quinta-feira,28 março 2024
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Perseguição, “Stalking” ou assédio por intrusão – Lei 14.132/21

1-INTRODUÇÃO

Há mais de seis anos este autor já vinha estudando o fenômeno do denominado “Stalking”, “Assédio por Intrusão” ou “Perseguição” e a falta de uma tipificação adequada no ordenamento jurídico – penal brasileiro.

Destacava-se que a expressão “Assédio por Intrusão” e o termo em inglês “Stalking” designam a ação de perseguição deliberada e reiterada perpetrada por uma pessoa contra a vítima, utilizando-se das mais diversas abordagens tais como agressões, ameaças ou ofensas morais reiteradas, assédio por telefone, e – mail, cartas ou a simples presença afrontante em determinados lugares frequentados pela vítima (escola, trabalho, clubes, residência etc.). Com a disseminação da informática e telemática e o fenômeno das Redes Sociais, tem-se denominado especificamente de “Cyberstalking”, “Cyberviolência” ou “Cyberbullying” essa prática realizada por meio da internet.

A lição de Damásio, um dos precursores nacionais na abordagem do tema, já era e continua sendo válida:

“Stalking é uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de privacidade da vítima, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos: ligações nos telefones celular, residencial ou comercial, mensagens amorosas, telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas indesejáveis, recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída da escola ou trabalho, espera de sua passagem por determinado lugar, frequência no mesmo local de lazer, em supermercados etc. O stalker, às vezes, espalha boatos sobre a conduta profissional ou moral da vítima, divulga que é portadora de um mal grave, que foi demitida do emprego, que fugiu, que está vendendo sua residência, que perdeu dinheiro no jogo, que é procurada pela polícia etc. Vai ganhando, com isso, poder psicológico sobre o sujeito passivo, como se fosse o controlador geral dos seus movimentos”.

Conforme se vê a conduta de “Stalking” é bastante variada, abrangendo uma série praticamente indeterminada de ações e podendo ter por sujeitos ativo e passivo qualquer pessoa.

A conduta varia desde agressões físicas, ofensas morais, ameaças, violações sexuais até práticas aparentemente menos graves ou mesmo de cunho afetivo, tais como mensagens amorosas e abordagens com propostas de relacionamento. Ocorre que mesmo nestes últimos casos a conduta do “stalker” é incomodativa, desagradável e insistente para além do tolerável, ocasionando inconveniências e constrangimentos.

Embora as condutas variem mantém em comum certos traços como a reiteração dos atos, a violação da intimidade e da privacidade da vítima e o constrangimento com consequente dano psicológico e emocional ao ofendido. Nesse quadro será também comum a ofensa à reputação da vítima, mudanças forçadas de seu modo de vida e restrições à sua liberdade de ação e locomoção.

O “Stalking”, dada a já mencionada variedade de condutas que abrange, pode ensejar responsabilizações civis (danos materiais e/ou morais) e penais (crimes ou contravenções). Na seara criminal os casos mais simples podiam configurar a contravenção penal de “Perturbação da Tranquilidade” (artigo 65, LCP). Mas, nem sempre, conforme já foi exemplificado, o “stalker” se limita a perturbar a vítima (lotando caixas de mensagens, fazendo ligações telefônicas inoportunas etc.). Muitas vezes extrapola para práticas mais graves que podem configurar crimes de ameaça (artigo 147, CP), constrangimento ilegal (artigo 146, CP), crimes contra a honra (artigos 138 a 140, CP), estupro (artigo 213, CP), lesões corporais (artigo 129, CP) ou até mesmo homicídio (artigo 121, CP). Note-se ainda que em alguns casos, dadas as circunstâncias de tempo, lugar, forma de execução e espécie delitiva, poderá configurar-se crime continuado nos termos do artigo 71, CP. Também não é incomum constatar-se a ocorrência nesses casos da chamada “progressão criminosa” em que o agente inicia com uma conduta de “Stalking” que configura infração penal menos gravosa, mas vai aos poucos ou mesmo abruptamente tomando atitudes cada vez mais agressivas e invasivas e atingindo bens jurídicos mais e mais relevantes. Em sua obra sobre a violência entre casais, Hirigoyen expõe o fato de que normalmente as violências de gênero são progressivas, iniciando pela coação psicológica até atingir a agressão física que pode chegar não tão raramente na prática de homicídio.

Outras contravenções, além da já mencionada “Perturbação da Tranquilidade”, podiam também ocorrer. São exemplos: Vias de Fato (artigo 21, LCP), Importunação Ofensiva ao Pudor (artigo 61, LCP, atualmente revogado pela Lei 13.718/18, mas se podendo falar em crime de Importunação Sexual, conforme redação dada pela mesma lei ao artigo 215-A, CP) e Perturbação do Trabalho ou do Sossego Alheios (artigo 42, LCP). Com o advento da Lei 13.718/18 também não se poderia descartar condutas como as que configuram o crime de “Divulgação de cena de estupro, de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia”, conforme dispõe o atual artigo 218 – C, CP.

Como se percebe nem sempre a reação penal então disponibilizada pela legislação era proporcional aos danos físicos, psicológicos e emocionais ocasionados à vítima de “Stalking”, tendo em vista as especiais características dessa conduta dotada de diferenciada variação e, principalmente, em virtude de sua reiteração de atos que, mesmo aparentemente de pequena monta ou até inofensivos isoladamente, podem tornar-se altamente danosos em seu conjunto e persistência.

Vale o alerta de Gilaberte no sentido de que “a perseguição ou Stalking pode se revelar um comportamento grave, apto a limitar a liberdade individual alheia e, não raro, a causar transtornos diversos à pessoa perseguida, inclusive psicológicos”.

Por isso mesmo, concluía-se à época assistir razão a Damásio quando aduzia que o “Stalking” em sua “ação global de perseguição” assume maior gravidade do que “os próprios delitos parcelares”, estando a merecer na ocasião “mais atenção e consideração do legislador brasileiro” quiçá “transformando-se em figura criminal autônoma e mais bem definida”.
Enfatizava-se à época e continua sendo válido que a conduta do “Stalking” possa ser perpetrada e sofrida por qualquer pessoa (homem ou mulher). Não obstante, é estatisticamente mais comum a presença dos homens no polo ativo e das mulheres no polo passivo, especialmente no que se refere a relacionamentos amorosos pretensos ou findos em que o “stalker” passa a perseguir a vítima dos mais variados modos.

Hirigoyen comenta a questão do “Assédio por Intrusão” ou “Stalking”, chamando a atenção para o fato de que “a maioria dos homicídios de mulheres ocorre durante a fase de separação”. Aduz que “a violência e a opressão se acentuam nesse momento e podem perdurar por muito tempo, depois de separados. O homem se recusa a deixar livre sua ex – companheira, como se ela fosse propriedade sua. Não consegue aceitar sua ausência, e a vigia, segue-a na rua, assedia-a por telefone, espera-a à saída do trabalho. Muitas vezes acontece de a mulher ter de mudar de local de moradia. É como se a agressividade e a violência que haviam se mantido contidas durante a relação agora tivessem livre curso”. A autora destaca que em países como os Estados Unidos “foram tomadas medidas de proteção (protective orders) para as mulheres vítimas desse tipo de assédio, extremamente perigoso, porque pode terminar em homicídio”. Também em Espanha criou-se a “Lei de Proteção Integral contra a Violência de Gênero” com medidas de proteção que determinam o afastamento do agressor e sua prisão em caso de desobediência (“quebrantamiento de condena”). A partir do ano de 2004 em Madri são disponibilizadas às mulheres vitimizadas “pulseiras de proteção contra maus – tratos”, ligadas telematicamente a “uma manga especial de que deverão ser portadoras as pessoas condenadas por agressão”, de maneira que sinais são emitidos se o agressor se aproximar da vítima a uma distância inferior a cinco metros ou se ele tentar retirar o aparelho. Também a vítima pode acionar um dispositivo da pulseira se sentir-se em perigo, comunicando imediatamente os serviços de urgência.

Ainda sem dispor de toda essa tecnologia o Brasil ao menos já se adiantou na criação das chamadas “Medidas Protetivas de Urgência” que podem ser aplicadas em casos de “Stalking” envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, nos estritos termos dos artigos 5º., I a III; 7º, I a V; 11; 12, III e 22 I a V; 23, I a IV e 24, I a IV, todos da Lei 11.340/06.
Assim sendo, a legislação brasileira é dotada de medidas capazes de conter o “stalker” em sua sanha persecutória, inclusive tendo à disposição o importante instrumento da Prisão Preventiva para os casos de contumácia ou persistência, mesmo após a ordem judicial protetiva (artigos 20 c/c 42, da Lei 11.340/06 e artigo 313, IV c/c 311 e 312, CPP).

Estes exemplos nacionais e estrangeiros são louváveis iniciativas de tratamentos especiais para a contenção dos “stalkers”, eis que essas condutas não se amoldam à costumeira lentidão das medidas penais definitivas, exigindo providências cautelares informadas pelo “fumus boni juris” e, principalmente, pelo “periculum in mora”.

Destaque-se que a Prisão Preventiva como instrumento para efetivar o cumprimento de medidas protetivas de urgência na legislação brasileira, nos termos do artigo 313, IV, CPP, deve ser encarada não só como um novo caso de aplicabilidade da prisão provisória (crimes que envolvem violência doméstica contra a mulher, independentemente da pena), mas também como um novo fundamento desta, objetivando garantir o cumprimento efetivo das medidas protetivas de urgência e somente então reclamando do artigo 312, CPP os requisitos da prova do crime e dos indícios suficientes de autoria. Para além disso, é de se ver que a conduta do “Stalking” também normalmente se amoldaria ao fundamento da preventiva previsto no artigo 312, CPP, da “garantia da ordem pública”, certamente abalada com a atuação reiterada do infrator.

Contudo, restava ainda uma lacuna para o tratamento especializado e mais rigoroso do “Stalking” sob o aspecto penal. Neste passo era oportuna a sugestão de Damásio quanto à necessidade de criação de figura específica para a conduta do “Stalking”. Essa infração penal, viria a lume para afastar as contravenções penais em caso de “Stalking” e até mesmo alguns crimes de pequena gravidade, cuja pena venha a ser menor do que aquela a ser atribuída ao “Stalking” ou “Assédio por Intrusão”. Isso sem qualquer lesão à proporcionalidade, dadas as especiais características do “Stalking”, capazes de amplificar o potencial lesivo das condutas mais simples isoladamente consideradas, as quais ganham dimensões altamente lesivas em face da acumulação de atos e da persistência do agente. Note-se ainda que não se trata de previsão de mais uma forma dos chamados “crimes de acumulação” tão criticados pela doutrina. Nesses a conduta do agente é ínfima e muitas vezes não lesiona o bem jurídico, sendo criminalizada na perspectiva de que se fosse repetida por um sem número de outras pessoas poderia tornar-se terrivelmente destrutiva. No “Stalking” não se trata de criminalizar um mero perigo de disseminação da conduta por terceiros. Refere-se, na verdade, à conduta do próprio agente que a perpetra de forma reiterada e insistente e efetivamente ocasiona uma sensível lesão aos bens jurídicos envolvidos com maior intensidade devido justamente à repetição dos atos, cuja acumulação produz lesão diferenciada da conduta isolada, merecendo proporcionalmente uma reação penal mais rigorosa. Não se trata, portanto, de qualquer espécie de prognóstico de disseminação da conduta por terceiros ou de uma lesão potencial ou suposta ao bem jurídico e sim da responsabilização adequada e proporcional do agente por sua conduta própria e pelos danos reais que ocasiona aos bens jurídicos de que é titular a vítima.

