sexta-feira,19 abril 2024
TribunaisInformativo STF nº 954

Informativo STF nº 954

Informativo STF nº 954 – data de divulgação: 30 a 04 de outubro 2019.

SUMÁRIO
Plenário
Delatado e direito de falar por último – 2
Falta de prestação de contas e suspensão automática do registro ou anotação de órgão partidário
Resolução do Senado Federal: operação de crédito e cessão de dívida ativa a bancos – 2
Controle de serviços jurídicos da administração pública estadual indireta
Competência legislativa e denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações
1ª Turma
Crime de estupro e “beijo lascivo” – 3
Expulsão de estrangeiro que possui filho brasileiro
Uso de algemas e fundamentação

PLENÁRIO

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Delatado e direito de falar por último – 2 –

Em continuidade de julgamento, o Plenário, por maioria, concedeu ordem de habeas corpus para anular decisão do juízo de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à fase de alegações finais, a qual deverá seguir a ordem constitucional sucessiva, ou seja, primeiro a acusação, depois o delator e por fim o delatado (Informativo 953).
O paciente foi denunciado em primeiro grau pela suposta prática dos crimes de organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo a denúncia, na qualidade de gerente da Petrobras, ele teria recebido, em conjunto com outros acusados, grande soma de dinheiro, a título de vantagem indevida, como contrapartida decorrente de favorecimentos concedidos a empresas em contratos firmados com a referida estatal, especialmente no que toca à construção de terminal aquaviário. Parte desses valores teria sido repassada ao paciente mediante atos de lavagem, inclusive com posterior adoção de medidas tendentes à reintegração de recursos.

O paciente foi citado nas declarações prestadas por corréu que celebrou acordo de colaboração premiada.

Apontava a defesa que, em sede de interrogatório, o juízo de primeiro grau assegurou que os acusados colaboradores fossem inquiridos em momento anterior aos corréus delatados. Encerrada a instrução processual, o juízo conferiu prazo comum a todos os acusados para fins de apresentação de alegações finais, não fazendo distinção entre colaboradores e não colaboradores.

O Tribunal entendeu que o reconhecimento do direito à última palavra atribuída ao réu significa a consagração da garantia constitucional do due process of law no âmbito do processo penal instaurado sob uma ordem constitucional de perfil democrático.

Essa essencial prerrogativa consiste em assegurar ao réu, notadamente ao réu delatado por seu litisconsorte passivo, a possibilidade de pronunciar-se por último, após o órgão da acusação estatal e depois do agente colaborador, quando esse intervier como corréu, no processo penal condenatório, em ordem a permitir, ao delatado, o direito de refutar, o direito de contestar, o direito de impugnar, o direito de contra-argumentar todas as alegações incriminadoras contra ele deduzidas, para que, desse modo, sejam efetivamente respeitados, em favor do acusado, o direito ao contraditório e à ampla defesa que lhes são garantidos pela própria Constituição.

A denegação ao réu delatado da possibilidade de apresentar suas alegações finais, após o prazo concedido ao agente colaborador, equivale à supressão do seu direito de defesa, porque transgride aquilo que lhe é essencial à plenitude de sua prática, e configura, na espécie, hipótese caracterizadora de prejuízo efetivo e real para o acusado em questão.

Considerou que constitui verdadeiro obstáculo judicial ao exercício do contraditório e da ampla defesa a concessão de prazo comum a todos os litisconsortes penais passivos, os quais figurem, simultaneamente, numa mesma relação processual penal, agentes colaboradores e corréus por estes delatados.

Portanto, traduz solução hermenêutica mais compatível com os postulados que informam o estatuto constitucional do direito de defesa a prerrogativa do réu delatado de produzir suas alegações finais após a apresentação de memoriais ou de alegações finais do litisconsorte penal passivo que, mediante colaboração premiada, o incriminou.

