quinta-feira,28 março 2024
ColunaAdministrativoPoder vinculado e discricionário da Administração Pública

Poder vinculado e discricionário da Administração Pública

O tema de hoje é bem simples de compreender. Trata-se dos poderes vinculados e os discricionários. Não são dotados de infinidades de detalhes, além de serem realmente bem agradáveis. Mas então, por qual motivo os certames cobram tanto tal temática? A resposta você será capaz de inferir ao final o nosso estudo. Perceberá que discernir tais poderes é essencial na rotina dos agentes públicos. Vamos lá!

O poder vinculante por sua própria nomenclatura, já nos induz a imaginar que se atrela a algo. É exatamente isso! Significa que a prática de um ato já nasce vinculada de forma bem restrita a uma lei. Tal norma, diz exatamente como a Administração deve agir em determinadas situações.

“Não resta para o administrador – no Poder Vinculado – margem alguma de liberdade.” (Celso Antônio Bandeira de Mello)

A atenção deve se voltar para a consequência do descumprimento da vinculação de um ato à determinada lei. Se ocorrer, o ato praticado é ilegal. Mas observe: se o vício (defeito) for sanável, diz-se o gera anulabilidade do ato. Por outro lado, se o vício for tão grave ao ponto de ser insanável, gera nulidade absoluta, não sendo possível convalidar. Concurseiro, caso se depare com a seguinte afirmativa: Se declarada a anulabilidade de um ato, os efeitos causados são ex nunc, ao passo que, se o ato for declarado nulo o efeito gerado é ex tunc. O que responderia? Calma! Não se espante! Irá compreender já:

Ex nunc é uma expressão do latim que significa “desde agora”, assim os efeitos não retroagem, não voltam ao tempo que foram praticados. De forma exemplificativa, é semelhante às falas dos jogadores da seleção brasileira depois do famoso 7×1: “bola pra frente!” “Vida que segue!” Assim, a Administração não vai voltar e desfazer todos os atos eivados de vícios sanáveis, simplesmente mudará a postura de agora em diante para não errar mais. Como dizem os antigos: Não adianta chorar sobre o leite derramado.

Já a expressão ex tunc, que obviamente também tem origem no latim, quer dizer “desde então’’, ou seja, é mais complicado. Os atos praticados são tão graves que os efeitos da anulação retroagem à data em que foram praticados. No contexto do presente estudo, significa que tornam sem efeito todos os atos que desobedeceram a previsão legal. Grosso modo, vamos usar mais um  exemplo futebolístico, façamos uma analogia: Está lembrado do uruguaio Luis Suárez? Pois bem, possuído por um espírito canino, o jogador mordeu o adversário Giorgio Chiellini durante a partida contra a seleção da Itália em plena Copa do mundo (2014) : “Durante o jogo, tanto o árbitro quanto o assistente não viram o incidente, mas o grande número de câmeras do estádio deixou claro o registro do que aconteceu.  Por conta disso, Luis Suárez foi julgado e recebeu nove jogos de suspensão”.  (Wikerson Landim). Ou seja, a FIFA retroagiu ao dia da terrível mordida para aplicar a punição. Talvez, depois da penalidade tardia, ou melhor, retroativa, o  jogador pense duas vezes antes de morder os coleguinhas, não é mesmo?

Analisando tudo que foi exposto acima, seria tranquilo marcar como correta uma assertiva semelhante à cobrada no 2º Exame da Ordem- MG (2004): “A aplicação de multa de trânsito por excesso de velocidade, a aposentadoria compulsória de servidor público e demissão de servidor público pela prática de ato de improbidade administrativa, são atos vinculados”. Certíssima!

Como brilhantemente afirma Gustavo Amora Cordeiro, “Competência, finalidade e forma sempre serão elementos vinculados do ato, além de outros que a lei especificar. O que caracteriza a vinculação é a predominância de elementos legalmente especificados”.

Agora fica bem mais fácil compreender o que vem a ser poder discricionário. Se de um lado o poder vinculado dita exatamente o que a Administração deve fazer, sem lhe conferir qualquer liberdade, o poder discricionário oferece certo grau de liberdade. Não significa que pela discricionariedade a Administração pode fazer o que bem quiser. Não é bem assim! Na verdade, também existe uma previsão legal, contudo, mais flexível. Permite ao administrador escolher como agir dentro dos limites legais.

Não se esqueça, enquanto administrados, podemos fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, ao passo que a Administração só pode fazer o que a lei determina. Mas então, como fica a discricionariedade? Poder discricionário é conferido à Administração para que diante de uma situação tenha a possibilidade de praticar ou não um ato conforme a conveniência, conteúdo e a oportunidade, contudo, sempre dentro dos limites previstos em lei.

“Mesmo diante de um ato discricionário, o administrador público deverá ter competência legal para praticá-lo; obedecerá a forma legal para a sua realização; e deverá atender à finalidade legal de todo ato administrativo, que é o interesse público.”(Hely Lopes Meirelles).

Exemplo claro e corriqueiro diz respeito ao pedido de porte de arma. Existe uma legislação específica que regula a concessão de tal autorização. Se a lei estabelecesse, por exemplo, que todo cidadão com mais de 30 anos pudesse ter porte de arma independente de qualquer avaliação por parte da Administração, seria um exemplo de vinculação, ou seja, a Administração não teria como julgar se seria ou não oportuno tal concessão. Contudo, no ordenamento brasileiro isso não ocorre, para que se obtenha o porte de arma, faz-se necessário que a Administração realize uma série de avaliações e ela julgará se é conveniente e oportuno  que determinada pessoa possa portar arma de fogo.

porte de arma
http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SEGURANCA/448413-PROJETO-DA-PORTE-DE-ARMA-A-VIGILANTES-DE-INSTITUICOES-DE-ENSINO-FEDERAIS.html

Veja como foi brilhante a assertiva “d’’ da questão 14 do 129º Exame da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo em 2006:

A decisão adotada por ocasião da aplicação da lei não reflete avaliações livres e ilimitadas do administrador, mas traduz a concretização da solução mais adequada e satisfatória, tomando em vista critérios abstratamente previstos em lei ou derivados do conhecimento técnico-científico ou da prudente avaliação da realidade. Reflete em relação ao agente público os limites da sua ação discricionária.

Há autores que questionam a existência de discricionariedade, já que a liberdade conferida à Administração se amolda aos limites legais: “Não há, usualmente, nenhum ato totalmente vinculado ou totalmente discricionário. Existem variações de predominância, mais ou menos acentuados, dando relevo à parte livre ou subordinada da manifestação administrativa. Se nos detivermos na análise de sua criação, poderemos concluir que a vinculação ou a discrição se manifesta no tocante a cada um dos elementos essenciais do ato (competência, finalidade e forma).”  (Caio Tácito Sá Viana Pereira de Vasconcelos).

Os questionamentos são válidos e de fato possuem lógica, contudo, para concursos de nível intermediário, não é necessário aprofundar-se tanto. Saber que existe tal linha de raciocínio já o fará se destacar. O principal é ser capaz de diferenciar com segurança os conceitos acerca de vinculação e da discricionariedade. Não é mesmo, futuro servidor público?

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