Finalmente esse projeto de criminalização especial do “Stalking” na legislação brasileira se concretizou com a criação do crime de “Perseguição”, ora previsto no artigo 147 –A, CP, conforme determinado pela Lei 14.132/21.

Seguem abaixo os comentários acerca dos principais aspectos do crime de “Perseguição” ora em vigor.

2-BEM JURÍDICO TUTELADO

O crime em estudo se encontra no Título I da Parte Especial do Código Penal, “Dos Crimes contra a Pessoa”, em seu Capítulo VI, “Dos Crimes contra a Liberdade Individual”. Com segurança, portanto, se pode afirmar que tutela a liberdade individual da pessoa humana. No entanto, também pode tutelar subsidiariamente outros bens jurídicos atingidos de acordo com a espécie de perseguição empreendida (crime de forma livre), tais como a honra, integridade física, inviolabilidade do domicílio, intimidade, vida privada, imagem, liberdade sexual etc.

Em acordo com esse entendimento da proteção subsidiária ou indireta de outros bens jurídicos, inclusive com base em decisão judicial do Direito Comparado (Espanha) acerca da questão, se manifesta Callegari, aduzindo que “também podem ser afetados outros bens jurídicos (…), em função dos atos em que se concretize a perseguição”. Ademais, noticia o mesmo autor, também com sustento em pesquisa no Direito Comparado que na Espanha foi proferida decisão judicial afirmando que “mais que a liberdade de autodeterminação do sujeito, o que se defende com esse crime seria o direito de sossego e tranquilidade da pessoa”.

Afinal, a própria autodeterminação é certamente prejudicada quando lhe falta o pressuposto de uma condição psíquica de tranquilidade de ânimo para a tomada de decisões.

3-SUJEITO ATIVO

O crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, independentemente de alguma especial qualidade. Como já destacado, o delito pode ser perpetrado tanto por homens como por mulheres. Não obstante, estatisticamente é mais comum sua prática por homens contra mulheres, envolvendo assim, muitas vezes, questões atinentes à violência doméstica e familiar contra a mulher. Observe-se, porém, que homens também podem ser vítimas de perseguição, seja por outros homens ou por mulheres. O crime em estudo, como já dito, é comum.

O concurso de pessoas é acidental, podendo ser praticado por um só indivíduo (crime unissubjetivo). Não há concurso necessário ou crime plurissubjetivo. É claro, no entanto, que nada impede o concurso de agentes.

Importa ressaltar a manifestação de Leitão Júnior que, com esteio no escólio de Belarmino Júnior e Pereira, sugere uma suposta “evolução” legislativa consistente na criação de uma figura que importe em responsabilidade penal de pessoas jurídicas por perseguição, sob o argumento de que estas também invadem corriqueiramente a “privacidade e liberdade” das pessoas “com práticas abusivas e lesivas”. No entender de Leitão Júnior e dos demais autores em que se escora, “a Constituição Federal prevê a responsabilidade penal de pessoas jurídicas de forma não restrita” e então “o legislador infraconstitucional perdeu a oportunidade de versar sobre essa matéria”.

Com o devido respeito, há que discordar dessas assertivas. Eventual responsabilização penal de pessoas jurídicas por perseguição seria inconstitucional. Isso porque a Constituição Federal somente prevê essa possibilidade para duas situações: crimes contra a ordem econômica e financeira e a economia popular, de acordo com o artigo 173, § 5º., CF (hipótese que nunca foi posta em prática pelo legislador ordinário) e crimes ambientais, nos termos do artigo 225, § 3º., CF (já com previsão prática pelo legislador ordinário no artigo 3º., da Lei 9.605/97). Não corresponde à realidade a afirmação de que a previsão de responsabilidade penal da pessoa jurídica é irrestrita na ordem constitucional brasileira. Embora os sistemas de “common law” (anglo – saxão) e de “civil law” (romano – germânico) venham se aproximando cada vez mais no que diz respeito ao reconhecimento da necessidade de responsabilização penal das pessoas jurídicas , fato é que tal modelo é tradicional no sistema de “common law” e uma novidade e, portanto, uma exceção, no sistema romano – germânico que informa o ordenamento jurídico brasileiro. Sem previsão constitucional expressa, ordenamentos de origem romano – germânica como o brasileiro não admitem, como regra, a responsabilidade penal de pessoas jurídicas, sendo regidos, de ordinário, pela máxima latina “societas delinquere non potest” (a sociedade não pode delinquir). Enfim, “a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, em nosso ordenamento, constitui-se em novidade e excepcionalidade” que somente é constitucionalmente prevista de forma casuística em 1988, bem como regulada na lei penal ordinária em 1998, apenas no que diz respeito a crimes ambientais. Nem mesmo com relação à criminalidade econômica (outra excepcional permissão constitucional) houve até o momento previsão na legislação criminal. A abordagem é tão tímida e limitativa no ordenamento brasileiro que mesmo no que tange aos crimes ambientais existe discussão na doutrina se a responsabilidade penal de pessoas jurídica ficaria limitada aos delitos previstos na Lei 9.605/98 ou poderia se espraiar para crimes de natureza ambiental com previsão em outros diplomas legais. E não há que confundir essa discussão acerca da restrição da responsabilidade penal de pessoas jurídicas à Lei Ambiental ou a sua expansão irrestrita a outros diplomas sobre o mesmo tema, com uma suposta previsão amplamente irrestrita de possibilidade de responsabilização criminal na legislação brasileira ao bel prazer do legislador ordinário. A Constituição, na verdade, é bastante limitativa no que diz respeito a isso. Eventual irrestrição dependeria de emenda constitucional, acaso se considere isso como algo adequado a se fazer em termos de Política Criminal. Nossas raízes romano – germânicas e a fórmula casuística e pontual com que o constituinte tratou do tema são incompatíveis com a hipótese de responsabilidade penal irrestrita das pessoas jurídicas. Para isso o modelo adotado pela Constituição teria de ter sido muito explícito no estabelecimento de norma permissiva genérica, o que afastaria a previsão específica para os casos de crimes ambientais e econômicos. Haveria uma guinada no modelo originário e não seria necessária a menção casuística, de modo que a sua própria previsão conforme consta dos artigos 173, § 5º. e 225, § 3º., CF, indica que se tratam de casos excepcionais, sendo a regra a vedação da responsabilização penal da pessoa jurídica.

Assim sendo, eventuais abusos perpetrados por pessoas jurídicas no que diz respeito à violação da liberdade e privacidade das pessoas não deixarão de constituir atos ilícitos, mas sua solução deverá dar-se nos âmbitos civil e administrativo, não na seara penal.

4-SUJEITO PASSIVO

Com as observações feitas no item anterior, é certo que qualquer pessoa pode ser sujeito passivo do crime de perseguição.

Corretamente destacam Costa, Fontes e Hoffmann que o crime é “bicomum”, já que “o legislador não exigiu nenhuma qualidade especial do criminoso ou da vítima”. Não obstante, também asseveram com razão os mesmos autores que a lei prevê uma causa especial de aumento de pena da ordem de metade sempre que a vítima for criança, adolescente, idoso ou mulher perseguida por razões da condição do sexo feminino (artigo 147 – A, § 1º., I e II, CP).

Interessante essa observação dos mencionados doutrinadores, pois que ao chamar a atenção para a prevalência estatística da mulher como vítima no ambiente doméstico e familiar, não se pode deixar de considerar também que podem ser vítimas preferenciais outras pessoas em condição de hipossuficiência, tais como as crianças, adolescentes e idosos, dos quais do legislador positivamente não se olvidou.

Referindo-se o tipo penal a “alguém” como vítima, é de se concluir que a perseguição deve ter por objeto material pessoa determinada ou ao menos um grupo de pessoas determinado. Significa dizer que a perseguição, ainda que reiterada, a grupos indeterminados de pessoas, tais como judeus, negros, índios, mulheres, homossexuais, nordestinos etc., é ao menos fato relativamente atípico, ou seja, em relação específica ao crime previsto no artigo 147 – A, CP. Não há se falar em todos os casos em atipicidade absoluta, pois que condutas de perseguição contra grupos de pessoas indeterminadas podem chegar a configurar crimes muito mais graves, tais como “Racismo” ou “Genocídio”. Tudo depende de uma análise detida do caso concreto.

Também é interessante notar que em se tratando de crime contra a “pessoa” (física ou natural) e referindo-se a lei a “alguém”, não será viável que as “pessoas jurídicas” figurem na qualidade de sujeito passivo de perseguição. Ademais, não se pode afirmar que as pessoas jurídicas tenham capacidade de gozo do bem jurídico primordialmente tutelado, qual seja, a liberdade individual. Também não é possível atribuir às pessoas jurídicas algum tormento psíquico ou físico, nem o atingimento de uma condição de “tranquilidade pessoal”. Por obviedade, as pessoas físicas que compõem uma pessoa jurídica podem ser normalmente vítimas do crime de perseguição e se o fato se dá com uma conduta abrangente que visa às várias pessoas físicas que compõem a pessoa jurídica, se configura concurso formal impróprio, tendo em vista a presença de desígnios autônomos, nos termos do artigo 70, parte final, CP.

5-TIPO OBJETIVO

O verbo nuclear do tipo é “perseguir” e tal perseguição que, aliás, dá “nomen juris” ao crime, deve ser perpetrada de forma reiterada. Ou seja, não basta um único ato. Em casos tais (conduta única ou espaçada) haverá configuração de outros tipos penais, tais como ameaças, crimes contra a honra, vias de fato, lesões corporais etc. A conduta de perseguição pressupõe uma reiteração ou um cúmulo de condutas de forma a transtornar a tranquilidade e a liberdade da vítima com muito maior intensidade do que ocorreria com um ato isolado ou alguns atos espaçados entre si.
Tal como aduz Moreira:

Assim, cometerá o delito, objetivamente, quem de maneira repetida e sistemática perseguir alguém, seguindo-o de perto, indo ao seu encalço, acossando-o, importunando a sua vida, incomodando a sua privacidade ou atormentando a sua paz e a sua tranquilidade.

