sexta-feira,29 março 2024
TribunaisInformativo nº 963 do STF

Informativo nº 963 do STF

Resumo do Informativo nº 963 do STF – data de divulgação: 09 a 13 de dezembro de 2019.

 

SUMÁRIO
Plenário
Lei 8.137/1990, art. 2º, II: não recolhimento de ICMS declarado e tipicidade
Audiência de custódia e espécies de prisão
1ª Turma
Acesso à educação para crianças com deficiência e inércia estatal
Homicídio qualificado e policial rodoviário federal – 2
Ato de CNJ e competência do STF
MS: CNJ e cálculo de precatórios – 2
Arquivamento de procedimento investigatório criminal e submissão ao Poder Judiciário – 2
Redução de alíquota de Imposto de Importação e dever de indenizar – 2

 

PLENÁRIO

DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

Lei 8.137/1990, art. 2º, II: não recolhimento de ICMS declarado e tipicidade –

O Plenário iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus no qual se discute se a conduta de não recolhimento de ICMS próprio, regularmente escriturado e declarado pelo contribuinte, enquadra-se no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências.

Na situação dos autos, sócios e administradores de uma empresa declararam operações de venda ao Fisco, mas deixaram de recolher o ICMS relativamente a diversos períodos. Denunciados pela prática do delito previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, o juízo de primeira instância os absolveu sumariamente por considerar a conduta atípica. Em sede de apelação, o tribunal de justiça local afastou a tese da atipicidade e determinou o regular prosseguimento do processo.

Ato contínuo, a defesa impetrou habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) (HC 399.109). Naquela Corte, a Terceira Seção, por maioria, asseverou ser inviável a absolvição sumária, notadamente quando a denúncia descreve fato que contém a necessária adequação típica e não há excludentes de ilicitude. Salientou-se que eventual dúvida quanto ao dolo de se apropriar deverá ser esclarecida com a instrução criminal. Daí a interposição do presente recurso ordinário, no qual requer seja declarada a ilegalidade do acórdão do tribunal de justiça, com o objetivo de restabelecer a sentença que absolveu sumariamente os denunciados, em virtude da atipicidade formal da conduta que lhes foi imputada.

O ministro Roberto Barroso (relator) negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Edson Fachin, Rosa Weber e Cármen Lúcia.

De início, o relator estabeleceu três premissas, que reputou importantes no equacionamento da matéria: (i) o Direito Penal deve ser sério, igualitário e moderado; (ii) o pagamento de tributos é dever fundamental de todo cidadão, na medida em que ocorra o fato gerador e ele exiba capacidade contributiva; e (iii) o mero inadimplemento tributário não deve ser tido como fato típico criminal, para que seja reconhecida a tipicidade de determinada conduta impende haver um nível de reprovabilidade especial que justifique o tratamento mais gravoso.

Explicitou que o sujeito ativo do crime é o sujeito passivo da obrigação, que, na hipótese do ICMS próprio, é o comerciante. O objeto do delito é o valor do tributo. No caso, a quantia transferida pelo consumidor ao comerciante. O ponto central do dispositivo em apreço é a utilização dos termos “descontado” e “cobrado”. Tributo descontado, não há dúvidas, refere-se aos tributos diretos. Já a expressão “cobrado” abarcaria o contribuinte nos tributos indiretos. Portanto, cobrado significa o tributo que é acrescido ao preço da mercadoria, pago pelo consumidor — contribuinte de fato — ao comerciante, que deve recolhê-lo ao Fisco. O consumidor paga mais caro para que o comerciante recolha o tributo à Fazenda estadual.

O ministro salientou que o valor do ICMS cobrado em cada operação não integra o patrimônio do comerciante, que é depositário desse ingresso de caixa. Entendimento coerente com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 574.706 (Tema 69 da repercussão geral). Oportunidade na qual assentado que o ICMS não integra o patrimônio do sujeito passivo e, consequentemente, não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins.

Dessa maneira, a conduta não equivale a mero inadimplemento tributário, e sim à apropriação indébita tributária. A censurabilidade está em tomar para si valor que não lhe pertence. Para caracterizar o tipo penal, a conduta é composta da cobrança do consumidor e do não recolhimento ao Fisco.

Segundo o relator, além da interpretação textual do preceito, a interpretação histórica também conduz à tipicidade da conduta. Na redação apresentada em substitutivo ao projeto de lei original, tratava-se, em incisos separados, a hipótese de retenção e não recolhimento e a hipótese de cobrança no preço e não recolhimento. No texto final aprovado, o dispositivo foi compactado sem a modificação do sentido da norma. Fundiu os dois incisos em um só e dispôs os termos “descontado”, para o tributo retido na fonte, e “cobrado”, para o incluído no preço.