Por fim, registrou que, somente se a delação efetivamente tiver auxiliado na obtenção de provas que permitam a condenação do delatado, é que o delator terá direito ao que foi acordado com o ministério público e com a polícia. Dessa forma, resta evidente que o interesse processual do delator é absolutamente oposto ao do delatado, uma vez que o delator não tem mais interesse em se defender, pois, ao fazer o acordo, assume a sua culpabilidade com diminuição da pena ou até mesmo ausência total de pena em troca das informações prestadas.

Vencidos os ministros Edson Fachin (relator), Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Marco Aurélio, que denegaram o habeas corpus.

O ministro Edson Fachin observou que a legislação não disciplinou imposição de ordem de colheita das argumentações de cada defesa, tampouco potencializou, para esse escopo, eventual adoção, ou não, de postura colaborativa. A lei processual diferencia expressamente os momentos de manifestação do ministério público, do assistente do ministério público e da defesa. Não distingue, entretanto, o momento de participação entre as defesas em razão de eventual adoção de postura colaborativa por parte de acusados. A observância de prazo comum para colheita de alegações finais dos acusados colaboradores e não colaboradores não configura constrangimento ilegal.

Segundo o ministro Roberto Barroso, o impetrante não trouxe um argumento objetivo sequer para demonstrar o prejuízo que teria sofrido. Reputou que a falta de concessão de prazo sucessivo para apresentação de alegações finais entre corréus, colaboradores e não colaboradores, não viola os princípios do contraditório e da ampla defesa

O ministro Luiz Fux aduziu que, no campo do Direito Público, só se pode fazer aquilo que está previsto em lei e não há previsão legal no sentido de que o delatado fala depois do delator. Para o ministro Fux, não há razão lógica de o delatado, que acompanhou todo o processo, desde a sua fase preambular, ter o direito de falar depois do delator. Ademais, o delator e o delatado são corréus e figuram no polo passivo da relação processual. Jamais poderiam ser assistentes de acusação.

A ministra Cármen Lúcia entendeu que o caso seria de nulidade relativa que, portanto, deveria ser arguida na primeira oportunidade. Além disso, seria necessária a demonstração do prejuízo, o que não foi feito pelo impetrante.

O ministro Marco Aurélio asseverou que, consideradas as partes do processo-crime, tem-se unicamente o ministério público a acusar, e o réu ou os réus a se defenderem. A adoção, por corréu, de postura colaborativa não o destitui da posição de acusado, tampouco viabiliza, ausente previsão legal, a distinção de prazos para a apresentação de alegações finais.

Ato contínuo, o ministro Dias Toffoli (Presidente) propôs à Corte a fixação de tese no caso em julgamento. O colegiado, por decisão majoritária, deliberou positivamente sobre a formulação de tese em relação ao tema discutido e votado no writ.

Vencidos, no ponto, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a adoção da tese implica modulação e requer oito votos. O ministro Marco Aurélio entendeu que não cabe a edição de tese, de modo a transformar processo subjetivo em processo objetivo.

Em seguida, o julgamento foi suspenso para fixação da tese em assentada posterior.

CPP: “Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença.”

HC 166373/PR, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 2.10.2019. (HC-166373)

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Falta de prestação de contas e suspensão automática do registro ou anotação de órgão partidário –

O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra dispositivos das Resoluções 23.432/2014, 23.546/2017 e 23.571/2018 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As normas impugnadas, ao regulamentarem a Lei 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos), estabelecem a sanção de suspensão automática do registro ou anotação de órgão partidário estadual ou municipal por falta de prestação de contas.
O ministro Gilmar Mendes (relator) converteu o julgamento do referendo da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito e julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta para conferir interpretação conforme a Constituição às normas do art. 47, caput, § 2º, da Resolução 23.432/2014; do art. 48, caput e § 2º, da Resolução 23.546/2017; e do art. 42, caput, da Resolução 23.571/2018. Afastou qualquer interpretação que permita que a sanção de suspensão do registro ou anotação do órgão partidário regional ou municipal seja aplicada de forma automática, como consequência da decisão que julga as contas não prestadas, assegurando que a penalidade somente possa incidir após decisão, com trânsito em julgado, decorrente de procedimento específico de suspensão de registro, nos termos do art. 28 da Lei 9.096/1995 (1).

