sexta-feira,19 abril 2024
ColunaFamília e SucessõesPensão Alimentícia: Necessidade x Possibilidade x Proporcionalidade

Pensão Alimentícia: Necessidade x Possibilidade x Proporcionalidade

Para a concessão dos valores referentes à pensão alimentícia faz-se necessário levar em consideração os parâmetros: necessidade, possibilidade e proporcionalidade (razoabilidade).

Analisando esses elementos é que então será fixada o valor da pensão que pode ser fixado em um percentual sobre o salário que o alimentante percebe, ou fixados em salários mínimos, por exemplo.

1. Conceito de alimentos

Quando buscamos compreender o que vem a ser os alimentos iremos nos socorrer de dois conceitos sobre o tema.

O primeiro conceito que apresentamos é de Orlando Gomes, que afirma que os alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si[1].

Quando ele estava pensando e refletindo sobre o tema, ainda não tínhamos o princípio da dignidade da pessoa humana como sendo o centro de nosso universo jurídico, assim, ele imaginava apenas aquilo que fosse necessário para as necessidades vitais.

Contudo, com o advento da Constituição Federal de 1988, em que o nosso sistema jurídico coloca a pessoa humana no centro, assim, passamos a analisar tudo aquilo que é necessário para compreender e atender à pessoa humana.

Cria-se assim, uma nova visão do ser humano que passa a ser visto com uma série de dimensões. Ao perceber que não são apenas as necessidades vitais que o ser humano precisa, o conceito de alimentos então é ampliado de tal sorte que Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald apontam que se trata do conjunto de meios materiais necessários para a existência das pessoas, sob o ponto de vista físico, psíquico e intelectual.[2]

Assim, se para pensarmos o ser humano precisamos que ele tenha acesso à alimentação, saúde, lazer, moradia, educação, dentre outros, isso tudo dever estar sendo coberto pelos alimentos.

 

2. Algumas Características dos alimentos

Como essa obrigação visa à manutenção da pessoa humana e de sua fundamental dignidade, é natural que os alimentos estejam cercados de características específicas, vejamos:

Caráter personalíssimo:  Uma característica que se destaca dos alimentos é o caráter personalíssimo. Isso implica dizer que, os alimentos devem ser fixados para uma pessoa específica, pois eles são destinados a preservar tanto a integridade física quanto a psíquica de que os recebe.

Irrenunciabilidade: Por muito já se discutiu a questão da irrenunciabilidade dos alimentos, até que com o advento do Código civil de 2002, por meio do art. 1.707, temos que não é possível renunciar aos alimentos decorrentes do vínculo de parentesco. Contudo, destaca-se que é possível ocorrer a renúncia, de forma expressa, quando o vínculo for de conjugalidade.

Atualidade: Outra característica é a questão da atualidade. Isso decorre de que a obrigação alimentar é de trato sucessivo, ou seja de execução continuada, diferida no tempo. E em decorrência disso pode sofrer com os danos decorrentes dos efeitos inflacionários e com isso comprometer o seu valor. Está em conformidade com o art. 1.710 do Código Civil. Assim, o quantum permanece atual sendo desnecessário fazer a ação revisional de alimentos.

Futuridade: Os alimentos visam do presente ao futuro, ou seja, presta-se à manutenção da pessoa que necessita hoje, e não com relação ao passado. Assim, se não foi proposta a ação de alimentos no passado, não se pode cobrar o passado, afinal, bem ou mal a pessoa já sobreviveu.

Imprescritibilidade:  Pleitear os alimentos pode ocorrer a qualquer tempo, assim, no vínculo parental, a pessoa que precisa irá pleitear quando efetivamente precisar, não se podendo falar que houve prescrição para a obtenção dos alimentos, o que se precisa é preencher os requisitos previstos na norma para a obtenção dos alimentos.

Essas não são as únicas características dos alimentos, porém, não iremos analisá-las no presente artigo, deixando esse tema para ser aprofundado em um outro momento.

3. A Fixação do Quantum Alimentício

Quando conjugamos os arts. 1.694 com o 1.695 do Código Civil verificamos que os alimentos devem ser fixados na proporção da necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. Assim, surge o trinômio Necessidade x Possibilidade x Proporcionalidade.

