quinta-feira,28 março 2024
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Rolezinho: Protesto ou baderna?

Olá nobres amigos de notável saber jurídico e reputação ilibada! Vamos religar os motores do papo de jurista abordando um tema um tanto quanto polêmico: Rolezinhos.

 

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Estava eu lendo meu jornal matinal quando no canto inferior esquerdo li um texto que tratava desse fenômeno dos “oprimidos socialmente”, confesso que não achei nada demais à primeira vista. No dia seguinte liguei a tv para ver o noticiário e vi que até a presidenta já tomou posicionamento a respeito desses rolezinhos e ai sim eu vi o tamanho da confusão que estava sendo criada. O problema é o seguinte: Isso é uma manifestação ou nada mais nada menos do que uma baderna mascarada de protesto?


Primeiro que se eles acham que estão protestando, estão protestando errado. Que espécie de manifestação é essa onde jovens entram em estabelecimentos PRIVADOS (se fossem públicos faria até uma certa lógica, mas nem isso) ouvindo funk (nada contra, bjo no ombro) quebrando tudo, roubando os clientes e saqueando as lojas? Seria alguma forma de ideologia baseada na história de Hobin Hood? Qual é o objetivo disso? Quais os argumentos utilizados pelos organizadores das badernas coletivas para justificar tais atos? hum?

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Por que tudo isso? Onde o rolezinho quer chegar?

Um dos pseudo-argumentos mais falados por quem defende a depredação ao patrimônio PARTICULAR é de que os jovens do subúrbio promoveram o movimento por conta da falta de lazer nas respectivas localidades. Você tem ideia da futilidade e absurdez de um argumento desses? Então veja: Onde moro não tem um local para lazer, então vou para o centro quebrar tudo e pegar o que puder porque simplesmente não tenho lazer. Um dos meus lazeres é ir à biblioteca, mas ela não fica onde moro, então eu poderia ir lá e queimar todos os livros da Universidade simplesmente porque no meu bairro não tenho o meu lazer preferido? Você que admira o automobilismo e gostaria muito de assistir uma corrida no autódromo que fica bem distante de seu bairro, é justo você ir lá e danificar os carros só porque o autódromo não fica perto de você? E os demais admiradores, como ficam? E os demais leitores, como ficam? E os demais frequentadores dos shoppings, como ficam? Os shoppings sempre estiveram abertos para TODOS.

 

O que eles querem protestar? Reivindicar destruindo algo que nada tem a ver com motivos plausíveis de protestar? Alguém ai viu algum cartaz cobrando mais investimento em saúde, educação, transporte, lazer, alimentação? Não, né? Afinal esse não é objetivo deles, eles querem causar e chamar a atenção. Além disso, o uso das aspas nos “oprimidos socialmente” foi proposital. Engana-se quem pensa que os frequentadores dos rolezinhos são as pessoas mais pobres das comunidades, muito pelo contrário! Os frequentadores dos rolês são uma espécie de “Elite da favela”. É como disse o jornalista Pieter Zalis:

“Os adolescentes dos rolezinhos decepcionam os que tentam ajustá-los aos seus moldes ideológicos. Suas bandeiras são os bonés de marca, seu interesse é se divertir e, se querem manifestar alguma coisa com as badernas nos shoppings, é apenas o pior do comportamento adolescente: irritante, egoísta, inconsequente e que inclui, obrigatoriamente, o desafio a algum tipo de autoridade. […] Os participantes originais dos rolezinhos — são, para usar o termo tão em voga, a elite da periferia. O único problema que têm em relação ao consumo é não o praticarem tanto quanto gostariam. Conectados e obcecados por marcas e acessórios de grife, têm o hábito de gastar com eles boa parte do salário (o próprio ou o dos pais).”

O que o rolezinho deixa evidente?

É interessante lembrar que, assim como no direito, toda regra tem sua exceção. Com o rolezinho não seria diferente. Existem alguns que simplesmente querem se reunir e passear em grupo em centros comerciais nos quais dificilmente frequentam tanto por conta da segregação social quanto pela segregação financeira. Podemos assim dizer que e nome dos aderentes ao que eu chamo de rolezinho do bem ocorre aqui um ato político. Eles estão mostrando que estão ocupando um espaço que a sociedade os nega todos os dias. Sabe os shoppings que ficam abertos para todos? Abertos no sentido geral, pois do que adianta você entrar num loja e não poder compra nada? É como ir em um aniversário e não poder comer o bolo (Passo por isso frequentemente, pois sou alérgico à lactose. Nunca mais reclame de sua vida). Percebe onde quero chegar?  Rosana Pinheiro da carta capital fala mais delicadamente sobre o assunto, vejamos:

 

“Esse tema é justamente o que me faz me afastar de uma certa antropologia vulgar com suas interpretações do tipo “que lindo essas pessoas se apropriam das marcas e dão novos significados e agência e bla blá blá prá boi dormir”. Mas também é este tema que me aproxima ao que a antropologia tem de melhor: ouvir as pessoas. Não há uma grande diferença do “rolezinho” organizado e ritualizado das idas aos shoppings mais ordinárias (ainda que a ida ao shopping pelas classes populares nunca tenha sido um ato ordinário), mas vejo uma continuidade que culmina num fenômeno político que nos revela o óbvio: a segregação de classes brasileiras que grita e sangra. O ato de ir ao shopping é um ato político: porque esses jovens estão se apropriando de coisas e espaços que a sociedade lhes nega dia a dia. Quando eu vejo aquele medo das camadas médias, lembro daquelas pessoas que se referiram “aos negões favelados”. E há certa ironia nisso. Há contestação política nesse evento, mas também há camadas muito mais profundas por trás disso.”

Isso quer dizer que os verdadeiros vilões não estão nos shoppings quebrando e roubando roupas e acessórios de marca, mas sim rindo de tudo. Os praticantes do rolezinho, assim como nós, somos meros escravos de um sistema capitalista no qual apenas obedecemos ordens que são dadas por quem dita as regras da forma da maneira como melhor lhe convém (leia-se: Da forma como melhor satisfaz os seus interesses pessoais). É claro que ninguém tá certo em sair roubando e quebrando algo que foi comprado com o suor do trabalho alheio.

Sergipano; Componente do grupo de pesquisa Educação, sociedade e Direito (CAPES/CNPQ); Advogado; Eterno estudante de Direito; Coautor do livro: Ensaios de Direito Constitucional - Uma homenagem a Tobias Barreto; Fã de xadrez e ficção científica.

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