sexta-feira,29 março 2024
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Privatização e o Contrato de Trabalho

Atualmente a maior parte das pessoas que se encontram empregadas no mercado de trabalho possuem o grande sonho da estabilidade no emprego, buscando suas chances na realização de concurso público, todavia, o que fazer quando se faz um concurso onde se é aprovado e após anos de trabalho seu empregador até o momento, Órgão Público, encontra-se privatizado?

A privatização é a venda do que é estatal para a iniciativa privada, havendo a proteção dos contratos de trabalho na forma dos art.10 e art.448 da Consolidação das Leis Trabalhistas expostos a seguir:

Art. 10 – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.

Art. 448 – A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

Tal situação torna-se muito confortável para o trabalhador contratado de forma irregular por qualquer Órgão Público, o qual na prática somente poderia realizar sua contratação com a realização de concurso público consoante art.37, inciso II e §2º da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(…)

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

(…)

§ 2º A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei.

Neste sentido, o empregado contratado sem concurso público seria protagonista de uma contratação irregular, cabendo seu imediato desligamento, percebendo somente o pagamento de saldo de salario e FGTS, sendo seu contrato nulo de pleno direito, conforme súmula 363 do Tribunal Superior do Trabalho:

CONTRATO NULO. EFEITOS – A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.

Porém, havendo a privatização de seu empregador o contrato de trabalho anteriormente irregular torna-se convalidado, vez que o funcionário passa a prestar seus serviços a um Órgão Público, seria funcionário da iniciativa privada, onde inexiste necessidade de realização de certame público de acordo com a súmula 430 do TST:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. NULIDADE. ULTERIOR PRIVATIZAÇÃO. CONVALIDAÇÃO. INSUBSISTÊNCIA DO VÍCIO – Convalidam-se os efeitos do contrato de trabalho que, considerado nulo por ausência de concurso público, quando celebrado originalmente com ente da Administração Pública Indireta, continua a existir após a sua privatização.

Desta forma, o vício existente no contrato de trabalho, ante a contratação irregular estaria sanado com a privatização do empregador, o que promoveu mudança significativa no contrato de trabalho do funcionário.

Agora e se ocorrer o inverso, o que acontece com o funcionário que ingressou em Órgão Público através de concurso público, cumprindo todos os rigores da lei, e depara-se com a estatização de seu empregador, perdendo sua estabilidade ou a garantia de uma motivação justa para seu desligamento, havendo alteração no regime o qual é submetido seu contrato de trabalho.

Assim, esse funcionário permanecerá com seu contrato de trabalho ativo como qualquer empregado de empresa privada, cabendo sua demissão imotivada em momento oportuno para seu empregador, detentor do direito potestativo de dispensa de seus prestadores de serviço, não sendo possível o deferimento de um pedido de reintegração, vez que com a alteração do regime jurídico houve a alteração dos direitos trabalhistas.

Ocorre que o Supremo Tribunal Federal defende o entendimento no sentido de não haver direito adquirido quando se tratar de regime jurídico, sob pena de gerar insegurança jurídica nas medidas aplicadas, pois não cabe ao empregador à realização de tratamento diferenciado a seus funcionários, com as diversas formas de vínculo empregatício em sua empresa.

Ora, se assim fosse, tal ato feriria de morte o Princípio da Isonomia, não cabendo por esse mesmo motivo à aplicação do Princípio da condição mais benéfica aos trabalhadores contratados antes da privatização.

Corroborando com o mencionado entendimento temos o acordão(1):

RECURSO ORDINÁRIO. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. DISPENSA IMOTIVADA APÓS PRIVATIZAÇÃO. POSSIBILIDADE – “Ora, se era nula a contratação sem concurso público e deixa de ser em razão da privatização, isso também ocorre quanto ao ato de dispensa, se era nulo por ausência de motivação, deixa de ser após a privatização”

Seguindo mesmo entendimento julgado do Tribunal Superior do Trabalho (2):

