quinta-feira,28 março 2024
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Lei nº 14.230/2021 e a legitimidade ativa ad causam na propositura das ações de improbidade administrativa

Da constitucionalidade da Lei nº 14.230/2021 ao optar pela legitimidade ativa exclusiva do MP para propor ações de improbidade administrativa.

No dia 17/02/2022, no bojo das Ações Diretas de Inconstitucionalidade ajuizadas pela Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal – ANAPE (ADI 7042) e pela Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais – ANAFE (ADI 7043), o Ministro Alexandre de Moraes deferiu medida cautelar para conferir interpretação conforme a CF/88 ao caput e §§ 6º-A, 10-C e 14, do artigo 17 da Lei nº 8.429/92, com a redação dada pela Lei nº 14.230/2021, e assim reconhecer a existência de legitimidade ativa concorrente entre o ministério público e as pessoas jurídicas interessadas para a propositura da ação por ato de improbidade administrativa.

A medida cautelar em questão ainda suspendeu os efeitos do § 20, do artigo 17 da Lei nº 8.429/92, com a redação dada pela Lei nº 14.230/2021 e o artigo 3º da Lei nº 14.230/2021.

Na redação que lhes fora conferida pela Lei nº 14.230/2021, o caput e o § 6º-A, do artigo 17 da Lei nº 8.429/92 estabelecem que a ação de improbidade administrativa será proposta pelo Ministério Público (que poderá requerer as tutelas provisórias adequadas e necessárias) e seguirá o procedimento comum previsto no Código de Processo Civil.

Os novos parágrafos 10-C e 14, do artigo 17 da Lei nº 8.429/92 prescrevem que após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor e que, sem prejuízo da citação dos réus, a pessoa jurídica interessada será intimada para, caso queira, intervir no processo.

Por fim, o § 20, do artigo 17 da Lei nº 8.429/92 estabelece que a assessoria jurídica que emitiu o parecer atestando a legalidade prévia dos atos administrativos praticados pelo administrador público ficará obrigada a defendê-lo judicialmente, caso este venha a responder ação por improbidade administrativa, até que a decisão transite em julgado ao passo que o artigo 3º da Lei nº 14.230/2021 preconiza que, no prazo de 1 ano a partir da data da sua publicação, o Ministério Público competente manifestará interesse no prosseguimento das ações por improbidade administrativa em curso ajuizadas pela Fazenda Pública, inclusive em grau de recurso.

O argumento principal que fundamentou a concessão da medida cautelar é o de que “a supressão da legitimidade ativa das pessoas jurídicas interessadas para a propositura da ação de improbidade administrativa pode representar grave limitação ao amplo acesso à jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), com ferimento ao princípio da eficiência (CF, art. 37, caput) e, no limite, obstáculo ao exercício da competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para ‘zelar pela guarda da Constituição’ e ‘conservar o patrimônio público’ (CF, art. 23, I), bem como, um significativo retrocesso quanto ao imperativo constitucional de combate à improbidade administrativa”.

Com a devida vênia para divergir do racional empregado para conceder a medida cautelar nas ADIs propostas pelas associações de membros da advocacia pública, é preciso inicialmente ter em mente que, quando a Constituição Federal quis tutelar a legitimidade processual ativa ela o fez em caráter expresso, como foi o caso do art. 5º, inciso LXXIII com relação a ação popular.

Ou seja, exceto o que consta expressamente do texto constitucional, a legitimidade ativa ad causam é uma questão de opção legislativa, e aqui, reforça-se: opção.

Veja, à luz do “imperativo constitucional de combate à improbidade administrativa” aduzido quando da concessão da medida cautelar, o próprio texto original da Lei nº 8.429/92 que garante às pessoas jurídicas interessadas a possibilidade de também ajuizarem ações de improbidade administrativa, também não seria constitucional, vez que a opção do legislador em 1992 foi a de não conferir legitimidade processual ativa para associações e para cidadãos, atores estes que, respectivamente, atuam para zelar pela guarda da Constituição (em ADIs, por exemplo) e para conservar o patrimônio público (ação popular).

Ora, se o legislador atua como caixa de ressonância da vontade popular quando da definição de quem terá legitimidade para ajuizar determinadas ações em juízo, o foro de debate primordial desta opção política é no Poder Legislativo e não no Poder Judiciário.

No mais, um debate que certamente há de ser feito no plenário quando da apreciação do mérito das ADIs 7042 e 7043 é o de ordem prática, pois há de se levar em conta que, na prática, quem milita no setor muito bem sabe que o número de ações de improbidade administrativa ajuizadas por Procuradorias das pessoas jurídicas interessadas é muito menor que o número das ações ajuizadas pelo Ministério Público.

Ou seja, nas discussões no plenário do STF há de se fazer a mesma reflexão feita por Luciana Yeung e Luciano Benetti Timm no artigo “Por que uma reforma no sistema de justiça?” publicado na edição de 12/02/2022 da Folha de São Paulo e debater a questão à luz de dados e evidências e não apenas em intuições derivadas de experiências pessoais, pois, sabendo-se que, de 1992 para cá, há Estados da Federação que nunca ajuizaram uma ação de improbidade e que a existência de uma Procuradoria estruturada com cargos efetivos não corresponde à realidade na maioria dos mais de 5.000 municípios brasileiros, faz sentido manter mais uma dentre tantas cacofonias de competências concorrentes e sobrepostas (que mais atrapalham que ajudam) existentes no ordenamento jurídico pátrio?

Aldem Johnston Barbosa Araújo

Advogado em Mello Pimentel Advocacia; Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE; Autor do livro “Processo Administrativo e o Novo CPC – Impactos da Aplicação Supletiva e Subsidiária” publicado pela Editora Juruá; Articulista em sites, revistas jurídicas e periódicos nacionais; Especialista em Direito Público.

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