quinta-feira,28 março 2024
ColunaDireito InternacionalPor que o Direito Internacional deve ser levado a sério?

Por que o Direito Internacional deve ser levado a sério?

Tenho a honra – e a grande responsabilidade – de inaugurar a coluna de Direito Internacional desta plataforma jurídica. Trarei, quinzenalmente, seleções doutrinárias, temas atuais, dicas para o Exame da Ordem e um pouco das possíveis vertentes de atuação profissional para quem, como eu, sonha em desbravar esta área.

Considerando que inúmeros estudantes de Direito acabam preterindo a disciplina durante a graduação por considerá-la distante do dia a dia de um advogado, nada mais justo que elucidar, neste artigo introdutório, questões basilares como a relevância do Direito Internacional, bem como sua aplicação e potencial de influência.

I. O que é e do que trata:

Os laços entre as pessoas naturais e/ou jurídicas que ultrapassam as fronteiras de um determinado Estado são chamados de “relações Internacionais”. O Direito Internacional, então, visa regular as relações internacionais.

A partir daí tem-se dois grandes conceitos:
relacoes-inteDireito Internacional Público: segundo o entendimento moderno e nas palavras de Portela[1], DIPúblico é o ramo do Direito que visa disciplinar a convivência entre os membros da sociedade internacional (o que inclui não só os Estados e as organizações internacionais, mas também indivíduos, empresas e organizações não-governamentais).

Tem-se, como exemplo clássico, os processos de ratificação dos tratados internacionais, que vinculam os Estados signatários perante os demais membros da aludida sociedade.

Direito Internacional Privado: disciplina os conflitos de lei no espaço, isto é, determina qual norma jurídica, nacional ou estrangeira, se aplica à uma determinada relação privada que possui conexão internacional.

Para ficar mais claro, imaginem a seguinte situação: você, brasileiro, conheceu uma sueca em pleno carnaval e casou-se com ela. Durante a lua de mel na Grécia, sua linda esposa falece em razão de uma intoxicação alimentar. Sabe-se que ela havia realizado um testamento em Lisboa dispondo sobre os seus bens, entre eles três apartamentos situados no Rio de Janeiro.

Esta foi uma questão (adaptada) do XV Exame de Ordem e traz uma típica situação privada de conexão internacional: o testamento da sueca será regido pela legislação da Grécia, onde ela faleceu? Pela legislação de Portugal, onde o testamento foi feito? Ou pela legislação brasileira, onde está uma parte dos seus bens?

O assunto será tratado em artigo próprio, mas só para não deixar meus caros leitores curiosos, adianto que seria a legislação portuguesa de acordo com o disposto no art. 9º da LINDB.

II. Por que é importante estudá-lo?

Ensina-se durante a graduação que os conceitos, princípios e regras do Direito Constitucional estão impregnados em todo o ordenamento jurídico pátrio. Pois bem, assim também é o Direito Internacional.

Engana-se quem pensa que debruçar-se apenas sobre o Processo e Direito do Trabalho é o suficiente para ser um bom advogado trabalhista, ou que estudar Processo e Direito Penal é o suficiente para ser um bom penalista.
Duvida?

Direito Internacional do Trabalho: destaca-se, nesta seara, a importância da Organização Internacional do Trabalho (OIT) por sua relevância máxima na produção de normas internacionais, derivadas de convenções e recomendações[2]. Estudar o Direito do Trabalho sem aprofundar-se nos princípios e objetivos estabelecidos na OIT e todo o conteúdo protetivo que dela emana, certamente traz graves prejuízos na construção de uma tese ou peça processual, por exemplo.

Registra-se, ainda, a relação entre o comércio internacional e o trabalho. Deve-se estar atento aos posicionamentos ditados pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e às possíveis repercussões na dignidade do trabalhador.

Direito Internacional Penal e Direito Penal Internacional: com o escopo de reprimir os crimes internacionais que põem em risco os interesses e valores fundamentais da sociedade internacional, ergue-se o Direito Internacional Penal, tendo como principal órgão o Tribunal Penal Internacional (TPI). Já com o intuito de promover uma rede de cooperação internacional contra a criminalidade, há o Direito Penal Internacional. É desenvolvido a partir de tratados multilaterais e convenções, como a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional[3], por exemplo.

Para além desses relevantes exemplos, não poderia deixar de trazer à baila a Internacionalização dos Direitos Humanos. Como ensina Flávia Piosevan[4], este é um movimento extremamente recente na história, surgindo a partir do pós-guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o nazismo. Destaca-se como marco a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), pois como informa o ilustre Fábio Konder Comparato[5], o horror engendrado pelo surgimento dos Estados totalitários suscitou em toda parte a consciência de que, sem o respeito aos Direitos Humanos, a convivência pacífica das nações tornava-se impossível.

A proteção aos Direitos Humanos trilhou um longo e lento caminho até transcender os limites geográficos e, finalmente, integrar a agenda política transnacional. É um tema que está SEMPRE em pauta e que deve ser dominado por todos que se propõem a adentrar na carreira jurídica.

III. Como aplicá-lo?

Como se pode perceber, o Direito Internacional não está tão distante quanto imaginávamos.

Além de haver a possibilidade (e o dever) de aprofundá-lo na sua própria área de atuação, existem ainda vertentes pouco exploradas, como o Direito Internacional Econômico, Direito do Comércio Internacional, Direito Internacional do Meio Ambiente, entre outros.

O advogado internacionalista pode cuidar, outrossim, de contratos internacionais, orientando acerca da legislação aplicável e as formalidades necessárias à concretização do negócio.

Espero que este incipiente artigo tenha elucidado alguns questionamentos e, por outro lado, despertado o interesse e a curiosidade sobre o tema!


Referências:

[1] PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado – Incluindo Noções de Direitos Humanos e Direito Comunitário. 3ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2011, p. 41 – 47.

[2] GONZALES, Ismal. Direito internacional público e direito internacional do trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, n. 1, p. 89-95. Disponível em: <http://portal.trt15.jus.br/documents/124965/125371/Rev1Art15.pdf/41c41727-dfb1-4167-9cbc-f230ef77c73d>.

[3] PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Op. cit, p. 453 – 475.

[4] PIOSEVAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. 2006, p. 06.

[5] COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos. 2ª edição, revisada e ampliada – São Paulo: Saraiva, 2001, p. 215.

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