sexta-feira,29 março 2024
TribunaisInformativo do STJ nº 644

Informativo do STJ nº 644

Informativo do STJ nº 644 – Brasília, 12 de abril de 2019.

Este periódico, elaborado pela Secretaria de Jurisprudência do STJ, destaca teses jurisprudenciais firmadas pelos órgãos julgadores do Tribunal nos acórdãos incluídos na Base de Jurisprudência do STJ, não consistindo em repositório oficial de jurisprudência.

DIREITO FALIMENTAR

PROCESSO: REsp 1.521.999-SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. Acd. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, por maioria, julgado em 28/11/2018, DJe 22/03/2019 (Tema 969)

TEMA: Falência. Classificação de créditos. Encargo legal inscrito em dívida ativa da União. Crédito não tributário. Preferência conferida aos créditos tributários. Extensão. Tema 969.

DESTAQUE
O encargo do DL n. 1.025/1969 tem as mesmas preferências do crédito tributário devendo, por isso, ser classificado, na falência, na ordem estabelecida pelo art. 83, III, da Lei n. 11.101/2005.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Nos termos do art. 1º do DL n. 1.025/1969, o encargo de 20% inserido nas cobranças promovidas pela União, pago pelo executado, é recolhido aos cofres públicos como renda da União, sendo que, com o advento da Lei n. 7.711/1988, conforme previsão do parágrafo único do art. 3º, “será recolhido ao Fundo a que se refere o art. 4º, em subconta especial, destinada a atender a despesa com o programa previsto neste artigo […]”, que é voltado para o incentivo da arrecadação, administrativa ou judicial, de receitas inscritas como Dívida Ativa da União e outras atividades relacionadas. Portanto, o encargo do DL n. 1.025/1969 é crédito não tributário destinado à recomposição das despesas necessárias à arrecadação, à modernização e ao custeio e diversas outras (despesas) pertinentes à atuação judicial da Fazenda Nacional. Não obstante, adequado o seu enquadramento no inciso III do art. 83 da atual Lei de Falências. Importante observar que no crédito tributário a que se refere a lei falimentar, estão incluídos somente a correção monetária e os juros de mora incidentes sobre o tributo devido pelo falido (art. 161 do CTN). Nessa linha e em tese, na falta de previsão legal, admitir que o encargo do DL n. 1.025/1969 seja classificado como crédito tributário poderia implicar violação do princípio do par conditio creditorum (igualdade de tratamento dos credores), segundo o qual todos os credores de uma mesma categoria devem ser tratados de forma igualitária (art. 126 da Lei n. 11.101/2005), pois um acréscimo de 20% da dívida cobrada da massa tem impacto na expectativa dos demais credores da mesma estatura (Estados, Distrito Federal, Municípios, autarquias). Entretanto, o § 4º do art. 4º da Lei n. 6.830/1980 dispõe: “Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional.” Com base nos referidos dispositivos se observa que, por opção do legislador, foi estendida expressamente ao crédito não tributário inscrito em dívida ativa a preferência dada ao crédito tributário, preferência já existente antes da LC n. 118/2005. Assim, se o encargo do mencionado Decreto-lei tem natureza não tributária (Lei n. 7.711/1988), compõe a dívida ativa da Fazenda Nacional (art. 2º, §§ 2º, 5º, II, da Lei n. 6.830/1980) e tem as mesmas preferências do crédito tributário, por força da autorização contida no art. 4º, § 4º, da Lei n. 6.830/1980, pode-se concluir pelo seu enquadramento, por equiparação, no inciso III do art. 83 da Lei n. 11.101/2005. Ademais, caso a questão surja sob a égide do DL n. 7.661/1945, antiga Lei de Falências, com o mesmo raciocínio deve-se-lhe assegurar a classificação pertinente aos créditos tributários, nos termos do art. 186 do CTN, antes da alteração implementada pela LC n. 118/2005.

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROCESSO: ProAfR no REsp 1.753.509-PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 18/12/2018, DJe 11/03/2019 (Tema 1.006)

TEMA: Execução penal. Unificação das penas. Superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória. Termo a quo para concessão de novos benefícios. Ausência de previsão legal para alteração da data-base. Tema 1.006.

