sexta-feira,29 março 2024
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Riscos decorrentes da redução de jornada para trabalhador em home office

Coordenação: Ricardo Calcini.

Em virtude da disseminação do coronavírus (Covid-19) muitas empresas passaram a adotar a política de home office, para resguardar a saúde de seus empregados, em respeito às orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, que dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, permitiu ao empregador alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.

Nos termos do artigo 4º, § 1º, da MP 927 , “considera-se teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo, aplicável o disposto no inciso III do caput do art. 62 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943.”

Os empregados que trabalham na modalidade home office, via de regra, não estão sujeitos ao controle de jornada, por isso não têm direito ao pagamento das horas extras prestadas, conforme artigo 62, inciso III, da CLT.

É necessário alertar que no direito do trabalho vigora o princípio da primazia da realidade. Neste princípio a verdade dos fatos prevalece sobre qualquer contrato formal, ou seja, caso haja conflito entre o que está escrito e o que ocorre de fato, prevalece o que ocorre de fato. Se o empregador fiscalizar a jornada de trabalho do empregado poderá assumir um risco de passivo trabalhista, por conta de eventual condenação ao pagamento de horas extras. Sendo assim, sugere-se que a jornada de trabalho deve ser livremente organizada pelo trabalhador remoto, não podendo a empresa realizar qualquer controle.

A Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020, que dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfretamento do estado de calamidade pública, criou o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, possibilitando a redução proporcional de jornada de trabalho e salário.

Art. 7º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregador poderá acordar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário de seus empregados, por até noventa dias, observados os seguintes requisitos:

I – preservação do valor do salário-hora de trabalho;
II – pactuação por acordo individual escrito entre empregador e empregado, que será encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos; e
III – redução da jornada de trabalho e de salário, exclusivamente, nos seguintes percentuais:
a) vinte e cinco por cento;
b) cinquenta por cento; ou
c) setenta por cento.

Considerando que os empregados que trabalham em home office não possuem, em regra, jornada de trabalho controlada, parece contraditório reduzir a jornada de trabalho desses trabalhadores.

Se o empregado que trabalha de forma remota não está sujeito ao controle de jornada, entende-se que ele tem liberdade para organizar a sua rotina de trabalho, assim como aqueles que exercem cargo de confiança. Desse modo, não pode a empresa, por exemplo, tentar diminuir a sua jornada de trabalho, seja reduzindo o número de horas trabalhadas por dia ou número de dias trabalhados em uma semana.

Outro risco é diminuir o número de tarefas delegadas ao empregado remoto para viabilizar a redução de jornada. Isso porque, em eventual ação trabalhista, seria bem complicado provar que a diminuição de trabalho se deu na exata proporção da redução de horas trabalhadas.
Por outro lado, os empregados que são monitorados pelas empresas, com controle de login e logout por exemplo, não se incluem na exceção do artigo 62, III, da CLT, em atenção ao princípio da primazia da realidade. Nesses casos, não pairam dúvidas que é viável a aplicação da redução proporcional de jornada e salário, pois é feito o controle patronal da jornada.

Assim, para evitar risco de passivo trabalhista, recomenda-se que a diminuição da jornada acompanhada de redução salarial seja feita apenas para os empregados que trabalham via home office e possuem controle de jornada.
Oportuno ressaltar, por fim, que a negociação coletiva é o meio mais seguro para garantir segurança jurídica para as empresas, especialmente quando se trata de redução salarial em respeito à Constituição Federal.

Advogada trabalhista e Sócia fundadora do AM&M Advogados Associados. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, possui MBA em Direito do Trabalho pela Fundação Getúlio Vargas, Pós- Graduação em Novo Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Pós- graduação em Direito e Compliance Trabalhista pelo IEPREV. Cursou Business Analytics: tomada de decisões a partir de dados, na Universidade de Cambridge. Colunista do Megajuridico, Conselheira da AMAT, Membro da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica-ABMCJ e Membro da Comissão de Direitos Sociais e Trabalhistas da OAB/MG (triênio 2019/2021).

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