sexta-feira,29 março 2024
ColunaPapo JurídicoPossível substituir a garantia contratual na pandemia?

Possível substituir a garantia contratual na pandemia?

1. Introito

É possível substituir a garantia contratual na pandemia?

Isto é, em contratos de longa duração, em geral, fixa-se uma modalidade de garantia do pagamento do crédito nas cláusulas contratuais. As mais usuais são: sobre o imóvel, cessão de recebíveis, fiador ou avalista.

Assim, poderia a empresa pedir liberação dos recebíveis, substituindo por outra modalidade de garantia?

No atual cenário de crise econômico-financeira provocada pela pandemia da Covid-19, não tem sido rara a provocação de empresas, inclusive judicial, para liberação dos recebíveis viabilizando-se o acesso a tais recursos.

De outro lado, tem-se o credor, que, sobremaneira, em um cenário como o presente, resiste em renunciar a qualquer garantia contratualmente estabelecida.

Assim, a finalidade deste artigo é analisar a viabilidade de substituição da garantia contratual de maior eficácia por outro de menor liquidez, em razão dos efeitos da pandemia sobre a situação econômica das empresas.

Poderia a empresa pedir liberação dos recebíveis, substituindo por outra modalidade de garantia?

2. Possível substituir a garantia contratual dos recebíveis na pandemia?

2.1. Da cessão dos recebíveis.

Muito comum em contratos contínuos que as empresas ofereçam, como garantia de pagamento do crédito, os valores que têm a receber em decorrência do exercício de sua atividade.

Trata-se de cessão fiduciária de recebíveis, em que a empresa devedora transfere a propriedade resolúvel sobre os recebíveis ao credor, o qual também passa a ser o possuidor direto de tais direitos ou títulos de crédito.

A empresa devedora, assim, não acessa esses recursos até a efetiva quitação da operação financeira.

Mas, adimplida sua obrigação, voltará a ser a plena proprietária dos recursos.

Por outro lado, em caso de inadimplemento, o credor poderá utilizar dos recebíveis para fins de satisfação do seu crédito, observados os procedimentos legais.

Em razão da sua usual eficácia e liquidez, tal garantia mitiga os riscos inerentes às atividades e contratos de longa duração.

Mas, em razão da pandemia, muitas empresas se viram buscando liberar o acesso aos recebíveis, de modo a garantir a sua sobrevivência durante a crise econômico-financeira que assolará o país, durante e após a pandemia.

E ai? Como fica o credor no contrato, perante o pedido de liberação dos recebíveis? A tendência natural é de recusa à renúncia de qualquer garantia previamente estabelecida em contratual.

E mais: apresenta reforço nas cláusulas contratuais, frente à redução do montante de recebíveis durante a paralisação das atividades durante a quarenta.

2.2. Da possibilidade de alteração da modalidade de garantia no contrato.

Nosso Direito Contratual tem por princípios básicos a força obrigatória dos contratos e a intervenção mínima.

Igualmente verdadeiro, todavia, é que também são previstos remédios que autorizam, em cenários excepcionais, o afastamento da vontade originária das partes, de forma a garantir o equilíbrio contratual.

Como exemplo, temos a teoria da imprevisão (artigo 317 do CC) e da onerosidade excessiva (artigo 478 do CC).

Assim, se em regra permanecem válidas as garantias originalmente contratadas entre as partes, bem como as previsões de complemento para manutenção do valor garantido, em algumas hipóteses excepcionais o pleito de substituição da modalidade de garantia pode ser legítimo.

Assim, como garantir a eficácia na substituição dos recebíveis por outra modalidade de garantia contratual?

2.3. Como garantir a eficácia na substituição dos recebíveis.

É possível realizar a substituição dos recebíveis por outra modalidade de garantia, inclusive sobre imóveis da empresa devedora.

Trata-se, inclusive, de nítida operação ganha-ganha.

Como assim, você pergunta?

Porque a empresa terá acesso a recursos preciosos para atravessar momento tão delicado, e o credor receberia uma garantia que, embora de menor liquidez, é mais sólida, afastando o risco de eventual esvaziamento decorrente da redução das vendas da empresa devedora.

Porém, necessário a análise de alguns requisitos.

Isto é, necessário que seja demonstrado o significativo impacto da pandemia na atividade do tomador e a real necessidade de tal garantia para sua continuidade.

Para tanto, ressalte-se, em regra deverá ser concedida uma nova garantia ao credor bastante e suficiente para o risco da operação.

Tal operação pode, inclusive, ser transitória, voltando-se ao status inicial quando configurados determinados eventos acordados pelas partes.

Por fim, deve-se alertar que o exposto acima não pode ser caminho para reequilibrar o que não foi desequilibrado.

Muitas empresas não sofreram negativamente pela pandemia e outras tantas, inclusive cresceram, em sua decorrência.

Para essas, a pandemia não exsurge como justificativa para pleito de modificação da garantia originalmente contratada.

3. Conclusão.

Então, a que conclusão chegamos?

Possível substituir a garantia contratual na pandemia?

Em regra permanecem válidas as garantias originalmente contratadas entre as partes, pela força obrigatória dos contratos, sob pena, inclusive, de vencimento antecipado as parcelas a vencer do contrato.

Mas, em situações excepcionais, possível a substituição da modalidade de garantia, quando houver impacto significativo na empresa devedora pela pandemia, e de que a garantia inicial prevista no contrato passe a ser vital para a sua sobrevivência.

E isso envolve também quanto à cessão de recebíveis da empresa por garantia imobiliária, deste que esta seja bastante e suficiente para o credor.

Das partes, sempre serão exigidos a boa-fé objetiva e o dever de colaboração, para reequilibrar apenas naquelas situações em que a pandemia causou um prejuízo excessivo e um desequilíbrio contratual.

Em momentos como este, é necessário um grande esforço de empatia e compreensão, construindo-se, à luz do originalmente contratado, alternativas sustentáveis para os contratantes.

O momento pede menos litígio e distanciamento processual e mais compreensão e aproximação.

Isto é, apenas com absoluta transparência e muito diálogo que se chegará às melhores soluções, para ambas as partes.

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