Mais singelamente, mas não menos objetivo, assim se manifesta Leitão Júnior:

“No aspecto conceitual podemos ter por perseguição a conduta a ser definida como aquela praticada por meios físicos ou virtuais que interfira na liberdade e na privacidade da vítima”.

A perseguição se refere a uma intensa perturbação corriqueira da vítima, chegando “a ponto de fazer com que se sinta tolhida na condução de sua vida cotidiana”.

Fazendo menção a uma decisão do Juizado de Instrução de Tudela (Navarra) na Espanha, Callegari afirma, com razão, ser necessária para a configuração da perseguição que esta se apresente como “uma estratégia sistemática”.

O tipo penal constitui crime de forma livre, mas, como visto, é habitual. Embora não se possa negar a habitualidade ínsita ao crime em estudo, não se trata de exigir que a perseguição seja um “modus vivendi” do agente. Tão somente é necessário que a conduta seja repetitiva, realizada de forma reiterada, conforme descrito na lei.
Como esclarecem Costa, Fontes e Hoffmann:

Ao fazer uso do termo reiteradamente, o legislador não deixa dúvidas de que o crime demanda habitualidade, por mais que isso não indique um verdadeiro estilo de vida do autor do fato. Mesmo que se trate de um crime habitual sui generis, o resultado prático é que um único ato de importunação não tem o condão de configurar o delito em estudo.
Não existe também um prazo delimitado para que a conduta passe a ser considerada como reiterada ou habitual. Tal como leciona Leitão Júnior, “basta que a perseguição reiterada seja contínua ou frequente”.

Trata-se claramente de crime de forma livre, tendo em vista a dicção do artigo 147 – A, CP, estabelecendo que a perseguição pode dar-se “por qualquer meio”.

Note-se que embora se exija reiteração (habitualidade) não há necessidade de que os meios de perseguição, invasão e perturbação sejam sempre idênticos em todos os atos que compõem a conduta criminosa. Vários meios ou formas de execução podem perfeitamente serem combinados. Um infrator pode perseguir a vítima na via pública, depois importuná-la com telefonemas e e-mails ou mensagens nas redes sociais, depois enviar-lhe cartas e assim por diante.

Essa perseguição deve resultar em ameaça ou risco à integridade física ou psicológica que ocasione restrições à capacidade de locomoção (direito de ir e vir) ou invasão ou perturbação de qualquer natureza à esfera de liberdade ou privacidade do sujeito passivo.

Costa, Fontes e Hoffmann observam, com acuidade, que numa primeira impressão pode-se considerar que a criação de ameaça ou risco à integridade física ou psicológica da vítima seria apenas uma das maneiras de cometer o crime em estudo. Outras formas seriam a restrição da liberdade de locomoção ou a invasão ou perturbação da liberdade ou privacidade. Esta, entretanto, não parece realmente ser a melhor interpretação, conforme esclarecem os autores citados. Na verdade, o mais correto é compreender que existe um liame necessário entre a prática ameaçadora ou a criação de um risco à integridade física e psicológica e os resultados necessários para que o crime ocorra, quais sejam, a restrição da liberdade de ir e vir ou a invasão ou perturbação da liberdade ou privacidade da vítima. A ameaça ou risco criado é a conduta propriamente dita do infrator e a restrição, invasão ou perturbação seguintes são os resultados exigidos para que o crime se aperfeiçoe. A relação é de conduta e resultado ou de causa e efeito, sendo que tanto a conduta ameaçadora como os efeitos sobre a liberdade são exigidos para que o tipo se integre.
Os autores em destaque asseveram corretamente que:

A exegese que parece mais adequada é a sistemática ou teleológica. Haverá crime apenas diante da perseguição reiterada que ameace a integridade física ou psicológica da vítima, quando (a) restrinja sua capacidade de locomoção ou (b) por qualquer outra forma, invada ou perturbe sua liberdade ou privacidade (cláusula de interpretação analógica).

O tipo penal descreve a conduta consistente na perseguição reiterada, indica a forma pela qual tal perseguição deve se processar (ameaça à integridade física ou psicológica) e, finalmente, os resultados que dela devem decorrer (restrição da locomoção ou invasão ou perturbação da liberdade ou privacidade por qualquer forma).

É importante ter em mente que a “ameaça” a que se refere o tipo penal em estudo é aquela decorrente da perseguição e não precisa, necessariamente, consistir na promessa de um mal injusto e grave, tal como é exigido para o crime específico de “Ameaça” (artigo 147, CP). Com isso não se quer dizer que qualquer bagatela irá configurar a perseguição, nem que a conduta de ameaça injusta e grave nos moldes do crime de ameaça não sirva para compor a perseguição. No entanto, não será preciso que o agente, necessariamente, ameace a vítima de agressão física, morte, causação de prejuízos financeiros, à imagem etc., como seria necessário no crime do artigo 147, CP. Para a perseguição, outras condutas consistentes na presença física ostensiva do indivíduo em locais frequentados pela vítima e sua aproximação, ainda que sem expressar ameaças físicas; a remessa de cartas ou mensagens de e – mail, lotando a caixa postal da vítima e causando-lhe empecilhos, ainda que dali somente constem alusões de afeto, ou até mesmo o envio de flores, cartões e presentes inoportunamente pode perfeitamente configurar a perseguição obsessiva. Telefonemas reiterados com assuntos já rechaçados pela vítima, embora não versando sobre ameaça física, eventualmente até mesmo constituindo-se em lamentos e alegações de que se a vítima não lhe dá atenção pode vir a suicidar-se, ou seja, o mal prometido não se refere à vítima, mas ao próprio autor. Tudo isso configura a perseguição, embora não fosse configurar o crime de ameaça. O termo “ameaça” no tipo penal em estudo é empregado de maneira ampla, podendo constituir sim também a ameaça de mal injusto e grave, mas abarcando uma acepção da palavra “ameaça” enquanto “risco causado” à integridade física ou psicológica da vítima. Na linguagem informática encontra-se uma expressão que pode aclarar a amplitude do termo “ameaça” neste tipo penal do artigo 147 – A, CP. É comum que um antivírus apresente na tela a mensagem de que foram encontradas “ameaças” ao seu computador ou que não foram encontradas “ameaças”. É evidente que o termo “ameaças” não é ali empregado no mesmo sentido utilizado no crime de “ameaça” (afinal, é impensável que alguém esteja “ameaçando” um computador), mas sim como sinônimo de “risco”. Este parece ser o emprego da palavra pelo legislador, de modo a ultrapassar seu sentido mais restrito no artigo 147, CP. E nosso auxílio encontra-se o escólio de Lessa:

Defendemos que a expressão ameaça deva ser vista de maneira ampla, e não em simetria ao tipo penal do art. 147 do Código Penal, o qual exige mal injusto e grave. A ameaça, no delito de perseguição, deve ser encarada como sinônimo de intimidação, ainda que velada, e que dê a entender, na visão da vítima, que aquela atitude persecutória está eivada do desejo de lhe fazer mal ou prejudicar. A ameaça, assim, deve ser hábil a impingir promessa de mal físico (vis corporalis) ou mácula psicológica (que cause dano emocional), resultando em restrição da capacidade de locomoção (por medo) ou gerando perturbação (desestabilização emocional) ou invasão (ocupação por força) na esfera de liberdade ou privacidade da vítima (grifo nosso).

Essa ampliação da acepção de “ameaça” no crime de “Perseguição” (artigo 147 – A, CP) é constatada também por Callegari quando aduz que “em muitos casos não se enquadrava formalmente” a conduta ora prevista como de perseguição “a um tipo penal como o de ameaça ou perturbação”. Agora “de acordo com a tipificação conferida pelo legislador os casos de perseguição serão alargados com a nova redação do tipo penal”.

Esses resultados são bastante abertos, pois realmente o legislador utiliza o sistema de “interpretação analógica”. Apresenta um exemplo casuístico de resultado negativamente valorado (restrição da locomoção) e, a seguir, expõe fórmula genérica ao referir-se a qualquer outra forma de invasão ou perturbação da liberdade ou privacidade da vítima. Ora, não resta dúvida que o coartar da liberdade de ir e vir constitui uma invasão ou perturbação indevida da liberdade e privacidade da vítima. Esse é um exemplo específico, que é segundado pela referência a qualquer outra forma de violação similar.

Não há dúvida de que há aqui um recurso legislativo à “interpretação analógica”, que consiste basicamente em desvelar o sentido da norma com os próprios elementos por ela dispostos. Na lição de Masson, isso é possível quando a norma é dotada de “uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica”, o que é exatamente o que ocorre neste caso em estudo, conforme foi demonstrado. Não se trata de analogia maléfica ao réu, mas daquilo que também se denomina de “interpretação intra legem”, já que a solução não é buscada por comparação externa à norma, mas em seu próprio bojo, de forma a não violar garantias individuais e o Princípio da Legalidade estrita.

Obviamente as mesmas condutas que poderiam configurar o crime de perseguição, quando praticadas por profissionais que atuam no cumprimento de suas funções legalmente permitidas e até mesmo impostas, não haverá incriminação, salvo em casos evidentes de abuso. Não é possível, por exemplo, pretender incriminar um Oficial de Justiça por perseguição quando este fica no encalço do citando que procura evadir-se à citação, pois age com sustento no Código de Processo Penal ou de Processo Civil. O mesmo se diga do Detetive Particular, que tem sua profissão regulamentada pela Lei 13.432/17. Diverso também não é o caso de Policiais Civis ou Militares que atuam com sustento nas leis penais e processuais penais vigentes. Finalmente, pode-se mencionar o caso de Operadores de Telemarketing, fotógrafos (“paparazzi”), jornalistas ou até mesmo meros “galanteadores” insistentes, salvo, como já dito, em casos de atitudes abusivas.

Não restam dúvidas de que o exercício de atividades que poderiam, em tese, subsumir-se ao tipo penal de “Perseguição”, quando perpetradas por pessoas no exercício regular e legal, permitido ou até mesmo determinado pelo conjunto do ordenamento jurídico, configura o que Zaffaroni e Batista denominam de “atipicidade conglobante”. Em suas palavras:

“A antinormatividade não se revela apenas na simples oposição entre a norma deduzida do tipo legal e a conduta, postulando também a consideração conglobada da norma deduzida do tipo com outras normas dedutíveis de outros tipos legais”.

