terça-feira,16 abril 2024
ColunaFamília e SucessõesO que é inventário negativo e sua finalidade

O que é inventário negativo e sua finalidade

Introdução

A ação de inventário tem como objeto principal a partilha de bens deixados pelo de cujus (falecido). Desta forma, em tese, para que seja feito a abertura de inventário é necessário a existência desses bens.

Assim, como é possível observar no Direito das Sucessões, o inventário é um procedimento utilizado para apurar todos os bens que foram deixados pelo de cujus, e sua consequente partilha e transferência aos herdeiros.

Desta forma, tanto o Direito Civil quanto o Direito Processual Civil fazem referência quanto à importância da abertura de inventario, que pode ocorrer na esfera judicial ou extrajudicial.

Sendo assim, a família daquele que falece sem deixar nenhum bem, com força na jurisprudência e na doutrina, possui a oportunidade de ingressar com o inventário, mais conhecido como inventário negativo.

Portanto, a doutrina e a jurisprudência expressam a possibilidade de existir inventário negativo, mesmo não estando expressamente em nossa legislação Brasileira, com o intuito de comprovar a inexistência de bens do de cujus.

 

O que é inventário negativo?

Inventário negativo é um procedimento utilizado nos casos em que o de cujus (falecido) não deixa bem algum, sendo necessário que os herdeiros obtenham uma declaração judicial ou escritura pública (vias cartorárias – extrajudicial), para que fique declaro a inexistência de bens deixados pelo mesmo.

Em outras palavras, o inventário negativo é a maneira de se comprovar a inexistência de bens em nome do falecido, quando necessário. E apesar de não estar contido em nosso ordenamento jurídico, mais precisamente no Código de Processo Civil, é uma medida aceita pela doutrina e jurisprudência.

Formalidades do inventário Negativo

O inventário negativo vem sendo utilizado como providência facultativa, tendo o objetivo de afastar de plano a controvérsia, não podendo o juiz ou o cartório competente negar seu prosseguimento, desde que comprovada a inexistência de quaisquer bens em nome do falecido (de cujus).

Neste âmbito, Hamilton de Moraes BARROS entende que:

Pode acontecer que um morto não deixe bens e que seu cônjuge ou os seus herdeiros tenham necessidade da certeza jurídica desse fato. O meio jurídico de positivar isso é recorrer o interessado ao inventário negativo. Muito embora o Código não o discipline, o inventário negativo é, às vezes, uma necessidade do cônjuge sobrevivo ou dos herdeiros. Por isso, os juízes e a praxe o admitem como o modo judicial de provar-se, para determinado fim, a inexistência de bens.

Com ele, não se pretende inventariar o nada. Cuida-se, exatamente, de utilizá-lo para fazer certo que nada existe a inventariar. Concebido para inventariar o nada seria, sem dúvida, uma onerosa inutilidade. Usado, entretanto, para firmar que nada existiu que devesse ser inventariado, para fazer certo que inexiste herança, é uma necessidade do Direito, pois que produzirá efeitos jurídicos.

 

Entretanto, é possível ainda observar entendimentos jurisprudenciais sobre o tema, conforme estes que seguem transcritos:

INVENTÁRIO NEGATIVO. INEXISTÊNCIA DE BENS. EXTINÇÃO DO PROCESSO. APELAÇÃO CÍVEL. CERTEZA JURÍDICA DE QUE “A DE CUJUS” NÃO DEIXOU BENS. CÓDIGO CIVIL, INC. XIII DO ART. 183 E § ÚNICO DO ART. 228. NECESSIDADE, LEGITIMIDADE E INTERESSE DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.CÓDIGO CIVILXIII183§ ÚNICO228O chamado “inventário negativo” não existe em lei, é uma criação da praxe forense, e tem lugar nos casos em que o “de cujus” não deixa bens, e quando a lei exige que o cônjuge supérstite, para casar-se no regime da comunhão, dê a inventário os bens do primeiro matrimônio, à vista do disposto no inciso XIII do artigo 183, e inciso I, do § único do artigo 228, do Código Civil. (1050615 PR 0105061-5, Relator: Ivan Bortoleto, Data de Julgamento: 14/08/2001, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 5955).

