sexta-feira,29 março 2024
ColunaAdministrativoIntervenção do Estado na propriedade privada.Pode?

Intervenção do Estado na propriedade privada.Pode?

Na prova da ANAC para o cargo de especialista de regulação de aviação civil (2012) a banca examinadora CESPE perguntou: “Na ocupação temporária, a indenização é condicionada à ocorrência de prejuízo pelo proprietário” Certo ou Errado?

E ai, concurseiro, saberia responder a questão? Se sua resposta foi não, pode ter certeza que ao final do nosso estudo saberá perfeitamente. Então, não percamos tempo!

A primeira coisa que precisamos saber é que o direito de propriedade é consagrado na Constituição e cabe ao Estado respeitá-lo. Em seu Art. 5º prevê que Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O inciso XXII assevera:

“é garantido o direito de propriedade.” Note que o direito de propriedade foi colocado na Constituição ao lado do direito à vida e liberdade, não se pode negar sua valoração.

Porém, muita atenção! O direito a propriedade não é absoluto, uma vez que, conforme Art 5º XXIII da CF, a propriedade atenderá a sua função social. O Código Civil brasileiro corrobora com tal dispositivo em seu Art. 1.228:

 § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

Tais dispositivos foram elencados tendo em vista o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, ou seja, pode acontecer que em benefício do interesse coletivo, o bem particular sofra intervenção estatal. Desta forma, quando o interesse particular encontra-se em conflito com interesse público, este prevalecerá.

Modalidades de Intervenção Estatal

Não é raro os certames cobrarem conceitos ligados às modalidades de intervenção estatal na propriedade privada. Então, vamos a elas.

Primeiramente cumpre destacar que a intervenção estatal se apresenta de duas formas: intervenção restritiva e supressiva. Nosso maior foco aqui será voltado para intervenção restritiva, assim, daremos apenas um breve conceito de supressiva (desapropriação), visto que, é um tema longo e repleto de detalhes que requer um estudo próprio, deste modo, ficará para a próxima oportunidade

A intervenção restritiva é bem mais branda, visto que, como o próprio nome diz,  o Estado apenas restringe o uso, estabelece certos padrões que julga conveniente ,em prol do bem coletivo.

Ao passo que a intervenção supressiva é mais gravosa para o proprietário do bem, uma vez que, o Estado de forma coercitiva promove a transferência de um bem particular para seu domínio, passando a pertencer ao Poder Público.

Passemos agora a analisar cada modalidade de intervenção restritiva (requisição, ocupação temporária, servidão administrativa, limitações administrativas e o famoso tombamento) e após, veremos apenas o conceito de desapropriação que é modalidade de intervenção supressiva.

Intervenções Restritivas

1.

Limitação administrativa:
A limitação administrativa pode ser negativa ou positiva. Na negativa o Estado estabelece uma obrigação de não fazer para o proprietário, ao passo que a positiva impõe um dever de fazer. Mais adiante os exemplos irão deixar tais aspectos ainda mais claros.

A renomada Maria Sylvia Zanella di Pietro conceitua da Limitação administrativa da seguinte forma:

As limitações podem, portanto, ser definidas como medidas de caráter geral, impostas com fundamento no poder de polícia do Estado, gerando para os proprietários obrigações positivas ou negativas, com o fim de condicionar o exercício do direito de propriedade ao bem-estar social.

A primeira observação que jamais pode ser esquecida pelos concurseiros de plantão, se refere ao fato de que as limitações administrativas não geram a obrigação de indenizar por parte do Estado, uma vez que, o proprietário não é privado de nenhum dos direitos inerentes à propriedade.

Sem delongas, vamos aos exemplos! São limitações administrativas: a ordem estatal limitando o número de andares a serem construídos em prédios de determinada região (que é obrigação de não fazer),  quando o  Poder público impõe que o particular pode a árvore de sua residência (que é obrigação de fazer).

2.

Ocupação temporária
Como o nome bem sugere, a ocupação temporária é o uso provisório de um bem imóvel de um particular pela Administração.  Tal ocupação não gera qualquer direito real sobre o imóvel, tendo em vista seu caráter provisório.

Algumas  provas de concursos públicos afirmam que para o aperfeiçoamento da ocupação temporária faz-se necessária a autorização judicial, mas tal informação é incorreta. A ocupação temporária é autoexecutável, assim, não se exige qualquer ordem judicial, logo, é executada direta e imediatamente pela Administração.