DESTAQUE
A unificação de penas não enseja a alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Sobre o tema, é imperioso salientar que as Turmas que compõem a Terceira Seção deste Superior Tribunal possuíam o entendimento pacificado de que, sobrevindo condenação definitiva ao apenado, por fato anterior ou posterior ao início da execução penal, a contagem do prazo para concessão de benefícios é interrompida e deve ser feito novo cálculo, com base no somatório das penas. Ademais, o termo a quo para concessão de futuros benefícios seria a data do trânsito em julgado da última sentença condenatória. Consoante o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a determinação de reinício do marco para concessão de novos benefícios, após a unificação das reprimendas impostas ao sentenciado, advém da possibilidade de que, determinada a regressão de regime, o apenado possa, em seguida, progredir, apenas diante do cumprimento da fração necessária em relação ao quantum da pena recém incluída na guia de execução. Portanto, verifica-se que não há previsão legal expressa que permita a alteração da data-base para concessão de novas benesses, caso, depois de efetuada a soma das penas, o resultado não permita a manutenção do regime atual. Da leitura dos arts. 111, parágrafo único, e 118, II, ambos da Lei de Execução Penal, conclui-se que, diante da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória, caso o quantum de pena obtido após o somatório não permita a preservação do regime atual de cumprimento da pena, o novo regime será então determinado por meio do resultado da soma, de forma que estará o sentenciado sujeito à regressão. Desse modo, não se infere que, efetuada a soma das reprimendas impostas ao sentenciado, é mister a alteração da data-base para concessão de novos benefícios, especialmente, ante a ausência de disposição legal expressa. Aliás, mesmo diante das razões suscitadas pelo Supremo Tribunal Federal, percebe-se que a regressão não é consequência imediata da unificação das penas, de maneira que o somatório não implicaria necessariamente alteração da data-base. É imperioso consignar que a alteração da data-base, em razão da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória, procedimento que não possui respaldo legal e é embasado apenas na regressão de regime, implica conjuntura incongruente, na qual o condenado que já havia progredido é forçado a cumprir lapso superior àquele em que permaneceu em regime mais gravoso para que novamente progrida. Por conseguinte, deduz-se da exposição supra que a alteração do termo a quo referente à concessão de novos benefícios no bojo da execução da pena constitui afronta ao princípio da legalidade e ofensa à individualização da pena, motivos pelos quais se faz necessária a preservação do marco interruptivo anterior à unificação das penas, pois a alteração da data-base não é consectário imediato do somatório das reprimendas impostas ao sentenciado. No entanto, ainda que assim não fosse, o reinício do marco temporal permanece sem guarida se analisados seus efeitos na avaliação do comportamento do reeducando. Caso o reeducando viesse a ser condenado pela prática de delito cometido no curso da execução, a superveniência do trânsito em julgado da sentença condenatória, segundo a atual jurisprudência desta Egrégia Corte, acarretaria a unificação das penas a ele impostas e a alteração da data-base para concessão de novos benefícios, o que já haveria ocorrido em momento anterior, dada o registro da respectiva falta grave, implicando indevido bis in idem. Aliás, se a condenação definitiva por delito praticado após o início da execução da pena não se presta a ensejar a modificação da data-base para concessão de novos benefícios, com maior razão não pode o trânsito em julgado de sentença condenatória prolatada em face de delito anterior implicar o reinício do marco temporal, porquanto se trata de fato que nem sequer fora praticado no curso do resgate das reprimendas impostas ao reeducando. Dessa maneira, não se pode alegar que um fato praticado antes do início da execução da pena constitua parâmetro de avaliação do mérito do apenado, uma vez que evento anterior ao início do resgate das reprimendas impostas não desmerece hodiernamente o comportamento do sentenciado. Assim, um delito cometido antes de iniciar-se o cumprimento da pena não possui o condão de subsidiar a análise do desenvolvimento da conduta do condenado e, por conseguinte, não deve ser utilizado como critério para que se proceda ao desprezo do período de pena cumprido antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, em face do reinício do marco temporal relativo aos benefícios executórios. Por tanto, assim como já delimitado no julgado do REsp n. 1.557.461/SC, Terceira Seção, julgado em 22/02/2018, DJe 15/03/2018, é preciso ressaltar que a unificação de nova condenação definitiva já possui o condão de recrudescer o quantum de pena restante a ser cumprido pelo reeducando; logo, a alteração da data-base para concessão de novos benefícios, a despeito da ausência de previsão legal, configura excesso de execução, com base apenas em argumentos extrajurídicos. O período de cumprimento de pena desde o início da execução ou desde a última infração disciplinar não pode ser desconsiderado, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta grave.

 

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROCESSO: CC 150.965-DF, Rel. Min. Raul Araújo, por unanimidade, julgado em 20/02/2019, DJe 22/03/2019

TEMA: Habeas corpus coletivo. Delegacias com estabelecimentos interditados. Problemas estruturais. Pedido de substituição de prisão provisória por medida cautelar diversa da prisão. Matéria predominantemente de direito penal. Competência da Terceira Seção.

DESTAQUE
Compete à Terceira Seção do STJ processar e julgar habeas corpus impetrado com fundamento em problemas estruturais das delegacias e do sistema prisional do Estado.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, registre-se que, nos termos do art. 9 do RISTJ, em matéria de habeas corpus, a regra geral é que eles sejam processados e julgados pela Terceira Seção, somente ingressando na competência da Primeira e da Segunda Seções quando se referirem às suas respectivas matérias. Ademais, a competência da Primeira Seção estará restrita à matéria de direito público não abrangida predominantemente pelo direito penal. Na hipótese, fundamentando-se na dignidade da pessoa humana, a impetrante pleiteia a substituição de prisões provisórias – tanto decorrentes de prisões em flagrante como do cumprimento de mandados de prisão preventiva – por medidas cautelares diversas da prisão, as quais estão previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. Embora a suposta ilegalidade das prisões surja de problemas na estrutura das delegacias e do sistema prisional do Estado, o pleito é de concessão de medidas processuais penais que afetam diretamente o direito do Estado de manter sob custódia as pessoas investigadas e acusadas do cometimento de crimes diversos e o direito de liberdade de tais pessoas em conflito com os interesses da sociedade. Assim, a relação jurídica litigiosa apresenta ligação por demais estreita com o direito penal para ser considerada de direito público em geral. Somente de forma mediata, isto é, em plano secundário, emergem questões de ordem administrativa.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO AgInt no AgInt na SLS 2.116-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, por unanimidade, julgado em 07/11/2018, DJe 26/02/2019

TEMA Suspensão de liminar e de sentença. Legislação de regência. Ausência de requisitos formais. Simples petição dirigida ao Presidente do Tribunal Competente. Possibilidade.

