quinta-feira,28 março 2024
ArtigosITCMD: inconstitucionalidade da diferenciação de alíquota em razão do grau de parentesco

ITCMD: inconstitucionalidade da diferenciação de alíquota em razão do grau de parentesco

Não é novidade para os contribuintes as inúmeras ilegalidades constantes nas legislações que regulamentam a cobrança de tributos, sejam elas federais, estaduais ou municipais.

A legislação do Estado de Santa Catarina que regulamenta a cobrança do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD é um bom exemplo a ser citado, visto que existem vários dispositivos passíveis de discussão.

Poucos contribuintes têm conhecimento, mas o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina reconheceu, em novembro de 2020, a inconstitucionalidade do artigo 9º, inciso V, da Lei Estadual nº 13.136/2004, o qual dispõe:

Art. 9º As alíquotas para a cobrança do imposto são:
(…)
V – oito por cento sobre a base de cálculo, quando:
o sucessor for:
1) parente colateral; ou
2) herdeiro testamentário ou legatário, que não tiver relação de parentesco com o de cujus; e
b) o donatário ou cessionário:
1) for parente colateral; ou
2) não tiver relação de parentesco com o doador ou cedente.

Segundo o entendimento da Corte, a aplicação de alíquota diferente em razão da inexistência de parentesco com o sucessor ou donatário viola o princípio da capacidade contribuitiva.

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. ART. 9º, V, DA LEI ESTADUAL N. 13.136/2004. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE BENS E DIREITOS – ITCMD. NORMA QUE APLICA MAIOR ALÍQUOTA DO TRIBUTO EM RAZÃO DO GRAU DE PARENTESCO COM O DE CUJUS. PROGRESSIVIDADE. CRITÉRIO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO COM A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 145, § 1º, DA CF. JURISPRUDÊNCIA DO STF PACÍFICA NESSE SENTIDO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. ARGUIÇÃO PROCEDENTE.
“[…] Embora constitucional, a adoção de alíquotas progressivas para o ITCD confronta com o princípio da capacidade contributiva a utilização do grau de parentesco como critério de fixação da progressividade” (RE 555511 AgR, Rela. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, j. 5/8/2020).
(TJSC, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível (Órgão Especial) n. 0000542-77.2020.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Órgão Especial, j. 18-11-2020).

Em seu voto, nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade acima citada, o Desembargador Relator Sérgio Roberto Baasch Luz, deixa claro que não se está em discussão a progressividade da alíquota, mas sim a utilização do critério relacionado ao parentesco constante especificamente no inciso V, do artigo 9º, da Lei Estadual nº 13.136/2004.

Importante citar que o Supremo Tribunal Federal também já se manifestou acerca da temática. Veja-se:

DIREITO TRIBUTÁRIO. ITCD. CONSTITUCIONALIDADE DA PROGRESSIVIDADE DA ALÍQUOTA. PAR METRO. GRAU DE PARENTESCO. CRITÉRIO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO COM A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. CONSON NCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TR NSITO. REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA. PROCEDIMENTO VEDADO NA INST NCIA EXTRAORDINÁRIA. AGRAVO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. O entendimento da Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. Embora constitucional, a adoção de alíquotas progressivas para o ITCD confronta com o princípio da capacidade contributiva a utilização do grau de parentesco como critério de fixação da progressividade. 2. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 3. Agravo interno conhecido e não provido (RE 555511 AgR-segundo, Relator(a): Rosa Weber, Primeira Turma, j. 5/8/2020) (grifou-se).

Embora tenha ocorrido o reconhecimento da inconstitucionalidade tanto pelo TJSC quanto pelo STF, a Fazenda Pública Estadual continua exigindo o pagamento do percentual de 8% (oito por cento) caso o contribuinte seja parente colateral ou não possua grau de parentesco com o falecido ou doador.

Logo, a única forma de obter a redução da alíquota é ingressando com ação judicial em face do fisco.

Vale ressaltar que, dependendo do valor do patrimônio, a diferença de valores recolhidos aos cofres públicos pode ser significativa, haja vista que as alíquotas progressivas variam de 1% (um por cento) a 7% (sete por cento), enquanto quem não for parente colateral ou não possuir grau de parentesco com o falecido ou com o doador sempre recolherá o ITCMD com alíquota de 8% (oito por cento), independentemente do valor dos bens ou direitos.

Por exemplo, na doação de um imóvel avaliado em R$ 100.000,00 (cem mil reais), caso ocorresse de pai para filho, a alíquota aplicada se basearia tão somente no valor do bem, aplicando-se, progressivamente, as alíquotas de 1% (um por cento) a 5% (cinco por cento):

Até R$ 20.000 (1%) = R$ 200,00
De R$ 20.000,00 até R$ 50.000,00 (3%) = 900,00
De R$ 50.000,00 até R$ 100.000,00 (5%) = R$ 2.500,00
TOTAL ITCMD A SER PAGO: R$ 3.600,00

Já se essa mesma doação fosse feita entre dois irmãos (parentes colaterais) a alíquota seria de 8% (oito por cento), o que resultaria no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a serem recolhidos aos cofres públicos. Ou seja, o contribuinte efetuaria, na prática, o recolhimento de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais) a mais do que o efetivamente devido.

Veja-se que o segundo caso levou em conta tão somente o grau de parentesco entre as partes, sem considerar o valor do bem imóvel, não havendo, portanto, a aplicação da alíquota progressiva como no primeiro caso.

Portanto, é de suma importância a verificação da legalidade da exigência do fisco, tendo em vista que há grandes chances de ocorrer uma cobrança indevida ou de valores incorretos.

Por fim, destaca-se que a legislação de outros Estados que utilize como critério para diferenciação das alíquotas a relação de parentesco, também é considerada inconstitucional.

Marcos Roberto Hasse
Hasse Advocacia

Graduado em direito na FURB – Universidade Regional de Blumenau/SC em (1995). Pós Graduado em Direito Tributário e Processual Tributário (2002), pela UNIVILLE –Universidade da Região de Joinville/SC. Advogado atuante nas matérias de Direito Civil, Tributário, Previdenciário, Trabalhista e Ambiental. Foi professor na UNERJ – Universidade Regional de Jaraguá do Sul/SC, hoje Católica de Santa Catarina.

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