Entendeu que as normas impugnadas, ao determinarem a suspensão do registro ou a anotação do partido como consequência imediata do julgamento das contas, violam o devido processo legal.

Segundo o relator, a legislação eleitoral prevê um procedimento específico para o cancelamento do registro em relação ao partido em âmbito nacional. Por questão de coerência, relativamente aos órgãos regionais ou municipais, consequência análoga deve ser precedida de processo específico em que se possibilite o contraditório e a ampla defesa.

Esclareceu que não permitir a suspensão do órgão regional ou municipal que omita a prestação de contas da Justiça Eleitoral abre uma lacuna no sistema eleitoral e inviabiliza a fiscalização desses órgãos de direção partidária, o que acarreta riscos para a própria democracia. Entretanto, é necessário compatibilizar as diversas normas incidentes sobre o dever dos partidos políticos de prestar contas em todos os níveis de direção partidária, de modo a concluir que a suspensão do órgão regional ou municipal por decisão da Justiça Eleitoral só poderá ocorrer após o citado processo específico.

Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos.

(1) Lei 9.096/1995: “Art. 28. O Tribunal Superior Eleitoral, após trânsito em julgado de decisão, determina o cancelamento do registro civil e do estatuto do partido contra o qual fique provado: I – ter recebido ou estar recebendo recursos financeiros de procedência estrangeira; II – estar subordinado a entidade ou governo estrangeiros; III – não ter prestado, nos termos desta Lei, as devidas contas à Justiça Eleitoral; IV – que mantém organização paramilitar.”

ADI 6032 MC-Ref/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 2.10.2019. (ADI-6032)

DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA

Resolução do Senado Federal: operação de crédito e cessão de dívida ativa a bancos – 2 –

O Plenário, por maioria, julgou procedentes os pedidos formulados em ações diretas para declarar a inconstitucionalidade da Resolução 33/2006 do Senado Federal, por meio da qual se autorizou estados, Distrito Federal e municípios a transferirem a cobrança de suas dívidas ativas, por meio de endossos-mandatos, a instituições financeiras (Informativo 906).
Inicialmente, o Tribunal considerou que as associações requerentes cumprem o requisito da pertinência temática, pois o ato impugnado legislou sobre cobrança da dívida ativa tributária, matéria incluída nas funções dos procuradores de estado e fiscais de tributos estaduais.

No mérito, entendeu que a resolução impugnada atuou fora dos limites da capacidade normativa cometida ao Senado Federal pelo art. 52, VII (1), da Constituição Federal (CF).

Segundo esse dispositivo, compete privativamente ao Senado dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo poder público federal.

O conceito constitucional de operação de crédito, ainda que por antecipação de receita, deve estar em consonância com a definição prevista no art. 29, III (2), da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

No entanto, a cessão a instituições financeiras, por endosso-mandato, de valores inscritos em dívida ativa estatal não caracteriza nenhuma das espécies de operação de crédito previstas na legislação complementar. Inexiste correspondência entre o conceito de operação de crédito da LRF e a “cessão” disciplinada pela resolução.

A alteração na forma de cobrança da dívida ativa, tanto tributária quanto não-tributária, demanda tratamento estritamente legal, afastada a competência do Senado para disciplinar a matéria por meio de resolução.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que, de início, não reconheceu a legitimidade das associações requerentes, por falta de pertinência temática. No mérito, votou pela improcedência dos pedidos, por considerar que a cessão de dívida ativa a instituições financeiras é uma operação de crédito, portanto, sujeita à regulamentação senatorial.