DESTAQUE
Para a formalização da pretensão e análise do pedido de suspensão de segurança, basta o requerimento em simples petição dirigida ao presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento de recurso na causa principal.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
No caso em análise, para obstar a imissão de Estado na posse de imóvel desapropriado foi ajuizada ação cautelar cuja liminar foi deferida pelo Juízo singular e mantida pelo Tribunal Regional Federal. O Estado, então, ajuizou pedido suspensivo dirigido à Presidência do STJ. Contudo, antes de decidido o pedido suspensivo, foi proferida sentença na ação cautelar, julgando improcedentes os pedidos iniciais e revogando os efeitos da liminar. Com isso, o então Presidente do STJ julgou prejudicado o pedido suspensivo. No entanto, essa decisão foi impugnada por meio de Agravo Interno pelo Estado, ao fundamento de que os efeitos da liminar objeto do Pedido de Suspensão teriam sido restabelecidos pelo TRF. Em julgamento do Agravo Interno, o Presidente do STJ reconsiderou sua decisão e deferiu a pretensão suspensiva. Em novo Agravo Interno, questiona-se, dentre outros pontos, se o Estado ao invés de ter interposto Agravo Interno contra a primeira decisão do Presidente do STJ, deveria ter formulado novo pedido suspensivo. Ocorre que, sem o trânsito em julgado da decisão em que se julgou prejudicado o pedido formulado na inicial no pedido de suspensão, não há nenhum equívoco em posteriormente reconsiderá-la. Na verdade, é indiferente que o pedido tenha sido formulado nos próprios autos, na forma de recurso ou requerido em uma autuação em separado. Isso porque as normas de regência não preveem, para a formulação de pedido de contracautela. É o que se infere do art. 25 da Lei n. 8.038/1990 e do caput do art. 4º da Lei n. 8.437/1992. Para a formalização da pretensão e análise do pedido suspensivo, basta o requerimento em simples petição dirigida ao presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento de recurso na causa principal, formalizado pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica que exerce munus público. É o que leciona a doutrina: “O pedido de suspensão é formulado por meio de uma petição dirigida ao presidente do Tribunal. […]. Não há requisitos formais previstos em lei para o pedido de suspensão; exige-se, apenas, que haja requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada”. Além disso, vale ainda acrescentar que a doutrina registra que a legislação não padronizou o processamento do pedido suspensivo. Portanto, a providência processual de protocolização de novo pedido suspensivo não tem fundamento. O provimento judicial que o Estado obteve poderia ter sido deferido tanto em uma decisão de reconsideração do ato anterior quanto em uma nova autuação. Não se pode deixar de ressaltar, ainda, que na hipótese – na qual o Ministro Presidente entendeu que estavam cumpridos os requisitos para sobrestar a execução da decisão do Tribunal de origem – mostrou-se prudente e consentâneo com as exigências de celeridade e economia processual a prolação imediata de decisão, em vez de se determinar a autuação do pedido em um novo feito suspensivo.

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PROCESSO EREsp 1.269.726-MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, por unanimidade, julgado em 13/03/2019, DJe 20/03/2019

TEMA Pensão por morte. Servidor público estadual. Relação de trato sucessivo. Prescrição de fundo de direito. Não ocorrência. Súmula n. 85/STJ. Aplicabilidade. Prescrição apenas das prestações vencidas no quinquênio anterior à propositura da ação.

DESTAQUE
Não ocorre a prescrição do fundo de direito no pedido de concessão de pensão por morte, estando prescritas apenas as prestações vencidas no quinquênio que precedeu à propositura da ação.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O acórdão embargado, da Segunda Turma, fixou o entendimento de que nos casos em que se pleiteia a pensão por morte, a prescrição atinge o próprio fundo de direito. Ao revés, os arestos paradigmas, da Quinta Turma, reconheceram que a prescrição, no caso, se aplica às prestações, não ao fundo de direito, considerando a natureza de trato sucessivo. Inicialmente cumpre salientar que as prestações previdenciárias têm características de direitos indisponíveis, daí porque o benefício previdenciário em si não prescreve, somente as prestações não reclamadas no lapso de cinco anos é que prescreverão, uma a uma, em razão da inércia do beneficiário. Nesse sentido, nas causas em que se pretende a concessão de benefício de caráter previdenciário, inexistindo negativa expressa e formal da Administração, não há falar em prescrição do fundo de direito, nos termos do art. 1º. do Decreto n. 20.910/1932, porquanto a obrigação é de trato sucessivo, motivo pelo qual incide no caso o disposto na Súmula n. 85 do STJ. Não se pode admitir que o decurso do tempo legitime a violação de um direito fundamental. O reconhecimento da prescrição de fundo de direito à concessão de um benefício de caráter previdenciário excluirá seu beneficiário da proteção social, retirando-lhe o direito fundamental à previdência social, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana e da garantia constitucional do mínimo existencial. Não é demais destacar que no âmbito da Lei n. 8.112/1990, o art. 219 confere esse tratamento distinto àquele que tem legítimo interesse ao benefício previdenciário, reconhecendo que só ocorre a prescrição das prestações exigíveis há mais de 5 anos, uma vez que a lei permite o requerimento da pensão a qualquer tempo. Assim, prevalece o entendimento de que não há que se falar em prescrição de fundo de direito nas ações em que se busca a concessão de benefício de caráter previdenciário.

 

DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO AREsp 832.354-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, por unanimidade, julgado em 21/02/2019, DJe 19/03/2019

TEMA Medida cautelar preparatória. Suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Débitos referentes a autuações fiscais distintas. Conexão com anterior medida cautelar de mesma finalidade. Inexistência.

DESTAQUE
O vínculo de conexão a justificar a reunião de medidas cautelares preparatórias está vinculado com a identidade de objeto e/ou de causa de pedir existente entre as ações principais a serem propostas e não do processo cautelar em si.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se a anterior distribuição de medida cautelar preparatória de suspensão da exigibilidade de crédito tributário mediante depósito integral (art. 151, II, do CTN) gera vínculo de conexão com outra medida cautelar distribuída com a mesma finalidade, mas que se refere a autuação fiscal diversa, na qual se imputaria a infringência de diferentes normas da legislação de regência do ICMS. É bem verdade que a conexão entre ações deve ser analisada de maneira flexível, devendo ser reconhecida sempre que exista o risco de decisões judiciais conflitantes, ainda que os feitos não guardem perfeita identidade entre objeto e/ou causa de pedir. Todavia esse entendimento não se aplica aos casos em que se controverte sobre a conexão entre medidas cautelares preparatórias, pois a pretensão cautelar de suspender a exigibilidade do crédito tributário mediante depósito integral não caracteriza o objeto ou a causa de pedir de que tratava o art. 103 do CPC/1973. Com efeito, dispunha o art. 800 do CPC/1973 que as medidas cautelares preparatórias deviam ser requeridas ao juiz competente para conhecer da ação principal. Em face dessa previsão normativa, o juízo a respeito da conexão entre ações cautelares preparatórias deve levar em conta a eventual identidade de objeto e/ou de causa de pedir das ações principais a serem propostas e não do processo cautelar em si. E nem poderia ser diferente já que o processo cautelar, porquanto acessório, guarda vínculo de dependência com o processo principal e, por isso, o seu juízo natural deve seguir as regras de competência jurisdicional, dentre elas as relativas à conexão, aplicável ao feito matriz. Assim, fica claro que as medidas cautelares manejadas com o objetivo de suspender a exigibilidade do crédito tributário mediante depósito judicial não guardam entre si vínculo jurídico apto a configurar a hipótese de conexão e a distribuição por dependência, visto que tais medidas são preparatórias de ações antiexacionais (anulatórias) independentes, voltadas contra autuações fiscais distintas e respaldadas em fundamentos legais também diferentes.