Aspecto importante diz respeito à necessidade de que a conduta de perseguição de que alguém se diz vítima seja séria, a fim de que represente efetivo dano ou perigo de dano ao bem jurídico tutelado, satisfazendo, destarte, ao “Princípio da Lesividade” e afastando também a ocorrência de ilícito bagatelar. Não é possível que o Direito Penal se ocupe de casos como o vivenciado na prática por este subscritor, quando uma dada pessoa compareceu à Delegacia (ainda não havia sequer previsão do delito de “Perseguição”) e reclamou que seu vizinho olhava para ela “com a cara feia”! Ora, isso é, no máximo, uma questão de estética subjetiva, jamais um problema real a ser solvido no mundo jurídico – penal. Nessa mesma trilha afirma Moreira:

De toda maneira, resta induvidoso que, para a configuração do delito, é preciso que a perseguição seja efetivamente grave, crível, idônea, verossímil, concreta e séria, capaz de atingir a liberdade física ou psíquica da vítima, além de sua tranquilidade pessoal, podendo ser uma perseguição explícita (clara) ou às escondidas (implícita ou velada), contanto que a vítima tome conhecimento da conduta (…). Assim, simples e infundadas ilações ou mesmo manias de perseguição, não legitimam a intervenção do Direito Penal que, como se sabe, é regido pelo princípio da intervenção mínima.

Enfim, a paranoia e o capricho não são e nunca foram bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal e nem mesmo por outros ramos jurídicos.
Nesses comentários acerca da necessária lesividade, tipicidade material e conglobante das condutas resta patente o fato de que o Direito Penal não se pode satisfazer simplesmente por meio do recurso silogístico lógico de mera adequação de premissas a uma conclusão pelo método dedutivo. Em suma, somente a subsunção da conduta ao tipo penal objetivo não é suficiente para a incriminação efetiva. Mister se faz um sucessivo esforço dialético no qual se confrontem discursos ou hipóteses contraditórias com o fim de obter uma espécie de percepção intuitiva (no sentido de evidência) de uma premissa que articule tais elementos contraditórios, ou reconhecendo um e afastando o outro ou concluindo que ambos são válidos, mas em circunstâncias ou planos diversos ou mesmo que são complementares entre si. Na verdade, a dialética opera exatamente ao reverso da lógica. Esta parte de premissas para obter conclusões, enquanto que a dialética parte de hipóteses contraditórias e remonta à premissa fundante que explique tais hipóteses de forma articulada. É somente para além do silogismo lógico (que é apenas uma fase inicial de raciocínio), adotando então o procedimento dialético, que se pode chegar a conclusões acerca da tipicidade conglobante, tipicidade material, lesividade, desvalor e significância de uma conduta formalmente típica.

O delito de “Perseguição” não se perfaz com uma simples perturbação ou incômodo. Sua configuração se dá quando o agente quer controlar, subjugar a vítima, causando-lhe medo, insegurança, ansiedade, angústia e temor. Conforme nos esclarecem Costa, Fontes e Hoffmann, em excelente pesquisa com exposição da normatização do crime de “Perseguição” no Direito Comparado (Austrália, Estados Unidos, Portugal, Irlanda, Holanda etc.), o assédio por intrusão limita a capacidade volitiva da vítima, condicionando intensamente suas “decisões e comportamentos”, ensejando alterações em seus “hábitos, horários, trajetos, número de telefone, email e até mesmo local de residência e trabalho”. Ocorre uma degradação considerável da qualidade de vida do sujeito passivo, ocasionada pela atuação perseguidora do criminoso. Os autores em destaque chamam a atenção para o fato de que legislações estrangeiras usam nos tipos penais respectivos expressões como “alterar seus hábitos de vida” (Itália) ou “prejudicar sua liberdade de determinação” (Portugal). Esse instrutivo passeio pelo Direito Comparado e o destaque para o grau de intimidação intenso que deve caracterizar a conduta criminosa, reforça a ideia já exposta de que a perseguição deve ser séria e concreta, a fim de satisfazer a lesividade, o minimalismo jurídico – penal e não dar abrigo à punição ou persecução de condutas insignificantes (Princípio da Insignificância ou da Bagatela).

No exato mesmo sentido Callegari cita decisão jurisprudencial espanhola do Juizado de Instrução de Tudela (“Procedimiento, diligencias urgentes n. 0000260/2016 Juzgado de Instrucción n. 3 de Tudela, Navarra), com a seguinte dicção:

As condutas de stalking afetam o processo de formação de vontade da vítima no sentido de que a sensação de temor e intranquilidade ou angústia que produz o repetido ato de espreitar por parte do perseguidor e que lhe levam a mudar seus hábitos, seus horários, seus lugares de passagem, seus números de telefone, contas de correio eletrônico e inclusive de lugar de residência e trabalho.

Sublinhe-se que quando a lei menciona a “restrição” da “capacidade de locomoção” da vítima, não há necessidade de que esta sofra uma “privação” do direito de ir e vir, tal como ocorre no crime de “Sequestro e Cárcere Privado” (artigo 148, CP). Tal distinção é relevante, pois até mesmo os verbos dos dois tipos penais divergem, no artigo 147 – A, CP o verbo é “restringir”, enquanto no artigo 148, CP o verbo é “privar”.
Releva ainda observar que o tipo penal faz referência à invasão ou perturbação da “privacidade”. Nesse passo é importante fazer a distinção entre “privacidade” e “intimidade”, bem como estabelecer se a segunda também conta com a tutela penal de acordo com o âmbito de incidência da norma em estudo.

Bulos bem expõe a distinção entre “vida privada” e “intimidade”:
A vida privada e a intimidade são os outros nomes do direito de estar só, porque salvaguardam a esfera de reserva do ser humano, insuscetível de intromissões externas (aquilo que os italianos chamam de rezervatezza e os americanos privacy). (…). Amiúde, a ideia de vida privada é mais ampla do que a de intimidade. Vida privada envolve todos os relacionamentos do indivíduo, tais como suas relações comerciais, de trabalho, de estudo, de convívio diário etc. Intimidade diz respeito às relações íntimas e pessoais do indivíduo, seus amigos, familiares, companheiros que participam de sua vida pessoal.

No mesmo diapasão se manifesta didaticamente Nunes Júnior:

Dessa maneira, podemos afirmar que intimidade e vida privada são dois círculos concêntricos que dizem respeito ao mesmo direito: o direito à privacidade ou direito de estar só. A intimidade é um círculo menor, que se encontra no interior do direito à vida privada, correspondendo às relações mais íntimas da pessoa e até mesmo à integridade corporal, não se admitindo as “intervenções corporais” como em outros países.

Sendo assim, no que tange à proteção penal há que reconhecer que a proteção dada à inviolabilidade da “privacidade”, necessariamente abarca a “intimidade”. Aqui se pode dizer que quem não pode o menos (violar a privacidade – círculo maior de abrangência), não pode consequentemente o mais (violar a intimidade – círculo mais restrito). Se a reserva é menor quanto à “privacidade” e esta é tutelada, não é possível que se possa chegar licitamente à violação da “intimidade”, cuja reserva é mais intensa, mantendo-se incólume à aplicação da lei penal.

Bernardes e Ferreira, no campo constitucional, lecionam exatamente essa continência da intimidade na privacidade. Em outras palavras, ensinam que a intimidade está contida, é abarcada ou abrangida pela privacidade, o que é muito bem representado graficamente pela figura dos círculos concêntricos já anteriormente referenciada:

O direito à vida privada se refere àquela parte mais destacada da intimidade, que é a já mencionada esfera do segredo. Mas tem a ver, ainda, com a ampla liberdade assegurada à pessoa para desenvolver sua vida interior, bem como o direito de estar só (“right to be alone”) e o direito de não ser importunado. Nessa última acepção, o direito à vida privada está interligado à liberdade de consciência e de autodeterminação individual, incluindo as íntimas motivações, opções e/ou preferências pessoais (religiosas, filosóficas, sexuais etc.), tanto as que impulsionam atos eminentemente privados, quanto aquelas relacionadas a outros direitos fundamentais importantes, tais como a liberdade de escolha profissional, a liberdade de aderir ou não a um culto religioso, de associar-se ou deixar de associar-se.

A rigor, portanto, a “vida privada” acaba por integrar o conceito de “intimidade”. Assim, a proteção à vida privada já se incluiria na proteção geral à intimidade em si (grifos no original no primeiro parágrafo e grifo nosso do segundo parágrafo).

Finalizando importa acrescentar que o crime de “Perseguição”, também conhecido pela expressão em inglês “Stalking”, certamente abrange o que se convencionou denominar também por meio de uma expressão inglesa, de “Bullying”. Afinal, o “Bullying” “corresponde a um conjunto de atitudes de violência física e/ou psicológica, de caráter intencional e repetitivo, praticado por um ‘bully’ (agressor) contra uma ou mais vítimas que se encontram impossibilitadas de se defender”.

O “Bullying” normalmente evoca o ambiente escolar, mas é preciso ter em mente que as condutas que o caracterizam são múltiplas, abrangendo situações e ambientes os mais diversos, bem como relações variadas (v.g. escola, trabalho, lazer, convívio social em geral).

Como bem expõe Nahur:

De qualquer modo, também não se pode deixar de assinalar que, como fenômeno detectado na sociedade moderna, nos tempos atuais, bullying e cyberbullying envolvem múltiplas formas, por muitas vias e por intermédio de vários instrumentos de “vitimização” por parte de grupos ou indivíduos, direta ou indiretamente, contra inúmeras pessoas, em contextos socioculturais de relações de pares. Manifestam-se essas práticas “vitimizadoras” em diversos espaços coletivos de convivência constante e não se restringem apenas a aspectos de gênero, faixa etária e nível socioeconômico. Trata-se de mais uma subcategoria da noção mais ampla da categoria violência que se exterioriza nas mais variadas, repetidas e sistemáticas práticas no mundo real e no virtual.

Portanto, é induvidoso que, a depender da espécie de conduta caracterizadora do “Bullying”, conformar-se-á também o delito de “Perseguição”, “Stalking” ou “Assédio por Intrusão”, ora previsto no artigo 147 –A, CP.

Como afirma Calhau, “o ‘Bullying’ é um ato ilegal”, podendo caracterizar ilícitos civis, administrativos ou penais a depender das circunstâncias, inclusive agora o artigo 147 –A, CP.

Vale ainda lembrar que a Lei 13.185/15, instituiu o “Programa de Combate à Intimidação Sistemática”. Tal legislação não criminaliza, mas define a prática de “Bullying” (artigo 1º., § 1º.), deixando bastante evidente que sua prática pode perfeitamente se subsumir ao tipo penal do artigo 147 – A, CP, senão vejamos:

No contexto e para os fins desta Lei, considera-se intimidação sistemática (bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas.

Há ainda que citar o denominado “Mobbing”, primeira forma identificada de “assédio moral”, advindo do verbo inglês “to mob”, significando “tumulto, turba, confusão”. A intimidação se processa neste caso por meio da ação de vários indivíduos contra um, são “perseguições coletivas” que podem “culminar em violência física”. Relembre-se que embora o delito de “Perseguição” não seja de concurso necessário, nada impede haver o concurso acidental de agentes.

A bem da verdade, “Stalking”, “Bullying” e “Mobbing” são espécies do gênero “Assédio Moral”, os quais muitas vezes se misturam e completam, cuja criminalização pode variar de acordo com as condutas praticadas pelo infrator para intimidar a vítima. Dessas práticas podem emergir crimes contra a honra, lesões corporais, vias de fato, crimes patrimoniais e, agora, também o crime de “Perseguição”.

