sexta-feira,19 abril 2024
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Consumidor desnorteado? Mercado de rótulos

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Rótulos e mais rótulos. O mercado de consumo gira. Nos dias atuais é possível encontrar em um supermercado diversas variações de um mesmo produto. A quantidade enorme de informações a respeito do que consumimos nos deixa desnorteados. Todavia, estas informações são importantes e não podem ser ignoradas. São uma questão de saúde pública. Todos já sabemos a importância da leitura de rótulos dos produtos a serem adquiridos.

Em recente artigo publicado no jornal “O Globo” [1] foi revelada a persistente dificuldade do consumidor em compreender as informações nutricionais constantes nas embalagens de alimentos. As informações geralmente estão ali (de alguma forma), mas nem sempre são inteligíveis. A pesquisa foi divulgada pelo IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). De acordo com os dados levantados pela pesquisa, os itens que mais dificultam a compreensão dos rótulos são:

  1. letra muito pequena (61 %)
  2. termos técnicos e números (51 %)
  3. poluição visual do rótulo (46,4 %)
  4. necessidade de cálculo da porção (41,6 %)

Houve ainda averiguação do nível de compreensão do rótulo na pesquisa realizada:

  1. quase totalmente (34,8 %)
  2. parcialmente (31,1 %)
  3. totalmente (25,1 %)
  4. muito pouco (8,5 %)
  5. nada (0,4 %)

Rótulo Frontal

Também houve constatação no sentido que a maioria dos consumidores entrevistados (93,3 % de 2.651 internautas) apoia o rótulo frontal, isto é, a informação nutricional na frente da embalagem, de forma que o consumidor consiga identificar de imediato a informação nutricional do produto a ser consumido e realizar comparações práticas. A ideia já é seguida por países como Equador, “Reino Unido” e Austrália, sendo defendida pelo IDEC e recomendada pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Informação

Quando tratamos do assunto “informação” na relação de consumo, estamos nos referindo diretamente aos princípios da transparência e da confiança, verificados expressamente no Código de Defesa do Consumidor [2]:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (…)

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (…)

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (…)

A palavra transparência não transmite um conceito difícil de entender. Transparência faz referência a algo nítido, tangível, verdadeiro, decifrável. Já o princípio da confiança é algo um tanto quanto universal. A sociedade funciona com base no princípio da confiança. Você tem a confiança de poder atravessar com seu carro um sinal verde em uma via pública, da mesma forma que tem a confiança de que o conteúdo daquela embalagem que você compra no supermercado realmente tem o que o fabricante diz ter. Uma barra de chocolate é uma barra de chocolate, e não um veneno. A verdade é que as informações nutricionais não asseguram de forma absoluta o conteúdo das embalagens. Por mais fiscalização que exista, sempre há o componente da confiança.

Confiança no rótulo

O princípio da confiança não é uma lei absoluta. Trata-se de um princípio e, como qualquer outro, pode ser quebrado. Foi o que aconteceu há pouco tempo com diversas marcas de suplementos para atletas (Whey Protein – proteína do soro do leite). Sabe-se quanto aos consumidores adeptos de uma vida saudável que a busca por aumento de massa muscular magra os leva à procura pela famosa proteína do soro do leite. Todavia, naquelas circunstâncias, muitas marcas vendiam algo que mais se aproximava de uma “massa de bolo” (rica em carboidratos) do que da proteína do soro do leite. É difícil saber se alguém teve a má sorte de ter algum problema de saúde causado pela falsidade de rótulos, mas pode-se afirmar que o máximo que os consumidores conseguiram consumindo aqueles produtos foi a obtenção de algumas calorias a mais (e nada ou quase nada de proteína).

Vale o alerta: os rótulos de suplementos alimentares ainda enganam muita gente. Muitos consumidores ainda são ludibriados. Fique atento e pesquise sobre o assunto. No que diz respeito ao Whey Protein – a proteína do soro do leite, temos grandes profissionais empenhados em submeter os produtos suplementares que se encontram à venda a análises laboratoriais, como Felix Bonfim. Não faltam também grupos nas redes sociais discutindo o assunto e compartilhando informações.