CIVIL. AÇÃO DE INVENTÁRIO NEGATIVO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. IRRELEVÂNCIA. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA ADMITIDO PELA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. CASSAÇÃO DA SENTENÇA E RETORNO DO PROCESSO À ORIGEM PARA REGULAR TRAMITAÇÃO.

A teor de consolidado entendimento doutrinário-jurisprudencial, admite-se o procedimento de inventário negativo quando o interessado pretender declaração judicial de inexistência de bens do falecido, de modo a salvaguardar seu patrimônio pessoal de dívidas eventualmente deixadas pelo de cujus. (Acórdão: Apelação Cível n. 2006.017664-4, da Capital/Distrital do Norte da Ilha. Relator: Des. Luiz Carlos Freyesleben. Data da decisão: 20.07.2006).

Aplicabilidade do inventário Negativo

Existem algumas situações específicas em que o procedimento de Inventário Negativo vem sendo admitido, como por exemplo:

Viúva ou a viúvo que deseja contrair novas núpcias:

Faculta ao viúvo(a) que deseja casar-se novamente, porem ainda não efetuou inventario para partilhar os bens do casal, impedindo-o(a) de sofrer sanção.

Art. 1.523, I – o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;

Entretanto, é necessário destacar, que para a efetivação do artigo acima mencionado, não se faz necessário o inventário negativo, sendo apenas uma maneira facultativa, podendo ser comprovado notoriamente a inexistência de bens, como a Súmula que segue abaixo:

Civil. Regime de bens. Segundo casamento, tendo filhos do anterior um dos cônjuges. A falta do chamado inventário negativo não acarreta por si mesma, o regime da separação de bens no segundo casamento, uma vez provado que notoriamente não havia bens a inventariar. Interpretação razoável da Lei (Súmula 400). (RE 90650, Relator(a): Min. Décio Miranda, Segunda Turma, julgado em 13/05/1980, DJ 01-07-1980 PP-04947 EMENT VOL-01177-02 PP-00727 RTJ VOL-00094-03 PP-01262).

Responsabilidade além das forças da herança (CC/02, art. 1.792)

Caso o falecido tenha deixado credores, certamente estes irão cobrar estas dívidas dos seus sucessores.

Assim discorre Maria Helena Diniz sobre esta hipótese:

O inventário negativo tem por escopo demonstrar que os interessados não receberam nenhum bem do espólio, principalmente se o de cujus deixou credores, para que aqueles não respondam por tais débitos (CC, art. 1.792).

Desta forma, o inventário negativo pode ser utilizado pelos herdeiros como forma de comprovar a inexistência ou não de bens, ou até mesmo a insuficiência para efetuar o pagamento das dívidas que o espólio deixou, pois devem os herdeiros apenas se responsabilizar pelas obrigações até o limite da herança recebida.

Substituição Processual

A regularização do polo ativo/passivo em ação judicial, após a morte da parte, gera outra possibilidade do ingresso de inventário negativo, assim preceitua o artigo 110 Código de Processo civil:

Art. 110. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no Art. 313, §§ 1º e 2º.

Desta forma, com o termo de inventariante efetuado, terá o inventariante capacidade de representar o falecido, ocorrendo a substituição processual pelo espólio ou sucessores do falecido.

Vale constar, porém, que no art. 1.060, CPC, é possível ocorrer a habilitação dos herdeiros nos autos, independentemente de sentença, bem como, sem a necessidade de abertura de inventário.

Valores não recebidos em vida pelo falecido

Nas hipóteses em que o falecido não recebeu determinados valores enquanto estava vivo, discorre a Lei 6.858/80, a respeito do pagamento aos dependentes ou sucessores do titular.