6 -TIPO SUBJETIVO

O crime de “Perseguição” é doloso, não havendo previsão de figura culposa. O dolo exigido é o dolo genérico, pois que não há descrição de especial fim de agir.
Tendo em vista a ampla acepção com que a ameaça é empregada no tipo penal, ensejando a aproximação com um conceito de “risco” que ultrapassa a restrita acepção de promessa de mal injusto e grave constante do crime de “Ameaça” (artigo 147, CP), seria de se concluir tratar-se de “crime de perigo” (perigo concreto). Porém, como bem aduz Gilaberte, “esta não é a melhor interpretação”, sendo o crime do artigo 147 –A, CP classificado como “crime de dano, por exigir uma lesão à liberdade individual”.

7- CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

Tratando-se de crime habitual que exige a reiteração de atos de perseguição, não é possível a tentativa, tal qual ensina a grande maioria da doutrina.
Neste sentido vale o ensinamento tradicional de Mirabete:

“Nos crimes habituais, não se admite a tentativa, pois ou há reiteração de atos e, portanto, consumação, ou não há essa habitualidade e os atos são penalmente indiferentes”.

8 – PENA E AÇÃO PENAL

A pena prevista para o crime de “Perseguição” é de “reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
Trata-se, como se vê, de infração de menor potencial ofensivo, sendo acessíveis aos seus autores os benefícios previstos na Lei 9.099/95, salvo quando se tratar de situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do artigo 41, da Lei 11.340/06, que então veda a aplicação dessas normas mais brandas, isso sem falar do aumento de pena previsto no artigo 147 – A, § 1º., II, CP que, por si só, já elevaria o patamar da pena máxima para além daquele admissível para infrações de menor potencial. Também é viável a aplicação de Acordo de Não Persecução Penal, desde que o crime não seja informado por violência ou grave ameaça, nos termos do artigo 28 – A, CPP com nova redação dada pela Lei Anticrime (Lei 13.964/19). Relembre-se que a “ameaça” descrita neste tipo penal é mais ampla do que aquela que conforma o crime de ameaça, razão pela qual pode sim haver “Perseguição” sem que haja efetiva “violência ou grave ameaça” à vítima, tal como já exemplificado linhas volvidas.

Em ocorrendo causas de aumento de pena previstas no § 1º., do artigo 147 – A, CP, o crime não será mais de menor potencial, eis que pena máxima ultrapassará o patamar de dois anos. O mesmo se diga se houver concurso com crime de lesões corporais ou outros crimes violentos. Nesses casos, a lei manda aplicar o cúmulo material (concurso formal impróprio) e então novamente a pena resultante necessariamente será maior do que dois anos (vide artigo 147 – A, § 2º.). É oportuno lembrar que as Súmulas 723, STF e 243, STJ, estabelecem que no caso de concurso material ou formal de crimes ou mesmo crime continuado, a pena “in abstrato” considerada para benefícios da Lei 9.099/95 é aquela resultante da somatória (cúmulo material) ou do aumento aplicado (exasperação). Observe-se, porém, que em se tratando de vias de fato (artigo 21, LCP) não haverá cúmulo material, mas absorção ou consunção.

Não parece ter agido o legislador com o devido rigor que o crime mereceria. Para que a questão fosse tratada como infração de menor potencial em regra, não seria necessária a elaboração de legislação nova. O artigo 147 – A, CP, em virtude da pena irrisória prevista, parece poder ser considerado um exemplo de insuficiência protetiva.

Também critica a incoerência do legislador quanto à eleição do preceito secundário o autor Bruno Gilaberte:

Perceba-se a incoerência do legislador ao criar um tipo penal de menor potencial ofensivo (sanção máxima de dois anos), ao mesmo tempo em que comina pena de reclusão, ao invés da detenção, mais adequada à sua extensão temporal. Entendemos injustificada e desproporcional a opção.

A inconsistência e erraticidade do legislador no estabelecimento da sanção penal são tamanhas que induzem a erro a melhor doutrina. No excelente trabalho de Costa, Fontes e Hoffmann, afirmam os autores que não seria possível o uso de interceptação telefônica para apuração do crime de “Perseguição”, uma vez que tal somente é permitido para crimes apenados com “reclusão”. Mas, o crime enfocado é apenado com reclusão, cabendo, portanto, em tese, a interceptação! É evidente que os autores foram induzidos a equívoco pela atuação errática do legislador que cria uma infração de menor potencial com pena de reclusão. Uma pequena distração e a aplicação de um raciocínio de coerência, leva os autores a um equívoco de pensarem que o crime seria apenado com detenção. Afinal, pensar com coerência vai à contramão daquilo que norteou a conduta do legislador! Por outro lado, estão corretos os autores quando informam que não será possível o uso de captação ambiental, já que esta somente pode ser aplicada em crimes de pena máxima acima de 4 (quatro) anos, nos termos do artigo 8º. – A, II, da Lei 9.296/96. E estão certos até mesmo se houver causas de aumento de pena previstas no artigo 147 – A, § 1º., I, II e III, já que o acréscimo é de metade e então a pena máxima chegaria somente a 3 (três) anos. A única hipótese em que poderia ser cabível, em tese, essa espécie de investigação, seria no caso do cúmulo material com violência, mesmo assim em se tratando de lesões graves, gravíssimas, seguidas de morte ou qualificadas por violência doméstica (inteligência do artigo 147 – A, § 2º. c/c artigo 129, §§ 1º. a 3º. e 9º., CP).

A ação penal é pública condicionada à representação do ofendido, nos termos expressos do artigo 147 – A, § 3º., CP.

O prazo decadencial de seis meses para representação começa a correr do conhecimento da vítima sobre a identidade do infrator (artigo 38, CPP). Portanto, em situações de atuação anônima em geral ou, como é bastante comum, em meios informáticos, o prazo decadencial somente passará a correr a partir da identificação do autor.
Mesmo nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher a ação penal é pública condicionada à representação da ofendida, pois que não houve qualquer excepcionalidade quanto a isso por parte do legislador. No entanto, se houver prática de violência física, ainda que com lesões corporais de natureza leve ou vias de fato, a ação penal será pública incondicionada, nos termos do artigo 101, CP (crime complexo) e de acordo com a Súmula 542, STJ (“A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada”). No mesmo sentido decidiu o STF na ADI 4424 e ADC 19. Além disso, quanto às vias de fato (artigo 21, LCP), STF e STJ têm reconhecido a abrangência de contravenções penais pela Lei 11.340/06, aplicando-se, portanto, as limitações do artigo 41 desse diploma e afastando a Lei 9.099/95 nos casos envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher. Conforme destaca Cunha:

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem se manifestando quanto à natureza pública incondicionada da ação penal em caso de delitos de vias de fato praticados mediante violência doméstica e familiar contra a mulher” (AgRg no REsp 1.738.183/AM, Sexta Turma, j. 27/11/2018).

Como já exposto, sabe-se que no caso das vias de fato a contravenção penal será absorvida pelo crime de Perseguição. Mas, isso não afasta, como se entende neste trabalho, a alteração da ação penal para incondicionada, já que se tratará de violência doméstica e familiar contra a mulher em situação de complexidade infracional, não se podendo olvidar que as vias de fato serão “elemento ou circunstância do tipo penal” do artigo 147 – A, CP (inteligência do artigo 101, CP).

9 – COMPETÊNCIA PARA PROCESSO E JULGAMENTO E ATRIBUIÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA

A competência para o processo e julgamento do crime de “Perseguição” será, em regra, da Justiça Comum Estadual. A atribuição de Polícia Judiciária, portanto, será também em regra da Polícia Civil.

Como bem observam Costa, Fontes e Hoffmann, a competência poderá ser da Justiça Federal e a atribuição de investigação da Polícia Federal, acaso o crime seja perpetrado pela internet com característica de transnacionalidade, nos termos do artigo 109, V e 144, § 1º., I, CF. Também poderá ocorrer essa competência e atribuição federal se a vítima for agente público federal no exercício ou em caso relacionado à função, nos termos do artigo 109, IV e 144, § 1º., I, CF. Também mencionam os autores referidos o caso de atribuição da Polícia Federal (sem que a competência seja da Justiça Federal), quando o fato ocasionar “repercussão interestadual ou internacional e exigir repressão uniforme”, bem como se praticado contra mulher em caso de misoginia via internet (inteligência dos artigos 1º., III e VII da Lei 10.446/02 e artigo 144, § 1º., I, CF).

10 – CAUSAS ESPECIAIS DE AUMENTO DE PENA

No artigo 147 – A, § 1º., são previstas causas especiais de aumento de pena da ordem de metade para o crime de “Perseguição”. São elas:
I-Crime cometido “contra criança, adolescente ou idoso”. A exasperação da reprimenda se justifica diante da hipossuficiência em geral de tais pessoas, bem como do tratamento constitucional e ordinário que lhes confere especial proteção. Crianças serão os menores de 12 anos e adolescentes aqueles com doze anos completos, mas menores de 18 anos, nos termos do artigo 2º., da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Por seu turno, os idosos serão aquelas pessoas com 60 anos completos ou mais, de acordo com o artigo 1º., da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso). Tendo em vista que ambas as causas de aumento têm razões etárias, sua comprovação nos autos deve dar-se pela juntada de documento comprobatório da idade da vítima (v.g. Certidão de Nascimento). Observe-se que não há necessidade de que o crime enfocado se dê em situação de violência doméstica e familiar para que esta causa de aumento de pena seja aplicada. Considera-se a situação de maior vulnerabilidade das pessoas ali elencadas em qualquer circunstância. É lamentável, conforme bem destaca Gilaberte, que o legislador tenha se olvidado dos deficientes, não sendo possível utilizar analogia para a aplicação do aumento.
II-Crime cometido “contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º. – A do art. 121 deste Código”. O aumento é aplicável sendo a vítima “mulher” e havendo a situação de violência doméstica e familiar ou misoginia em identidade ao tratamento dado à configuração da qualificadora do “Feminicídio”.
Não resta dúvida de que em sendo a vítima “mulher”, a exasperação deverá ocorrer independentemente da espécie de relação (heterossexual ou homoafetiva feminina). Lembra com percuciência Gilaberte que o conceito de gênero é acatado, com centralidade, pela Lei 11.340/06 para caracterização da violência doméstica e familiar contra a mulher. Acrescente-se que a Lei Maria da Penha é explícita em estabelecer que a proteção especial à mulher independe de “orientação sexual” (artigo 2º., da Lei 11.340/06), conceituando a violência doméstica e familiar contra a mulher como ações ou omissões lesivas “baseadas no gênero”, enquanto cultura de dominação e discriminação da mulher (artigo 5º., “caput”, da Lei 11.340/06). Finalmente, é de se salientar que o artigo 5º., em seu Parágrafo Único, deixa claro o fato de que “as relações pessoais” tipificáveis como violência doméstica e familiar contra a mulher “independem de orientação sexual”. Portanto, não resta dúvida de que a mulher em relação homoafetiva que sofra “Perseguição” de parceira será especialmente protegida pela causa de aumento em estudo e isso não configura analogia “in mallam partem” contra a infratora, mas simplesmente uma interpretação sistemática que dá o devido alcance à norma.

