O extrativismo da terra indígena

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Tormentosa a ascensão da ideia de explorar riqueza mineral em terra indígena, uma vez que a área ocupada não guarda apenas o tesouro materialmente considerado no subsolo, mas aquele patrimônio imaterial que circunda a vida da comunidade.

Conforme dispõe a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas: “Artigo 5. Os povos indígenas têm direito a conservar e reforçar suas próprias instituições políticas, jurídicas, econômicas, sociais e culturais, mantendo por sua vez, seus direitos em participar plenamente, se o desejam, na vida política, econômica, social e cultural do Estado”.

A Constituição Federal dispõe em capítulo próprio acerca das terras tradicionalmente ocupadas por índios, reservando-lhes a posse permanente e o usufruto exclusivo das riquezas minerais e potenciais energéticos.

Mas, o constituinte não veda a lavra pelo Estado, contudo, sujeitando o tema à aprovação prévia do Congresso Nacional, significa dizer, ao sufrágio dos representantes eleitos pelo povo.

O espanto vindo do atual Governo deve-se à circunstância dos diversos episódios de exposição do povo indígena durante a campanha presidencial e em mais recente comentário no qual o Presidente afirma que “se um dia eu puder eu os confino na Amazônia já que eles gostam tanto do meio ambiente. E deixem de atrapalhar, daqui de dentro das áreas urbanas”, referindo-se ao Estado que concentra potencial de extrativismo e população indígena em destaque.

Logo, o discurso a respeito ao estabelecimento do extrativismo em terras indígenas carrega consigo o histórico de eliminação de diversas comunidades ao longo da história, a mudança do modo de vida, a violência, o conflito armado etc.

“A caça aos índios foi desencadeada, nos últimos anos, com furiosa crueldade; a maior floresta do mundo, gigantesco espaço tropical aberto à lenda e à aventura, converteu-se, simultaneamente, no cenário de um novo sonho americano” (Eduardo Galeano, Veias Abertas da América Latina).

Essa é a questão polêmica: qual o verdadeiro interessado por trás da exploração das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios? Para qual finalidade será destinada a riqueza extraída? Quem será o financiador desta incursão?

O processo de extrativismo da terra tradicionalmente ocupada implica no rompimento cultural e na imersão da cultura indígena com a cultura do homem branco, com o desfalecimento de um patrimônio centenário.

“A sociedade indígena de nossos dias não existe no vazio, fora do marco geral da economia latino-americana. É verdade que há tribos ainda encerradas na floresta amazônica e comunidades isoladas do mundo no altiplano andino e em outras regiões, mas no geral os indígenas estão incorporados ao sistema de produção e ao mercado de consumo, embora de forma indireta” (Eduardo Galeano, Veias Abertas da América Latina).

A Amazônia não é parque de recreação, mas se trata de área de interesse ambiental, cujo patrimônio só não está protegido diante do desinteresse político, que culminou na ausência de plano de ação com as últimas queimadas.

Curiosamente, o discurso de extrativismo das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios vem logo após as cinzas das grandes áreas da Floresta Amazônica haverem cessado de pairar no ar.

O interesse econômico sobrepondo-se à preservação do meio ambiente como elemento essencial à preservação da própria vida humana, ruinando a possibilidade de busca por melhores condições de saúde intergeracional.

Cristiano Quinaia

Mestre em Direito - Sistema Constitucional de Garantia de Direitos (Centro Universitário de Bauru). Especialista LLM em Direito Civil e Processual Civil. Advogado.

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