quinta-feira,28 março 2024
ColunaDireito da SaúdeResponsabilidade Civil dos Hospitais nos Casos de Infecção Hospitalar

Responsabilidade Civil dos Hospitais nos Casos de Infecção Hospitalar

Coordenação: Alan Kozyreff

 

Autores: Alice Apolinário Mendes, Carlos Daniel de Paula Oliveira e Vitoria da Silva Ferreira*

 

 

Conceito de Infecção Hospitalar

 Infecção relacionada a assistência à saúde (IRAS), é a infecção adquirida após a admissão do paciente no hospital, que se manifestar durante a internação ou após a alta, que possam ser correlacionadas com a hospitalização.

Essa expressão “que possam ser correlacionadas com a hospitalização”, não implica, necessariamente que o micro-organismo responsável pela infecção seja de origem hospitalar, mas identifica o hospital como lugar onde se contraiu a infecção.

Outro ponto também, que vale destacar, diz respeito à nomenclatura “infecção hospitalar”, a qual não se restringe somente aos nosocômios, pois abrange também pronto atendimentos, clínicas e instituições de saúde no geral, tendo em vista que essas não estão imunes de propagar a referida infecção.

A infecção em comento pode se dar de vários modos, muitos deles por questões simples como a falta de higienização das mãos, a ausência de troca de luvas descartáveis, a inobservância da correta esterilização de materiais médico-hospitalares, etc. Sendo que as principais causas de IRAS, estão relacionadas com o trato respiratório, o trato urinário, a pele e a corrente sanguínea.

O presente trabalho, é de extrema importância, considerando os dados de alguns estudos já realizados na área, os quais demonstram a elevada taxa de contração de infecções dentro dos hospitais, a quantidade de ações ajuizadas referente a esses casos e o mais importante, estamos lidando com a vida de muitas pessoas.

Comissão de controle de infecção hospitalar (CCIH)

 

A CCIH foi criada em 1978, antes que houvesse qualquer exigência governamental relacionada ao tema, com a missão de prevenção e controle das infecções hospitalares. Foram instituídas por lei a partir de 1998 com o advento da Portaria nº 2.616 do Ministério da Saúde.

De acordo com a referida Portaria, os hospitais do país todo devem constituir uma Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, com o objetivo de reduzir os riscos de infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS). Os profissionais de saúde que atuam nesses serviços são responsáveis por promover ações de prevenção de Infecções, além de monitorar esses agravos e definir medidas de controle.

Para que a mesma seja constituída, é necessário a presença de membros consultores, que deverão incluir representantes dos seguintes serviços: médico, enfermagem, farmácia, laboratório de microbiologia e administração. No entanto, em instituições com número igual ou menor que 70 (setenta) leitos, a CCIH pode ser composta apenas por 01 (um) médico e 01 (um) enfermeiro.

As competências da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar estão previstas no item 3, do anexo I, da Portaria nº 2.616/98, dentre elas, está o dever de elaborar o Programa de Controle de Infecção Hospitalar; implantar um Sistema de Vigilância Epidemiológica para monitoramento das infecções; implementar e supervisionar normas e rotinas, visando a prevenção e o controle das infecções; promover treinamentos e capacitações do quadro de profissionais da instituição, através de educação continuada; realizar investigação epidemiológica de surtos e implantar medidas imediatas de controle e contenção; elaborar e divulgar, periodicamente, relatórios dirigidos à autoridade máxima da instituição e às chefias dos serviços, contendo informações sobre a situação das infecções relacionadas à assistência à saúde na instituição.

Verifica-se, portanto, que a CCIH oferece uma vasta gama de atuação no combate às infecções hospitalares, caracterizando um passo a mais rumo a diminuição da incidência desses casos. No entanto, em que pese, os hospitais tenham a obrigação de instituir referida Comissão, muitos ainda não a possuem.

Este assunto  deveria ser melhor debatido. Por que isso ocorre? O que lhes impede de constituí-las? A CCIH é importante para prevenir e conter infecções e sua falta é um argumento a mais para o paciente infectado demandar a responsabilização dos hospitais.

 

A responsabilidade civil dos Hospitais nos casos de infecções hospitalares

 

A Constituição Federal considerou a saúde como sendo direito fundamental, inserindo-a no rol de direitos sociais previstos no art. 6º.

Outrossim, os artigos 196 e 197 da nossa Carta Magna, declaram que a saúde é prevista como sendo direito de todos e dever do Estado, sendo ainda possível à iniciativa privada explorar a assistência a esse direito:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

A infecção hospitalar muitas vezes causa lesão aos pacientes e, portanto, o nosocômio pode ser acionado para reparar o dano causado.

O entendimento da jurisprudência é que a ocorrência da infecção hospitalar representa defeito na prestação de serviços pelo hospital e a responsabilidade é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.