Não obstante resta uma dúvida: estariam abrangidos nessa causa de aumento de pena os casos em que a vítima for um transexual do sexo masculino ou mesmo um travesti?
Nesses casos, não se trata propriamente de uma “mulher” ou de envolvimento de uma “condição do sexo feminino”, conforme a dicção legal e também não há menção na lei, como poderia ocorrer, de especial proteção aos transexuais e travestis.

Acontece que tendo em vista decisões do STF a respeito do tratamento a ser dado a transexuais e travestis, reconhecendo-os como “mulheres” por meio da simples impressão subjetiva externada, sem necessidade de sequer alteração do registro civil e/ou realização de cirurgia de redesignação sexual, é de se esperar que a maioria da doutrina e, com ainda mais certeza, a jurisprudência, equipare os transexuais e travestis para fins de configuração da causa de aumento em estudo, afastando a argumentação de analogia “in mallam partem” com relação ao condenado(a).
Essa posição que radicaliza a influência do gênero já era reconhecida em março de 2018 no julgamento pelo STF da ADI 4275, sendo fato que em data de 15.08.2018 (RE 670.422) foi firmada a seguinte tese por aquele Tribunal:

“O transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo, para tanto, nada além da manifestação de vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente pela via administrativa”.

Em que pese ser este o provável norte interpretativo predominante na doutrina e na jurisprudência, tendo em vista o “status quo” da mentalidade reinante, inclusive no mundo jurídico, moldada sob o influxo da chamada “Ideologia de Gênero”, discorda-se de tal orientação e considera-se que a causa de aumento de pena somente poderia ser aplicada sendo a vítima realmente uma “mulher” (sexo feminino) ou, no máximo, uma pessoa que teve seu registro civil alterado e agora, para todos os fins legais, é uma “mulher”, certamente havendo se submetido a procedimento de mudança de sexo. O mais configura malsã analogia “in mallam partem” escancarada.

É preciso não se deixar enredar por uma cômoda atitude que Anders denominaria de “congruísta”, ou seja, pensar e agir (por covardia, preguiça mental ou conveniência) da forma que lhe é imposta ou destinada pelo entorno sócio – cultural, deixar-se fazer o que quiser de si e sentir somente o que se espera que se sinta. Enfim, entregar-se ao que o autor chama de um “monólogo coletivo”, caracterizado por uma sociedade “conformista” em altíssimo grau, a ponto de o conformismo não ser mais notado como tal, mas como se fora um elevado senso de responsabilidade. Isso nos faz sermos “duplamente não livres”, eis que “somos privados até da liberdade de perceber nossa falta de liberdade”.

A “Ideologia de Gênero”, chamada de “Teoria” com pretensões “científicas” na área das “Ciências Humanas”, chega a ser histriônica, valendo lembrar a assertiva de Sertillanges:

“A ciência só é o que deve ser nas naturezas fortes. Em raras mãos ela é um cetro; nas outras não passa de um cetro de bobo”.

Dip com razão manifesta sua estranheza quanto ao fato de que, de acordo com a “Ideologia de Gênero” a “identidade biológica, que é física, seja, segundo alguns, um construto social, mas a ‘identidade psicológica’, não, e que se possa preferir esta àquela, não somente num plano individual, senão que imposto a toda a sociedade”.
Ocorre que, como acontece com toda ideologia, “a ideologia de gênero fundamenta-se não na realidade, mas numa concepção de mundo. Ela parte do ‘dever ser’ tal qual entendido por alguns, e não do mundo como ele é”.

Exatamente por seu caráter ideológico essa linha de pensamento torna-se praticamente irrefutável (o que a afasta novamente de qualquer caráter científico). Afinal é sabido que a ideologia é invencível, não se permitindo atingir nem mesmo pela notoriedade do erro e tornando-se, dessa forma, “dogmática e fideísta”. Nesse passo é até mesmo difícil encontrar argumentos capazes de convencer seus adeptos de seu equívoco. Quanto mais absurda uma “teoria”, “impressão” ou “ideia”, mais difícil é demonstrar o erro para seus aderentes. Não sem razão aduzem Oliveira e Serpentino ser “das atividades intelectuais mais difíceis, convencer alguém de que existem diferenças entre quadrados, círculos e triângulos”. Isso porque “se um simples olhar intelectualmente honesto não convence o indivíduo de que quadrados, círculos e triângulos são diferentes, há poucos argumentos (se é que haverá algum) capazes de convencê-lo”. O trabalho deletério da “desonestidade” ou da “deformação intelectuais” é de tal forma profundo “que argumentos (que pressupõem sempre a abertura do interlocutor ao convencimento) dificilmente o demoverão de sua posição”.

Pode-se dizer que como na frase atribuída a Nelson Rodrigues, trata-se de um caso em que “o fracasso subiu à cabeça”. Acata-se como máxima insuperável de intelectualidade a adoção de uma espécie de nominalismo mágico que se mostra capaz, supostamente, de identificar o dever ser, ou pior, o querer ser com o próprio ser. O signo se confunde com o referente. O signo não é mais apenas um símbolo, uma forma de expressão linguística. Magicamente, ele se materializa na realidade da vida. Usam-se os signos “mulher” e “homem” sem mais necessidade de referentes concretos da vida real e nessa confusão de signo e referente também se perde o alcance do significado das palavras e sua correspondência ou não com as coisas ou as pessoas. Não é possível perder a capacidade de discernir entre o signo e a coisa em si sem perder a coerência. Necessário lembrar o dito atribuído a Aristóteles: “A palavra cão não morde”. É claro que as palavras muitas vezes são dotadas de polissemia, mas isso ocorre em situações ou contextos nos quais é possível facilmente distinguir o sentido empregado. Trata-se exatamente do oposto de buscar uma identidade no que é diverso ou unicidade no que é plural. A função polissêmica das palavras serve exatamente para marcar seus diversos significados em circunstâncias ou contextos diferentes, não para homogeneizar aquilo que é distinto.

Essa diluição dos seres em uma espécie de massa indeterminada, desconsiderando seus componentes sexuais, biológicos, genéticos etc., não se adequa à vida concreta, gerando uma série de problemas (v.g. encarceramento em mesma cela de homens e mulheres com base no gênero; homens disputando lutas e levantamento de peso em prejuízo esportivo para mulheres, entre outras situações aberrantes). Em suma, a “Ideologia de Gênero” nunca satisfez e nem satisfará a prova proposta pelo filósofo Brunschvicg, qual seja, a de suportar o seu “próprio ideal”.

Aplicar um “Princípio de Identidade” quando isso não corresponde à realidade é uma forma de criar deliberadamente um paralogismo, usando os esquemas lógicos para abrigar a insanidade e tentar justificá-la formalmente, olvidando ou ocultando o vazio material ou substantivo que ali se encontra. Essa espécie de racionalização sem sustento na “presença” real dos seres certamente seria capaz de fazer com que um filósofo do “Realismo do Bom Senso ou do Senso Comum”, como Thomas Reid, se sentisse diante de uma barbaridade. Isso porque o primeiro alvo atingido de morte por essas “teorias” (sic) é exatamente o mais mínimo bom senso. E como nos lembra Dostoiévski, “é preciso ser um grande imbecil para saber resistir ao bom senso”. Para Reid a filosofia “não tem outra raiz senão os princípios do bom senso; cresce desses princípios e tira sua nutrição deles”. O bom senso é para o mencionado autor “a experiência pré – teórica” fornecedora do material inicial para as teorias filosóficas, científicas, morais etc. Então, “o papel da filosofia é explicar por que é possível saber as coisas que já sabemos por experiência”. O conhecimento experiencial, por presença, serve para testar o erro de supostas teorias. Se um filósofo ou cientista elabora um sistema abstrato que é contraditório com “verdades evidentes por si mesmas”, pode-se ter certeza de que há algo de errado. Enfim, “adotar uma filosofia que nega as verdades conhecidas pela experiência é arrematada loucura”. Como afirma Chesterton, com a sabedoria que lhe é peculiar, não é uma boa ideia tentar libertar um triângulo da suposta “prisão” de ter três lados. Isso pode ter efeitos nefastos.

Não é que as pessoas sejam em sua maioria imbecis, incapazes, desdotadas de intelecto e do mais mínimo bom senso. Acontece que sofrem um influxo muito pungente e sutilmente constrangedor, o qual acaba moldando suas mentalidades, ainda que em prejuízo das noções mais notórias. Dessa forma, “há quem julgue estar voando, quando, na verdade, apenas serrou o galho sobre o qual estava sentado”.

A situação é similar àquela descrita pelo personagem Laurent Pasquier do romance de Duhamel:

Ingeri, desde o começo, certas beberagens que me envenenaram para o resto dos meus dias. É preciso que me debata agora com uma razão pesada que me não satisfaz, mas que me deu hábitos tirânicos, dos quais pressinto que nunca me verei livre.

A falta de uma reação a demonstrar a absurdidade de certos malabarismos jurídicos levados a termo por um ativismo judicial injustificável permite até mesmo que legislações com conteúdo semântico bem determinado e induvidoso, sejam manipuladas diante de um público leigo e mesmo profissional inerte ou condescendente. E isso é derivado das circunstâncias “congruístas” do “monólogo coletivo” que a tantos atinge e domina, em prejuízo do exercício individual do simples bom senso. Está então exposta a fragilidade dos princípios e da autoridade da lei diante de condicionamentos os mais diversos, movidos por ideologias de toda sorte, ao ponto em que pensar em segurança jurídica já é algo quase inviável.

Como ensina Torres:

Os princípios de legitimidade são, diz Ferrero, fios de seda que seguram dragões. São inteiramente inúteis se a vontade livre dos homens se recusa a obedecê-los – surgem inesperadamente como fortíssimos nas horas solenes em que queremos justificar o direito de obediência que normalmente existe por força do hábito e de necessidade e pela ausência de meios da maioria para desobedecer.

Quando, com sustento em um suposto “Princípio de Legitimidade”, a própria legitimidade se sobrepõe à autoridade da lei ao ponto de perverter ou contradizer sua expressão semântica de forma grotesca, percebe-se, conforme ilustra Torres, citando Guglielmo Ferrero numa belíssima figura de linguagem, que a legitimidade como limite ao arbítrio equivale a “fios de seda que seguram dragões”. Nesse passo, ideologias, por mais estapafúrdias ou absurdas que sejam, podem desconstruir todos os alicerces do edifício jurídico baseado na legalidade, no rigor hermenêutico, na segurança jurídica possível e até mesmo na correspondência mínima entre a abstração legal e o mundo concreto.