(1) CF: “Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (…) VII – dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal. ”
(2) LRF: “Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as seguintes definições: (…) III – operação de crédito: compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros. ”

ADI 3786/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 3.10.2019. (ADI-3786)
ADI 3845/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 3.10.2019. (ADI-3845)

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Controle de serviços jurídicos da administração pública estadual indireta –

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada contra dispositivos da Lei Complementar 226/2002 do Estado de Santa Catarina, a qual confere à Procuradoria-Geral do Estado competência para controlar os serviços jurídicos de entidades da administração estadual indireta, inclusive a representação judicial, com a possibilidade de avocação de processos e litígios judiciais, de empresas públicas e sociedades de economia mista.
O Colegiado declarou a inconstitucionalidade da expressão “sociedades de economia mista e empresas públicas estaduais”, constante dos arts. 1º, 2º, 3º, 4º, VI, 12, caput e parágrafo único, 16, caput e II, e 17, da lei impugnada.

Entendeu que os referidos dispositivos violam o art. 132 da Constituição Federal (CF) (1), que confere às procuradorias dos estados atribuições para as atividades de consultoria jurídica e representação judicial das respectivas unidades federadas, mas apenas relativamente à administração pública direta, autárquica e fundacional.

Asseverou que a lei cria uma ingerência indevida do Governador na administração das empresas públicas e sociedades de economia mista, pessoas jurídicas de direito privado, o que impede a defesa dessas entidades. No ponto, observou que o chefe do poder executivo estadual é quem escolhe o Procurador-Geral do Estado. Num eventual litígio, por exemplo, entre uma sociedade de economia mista e a administração pública direta, o Governador poderia determinar a avocação do processo e defender o seu próprio interesse. Haveria, portanto, partes conflituosas, no mesmo litígio, com o mesmo advogado.

Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux, que julgaram o pleito improcedente.

Consideraram que as empresas públicas e sociedades de economia mista, embora possuam personalidade jurídica de direito privado, constituem instrumentos de ação do Estado para a consecução de interesses públicos. Em decorrência disso, podem ser supervisionadas e representadas judicialmente pela Procuradoria-Geral do Estado.

Esclareceram que o art. 132 da Constituição, ao dispor sobre a advocacia pública dos Estados e do Distrito Federal, não exauriu as suas funções, deixando amplo espaço para a legítima atuação dos poderes constituídos locais. No caso das entidades privadas da Administração Pública, a representação judicial pela Procuradoria-Geral do Estado não é, de fato, impositiva. Entretanto, isso não significa que norma legal que contém essa previsão seja inconstitucional.

(1) CF: “Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.”

ADI 3536/SC, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 2.10.2019. (ADI-3536)

DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

Competência legislativa e denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações –

O Plenário, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário para declarar a constitucionalidade do art. 33, XII, da Lei Orgânica do Município de Sorocaba/SP (1), concedendo-lhe interpretação conforme a Constituição Federal (CF) no sentido da existência de uma coabitação normativa entre os Poderes Executivo (decreto) e Legislativo (lei formal) para o exercício da competência destinada à denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações, cada qual no âmbito de suas atribuições.
Na espécie, tratava-se de recurso extraordinário veiculado nos autos de ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente no tribunal de justiça estadual, que declarou a inconstitucionalidade do aludido preceito, com efeitos ex tunc, por violação ao princípio da separação dos Poderes (Informativo 936).

Preliminarmente, o colegiado reputou ser constitucional a questão debatida e reconheceu a repercussão geral da matéria.

Em seguida, observou ser comum, na maioria das municipalidades, a existência da previsão dúplice de o chefe do Poder Executivo, mediante decreto, e de as câmaras municipais poderem estabelecer nomes de vias e logradouros públicos.

Pontuou que a referida lei orgânica permite essa conciliação. Em nenhum momento, a norma afastou expressamente a iniciativa concorrente para a propositura de projeto de lei a respeito. Logo, deve ser interpretada de maneira a não excluir a competência administrativa do prefeito e a possibilitar às câmaras municipais, por meio de lei formal, a concretização da memorização da história e da proteção do patrimônio cultural imaterial do município, que é assunto de interesse local.

