes de condenação em ação de cobrança de cotas condominiais, possuem natureza ambulatória (propter rem), bem como se está configurado, na espécie, o excesso de penhora.
3. O art. 1.345 do CC/02 estabelece que o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios.
4. A obrigação de pagar as verbas de sucumbência, ainda que sejam elas decorrentes de sentença proferida em ação de cobrança de cotas condominiais, não pode ser qualificada como ambulatória (propter rem), seja porque tal prestação não se enquadra dentre as hipóteses previstas no art. 1.345 do CC/02 para o pagamento de despesas indispensáveis e inadiáveis do condomínio, seja porque os honorários constituem direito autônomo do advogado, não configurando débito do alienante em relação ao condomínio, senão débito daquele em relação ao advogado deste.
6. Hipótese em que não se justifica a alienação judicial do imóvel do recorrente-adquirente para o pagamento das verbas de sucumbência devidas pelo recorrido-alienante.
7. Recurso especial conhecido e provido.
STJ – Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – RECURSO ESPECIAL Nº 1.730.651 – SP (2016/0033800-3). Ministra Relatora Nancy Andrighi. Brasília (DF), 09 de abril de 2019(Data do Julgamento).

Leia o acórdão.

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