 

DIREITO ADMINISTRATIVO

PROCESSO REsp 1.569.560-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. Ac. Min. Og Fernandes, por maioria, julgado em 21/06/2018, DJe 11/03/2019

TEMA: Profissionais do magistério público da educação básica. Jornada de trabalho. Art. 2º, § 4º, da Lei n. 11.738/2008. Reserva de um terço da carga horária para dedicação às atividades complementares.

DESTAQUE
O cômputo dos dez ou quinze minutos que faltam para que a “hora-aula” complete efetivamente uma “hora de relógio” não pode ser considerado como tempo de atividade extraclasse dos profissionais do magistério.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A composição da jornada de trabalho dos professores encontra-se disciplinada na Lei n. 11.738/2008, que instituiu o piso salarial para os profissionais do magistério da educação básica. Dispõe o § 4º do art. 2º da referida lei que apenas 2/3 (dois terços) da jornada de trabalho do professor pode ser destinada à atividade que envolva interação com os educandos. O diploma normativo em questão foi discutido em controle concentrado na ADI n. 4.167 perante o Supremo Tribunal Federal, o qual afirmou a constitucionalidade da norma quanto à reserva de 1/3 da carga horária dos professores para dedicação às atividades extraclasse. Fundamenta o julgado que o limite de 2/3 (dois terços) da jornada do professor com atividades de interação com educando justifica-se exatamente pela importância das atividades extra-aula para esses profissionais. O ofício do professor abrange, além das tarefas desempenhadas em classe, a preparação das aulas, as reuniões pedagógicas e as com os pais, entre outras práticas inerentes ao exercício do magistério. Assim, sendo essa a razão de ser da mencionada limitação, não se mostra razoável o cômputo dos 10 (dez) ou 15 (quinze) minutos que faltam para que a “hora-aula” complete efetivamente uma hora como atividade extraclasse. Tal ínterim não se mostra, de forma alguma, suficiente para que o professor realize nenhuma das atividades para as quais foi o limite idealizado. Desse modo, entende-se que os minutos que faltam para o cumprimento de uma “hora-relógio” não podem ser computados como tempo de atividade extraclasse.

 

 

DIREITO CIVIL

PROCESSO REsp 1.722.691-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA Sucessão. Inventário. Imóvel residencial. Ocupação e uso gratuito (comodato). Herdeiro. Adiantamento da legítima. Inocorrência. Colação. Desnecessidade.

DESTAQUE
É prescindível que herdeiro necessário traga à colação o valor correspondente à ocupação e ao uso a título gratuito de imóvel que pertencia ao autor da herança.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, salienta-se que a utilização do imóvel decorre de comodato e a colação restringe-se a bens doados a herdeiros e não a uso e ocupação a título de empréstimo gratuito, razão pela qual não se vislumbra ofensa ao art. 2.002 do Código Civil. Com efeito, não se pode confundir comodato, que é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis, com a doação, mediante a qual uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. Somente a doação tem condão de provocar eventual desequilíbrio entre as quotas-partes atribuídas a cada herdeiro necessário (legítima), importando, por isso, em regra, no adiantamento do que lhe cabe por herança. Já a regra do art. 2.010 do Código Civil dispõe que não virão à colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente, enquanto menor, na sua educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval, assim como as despesas de casamento, ou as feitas no interesse de sua defesa em processo-crime. À luz dessa redação, poderia haver interpretação, a contrario sensu, de que quaisquer outras liberalidades recebidas pelos descendentes deveriam ser trazidas à colação. No entanto, o empréstimo gratuito não pode ser considerado “gasto não ordinário”, na medida em que a autora da herança nada despendeu em favor de uma das herdeiras a fim de justificar a necessidade de colação.

 

 

PROCESSO REsp 1.742.246-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019

TEMA: Responsabilidade civil de advogado. Ato praticado exclusivamente pelo substabelecido. Responsabilidade do substabelecente. Culpa in eligendo. Inexistência. Necessidade de circunstância contemporânea à escolha e de conhecimento do substabelecente.

DESTAQUE
O advogado substabelecente somente irá responder por ato ilícito cometido pelo advogado substabelecido se ficar evidenciado que, no momento da escolha, a despeito de possuir inequívoca ciência acerca da inidoneidade do aludido causídico, ainda assim o elegeu para o desempenho do mandato.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se o advogado substabelecente (mantidos os seus poderes) responsabiliza-se solidariamente pelos prejuízos causados a cliente por ato ilícito praticado unicamente pela causídica substabelecida, que deixou de lhe repassar os valores recebidos em razão de acordo, por ela subscrito, realizado entre as partes, o qual pôs fim à demanda. Dos termos do § 2º do art. 667 do Código Civil, ressai que, em regra, na hipótese de haver autorização para substabelecer, o mandatário não responde pelos atos praticados pelo substabelecido que venham causar danos ao mandante, salvo se for comprovada a sua culpa in eligendo, que se dá no caso de o mandatário proceder a uma má escolha do substabelecido, recaindo sobre pessoa que não possui capacidade legal (geral ou específica), condição técnica ou idoneidade para desempenhar os poderes a ela transferidos. A culpa in eligendo resta configurada, ainda, se o substabelecente negligenciar orientações ou conferir instruções deficientes ao substabelecido, subtraindo-lhe as condições necessárias para o bom desempenho do mandato. De suma relevância anotar que, para o reconhecimento da culpa in eligendo do substabelecente, é indispensável que este, no momento da escolha, tenha inequívoca ciência a respeito da ausência de capacidade legal, de condição técnica ou de idoneidade do substabelecido para o exercício do mandato. Ademais, não se olvida que o substabelecimento, em especial o com reserva de poderes, evidencia, naturalmente, a existência, entre as partes envolvidas (substabelecente e substabelecido), de uma relação calcada, minimamente, na confiança. Todavia, essa relação prévia, por si, não é suficiente para vincular o substabelecente, a ponto de responsabilizá-lo por atos praticados pelo substabelecido que venham a desbordar dos poderes transferidos, a revelar sua inaptidão para o exercício do mandato. Entendimento contrário redundaria, por óbvio, em todos os casos, na responsabilidade solidária entre mandatário e substabelecido pelos atos perpetrados por esse último, imputação objetiva que não encontra nenhum amparo legal.

