sábado,20 abril 2024
ArtigosReforma trabalhista: o acesso à justiça e as ME e EPP

Reforma trabalhista: o acesso à justiça e as ME e EPP

Segundo dados disponíveis no portal da Fenacon, “as micro e pequenas empresas foram responsáveis pela geração de quase 78% das vagas com carteira assinada em 2021[1]”. Portanto, no Brasil, quando se pensa nos pequenos negócios, é importante ter em mira que trata-se do setor econômico que mais emprega no país e que, portanto, reclama olhar atento e tratamento favorecido, como, inclusive, recomenda a Constituição Federal de 1988[2].

Todavia, no que se refere ao direito material e processual do trabalho, é possível afirmar, como regra geral, à exceção de algumas simplificações introduzidas pela Lei Complementar 123/2006[3], que as microempresas e as de pequeno porte estão sujeitas ao mesmo regramento legal aplicável a toda e qualquer organização econômica que emprega trabalhadores no Brasil, independentemente de seu porte, de modo que uma grande corporação, constituída sob a forma de sociedade anônima de capital aberto e com sede na cidade de São Paulo, que conta com investimentos estrangeiros e negocia papéis na bolsa de valores, faturando bilhões, submete-se à mesma disciplina jurídica trabalhista que uma pequena lanchonete ou papelaria de um distrito localizado no interior do país.

Entretanto, de modo bastante oportuno, e certamente com o propósito de corrigir distorções no campo processual, dando concretude à garantia constitucional do amplo acesso à justiça, a Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, introduziu importante alteração na sistemática do direito adjetivo visando permitir que as micro e pequenas empresas recorram das sentenças e acórdãos trabalhistas proferidos na fase de conhecimento, mediante o recolhimento do depósito recursal pela metade[4].

O processo do trabalho, por servir a um direito material de natureza alimentar e existencial, possui peculiaridades que lhes são próprias, entre elas a figura do depósito recursal[5], que constitui pressuposto para interposição de recursos, cuja natureza jurídica é de garantia da futura execução. Por outro lado, não raramente, a prática forense revela que a obrigatoriedade do pagamento deste depósito recursal para o exercício do direito de recorrer constitui óbice quase intransponível para muitas empresas acionadas no judiciário trabalhista, notadamente para os pequenos negócios, que nem sempre têm ou podem dispor do referido valor e acabam sendo compelidos a se contentar com a sentença proferida pelo juiz de primeira instância, sem submetê-la à instância revisora, ou ao duplo grau de jurisdição.

Com isso, ao assegurar tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas demandadas na Justiça do Trabalho, propiciando-lhes o direito de recorrer com menor ônus financeiro – como dito, pagando o depósito recursal pela metade -, o legislador da Reforma Trabalhista deu importante passo na efetivação das garantias constitucionais do acesso à justiça e do exercício da plena defesa em juízo, dado que flexibiliza obstáculos para interposição de recursos, o que resulta no incremento da participação da parte – ME e EPP – no procedimento em contraditório, inclusive com mais chances de se chegar à instância revisora, implicando também na maior legitimação das decisões judiciais, porquanto submetidas ao duplo grau de jurisdição.

 


[1] https://fenacon.org.br/noticias/pequenos-negocios-geraram-78-dos-empregos-formais-criados-em-2021-aponta-sebrae/#:~:text=UniFenacon-,Pequenos%20neg%C3%B3cios%20geraram%2078%25%20dos%20empregos,criados%20em%202021%2C%20aponta%20Sebrae&text=As%20micro%20e%20pequenas%20empresas,com%20carteira%20assinada%20em%202021.

[2] Art. 170: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…) IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País”.

[3] O Capítulo VI – DA SIMPLIFICAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO da Lei Complementar 123/2006, que institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, flexibiliza certas obrigações para os empregadores que se enquadram no conceito de microempresa e empresa de pequeno porte.

[4] Art. 899 (…) § 9º O valor do depósito recursal será reduzido pela metade para entidades sem fins lucrativos, empregadores domésticos, microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte.

[5] Segundo o ATO SEGJUD.GP Nº 175, DE 20 DE JULHO DE 2021, os valores referentes aos limites de depósito recursal previstos no artigo 899 da Consolidação das Leis do Trabalho, no período de julho de 2020 a junho de 2021, serão de: a) R$ 10.986,80 (dez mil novecentos e oitenta e seis reais e oitenta
centavos), no caso de interposição de Recurso Ordinário; b) R$ 21.973,60 (vinte um mil novecentos e setenta e três reais e sessenta centavos), no caso de interposição de Recurso de Revista e Embargos; c) R$ 21.973,60 (vinte um mil novecentos e setenta e três reais e sessenta centavos), no caso de interposição de Recurso em Ação Rescisória.

Conrado Di Mambro Oliveira

Presidente da Comissão de Apoio Jurídico às Micro e Pequenas Empresas da OAB/MG. Diretor de Comunicação Oficial da Comissão de Direitos Sociais e Trabalhistas da OAB/MG. Diretor do Departamento de Direito do Trabalho do Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG). Conselheiro Fiscal da Associação Mineira dos Advogados Trabalhistas (AMAT). Professor em cursos de pós-graduação em Direito do Trabalho.

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