Vencidos os ministros Roberto Barroso e Marco Aurélio, que negaram provimento ao recurso e mantiveram a decisão proferida pelo tribunal de justiça. Consideraram que o mencionado dispositivo subtraiu competência do chefe do Poder Executivo. O ministro Marco Aurélio sublinhou que, da forma como redigido, o preceito exclui a iniciativa do Executivo no tocante à outorga de nome. Por isso, não vislumbrou campo para a interpretação conforme a CF.

(1) Lei Orgânica do Município de Sorocaba: “Art. 33. Cabe à Câmara Municipal, com a sanção do Prefeito, legislar sobre as matérias de competência do Município, especialmente no que se refere ao seguinte: (…) XII – denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações;”

RE 1151237/SP, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 3.10.2019. (RE-1151237)

PRIMEIRA TURMA

DIREITO PENAL – TIPO PENAL
Crime de estupro e “beijo lascivo” – 3 –

A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em habeas corpus no qual se pretendia a desclassificação do delito previsto no art. 217-A do Código Penal (CP) (1) — “estupro de vulnerável” — para a conduta versada no art. 65 da Lei das Contravenções Penais (LCP) (2) (Informativos 870 e 928).
No caso, tratava-se de paciente condenado a oito anos de reclusão pelo delito de estupro de vulnerável com base no caput do art. 217-A do CP. A ação consistiu em ato libidinoso (beijo lascivo) contra vítima de cinco anos de idade.

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes (redator para o acórdão), que considerou que, para determinadas idades, a conotação sexual é uma questão de poder, mais precisamente de abuso de poder e confiança. Entendeu presentes, no caso, a conotação sexual e o abuso de confiança para a prática de ato sexual. Para ele, não há como desclassificar a conduta do paciente para a contravenção de molestamento — que não detém essa conotação.

O ministro Luiz Fux, na linha da divergência iniciada pelo ministro Alexandre de Moraes, denegou o writ, no que foi acompanhado pela ministra Rosa Weber. Acrescentou que o art. 227, § 4º, da Constituição Federal (CF) (3) exige que a lei imponha punição severa à violação da dignidade sexual da criança e do adolescente. Além do mais, a prática de qualquer ato libidinoso diverso ou a conduta de manter conjunção carnal com menor de quatorze anos se subsume, em regra, ao tipo penal de estupro de vulnerável, restando indiferente o consentimento da vítima.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedeu a ordem para enquadrar a conduta do paciente na contravenção penal de molestamento, e o ministro Roberto Barroso, que denegou o habeas corpus, mas concedeu a ordem de ofício para que o juízo de origem aplicasse ao caso o tipo previsto no art. 215-A do CP (4), incluído pela Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018.

(1) CP: “Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.”
(2) LCP: “Art. 65. Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável: Pena – prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.”
(3) CF: “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.”
(4) CP: “Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. ”

HC 134591/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 1.10.2019. (HC-134591)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – HABEAS CORPUS

Expulsão de estrangeiro que possui filho brasileiro –

A Primeira Turma retomou julgamento de habeas corpus em que se discute a possibilidade de aplicação da medida administrativa de expulsão em relação ao estrangeiro que possui filho brasileiro.
Na sessão do dia 2.4.2019, o ministro Marco Aurélio (relator) deferiu a ordem para afastar o ato de expulsão, haja vista ter sido demonstrado que o paciente tem filho brasileiro que está sob sua guarda e dependência.

Na presente assentada, o ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator. Asseverou que, no caso, verifica-se a existência de excepcionalidade a ensejar a superação do Enunciado 691 da Súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) (1), diante da presença, no caso, de requisito negativo impeditivo da expulsão, qual seja, a comprovação da dependência econômica e socioafetiva de filho brasileiro, nos termos da Lei 13.445/2017 (2). Registrou que a nova lei excluiu o critério cronológico do nascimento do filho e passou a exigir a relação socioafetiva e não só econômica.

Em seguida, o ministro Roberto Barroso pediu vista dos autos.