Ciente de que a crítica ora exposta seja ainda menos que um “fio de seda”, é assim mesmo gratificante não se render à massificação de ideologias, propondo uma contenção da consideração das questões de gênero, cujo limite não permita a infração cega às ciências naturais e nem às ciências normativas, tal qual ocorre com o Direito no que tange à questão da analogia “in mallam partem” e da interpretação violadora da carga semântica da lei.

É preciso reconhecer e denunciar que a radicalização das questões de gênero é uma hipótese ideológica de caráter dogmático – religioso, informada por traços fideístas e fanáticos que se mostram irracionais e anticientíficos, pois perpetram, de um só roldão, um radical negacionismo injustificável de várias áreas do conhecimento, tais como a ontologia, a antropologia, a história, a biologia, a genética, a medicina, a fisiologia e até mesmo a anatomia. Tudo isso submetendo o objetivo ao meramente subjetivo e voluntarista e pretendendo que o primeiro e não o segundo seja produto de uma suposta “construção social”.

III-Crime cometido “mediante concurso de duas ou mais pessoas ou com o emprego de arma”. Tanto o concurso de agentes como o emprego de arma são circunstâncias que aumentam consideravelmente o potencial lesivo e intimidativo da conduta criminal, razão pela qual são também eleitos como causas especiais de incremento da pena.
Haverá concurso de agentes ainda que o coautor seja inimputável (menor de 18 anos ou alienado mental). É claro que o menor será processado e julgado por “ato infracional” no respectivo “Juízo da Infância e Juventude”. Quanto ao inimputável mental, poderá ser processado e julgado no juízo comum, mas receber absolvição imprópria, com aplicação de medida de segurança. Não obstante, esses fatores diferenciadores do procedimento não afastam o fato de que há concurso de “pessoas”, já que tanto o menor como o alienado não perdem sua personalidade devido à questão etária ou à doença mental. Também há de reconhecer o concurso quando apenas um dos envolvidos for responsável pelos atos de assédio ou perseguição, enquanto que o outro é o mandante ou autor intelectual do ilícito. Note-se que o inciso III em estudo menciona como causa de aumento o “concurso de pessoas”, de modo a abranger suas duas espécies (coautoria e participação). Entretanto, há que mencionar o fato de que se um maior atuar em concurso de agentes com um menor, além de responder pelo crime majorado pelo concurso de pessoas, deverá ser responsabilizado pelo delito de “Corrupção de Menores” previsto no artigo 244 – B do ECA (Lei 8.069/90), em concurso formal. Não há falar em “bis in idem”, pois que os ilícitos perpetrados tutelam bens jurídicos diversos. O artigo 147 – A, CP tutela da liberdade individual e tem por vítima a pessoa objeto da perseguição. Já o artigo 244 – B, do ECA se refere à conduta de praticar infração penal com um menor, provocando sua corrupção moral, sendo, portanto, o bem jurídico visado a formação moral da criança ou do adolescente. Ademais, a vítima do artigo 244 – B, do ECA também é diversa, pois que é o próprio menor (criança ou adolescente) envolvido em atividade criminal.

No que tange ao emprego de arma, o termo deve ser interpretado em um sentido amplo, abrangendo tanto armas próprias (pistolas, revólveres, facas militares etc.) como impróprias (faca de cozinha, machado, foice, enxada, tesoura etc.). Também podem ser armas de fogo ou armas brancas, já que não há limitação na dicção legal. No entanto, é necessário que a arma seja efetivamente utilizada na ação, ao menos através de seu porte ostensivo, intimidando a vítima. No que tange à arma de brinquedo, com o cancelamento do Súmula 174, STJ, entende-se que não serve para qualificar o crime.

11 – REVOGAÇÃO DA CONTRAVENÇÃO PENAL DE PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE

Em seu artigo 3º., a Lei 14.132/21, responsável pela criação do crime de “Perseguição”, revogou expressamente o artigo 65 da Lei de Contravenções Penais (Perturbação da Tranquilidade).

Pertinente a crítica a essa revogação formulada por Costa, Fontes e Hoffmann, pois que poderia continuar em vigor como infração penal subsidiária em casos de perturbações que não se tipificassem perfeitamente no artigo 147 – A, CP. Ademais, é fato que na falta de habitualidade não de poderá cogitar de aplicação do crime de “Perseguição”, de forma que seria útil a continuidade da vigência do artigo 65, LCP para esses casos.

Também lamenta a revogação contravencional Leitão Júnior:

Nossa argumentação é de que o legislador ordinário poderia ter optado pela manutenção do aludido dispositivo, já que agora poderá deixar a porta aberta para a impunidade em condutas de poluição sonora e similares que não se enquadrem no art. 54 da Lei do Meio Ambiente e nem no art. 42 da LCP – em que o operador subsidiariamente tinha o art. 65, da LCP. Logo, teria um possível vácuo criado.

Conforme já consignado, se está de acordo com a crítica formulada pelos autores acima mencionados. Entretanto, quando Leitão Júnior afirma que no caso de barulho, gritaria, algazarra etc., poderia não haver possibilidade de aplicação do artigo 42, LCP, não se enxerga essa lacuna. Afinal o dispositivo, denominado “Perturbação do Trabalho ou Sossego Alheios” descreve em seus incisos exatamente tais condutas. O problema, a nosso ver, se reduz à questão da perturbação pontual, sem habitualidade por acinte ou motivo reprovável, nos termos do revogado artigo 65, LCP. Aí sim, haverá uma lacuna legal no caso de perturbações sem habitualidade ou reiteração.

Interessante observar a questão da lei penal no tempo com relação à revogação do artigo 65, LCP e o advento do crime de “Perseguição” (artigo 147 – A, CP).
Considerando que a dicção do antigo artigo 65, LCP era bem mais aberta que a do atual artigo 147, CP, se houver pessoas que estejam respondendo pela contravenção penal em casos que hoje configurariam “Perseguição”, não será possível aplicar o artigo 147 –A, CP retroativamente (“novatio legis in pejus”), de modo que haverá a ultratividade da lei penal mais benéfica, no caso a contravenção. Doutra banda, nos casos em que a contravenção foi perpetrada sem os requisitos específicos do artigo 147 – A, CP (em especial a habitualidade ou reiteração), opera-se “abolitio criminis”. Doravante, em casos ocorridos após o vigor da Lei 14.132/21, somente serão incriminados os casos tipificáveis no artigo 147 – A, CP, pois que operou-se, sem dúvida, “abolitio criminis” com relação à contravenção outrora prevista no artigo 65, LCP.

12 – CONCURSO DE CRIMES, DISTINÇÃO DELINQUENCIAL E CASOS DE CONSUNÇÃO

12.1 – ABUSO DE AUTORIDADE

Acaso a perseguição consista em conduta praticada por agente público dotado de autoridade no exercício ou em razão da função, fica afastado o crime do artigo 147 –A, CP e se aplicam as normas da Lei 13.869/19. Somente haverá aplicabilidade do artigo 147 – A, CP ao agente público quanto atuando fora da função ou mesmo na função ou em razão dela, não havendo previsão da conduta específica na Lei de Abuso de Autoridade, operando o crime de “Perseguição” por subsidiariedade.

12.2- FALSA IDENTIDADE

No caso de uso de perfis falsos em redes sociais ou falsa identificação em geral, entendem Costa, Fontes e Hoffmann que haverá concurso de crimes do artigo 307, CP com o artigo 147 – A, CP. A nosso ver esse entendimento é acertado e o concurso seria formal impróprio, tendo em vista a dualidade de desígnios, de modo que haveria o cúmulo material das penas. Efetivamente, como afirmam os autores, a falsa identidade não é meio necessário para a prática do “Stalking”. Além disso, acrescente-se que os bens jurídicos tutelados são diversos (liberdade individual e fé pública).
Não obstante, poderá surgir entendimento quanto a ser a prática de falsa identidade crime – meio para a “Perseguição”, de modo que deveria ser absorvida pela última.

Entende-se, como já dito, mais correta a posição que advoga o concurso de crimes. No entanto, é de se consignar que seria interessante que o legislador houvesse previsto uma causa de aumento de pena para o uso de falsa identidade, nome suposto ou anonimato, o que então solucionaria essa eventual controvérsia e prestaria homenagem à proibição de anonimato constitucionalmente prevista (artigo 5º., IV, CF). Porém, a própria falta de previsão do legislador está a indicar e confirmar que o concurso delinquencial é a solução mais acertada, de forma a não deixar bem jurídico constitucionalmente previsto sem a devida tutela penal.

12.3 – CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO

Não são raros os casos em que cerimônias religiosas ou funerárias podem ser perturbadas por atos de “Stalking”. Nesses casos, entende-se que os crimes previstos, por exemplo, nos artigos 208 e 209, CP devam ser imputados em concurso formal impróprio com cúmulo material de penas em relação ao crime de “Perseguição” (artigo 147 – A, CP). Torna-se muito difícil defender a tese de consunção como crime – meio, tendo em vista a extrema especificidade do bem jurídico em jogo no que diz com os crimes contra o sentimento religioso. Inclusive normalmente haverá vítimas diversas da pessoa visada pelo perseguidor, mas que participam do culto, cerimônia ou funeral (trata-se do chamado “dolo direto de segundo grau, mediado ou de consequências necessárias”).

12.4 – INVASÃO DE DISPOSITIVO INFORMÁTICO

Em casos de “Cyberbullyng” ou “Cyberstalking” poderá ocorrer que o infrator, além de perturbar a vítima, venha a invadir seus dispositivos informáticos de acordo com o artigo 154 – A, CP. Novamente a solução mais correta parece ser o concurso, que poderá ser formal impróprio ou material, tendo em vista não se tratar de meio necessário para o crime de “Perseguição”. Também serão violados bens jurídicos diversos: liberdade individual, intimidade, vida privada e segurança dos sistemas informáticos. Anote-se, porém, que para quem não aponte a “segurança dos sistemas informáticos” como bem jurídico tutelado afora a liberdade individual, intimidade e vida privada, tornar-se-á mais difícil sustentar a tese do concurso, prevalecendo, nesse caso, a absorção do artigo 154 – A como crime – meio. Não obstante, razão parece assistir ao entendimento que advoga o concurso.

12.5 – DIVULGAÇÃO DE CENA DE ESTUPRO OU DE CENA DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, DE CENA DE SEXO OU DE PORNOGRAFIA

Outra situação nada incomum será aquela em que o autor da “Perseguição” atuar na forma do que se convencionou chamar de “Revenge Porn” ou “Pornografia de Vingança”. Haverá nesse caso infração a delitos de natureza sexual previstos nos artigos 216 – B, CP ou 218 – C, CP, sendo o caso induvidoso de concurso material de delitos.