 

PROCESSO REsp 1.749.954-RO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 26/02/2019, DJe 15/03/2019

TEMA: Acidente de trânsito. Condução de motocicleta sob estado de embriaguez. Presunção de culpabilidade do infrator. Responsabilidade civil. Configuração. Inversão do ônus probatório. Cabimento.

DESTAQUE
Em ação destinada a apurar a responsabilidade civil decorrente de acidente de trânsito, presume-se culpado o condutor de veículo automotor que se encontra em estado de embriaguez, cabendo-lhe o ônus de comprovar a ocorrência de alguma excludente do nexo de causalidade.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, consigna-se que as responsabilidades administrativa e criminal, autônomas entre si, não se confundem com a responsabilidade civil advinda de acidente de trânsito. Porém, é inegável que a inobservância de regra administrativa de trânsito ou a prática de crime de trânsito pode repercutir na responsabilização civil, na medida em que a correlata conduta evidencia um comportamento absolutamente vedado pelo ordenamento jurídico, contrário às regras impostas. Efetivamente, a inobservância das normas de trânsito pode repercutir na responsabilização civil do infrator, a caracterizar a sua culpa presumida se tal comportamento representar, objetivamente, o comprometimento da segurança do trânsito na produção do evento danoso em exame. É preciso ressalvar que não é todo e qualquer comportamento contrário às normas de trânsito que repercute na apuração da responsabilidade civil. A caracterização da culpa presumida se dá quando o comportamento se revela idôneo a causar o acidente no caso concreto, hipótese em que, diante da inversão do ônus probatório operado, caberá ao transgressor comprovar a ocorrência de alguma excludente do nexo de causalidade, tal como a culpa ou fato exclusivo da vítima, a culpa ou fato exclusivo de terceiro, o caso fortuito ou a força maior. Assim, é indiscutível que a condução de veículo em estado de embriaguez, por si, representa gravíssimo descumprimento do dever de cuidado e de segurança no trânsito, na medida em que o consumo de álcool compromete as faculdades psicomotoras, com significativa diminuição dos reflexos; enseja a perda de autocrítica, o que faz com que o condutor subestime os riscos ou os ignore completamente; promove alterações na percepção da realidade; enseja déficit de atenção; afeta os processos sensoriais; prejudica o julgamento e o tempo das tomadas de decisão; entre outros efeitos que inviabilizam a condução de veículo automotor de forma segura, trazendo riscos, não apenas a si, mas, também aos demais agentes que atuam no trânsito, notadamente aos pedestres, que, por determinação legal (§ 2º do art. 29 do CTB), merecem maior proteção e cuidado dos demais.

 

 

PROCESSO REsp 1.770.358-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019

TEMA: Contrato de consórcio. Seguro prestamista contratado. Falecimento de consorciado. Liberação imediata da carta de crédito à beneficiária.

DESTAQUE
A beneficiária do consorciado falecido tem direito à liberação imediata da carta de crédito, em razão da quitação do saldo devedor pelo seguro prestamista contratado, independentemente da efetiva contemplação ou do encerramento do grupo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O contrato de consórcio é instrumento que, firmado pelo consorciado e pela administradora, cria vínculo jurídico obrigacional entre as partes e pelo qual o consorciado formaliza o seu ingresso em grupo de consórcio, estando nele expressas as condições da operação. Em certas hipóteses, há a previsão adicional de contratação de seguro com cobertura para o evento morte, denominado seguro prestamista, como garantia à própria família do consorciado segurado. É certo que a Lei n. 11.795/2008, embora disponha sobre o sistema de consórcio, não trouxe previsão específica acerca da situação de falecimento do consorciado que aderiu ao pacto prestamista, tampouco da possibilidade de o(s) beneficiário(s) fazer(em) jus ao recebimento da carta de crédito quando da ocorrência de fatídico evento. Vale frisar que a referida lei delegou ao Banco Central do Brasil – órgão regulador e fiscalizador das operações do segmento – a competência para disciplinar normas suplementares. Ocorre que, quanto a tal situação específica, tampouco houve qualquer normatização por parte do BACEN. Para solucionar a celeuma, indispensável, portanto, que se averigue a dimensão social do consórcio à luz da cláusula geral da função social do contrato, conciliando-se o bem comum pretendido – qual seja, a aquisição de bens ou serviços por todos os consorciados – e a dignidade de cada integrante do núcleo de obrigações financeiras (perante o grupo consorcial) absorvidas pela própria seguradora, quando do adimplemento do saldo devedor remanescente. Com efeito, e amparando-se na própria função social do contrato, se existe previsão contratual de seguro prestamista vinculado ao contrato de consórcio, não há lógica em se exigir que o beneficiário aguarde a contemplação do consorciado falecido ou o encerramento do grupo para o recebimento da carta de crédito, uma vez que houve a liquidação antecipada da dívida (saldo devedor) pela seguradora, não importando em qualquer desequilíbrio econômico-financeiro ao grupo consorcial. Ressalte-se que estaria configurado o próprio enriquecimento sem causa a disponibilização de todo o valor da cota do falecido ao grupo consorcial, sem a devida contraprestação por parte deste.

