Segundo o STJ, a doação de um imóvel com fundamento na ingratidão do donatário, que ofendeu a integridade psíquica da doadora, pode ser revogada.
No caso analisado, uma mulher doou seu imóvel ao irmão e à esposa dele, em seguida os três passaram a viver na mesma residência. Após uma série de maus-tratos, ela procurou o Ministério Público com a finalidade de revogar a doação.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do REsp. nº 1593857, decidiu ser possível revogar a doação de um imóvel com fundamento na ingratidão dos donatários, que ofenderam a integridade psíquica da doadora. Para os magistrados, o conceito de ingratidão previsto no Código Civil é aberto, visto que o rol de condutas elencadas no artigo 557 do Código Civil seria meramente exemplificativo e não numerus clausus.
“Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:
I – se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele;
II – se cometeu contra ele ofensa física;
III – se o injuriou gravemente ou o caluniou;
IV – se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava”
Para o ministro Villas Bôas Cueva, não há nenhuma ilegalidade no acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que admitiu a possibilidade de se revogar doação motivada por ingratidão, conceito que não seria previsto de modo taxativo pelo Código Civil.
O relator lembrou também que os beneficiários nem sequer negam a existência de uma convivência conflituosa com a doadora do imóvel, o que foi comprovado nos autos da ação, e não poderia ser revisto pela instância superior, nos termos da Súmula nº 7/STJ.
“A gravidade dos fatos se afere a partir das provas constantes do feito, caracterizadores de uma profunda ingratidão dos familiares da doadora, a quem deviam respeito e reconhecimento, destacando-se insultos ofensivos e humilhantes e referências desonrosas a sua pessoa, indicadores de indiferença com a própria vida e dignidade daquela”, sublinhou Vilas Bôas Cueva.
No caso analisado, uma mulher doou seu imóvel ao irmão e à esposa dele. Após a formalização do ato, as partes passaram a viver na mesma residência.
Após uma série de maus-tratos, a doadora procurou o Ministério Público com a finalidade de revogar a doação, já que, dentre outras coisas, teria sido privada de se alimentar na própria casa, não podendo sequer circular livremente pelo imóvel, já que a convivência seria “insuportável”.
Os ministros justificaram que, no caso em questão, estão presentes todos os pressupostos necessários para a revogação do imóvel doado, mantendo incólume o acórdão recorrido.
O relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, ponderou em seu voto as justificativas para a revogação, assentando que “A injúria a que se refere o dispositivo (Código Civil) envolve o campo da moral, revelada por meio de tratamento inadequado, tais como o descaso, a indiferença e a omissão de socorro às necessidades elementares do doador, situações suficientemente aptas a provocar a revogação do ato unilateral em virtude da ingratidão dos donatários”.
Confira Ementa:
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. DOAÇÃO. REVOGAÇÃO. INGRATIDÃO DOS DONATÁRIOS. OFENSA À INTEGRIDADE PSÍQUICA.
PROVA. ART. 557 DO CC/2002. ROL MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO. ENUNCIADO Nº 33 DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. INJÚRIA GRAVE. DEMONSTRAÇÃO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. O conceito jurídico de ingratidão constante do artigo 557 do Código Civil de 2002 é aberto, não se encerrando em molduras tipificadas previamente em lei.
2. O Enunciado nº 33 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, prevê que “o Código Civil vigente estabeleceu um novo sistema para a revogação da doação por ingratidão, pois o rol legal do art. 557 deixou de ser taxativo, admitindo outras hipóteses “, ou seja, trata-se de rol meramente
exemplificativo.
3. A injúria a que se refere o dispositivo envolve o campo da moral, revelada por meio de tratamento inadequado, tais como o descaso, a indiferença e a omissão de socorro às necessidades elementares do doador, situações suficientemente aptas a provocar a revogação do ato unilateral em virtude da ingratidão dos donatários.
4. Rever o entendimento do acórdão impugnado, que considerou cabível a revogação por ingratidão no presente caso, ante a gravidade dos fatos narrados na inicial e demonstrados nos autos, implicaria o reexame do contexto
fático-probatório, procedimento inadmissível em âmbito de recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ.
5. Recurso especial não provido.
(Terceira Turma STJ. REsp 1.593.857 / MG. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA – Relator. Julgado em 14 de junho de 2016).
Confira íntegra AQUI
Fonte: STJ
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Excelente exposição e clara fundamentação. Peça que serviu de base para aprendizado de meu estagiário que cursa o quarto ano de direito na Uninove.