A necessidade da pessoa que pleiteia precisa ser demonstrada. Num primeiro momento, a necessidade de uma criança ou adolescente é presumida, afinal ela não tem como se manter. Contudo, qual o padrão dessa criança/adolescente, quais as suas necessidades. Nesse momento iremos analisar efetivamente a criança que está pleiteando. Assim, fica diferente a necessidade se ela estuda numa escola pública ou numa escola particular, por exemplo.

Iremos portanto, fazer uma tabela com os gastos mensais dessa criança, buscando refletira a realidade dela, e do ambiente em que encontra-se inserida.

Da outra banda, iremos verificar qual a possibilidade dos genitores em arcar com essas necessidades. Sim, genitoreS no plural, pois são os pais responsáveis para manter essa criança, dentro do padrão deles.

Num primeiro momento iremos pensar que cada genitor deveria ser responsabilizado em arcar com 50% (cinquenta) por cento das despesas existentes. Contudo, como temos discrepância no poder aquisitivo dos genitores isso, ainda fica difícil de ocorrer.

Assim, aquele genitor que ganha mais irá contribuir mais. Isso analisando apenas nesse aspecto remuneratório, mas , conforme o caso concreto, nem sempre aquele que ganha mais terá como contribuir com mais, pois podemos ter algumas despesas de qualidade, e com isso a renda dele disponível não é aquela esperada, usando assim a razoabilidade no caso concreto.

Se o genitor tem um emprego fixo ou é servidor público conseguimos verificar o quanto ele ganha em decorrência do seu contracheque e com isso determinar um percentual, em cima desse valor. Se a pessoa vive de renda de aluguéis isso também é mais fácil de mensurar.

Por outro lado nos deparamos com profissionais liberais e empresários em que encontramos dificuldade em mensurar o poder aquisitivo, eis que, ou existe uma sonegação fiscal mesmo, não declarando o que ganha ou ainda, como ocorre com muitos empresários, em que há uma confusão patrimonial entre o que é efetivamente da pessoa física e o que pertence à pessoa jurídica. Nessas hipóteses temos a necessidade de pleitear a quebra do sigilo bancário e fiscal, tanto da pessoa física quanto da pessoa jurídica.

Ou ainda, iremos adotar a teoria da aparência, ou seja, verificar os sinais exteriores de riqueza que apesar de não ter uma renda comprovada, verifica-se pela forma que a pessoa se manifesta perante a sociedade. Quais os restaurantes que frequenta, as viagens que tem feito, etc.

4. Diferença de pensionamento entre filhos

Quando analisamos os filhos a previsão constitucional é que deve ser dado tratamento igualitário entre esses. Igualdade essa, que também precisa ser analisada sob a ótica da igualdade formal e da igualdade material. E assim ao atender os artigos 1.694 e 1.695 podemos nos deparar com o pensionamento diferenciado entre dois filhos.

Isso pode ocorrer quando irmãos bilaterais mas que apresentam necessidades distintas. Se apresentam necessidades distintas então o resultado final será diferenciado. Por exemplo, se um dos filhos apresenta uma deficiência ou um grave problema de saúde, e em decorrência disso há um gasto maior com saúde, educação ? Nesse caso, atendendo ao princípio da igualdade essa criança deverá receber um valor maior do que o seu irmão ou irmã que não apresenta tal condição.

Outra hipótese é quando a necessidade de um dos filhos é menor do que o do outro. Nesse caso podemos exemplificar quando filhos de mães diferentes, com padrão social distinto. A mãe que tem um poder aquisitivo maior irá contribuir com a manutenção da criança mais do que a mãe que tem um poder aquisitivo menor, fazendo com que os valores das pensões sejam distintos.

E foi exatamente esse o entendimento da 3a. Turma do Superior Tribunal de Justiça que admitiu que os alimentos fossem pagos com valores distintos para filhos oriundos de relacionamentos diferentes. Além de olhar o pai, os ministros analisaram a capacidade contributiva de cada mãe.

O posicionamento do E. Superior Tribunal de Justiça, por sua 3a. Turma encontra-se em consonância com os princípios da igualdade entre os filhos, princípio da solidariedade e os artigos retromencionados do Código Civil.

Na fala da Ministra Nancy Andrighi ela destaca que em regra os filhos devem receber os mesmos valores, porém se há algo que os diferencia então esses valores precisam ser diferenciados. E somente assim é que estaremos atendendo ao comando constitucional e os princípios que regem o direito das famílias.

 


[1] Orlando Gomes. Direito de família, p. 427.

[2] Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. Direito das Famílias, p. 588.

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