 

 

DIREITO DO CONSUMIDOR

PROCESSO REsp 1.717.111-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA Prestação de serviços de hotelaria. Período da diária (24 horas). Lei n. 11.771/2008 e Decreto n. 3.781/2010. Horários diversos de check-in e check-out. Legalidade.

DESTAQUE
Não é abusiva a cobrança de uma diária completa de 24 horas em hotéis que adotam a prática de check-in às 15:00h e de check-out às 12:00h do dia de término da hospedagem.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente cumpre salientar que a interpretação literal do enunciado normativo do § 4º do art. 23 da Lei n. 11.771/2008 (Lei Nacional de Turismo), ou mesmo do art. 25 do Decreto n. 7.380/2010, conduziria à conclusão de que a diária de um hotel ou qualquer outro estabelecimento congênere de hospedagem em unidades mobiliadas consubstancia período de 24 horas entre a entrada e saída do hóspede. Contudo, uma interpretação razoável tem em conta, notadamente, a boa-fé do fornecedor, a razoabilidade no estabelecimento de um período de tolerância para a entrada do novo hóspede no apartamento por ele reservado e os usos e costumes do serviço prestado ao mercado consumidor. Natural a previsão pelo estabelecimento hoteleiro, para permitir a organização de sua atividade e prestação de serviços com a qualidade esperada pelo mercado consumidor, de um período entre o check-out do anterior ocupante da unidade habitacional e o check-in do próximo hóspede, inexistindo ilegalidade ou abusividade a ser objeto de controle pelo Poder Judiciário. Ademais, a prática comercial do horário de check-in não constitui propriamente um termo inicial do contrato de hospedagem, mas uma prévia advertência de que o quarto poderá não estar disponível ao hóspede antes de determinado horário. Assim, a fixação de horários diversos de check-in (15:00hs) e check-out (12:00hs) atende a interesses legítimos do consumidor e do prestador dos serviços de hospedagem, espelhando antiga prática amplamente aceita dentro e fora do Brasil.

 

 

PROCESSO REsp 1.737.428-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA: Espetáculos culturais. Aquisição de ingressos na internet. Cobrança de taxa de conveniência. Venda casada indireta. Prática abusiva. Configuração.

DESTAQUE
É abusiva a venda de ingressos em meio virtual (internet) vinculada a uma única intermediadora e mediante o pagamento de taxa de conveniência.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Salienta-se preliminarmente que a venda casada “às avessas”, indireta ou dissimulada consiste em se admitir uma conduta de consumo intimamente relacionada a um produto ou serviço, mas cujo exercício, é restringido à única opção oferecida pelo próprio fornecedor, limitando, assim, a liberdade de escolha do consumidor. A venda pela internet, que alcança interessados em número infinitamente superior do que a venda por meio presencial, privilegia os interesses dos produtores e promotores do espetáculo cultural de terem, no menor prazo possível, vendidos os espaços destinados ao público e realizado o retorno dos investimentos até então empregados. Ademais, a fim de preservar a boa-fé e a liberdade contratual dos consumidores, os produtores e promotores do espetáculo cultural, ao optarem por submeter os ingressos à venda terceirizada em meio virtual (da internet), devem oferecer ao consumidor diversas opções de compra em diversos sítios eletrônicos, caso contrário, a liberdade dos consumidores de escolha da intermediadora da compra é cerceada, de modo a ficar configurada a venda casada, ainda que em sua modalidade indireta ou “às avessas”, nos termos do art. 39, I e IX, do CDC. Além disso, é fictícia a liberdade do consumidor em optar pela aquisição virtual ou pela presencial, ante a uma acentuada diferença de benefícios entre essas duas opções: ou o consumidor adquire seu ingresso por meio virtual e se submete à cobrança da taxa, tendo ainda que pagar uma nova taxa para receber o ingresso em seu domicílio; ou, a despeito de residir ou não na cidade em que será realizado o espetáculo cultural, adquire o ingresso de forma presencial, correndo o risco de que todos os ingressos já tenham sido vendidos em meio virtual, enfrentando filas e deslocamentos. Assim, não fosse a restrição da liberdade contratual bastante para macular a validade da cobrança da taxa de conveniência, por violação da boa-fé objetiva, esses fatores adicionais agora enumerados também têm o condão de modificar substancialmente o cálculo da proporcionalidade das prestações envolvidas no contrato, não sendo mais possível vislumbrar o equilíbrio pretendido pelas partes no momento da contratação ou eventual vantagem ao consumidor com o oferecimento conjunto dos serviços. Por fim, o serviço de intermediação apresenta mais uma peculiaridade: a de que não há declaração clara e destacada de que o consumidor está assumindo um débito que é de responsabilidade do incumbente – produtor ou promotor do espetáculo cultural – não se podendo, nesses termos, reconhecer a validade da transferência do encargo (assunção de dívida pelo consumidor). Verifica-se, portanto, da soma desses fatores, o desequilíbrio do “contrato, tornando-o desvantajoso ao consumidor enquanto confere vantagem sem correspectivo (sem “sinalagma”, do grego, câmbio) ao fornecedor”, o que também acaba por vulnerar o princípio da vedação à lesão enorme, previsto nos arts. 39, V, e 51, IV, do CDC. Desse modo, deve ser reconhecida a abusividade da prática da venda casada imposta ao consumidor em prestação manifestamente desproporcional, devendo ser admitido que a remuneração da intermediadora da venda, mediante a taxa de conveniência, deveria ser de responsabilidade das promotores e produtores de espetáculos culturais, verdadeiros beneficiários do modelo de negócio escolhido.

 

DIREITO FALIMENTAR

PROCESSO REsp 1.634.844-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA: Plano de recuperação judicial. Criação de subclasses. Possibilidade. Parâmetros objetivos. Credores com interesses homogêneos.