Sobre o princípio da transparência, Rizzato Nunes assim expõe em sua doutrina [3]:

O princípio da transparência, expresso no caput do art. 4º do CDC, se traduz na obrigação do fornecedor de dar ao consumidor a oportunidade de conhecer os produtos e serviços que são oferecidos e, também, gerará no contrato a obrigação de propiciar-lhe o conhecimento prévio de seu conteúdo.

O princípio da transparência será complementado pelo princípio do dever de informar, previsto no inciso III do art. 6º, e a obrigação de apresentar previamente o conteúdo do contato está regrada no art. 46.

Produtos diet vs produtos light.

Ainda não sabe a diferença? De acordo com a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) os alimentos diet (Portaria SVS/MS 29/1998) se direcionam para pessoas que fazem dietas com restrição de nutrientes (sódio, carboidrato, proteína, gordura), alimentos para controle de peso e açúcares [4].

Os alimentos para dietas com restrição de nutrientes são classificados em: a) alimentos para dietas com restrição de carboidratos; b) alimentos para dietas com restrição de gorduras; c) alimentos para dietas com restrição de proteínas; d) alimentos para dietas com restrição de sódio e e) outros alimentos destinados a fins específicos. As quantidades máximas de cada um destes ingredientes está prevista na própria Portaria.

De outro lado, o produto light/zero (Portaria SVS/MS 27/1998) faz referência a uma informação nutricional complementar:

A informação nutricional complementar é qualquer representação que afirme, sugira ou implique que um alimento possui uma ou mais propriedades nutricionais particulares, relativas ao seu valor energético e o seu conteúdo de proteínas, gorduras, carboidratos, fibras alimentares, vitaminas e ou minerais. É de caráter opcional e deve cumprir com os requisitos e atributos estabelecidos pela Portaria.

Responsabilidade

Reiteramos: é importante ler o rótulo. Recentemente em um julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais uma consumidora não obteve êxito no pedido de indenização (danos morais e materiais) por simplesmente não ter lido o rótulo do produto adquirido ou seguido as orientações daquele. A consumidora naquela ocasião comprou um produto de tintura de cabelo fabricado pela empresa “requerida” e, após o uso, perdeu grande parte de seu cabelo e ficou internada por oito dias, conforme alegação constante na petição inicial. O relator do caso afirmou que seria o caso de aplicação da responsabilidade objetiva por defeito do produto (se fosse de fato defeituoso), isto é, a responsabilidade da empresa ocorreria mesmo sem a comprovação de culpa de sua parte, haja vista que esta responsabilidade decorre legalmente do risco da atividade desenvolvida. [5]

Entretanto, de acordo com as provas juntadas aos autos, houve entendimento no sentido de que a fabricante prestou todas as informações sobre o produto nas embalagens, incluindo: componentes, precauções, informações sobre a reação química e a possível reação alérgica que poderia ser provocada, alertando para a necessidade de se fazer um teste de sensibilidade antes de utilizar o produto. Restou afastada a responsabilidade da empresa “requerida” e constatada culpa exclusiva da vítima. Fundamentou-se a decisão no art. 12, §3º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor:

CDC – Art. 12.

(…)

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

(…)

III – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Negou-se provimento ao recurso e manteve-se a sentença de primeira instância como “bem lançada”.


[1] http://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/consumidores-ainda-tem-dificuldades-de-entender-os-rotulos-dos-alimentos-20147764

[2] BRASIL. Lei nº 8.078. Brasília, 11 de setembro de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm> . Acesso em 04/04/2016.

[3] NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. 8. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013.

[4] http://portal.anvisa.gov.br

[5] JURISDIÇÃO. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Cível 1.0699.14.004862-9/001 0048629-20.2014.8.13.0699 (1). Relator: Des. Alberto Henrique. Publicação: 13/11/2015.

Advogado. Pós-graduando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

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