BANCO DO ESTADO DO CEARÁ. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PRIVATIZAÇÃO. SUCESSÃO POR INSTITUIÇÃO BANCÁRIA PRIVADA. DISPENSA DE EMPREGADO. DESNECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DO ATO. NÃO INCIDÊNCIA DO DECRETO ESTADUAL Nº 21.325/91. AUSÊNCIA DE DIREITO À REINTEGRAÇÃO. Trata-se de avaliar a necessidade de motivação da dispensa de empregado do Banco do Estado do Ceará, sociedade de economia mista, posteriormente sucedido pelo Bradesco, em face de norma vigente à época da admissão da reclamante, que limitava o poder de dispensa pelo Banco. O Tribunal Pleno desta Corte, no julgamento do Processo nº E-RR – 44600-87.2008.5.07.0008, pacificou entendimento de que o Decreto Estadual nº 21.325/91 não se incorporou aos contratos de trabalho dos então empregados do Banco do Estado do Ceará absorvidos pelo Banco Bradesco. É de se reconhecer, por um lado, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 589.998-Piauí, em 20/3/2013, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, decidiu pela necessidade de motivação do ato de dispensa de empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, em atenção aos princípios da impessoalidade e da isonomia. Por consequência, em alinhamento com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, esta Corte firmou novo direcionamento da jurisprudência, no sentido da exigência da motivação do ato administrativo de dispensa de empregados integrantes de empresas públicas e de sociedades de economia mista. Assim, não obstante o teor da Súmula nº 390, item II, deste Colegiado e da Orientação Jurisprudencial nº 247, item I, da SbDI-1 do TST, esta Corte passou a exigir a motivação do ato administrativo de dispensa de empregados integrantes de empresas públicas e sociedades de economia mista. Todavia, no referido julgamento plenário desta Corte superior, entendeu-se, por maioria de votos, que não prevalece esse entendimento na situação específica dos autos em que houve a privatização do banco estatal (Banco do Estado do Ceará). Concluiu-se, na ocasião, que nas hipóteses em que a empresa estatal é sucedida por empresa particular ou privatizada, o empregado passa a se sujeitar à discricionariedade que tem o empregador privado para operar a rescisão contratual, o que dispensa a necessidade de motivação do ato de dispensa, já que, a partir da privatização, são inaplicáveis as regras relativas ao artigo 37 da Constituição Federal ao sucessor, integrante do regime jurídico próprio das empresas privadas. Não há, portanto, como se entender que a determinação presente no decreto estadual, ora impugnado, seja direcionada a qualquer outra entidade que não a própria Administração Pública. Além disso, evidencia-se a incompatibilidade entre o conteúdo do decreto estadual e a nova relação jurídica de direito privado que se formou entre empresa e empregado, já consolidada à época da dispensa da reclamante. Recurso de revista conhecido e provido.

Devemos observar a clara aplicação da lógica da questão pelos Magistrados, vez que se cabe à convalidação dos contratos de trabalho, por que o empregado deveria permanecer com as características de seu vínculo com o empregador como se servidor/empregado público fosse ante a privatização de seu contratante?

Vale a reflexão para a existência de novos entendimentos e soluções para casos versando sobre o referido assunto.

(1) Jurisdição. Tribunal Regional de Trabalho 1ª Região. Processo: 0010068-03.2015.5.01.0043 ,Recurso Ordinário, Relator: Claudia de Souza Gomes Freirw; Órgão Julgador: 09ª Turma, Data da Publicação: 24.06.2016.

(2) Jurisdiçã. Tribunal Superior do Trabalho. RR – 132300-76.2009.5.07.0005 , Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 29/06/2016, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 01/07/2016.

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4 COMENTÁRIOS

  1. Minha empresa tem Contrato assinado (porem sem emissão da Ordem de Serviço) com empresa Estatal que foi privatizada recentemente.
    O contrato foi baseado na Lei 8666
    Na Lei 8666 tem algum Artigo que trata deste assunto – informando os diretos da empresa Contratada?
    Obrigado

  2. Bom dia! Sou concursado em uma empresa que está para ser privatizada, o que acontece com meu emprego nesse caso? Obrigado!

  3. Boa tarde, sou empregada pública concursada, da administração indireta, e minha empresa está na lista de prováveis empresas a serem privatizada. Acontece que fui cedida/requisitada a outro órgão da Administração Direta e gostaria de saber o que aconteceria comigo no caso da desestatização da minha empresa? Atualmente, a minha empresa não pode requerer minha volta ao órgão que em requereu mas não sei o que aconteceria se ela fosse privatizada.

  4. Passei em um concurso público. Mas o órgão foi privatizado antes deu assumir. Tenho algun direito?

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