DESTAQUE:
É possível a criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial, desde que estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a anulação de direitos de eventuais credores isolados.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR:
A Lei n. 11.101/2005, consagra o princípio da paridade entre credores. Apesar de se tratar de um princípio norteador da falência, momento em que o patrimônio do falido será vendido e o produto utilizado para o pagamento dos credores na ordem estabelecida na lei (realização do ativo para o pagamento do passivo), seus reflexos se irradiam na recuperação judicial, permitindo o controle de legalidade do plano de recuperação sob essa perspectiva. Na recuperação judicial, não há realização do ativo para o pagamento dos credores. Em regra, todos os credores serão pagos. Diante disso, o princípio da paridade se aplica “no que couber”, como declara o Enunciado nº 81 da II Jornada de Direito Comercial. Significa dizer que deve haver tratamento igualitário entre os credores, mas que pode ocorrer o estabelecimento de distinções entre integrantes de uma mesma classe com interesses semelhantes. Tal fato se justifica pela constatação de que as classes de credores, especialmente a de quirografários, reúnem credores com interesses bastante heterogêneos: credores financeiros, fornecedores em geral, fornecedores dos quais depende a continuidade da atividade econômica, credores eventuais, créditos com privilégio geral, entre outros. Nesse contexto, a divisão em subclasses deve se pautar pelo estabelecimento de um critério objetivo, abrangendo credores com interesses homogêneos, com a clara justificativa de sua adoção no plano de recuperação. Essa providência busca garantir a lisura na votação do plano, afastando a possibilidade de que a recuperanda direcione a votação com a estipulação de privilégios em favor de credores suficientes para a aprovação do plano, dissociados da finalidade da recuperação judicial. Vale lembrar, no ponto, que a recuperação judicial busca a negociação coletiva e não individual, reunindo os credores para tentar a superação das dificuldades econômicas da empresa. Outro ponto que deve ser objeto de atenção é evitar que credores isolados, com realidades específicas, tenham seu direito de crédito anulado com a criação de subclasses.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO REsp 1.574.008-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA: Empresa Brasileira de Correios e Telegráfos – ECT. Prerrogativa de intimação pessoal. Inaplicabilidade. Sistema PJE. Cadastro do advogado feito em nome próprio. Intimação. Validade.

DESTAQUE
É valida a intimação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT realizada na pessoa do advogado cadastrado no sistema PJe.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, convém salientar que o art. 12 do Decreto-Lei n. 509/1969 atribui à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) os privilégios concedidos à Fazenda Pública no concernente, dentre outros, a foro, prazos e custas processuais. Nessa linha, o STF firmou o entendimento, a partir do julgamento do RE 220.907/RO (Segunda Turma, julgado em 12/06/2001, DJ de 31/08/2001), no sentido de que a ECT é empresa pública, prestadora de serviço público, que integra o conceito de Fazenda Pública. No entanto, o art. 12 do Decreto-Lei n. 509/69 não faz qualquer referência à prerrogativa de intimação pessoal quando trata dos “privilégios” concedidos à Fazenda Pública estendidos à ECT. Nessa toada, há de ser salientado que a ECT não é representada judicialmente por órgão da Advocacia Pública, a quem a lei determina seja a intimação realizada pessoalmente, por carga, remessa ou meio eletrônico. Ademais, em se tratando de processo eletrônico, prevê o § 6º do art. 5º da Lei n. 11.419/2006 que as intimações feitas na forma do referido artigo, inclusive da Fazenda Pública, serão consideradas pessoais para todos os efeitos legais. É dizer, a intimação por meio eletrônico aos devida e previamente cadastrados – nos termos do art. 2º da mesma lei – é tida como pessoal e se considera realizada no dia em que efetivada a consulta eletrônica ao seu teor ou no dia em que escoado o prazo de 10 dias corridos para fazê-lo. Logo, se o advogado, no momento em que ajuizou a ação, fez o cadastro em nome próprio, não pode, posteriormente, alegar a nulidade da intimação realizada na sua pessoa, e não na da entidade que representa, para se eximir da responsabilidade de acompanhar o andamento do processo, a partir da consulta assídua ao sistema PJe.

 

 

PROCESSO REsp 1.724.453-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019

TEMA: Agravo de instrumento. Art. 1.015, VII, do CPC/2015. Pedido de exclusão de litisconsorte. Decisão interlocutória de indeferimento. Irrecorribilidade imediata.

DESTAQUE
Não cabe agravo de instrumento contra decisão de indeferimento do pedido de exclusão de litisconsorte.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O propósito recursal é definir se o conceito de “decisões interlocutórias que versarem sobre exclusão de litisconsorte”, previsto no art. 1.015, VII, do CPC/2015, abrange somente a decisão que determina a exclusão do litisconsorte ou se abrange também a decisão que indefere o pedido de exclusão. Inicialmente, destaque-se que o CPC/2015 disciplinou, de modo específico, sobre os vícios de que padecerão as sentenças proferidas sem a integração de um litisconsorte: (i) na hipótese de litisconsórcio necessário e unitário, a sentença é nula (art. 115, I); (ii) na hipótese de litisconsórcio necessário e simples, a sentença será ineficaz em relação aos que não foram citados (art. 115, II); (iii) e, em ambas as situações, o não atendimento da ordem judicial que determina a integração do polo passivo para a inclusão dos litisconsortes necessários faltantes acarretará a extinção do processo (art. 115, parágrafo único). Justamente porque a errônea exclusão de um litisconsorte é capaz de invalidar a sentença de mérito, inclusive porque à parte excluída deveria ser facultada a ampla participação na atividade instrutória, é que se admite que a decisão interlocutória com esse conteúdo seja, desde logo, reexaminada pelo tribunal, antes da sentença. Essa é a razão de existir do art. 1.015, VII, do CPC/2015. Todavia, não se verifica a mesma consequência jurídica quando se examina a decisão interlocutória que rejeita excluir o litisconsorte. A manutenção, no processo, de uma parte alegadamente ilegítima não fulmina a sentença de mérito nele proferida, podendo o tribunal, por ocasião do julgamento do recurso de apelação, reconhecer a ilegitimidade da parte e, então, exclui-la do processo. Por mais que o texto legal seja amplo e genérico – realmente, o conceito de “versar sobre” previsto no art. 1.015, caput, do CPC/2015, é bastante elástico e comporta debate sobre a sua real abrangência – a boa hermenêutica não autoriza que se coloque, na mesma hipótese, questões assentadas em premissas teóricas distintas ou que sejam ontologicamente diferentes. Nesse aspecto, sublinhe-se que ambas as decisões interlocutórias poderão ser reexaminadas pelo tribunal, diferenciando-se o momento em que a parte poderá exercer o direito de recorrer (na exclusão, imediatamente por agravo; na manutenção, posteriormente por apelação), o que é lícito, legítimo e justificável. O regime recursal diferenciado criado pelo legislador na hipótese se assentou em razão de um aspecto objetivo da controvérsia (maior gravidade do ato que exclui o litisconsorte em relação ao ato que o mantém). Ademais, quando quis, o CPC/2015 expressamente estabeleceu o cabimento recursal para a hipótese de acolhimento e de rejeição do requerimento da parte, como se verifica, por exemplo, no art. 1.015, IX, que expressamente prevê a recorribilidade imediata da decisão interlocutória que versar sobre a admissão e também sobre a inadmissão de intervenção de terceiros.