12.6 – PERTURBAÇÃO DO TRABALHO OU DO SOSSEGO ALHEIOS

Acaso em conduta reiterada de “Perseguição” nos termos do artigo 147 –A, CP, o indivíduo praticar perturbação do trabalho ou sossego alheios, de acordo com o disposto no artigo 42, LCP, em se tratando de contravenção penal, entende-se que deve haver consunção do crime – anão pelo crime de “Perseguição”. Doutra banda, havendo perturbação do trabalho ou sossego sem que seja de forma reiterada, afastada, portanto, a habitualidade, haverá a possibilidade de imputar subsidiariamente ao infrator a contravenção em destaque.

12.7 – ARMAS DE FOGO IRREGULARES

Já se sabe que o emprego de arma em geral, incluindo as de fogo, conduz a incremento de pena do crime de “Perseguição”, nos termos do artigo 147 – A, § 1º., III, “in fine”, CP.
Pode acontecer que além de ser empregada arma de fogo, seja esta irregular, de forma que haja incidência nos artigos 12, 14 ou 16 do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03). Também pode haver o disparo da referida arma (artigo 15 da Lei 10.826/03).

A incidência dos artigos 12 e 14 será com relação ao emprego de armas de fogo de uso permitido. Do artigo 16, com relação a emprego de armas de fogo de uso restrito ou proibido.
No caso do indivíduo exibir, por exemplo, uma arma irregular de dentro de sua casa para a vítima por via telemática, sem portá-la na via pública, sendo localizada e apreendida a arma, ensejará concurso material de crimes entre o artigo 147 – A, CP e os artigos 12 ou 16 da Lei 10.826/03, conforme se trate de arma de uso permitido ou restrito ou proibido. Já se o infrator chegar a portar a arma na via pública, por exemplo, seguindo a vítima, será também o caso de concurso de crimes entre o artigo 147 –A, CP e os artigos 14 ou 16 do Estatuto do Desarmamento, conforme seja a arma de uso permitido ou restrito ou proibido.

Pode parecer que haveria “bis in idem” devido ao fato de que o emprego de arma já é uma majorante. Acontece que, em primeiro lugar, a arma não precisa necessariamente ser de fogo e, além disso, não precisa a posse ou o porte ser ilícito. A causa de aumento se aplica isoladamente, sem o concurso com infrações do Estatuto do Desarmamento no caso de emprego de armas de fogo legais.

No caso de eventual disparo irregular de arma de fogo, mesmo sendo a arma legalizada, restará o concurso de crimes (formal impróprio com cúmulo das penas dos artigos 147 – A, CP e 15 da Lei 10.826/03). Acaso a arma ainda seja ilícita nada se altera a respeito a respeito do concurso com o crime de “Perseguição”. Contudo, há que verificar como ficaria a questão entre a posse ou porte irregular, necessários ao disparo e o crime de disparo de arma de fogo. Pois bem, em sendo a arma de uso permitido, o disparo (artigo 15) absorve tanto a posse (artigo 12) como o porte (artigo 14), eis que estes serão crimes – meio. Mas, se a arma for de uso restrito ou proibido ocorrerá o contrário, o artigo 16 absorverá o artigo 15, tendo em vista que tem pena maior. Assim sendo, no caso de disparo de armas de fogo ilegais, poderá haver concurso formal impróprio entre o artigo 147 – A, CP e o artigo 15 do Estatuto do Desarmamento (no caso de armas de uso permitido), ou o artigo 16 do Estatuto no caso de armas de uso restrito ou proibido. Em todos os casos o aumento de pena do emprego de arma do crime de “Perseguição” seria normalmente aplicável. Não há “bis in idem”, tendo em vista que o aumento se dá pelo “emprego” da arma de fogo nos atos de perseguição, que não é meio necessário e os crimes do Estatuto se referem à posse, ao porte e/ou ao disparo ilícitos da arma de fogo.

Agora, se a posse ou porte ocorrem em contextos fáticos distintos, poderá haver o concurso material. Por exemplo, um sujeito porta uma arma de uso permitido, seguindo a vítima de “Stalking” por horas. Em dado momento, saca e efetua o disparo. Haverá os três crimes (artigo 147-A, CP e artigos 14 e 15 da Lei 10.826/03). O mesmo raciocínio valerá para o caso de contextos distintos e o disparo e a posse ou porte de arma de uso restrito ou proibido. Permanece incólume a observação a respeito da aplicabilidade, sem dupla apenação pelo mesmo fato, da majorante do crime de “Perseguição”, devido ao “emprego” da arma.

Não há falar em consunção dos crimes do Estatuto do Desarmamento pelo crime de “Perseguição”, tendo em vista a tutela de bens jurídicos diversos pelos tipos penais em concurso.

12.8 – DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA

A Lei 11.340/06 prevê, em seu artigo 24 – A, o crime de descumprimento de medida protetiva de urgência pelo praticante de violência doméstica e familiar contra a mulher. Nesses casos, havendo a medida protetiva e seguindo o infrator na prática da “Perseguição”, a melhor solução será o concurso formal impróprio de infrações (cúmulo material). Certamente o concurso se dará com o delito de “Perseguição” com aumento de pena devido à circunstância de violência contra a mulher, nos termos do artigo 147 – A, § 1º., II, CP. Não há também aqui “bis in idem”, tendo em vista a tutela de bens jurídicos diversos (liberdade individual da vítima e administração da justiça).

Lembram ainda Costa, Fontes e Hoffmann que pode haver descumprimento de medidas de proteção ao idoso (artigo 45 da Lei 10.741/03) ou criança ou adolescente (artigo 101 da Lei 8.069/90), caso em que não haverá possibilidade de aplicação do artigo 24 – A da Lei Maria da Penha, que é exclusivo para a violência contra a mulher. Também não caberá o crime de desobediência (artigo 330, CP), tendo em vista que já existe sanção processual para inibir o descumprimento, qual seja o decreto de Prisão Preventiva, nos termos do artigo 313, III, CPP.

Acrescente-se que também no caso de descumprimento de cautelares protetivas ora previstas no artigo 319, II e III, CPP, mesmo não se tratando de menores ou idosos, também caberá o decreto de preventiva, de acordo com o artigo 312, Parágrafo Único c/c 282, § 4º., CPP, de modo que também não será possível a cumulação do crime de “Perseguição” com o crime de “Desobediência”.

12.9 – CRIME DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO

Como já visto anteriormente, na “Perseguição” (artigo 147 –A, “caput”, CP) há mera “restrição” da liberdade de locomoção, enquanto que no crime de “Sequestro e Cárcere Privado” (artigo 148, CP) há “privação”. O segundo verbo pressupõe um ataque mais intenso ao bem jurídico.

Feita a distinção entre os delitos, há que considerar o caso em que haja a prática de perseguição por outros atos e em dado momento o “stalker” pratique o sequestro da vítima, passando, numa espécie de progressão criminosa, da “restrição” para a “privação” da liberdade de ir e vir. Nessas situações não parece haver outra solução senão o concurso material de infrações.

12.10 – CRIMES PATRIMONIAIS

Não é incomum que em casos de “Stalking” o infrator perpetre crimes patrimoniais contra o perseguido(a). A prática de crimes de dano (v.g. arremesso de pedras quebrando vidraças da casa da vítima, furar o pneu do carro, riscar a pintura etc.) é usual. Outro caso que inclusive já tive oportunidade de registrar trata-se de perseguição por motivos de atração sexual e subtração (furto) de roupas íntimas da vítima (calcinhas). Nesse caso concreto o indivíduo seguia a vítima constantemente sem nada dizer, mas a importunando indiretamente e depois invadiu seu quintal diversas vezes, subtraindo calcinhas de seu varal. Interrogado, informou que cheirava as peças íntimas em estado de excitação sexual e depois as vestia, raspava os pelos das pernas e nádegas, se olhava num espelho de costas com outro espelho à frente e se masturbava! Na época respondeu apenas pelos furtos continuados e pela contravenção penal de “Perturbação da Tranquilidade” (artigo 65, LCP), então vigente e hoje revogada. Não havia ainda sido criado o crime de “Perseguição” (artigo 147 – A, CP) pela Lei 14.132/21.

Parece que os crimes patrimoniais devem ser imputados em concurso material ao infrator, tendo em vista a tutela de bens jurídicos diversos (liberdade individual e patrimônio).

12.11 – VIOLAÇÃO DE CORRESPONDÊNCIA, INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, E VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO

Embora o crime de “Perseguição” já proteja os bens jurídicos da intimidade e da vida privada, não parece que violações como as de correspondência epistolar, telefônica e de domicílio possam ser absorvidas. Um aspecto é a perturbação causada pelo “stalker”, objeto por excelência do crime de “Perseguição”, outra são as violações especialmente incriminadas que não podem restar impunes, devendo haver concurso formal ou material conforme o caso concreto. Porém, pode haver pensamento que pugne pela consunção do crime maior pelo crime menor nesses casos, somente admitindo o concurso material em havendo atos de perseguição autônomos às violações, embora não pareça ser o mais certo.

12.12 – PICHAÇÃO

Uma das formas de importunar uma pessoa pode ser a realização de pichações em sua propriedade, com impropérios, ameaças ou mesmo símbolos ou manifestações de suposto afeto.
Não se vislumbra motivo para que não haja o concurso formal impróprio de infrações entre o artigo 147 – A, CP e o artigo 65 da Lei 9.605/98, mesmo porque há novamente diversidade de bens jurídicos (liberdade individual e meio ambiente).

12.13 – CRIMES DE PERIGO COMUM E INDIVIDUAL

Não será impossível que em meio a uma conduta de “Perseguição” o infrator acabe praticando crimes como incêndio ou explosão. Novamente a solução somente pode ser o concurso formal impróprio, pois há bens jurídicos diversos em jogo, inobstante sejam os crimes de perigo comum subsidiários (liberdade individual e incolumidade pública). O mesmo se pode afirmar com relação a crimes de perigo individual como, por exemplo, perigo para a vida ou a saúde de outrem, perigo de contágio venéreo, perigo de contágio de moléstia grave etc. Tendo em vista a alteridade de bens jurídicos, não parece que a subsidiariedade dos crimes de perigo seja suficiente para elidir sua aplicação. Malgrado isso, admite-se que pode surgir entendimento quanto ao afastamento dos crimes de perigo exatamente devido à sua característica subsidiária.

13 – CONCLUSÃO

Foram abordados os principais temas referentes ao crime de “Perseguição”, criado pela Lei 14.132/21, mediante a inclusão do artigo 147 – A no Código Penal.
Havia realmente uma lacuna quanto a condutas de perseguição reiterada, a qual já era indicada pela doutrina e foi colmatada pelo legislador de forma razoável, embora com alguns traços de insuficiência protetiva.


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Delegado de Polícia, Mestre em Direito Social, Pós Graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós – graduação do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

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