No entanto, há posições divergentes. Para aqueles que advogam para hospitais, a responsabilidade civil subjetiva acaba sendo mais vantajoso, por serem argumentos que trazem a possibilidade de se eximir da obrigação de indenizar.

Alguns argumentos encontrados a esse respeito, se baseiam na inexistência de nexo causal entre a atuação do hospital e a ocorrência do fato danoso; a tentativa de comprovar que o hospital adotou todas as medidas preventivas para a inocorrência do dano ao paciente, bem como, alegar que a infecção surgiu por questões endógenas, que são as condições clínicas do próprio paciente, como por exemplo a imunidade baixa, tornado-o mais propenso a contração de doenças.

Além do já mencionado, alega-se como pensamento favorável à responsabilidade civil subjetiva que os hospitais correriam sério risco de fechar as portas, pois há um número muito grande de ações judiciais.

Por fim, nos casos de infecção hospitalar, pode haver a responsabilidade civil dos médicos  que conforme prevê o art. 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor, trata-se de responsabilidade subjetiva, devendo ser constatada a sua culpa por meio da comprovação de negligência, imprudência ou imperícia.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§4° – A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

De outro modo, para aqueles que advogam nas causas dos pacientes, a alegação da responsabilidade objetiva, torna-se muito propícia, considerando que a atuação do hospital, independendo da comprovação de culpa, bastaria a ocorrência do dano e o nexo causal com o hospital, para caracterizar a obrigação de indenizar.

Dentre os argumentos nesse âmbito estão, o já mencionado art. 14, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor, que categoricamente prevê a responsabilidade civil objetiva dos hospitais, assim como a alegação da ausência de Comissões de Controle de Infecção hospitalar, tendo em vista que todo hospital deveria constituir uma CCIH e ainda as questões exógenas, que se traduz em questões exteriores ao paciente, como infecções contraídas pelas condições do próprio ambiente hospitalar.

Além destes, outro ponto relevante, diz respeito à obrigação dos hospitais, que não podem serem compreendidas como obrigação de resultado, levando em conta que estes não podem garantir a cura do paciente, portanto a sua obrigação é de meio.

Dessa forma, considerando que o interesse da sociedade está atrelado a boa prestação dos serviços de saúde, a adoção de medidas que diminuam consideravelmente as causas de contração de infecção hospitalar e a sua consequente fiscalização, deve se aplicar a responsabilidade objetiva.

 

Conclusão

 Em que pese, a complexidade da questão em epígrafe, bem como a existência de uma certa falta de consenso entre os polos que circundam esses casos de infecções hospitalares e ainda, a vasta gama de argumentações que se apresentam, percebe-se que a jurisprudência dos tribunais brasileiros é, em grande parte, favorável à aplicação da responsabilidade civil objetiva, não ficando a parte lesada, sem aquilo que pleiteia na esfera judicial.

 

*Graduandos em Direito. Trabalho realizado no Laboratório Jurídico da Universidade de Sorocaba (UNISO)

 


Referências:

BARCELOS, Rodrigo Diniz de Paula. A responsabilidade civil nos casos de infecção hospitalar. Brasília: Conteúdo Jurídico, 2021. Disponível em: https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/56031/a-responsabilidade-civil-nos- casos-de-infeco-hospitalar. Acesso em: 08 abr. 2021.

BATISTA, Rute Ester Assayag. Módulo 1 – Legislação e Criação de um Programa de Prevenção e Controle de Infecção Hospitalar (Infecção relacionada à Assistência à Saúde – IrAS). São Paulo: ANVISA, 2004. Disponível em: https://www.anvisa.gov.br/servicosaude/manuais/iras/M%F3dulo%201%20-%20Legisla%E7%E3o%20e%20Programa%20de%20Preven%E7%E3o%20e%20Controle%20de%20Infec%E7%E3o%20Hospitalar.pdf. Acesso em: 09 abr. 2021.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 15 abr. 2021.

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em: 19 abr. 2021.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: Presidência da República, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 19 abr. 2021.

MENEZES, Fernando Gatti de. O que são Infecções Hospitalares e como evitá-las?. O autor, 2018. Disponível em:

 

https://www.einstein.br/noticias/entrevistas/fernando-gatti-menezes? utm_source=facebook&utm_medium=post&utm_campaign=every-infeccao-hospitalar- facebook-post-04-11-2018. Acesso em: 08 abr. 2021.

SOUSA, Daniel Eric dos Santos. Responsabilidade civil nas questões de saúde. Âmbito Jurídico, 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/49192/responsabilidade-civil-nas-questoes-de-saude. Acesso em: 09 abr. 2021.

Advogado e professor. Doutorando em Ciências Farmacêuticas, Mestre em Direito da Saúde e especialista em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário.

Alice Apolinário Mendes
Carlos Daniel de Paula Oliveira
Vitoria da Silva Ferreira
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