 

 

PROCESSO REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019

TEMA: Agravo de instrumento. Art. 1.015, I, do CPC/2015. Decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória para fins de recorribilidade imediata. Abrangência.

DESTAQUE
O conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória” previsto no art. 1.015, I, do CPC/2015, abrange as decisões que examinam a presença ou não dos pressupostos que justificam o deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela provisória e, também, as decisões que dizem respeito ao prazo e ao modo de cumprimento da tutela, a adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela provisória e, ainda, a necessidade ou dispensa de garantias para a concessão, revogação ou alteração da tutela provisória.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O art. 1.015, I, do CPC/2015 (“decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória”) deve ser lido e interpretado como uma cláusula de cabimento de amplo espectro, de modo a permitir a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias que digam respeito não apenas ao núcleo essencial da tutela provisória, mas também que se refiram aos aspectos acessórios que estão umbilicalmente vinculados a ela, porque, em todas essas situações, há urgência que justifique o imediato reexame da questão em 2º grau de jurisdição. Isso não significa dizer, todavia, que absolutamente toda e qualquer questão relacionada ao cumprimento, operacionalização ou implementação fática da tutela provisória se enquadre no conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória e, consequentemente, possa ser impugnada de imediato pelo agravo de instrumento. Como exemplo: a necessidade de recolhimento de taxas, despesas ou custas para a implementação da medida deferida. Tais providências, não se relacionam, direta e nem mesmo indiretamente, com a tutela provisória objeto da decisão interlocutória impugnável, mas sim, com a execução, operacionalização e implementação fática da providência que já foi requerida e obtida, descabendo discutir, em âmbito de tutela provisória, a questão relacionada ao fato de a parte beneficiária da tutela arcar com as despesas e, ao final, ser ressarcida pelo vencido, inclusive como decorrência lógica da necessidade de plena reintegração que permeia a tutela jurisdicional efetiva.

 

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO MARCÁRIO

PROCESSO REsp 1.775.812-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019

TEMA: Reconvenção. Pedido de nulidade de registros de marca sob o mesmo fundamento da defesa. Posição processual do INPI. Litisconsórcio sui generis. Legitimidade recursal. Aferição para cada ato.

DESTAQUE
O INPI possui legitimidade para recorrer de decisão que extinguiu, sem resolução de mérito, reconvenção apresentada por litisconsorte passivo, na qual se veiculou pedido de nulidade de registro de marca.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Nos termos do art. 175, caput, da Lei n. 9.279/1996, o INPI deve intervir nas ações anulatórias de registro. A participação do INPI, entretanto, não lhe impõe a defesa do ato concessivo do registro por ele praticado. Ao contrário, o interesse jurídico do INPI se distingue do interesse individual de ambas as partes, tendo por objetivo último a proteção da concorrência e do consumidor, direitos essencialmente transindividuais, o que atrai certo temperamento das regras processuais tradicionais da defesa de direitos individuais. Por essa razão, a legitimidade ad causam do INPI, bem como todas as demais situações processuais, dependerá de exame casuístico e particularizado, não se resolvendo por meio da simples aplicação de conceitos consolidados. Nesse sentido, a doutrina moderna vem ressaltando que a apreciação da legitimidade, embora não se tenha libertado da avaliação inicial in status assertionis, deve também levar em consideração as “zonas de interesse” dos sujeitos litigantes, que ora se contrapõem, ora se coincidem e ora se complementam pela atuação baseada sobretudo num interesse social ou público. Desse modo, para além de uma legitimidade ad causam, verificável ab initio, há que se reconhecer uma legitimidade móvel refletida na prática dos atos processuais adequados e necessários à defesa de sua “zona de interesse”. A Terceira Turma do STJ já se posicionou no sentido de que o INPI desempenha função própria, mediante intervenção sui generis, nos processos de anulação de registro de marca. Em face disso, nem sempre se comportará como litisconsorte passivo, devendo a sua legitimidade e os consectários da sua atuação processual tomarem em consideração a função efetivamente exercida no caso concreto. Daí se extrai que, sobrevindo ação anulatória de registro, mesmo que o ente estatal não fosse parte na demanda originária, seria impositiva sua participação, podendo, após sua integração no polo passivo da demanda, reposicionar-se em qualquer um dos polos da reconvenção. Essa imposição de intervenção, além de não inviabilizar, por si só, a utilização do instituto da reconvenção, legitima o INPI a impugnar a sentença que a extingue, com ou sem resolução de mérito, e qualquer que tenha sido o resultado do julgamento, devendo o interesse recursal ser avaliado sob a perspectiva da atuação concreta do INPI ao longo da tramitação da reconvenção.

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