(1) Enunciado 691 da Súmula do STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.”
(2) Lei 13.445/2017: “Art. 55. Não se procederá à expulsão quando: (…) II – o expulsando: a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela;”

HC 150343/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 1.10.2019. (HC-150343)

DIREITO CONSTITUCIONAL – RECLAMAÇÃO

Uso de algemas e fundamentação –

A Primeira Turma iniciou julgamento de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento a reclamação em que se requer a decretação de nulidade de julgamento do tribunal do júri por inobservância do Enunciado 11 da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) (1).
No caso, a juíza de direito presidente do tribunal do júri, durante julgamento em plenário, indeferiu o pleito da defesa de retirada das algemas do reclamante. Determinou que, excepcionalmente, fosse o acusado mantido algemado, na forma do que autoriza o referido verbete sumular, tendo em conta ofício exibido pela escolta do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), o qual justificaria o uso de algemas. O juízo de origem considerou, ainda, que os policiais federais responsáveis pela escolta, quando consultados, afirmaram não poder opinar favoravelmente à retirada das algemas sem ferir o procedimento recomendado pelo órgão a que pertencem, em relação ao réu custodiado em presídio federal de segurança máxima.

O tribunal de justiça local, em sede de apelação, afastou a apontada nulidade. Citou o envolvimento do réu com milícias, bem como seus maus antecedentes e acautelamento em presídio de segurança máxima.

O ministro Alexandre de Moraes (relator) negou provimento ao agravo, no que foi acompanhado pelos ministros Roberto Barroso e Rosa Weber.

O relator entendeu que a juíza de primeiro grau justificou devidamente a manutenção do uso das algemas e que todas as circunstâncias fáticas exigiriam que o acusado estivesse algemado. Destacou que o réu integra milícia, possui extensa folha de antecedentes criminais e foi transferido para presídio de segurança máxima, em virtude da sua alta periculosidade, além da possibilidade de sua fuga ou de seu resgate.

O ministro Roberto Barroso ressaltou, sobretudo, o que consignado pelo tribunal de justiça ao decidir a matéria. Para ele, não se pode desconsiderar o que está nos autos do processo e na decisão do juízo a quo. Salientou que a questão da periculosidade, ou não, do réu, é assunto de polícia e não de juiz. Se a polícia informa que o réu é perigoso, o juiz, que, normalmente, entra em contato com o réu pela primeira vez, tem de confiar na presunção de legitimidade da informação passada pela autoridade policial. Fora dos casos de abuso patente, é preciso dar credibilidade àquele que tem o encargo de zelar pela segurança pública, inclusive no âmbito do tribunal.

O ministro Marco Aurélio, em divergência, votou pelo provimento do agravo para julgar procedente a reclamação.

Considerou que a fundamentação que respaldou a negativa do pleito de retirada das algemas do acusado resultou no desrespeito ao referido verbete sumular. Isso porque a acusação não reflete culpa selada. A defesa requereu que se retirassem as algemas para que os leigos, componentes do corpo de jurados, não vissem o acusado como uma verdadeira fera, já estabelecendo um entendimento antes dos trabalhos no plenário do júri.

Não é o fato de o custodiado ser egresso de prisão de segurança máxima que conduzirá sempre ao uso das algemas em audiência. Há de se apresentar algo concreto, ligado ao caso — não sendo suficiente, para tanto, a folha penal —, que prove que é imprescindível proceder ao julgamento com o acusado algemado.

Em seguida, o ministro Luiz Fux pediu vista dos autos.

(1) Enunciado 11 da Súmula do STF: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”

Rcl 32970 AgR/RJ, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 1.10.2019. (Rcl-32970)

Perfil editorial do Megajurídico, criador e editor de conteúdo.

Receba artigos e notícias do Megajurídico no seu Telegram e fique por dentro de tudo! Basta acessar o canal: https://t.me/megajuridico.
spot_img
spot_img

Mais do(a) autor(a)

spot_img

Seja colunista

Faça parte do time seleto de especialistas que escrevem sobre o direito no Megajuridico®.

spot_img

Últimas

- Publicidade -