Nas palavras de Carvalho Filho, a ocupação temporária serve para que o Estado deixe alocado em terreno privado, materiais usados em construções públicas, bem como levantamento de barracões que servem de apoio para a obra durante curto período de tempo.

3.

Requisição administrativa
Diferentemente da ocupação temporária, a requisição surge de uma necessidade urgente e imprevista. Decorre de calamidades em que o Estado se vê obrigado a usar bem de particular, como bem preceitua o Art. 5º da Constituição:

XXV – no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;

Fica claro que a requisição é como todas  as demais modalidades de intervenção estatal, tem o intuito de atender o interesse público.

Não podemos deixar de salientar ainda que, ao contrário da servidão administrativa, a requisição recai não somente sobre bens imóveis, mas também sobre móveis e serviços. Lembre-se ainda que só há que se falar em indenização posteriormente e se houver dano ao patrimônio do requisitando.

4.

Tombamento
A função do tombamento é proteger bens históricos e culturais por meio da intervenção na propriedade privada. Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. O Decreto – lei 25 de 1937 é responsável por disciplinar a matéria.

casa tombada

Para não cair em pegadinhas das bancas examinadoras, não esqueça que o tombamento dos bens pertencentes á União, estados e municípios se fará de ofício. O responsável pelo pedido é o diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e artístico Nacional e a notificação de tombamento se faz à entidade a quem pertencer. Já o tombamento de bens pertencentes à pessoa natural ou jurídica pode ser feito voluntária ou compulsoriamente, como dispõe o Art. 6 do Decreto lei 25.

Outro fator muitíssimo importante acerca do tombamento diz respeito à ordem de preferência quando a pessoa natural ou jurídica pretende alienar o bem tombado. Ao contrário do que muitos pensam, os bens tombados podem sim serem vendidos, pois não deixam de pertencer ao particular. Contudo, se assim pretender, respeitarão a seguinte ordem de preferência para alienação: primeiro a União, depois estados e por último os municípios. Ou seja, o proprietário só poderá alienar para outra pessoa que não os entes citados, se após notificá-los, nenhum manifestar-se em trinta dias. Não se pode ignorar o que dispõe o Art. 22: § 2º “É nula alienação realizada com violação do disposto no parágrafo anterior, ficando qualquer dos titulares do direito de preferência habilitado a sequestrar a coisa e a impor a multa de vinte por cento do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis”.

5.

Servidão administrativa
De acordo com Gustavo Amora Cordeiro, a servidão administrativa é o direito real de uso imposto pela administração ao particular que recai sobre a propriedade particular, para assegurar a realização e conservação obras ou serviços públicos, ou utilidades públicas, mediante indenização.

servidao

Exemplificando você notará que certamente já teve a oportunidade de ter conhecimento de uma servidão administrativa. Quando fios de alta tensão passam sobre propriedade particular, temos a servidão administrativa. Há outro exemplo que é ainda mais comum, quando a Administração pública instala em imóveis particulares placas para identificar a rua, é um típico caso de servidão administrativa. A indenização em casos de servidão serão pagas somente se comprovada a ocorrência de danos ao particular.

Ah, não esqueça que ao contrario da limitação administrativa, a servidão tem caráter permanente.

INTERVENÇÃO SUPRESSIVA

Desapropriação:

Como dito inicialmente, tal tema requer um cuidado especial. É um tema longo e rico em detalhes. Deixemo-lo para outro momento, fechando o presente estudo apenas com seu conceito muito bem colocado pela ESAFE no certame da ANAC para o cargo de analista (2009) : Pela desapropriação promove-se a transferência da propriedade por razões de utilidade pública ou interesse social; pode recair sobre bens móveis ou imóveis dotados de valoração patrimonial, em regra, enseja indenização.

Ah, a resposta para nossa pergunta inicial da temida banca CESPE agora você já sabe, não é mesmo? Marcaria seguramente “C” de certíssima!

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1 COMENTÁRIO

  1. Muito legal.

    Só confirmem depois..
    “Ah, não esqueça que ao contrario da limitação administrativa, a servidão tem caráter permanente.”

    Não seria:
    Ah, não esqueça que ao contrário da REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA, a servidão tem caráter permanente.

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