Destaca-se, portanto, que a própria legislação dispensa ação de inventário ou arrolamento de bens, facultando assim o ingresso de inventário negativo.

Por fim, ainda que, para alguma outra razão, alguém necessite provar que o falecido não deixou bens patrimoniais a inventariar, o inventário negativo pode ser utilizado para outros fins, que não os já mencionados acima.

Um exemplo é a outorga de escritura a compromissários compradores de imóveis vendidos pelo autor da herança, enquanto vivo, é uma destas outras possibilidades, bem como, o ingresso de inventário negativo para efetuar a baixa fiscal ou encerramento legal de pessoa jurídica de que o falecido era sócio.

Diferenças entre Inventário x Inventário negativo

Existem muitas diferenças e semelhanças entre as duas espécies de inventário. Porém, por não ter a existência de bens, o inventário negativo tem um procedimento mais simples e ágil.

Após fazer o pedido de inventário negativo e nomeado inventariante, o mesmo deverá indicar a pessoa que ficará responsável pelo patrimônio do falecido, quais sejam: dívidas, créditos, etc. O termo de inventariante será utilizado em todas as ocasiões em que o falecido será representado.

Ao ser comprovada a inexistência de dívidas do falecido junto aos órgãos públicos, bem como a inexistência de bens tanto móveis quando imóveis, a sentença homologatória será de natureza declaratória.

O Inventário Extrajudicial

Primeiramente cumpre ressaltar, que, mesmo não estando presente na legislação brasileira, a Resolução nº 35, do Conselho Nacional de Justiça, que visa regulamentar a Lei nº 11.441/07, fez menção ao inventário negativo, em seu art. 28, dando a oportunidade de ser efetuado através de escritura pública.

Desta forma, é admissível a realização de inventário negativo não só judicial, como também, extrajudicial, devendo todas as partes serem capazes e haver concordância, todas devem estar assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público (CPC, art. 982).

Considerações Finais

Diante de todo o exposto neste artigo, por se tratar de um assunto em que o ordenamento jurídico brasileiro é omisso, é possível observarmos entendimentos através da doutrina e da jurisprudência, que vem sendo favoráveis a este procedimento do inventário negativo.

Sendo assim, na ocorrência do falecido não deixar bens a inventariar, o objetivo do ingresso de inventário negativo é provar esta inexistência de bens. Por se tratar de uma medida facultativa, não tem nenhuma obrigatoriedade, nem mesmo intenção de transmitir bens nem direitos.

Não tendo sua aplicação impedida, afasta dúvidas quanto à existência de bens para possível partilha entre herdeiros, e principalmente para determinadas situações, que podem servir de comprovante aos credores do de cujus, bem como para impedir a presença de impedimento materiais aos viúvos que queiram ter novos casamentos.

Sendo assim, utilizada para alguns fins legais, esta criação da praxe forense, mesmo sem previsão legal, vem sendo admitida favoravelmente, podendo evitar futuros embaraços.

 


Referências Bibliográficas:

BARROS, Hamilton de Moraes e. Comentários ao Código de Processo Civil: lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, v. 9.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. V6: Direito das Sucessões. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 9, Ed. São Paulo: Atlas, 2009.

BRASIL. Lei n° 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30/04/2013.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 30/04/2013.

Colunista

Advogada - Graduada pela Universidade Paulista UNIP – Pós Graduada em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito - EPD, Pós Graduada em Direito Previdenciário – Faculdade Legale, Presidente da Comissão de Violência Doméstica- Subseção 103° OAB/SP Vila Prudente (Gestão 2019 a 2021).
Membro da Comissão Jovem Advocacia OAB SP - Membro da Comissão de Direito Penal na empresa OAB Ipiranga - 100ª Subseção
Professora Universitária no Colégio Santa Rita Ibec - Professora/auxiliar de necropsia/pericia criminal na empresa Cisa Ciep Cursos Profissionalizantes Sócia Majoritária do escritório Medina Advocacia & Consultoria

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