De igual modo, a análise do direito comparado reforça essa compreensão. Em outras partes do mundo, os delitos tributários inclusive são punidos de forma mais severa. O relator lembrou que a Primeira Turma do STF concedeu pedido de extradição fundado em tipo penal análogo (Ext 1.139) e que o STF já reconheceu a constitucionalidade do tipo penal em debate (ARE 999.425, Tema 937 da repercussão geral).

Ao versar sobre a interpretação teleológica, o ministro observou que são financiados, com a arrecadação de tributos, direitos fundamentais, serviços públicos, consecução de objetivos da República. No país, o ICMS é o tributo mais sonegado e a principal fonte de receita própria dos estados-membros da Federação. Logo, é inequívoco o impacto da falta de recolhimento intencional e reiterado do ICMS sobre o erário. Considerar crime a apropriação indébita tributária produz impacto relevante sobre a arrecadação.

Também a livre iniciativa é afetada por essa conduta. Empresas que sistematicamente deixam de recolher o ICMS colocam-se em situação de vantagem competitiva em relação as que se comportam corretamente. No mercado de combustíveis, por exemplo, são capazes de alijar os concorrentes que cumprem suas obrigações.

O ministro esclareceu que a oscilação da jurisprudência do STJ afirmando a atipicidade da conduta adversada fez com que diversos contribuintes passassem a declarar os valores devidos, sem recolhê-los. Houve uma “migração” do crime de sonegação para o de apropriação indébita e não é isso que o direito deseja estimular.

No tocante às consequências do reconhecimento da tipicidade sobre os níveis de encarceramento no país, aduziu que é virtualmente impossível alguém ser efetivamente preso pelo delito de apropriação indébita tributária. A pena cominada é baixa, portanto, são cabíveis transação penal, suspensão condicional do processo e, em caso de condenação, substituição da pena privativa de liberdade por medidas restritivas de direito. Demais disso, é possível a extinção da punibilidade se o sonegador ou quem tenha se apropriado indevidamente do tributo quitar o que devido.

Assentada a possibilidade do delito em tese, o relator assinalou que o crime de apropriação indébita tributária não comporta a modalidade culposa. É imprescindível a demonstração do dolo e não será todo devedor de ICMS que cometerá o delito. O inadimplente eventual distingue-se do devedor contumaz, este faz da inadimplência tributária seu modus operandi.

O relator consignou que o dolo da apropriação deve ser apurado na instrução criminal, pelo juiz natural da causa, a partir de circunstâncias objetivas e factuais, tais como a inadimplência reiterada, a venda de produtos abaixo do preço de custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de “laranjas”, a falta de tentativa de regularização de situação fiscal, o encerramento irregular de atividades com aberturas de outras empresas.

Mantida a decisão do STJ, o ministro Roberto Barroso propôs a seguinte tese: “O contribuinte que deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, desde que aja com intenção de apropriação do valor do tributo a ser apurada a partir de circunstâncias objetivas factuais.”

Por seu turno, o ministro Alexandre de Moraes enfatizou que os tipos da Lei 8.137/1990 não se confundem com prisão civil por dívida. Para ele, o delito em debate consiste em apropriação dolosa. Acrescentou ter sido estabelecido pelo legislador que o sujeito ativo do crime é o sujeito passivo da obrigação tributária. Diferentemente do que alegado pela defesa, não teria restringido o tipo à hipótese de substituição tributária. Concluiu ser possível a continuidade da ação penal nos termos em que julgado pelo tribunal de justiça.

Segundo o ministro Luiz Fux, o preceito penal dispõe crime contra a ordem tributária, e não delito de apropriação indébita tributária. Evidentemente, exige-se o dolo, o animus de não pagar o tributo e enriquecer às custas do Estado. Indicou que, para caracterização do delito, a denúncia deve narrar circunstanciadamente a efetiva cobrança ou desconto do tributo do preço final ao consumidor ou a redução do preço para finalidade ilícita, excluída do âmbito de incidência do tipo penal a criminalização da mera inadimplência isolada do contribuinte. Nessa inadimplência isolada do contribuinte, encaixar-se-iam os casos enumerados pelo relator.

O ministro Edson Fachin discorreu que o tipo penal versa crime próprio, cuja conduta é suscetível de realização pelo sujeito passivo da obrigação tributária, abrangidas as figuradas do contribuinte e do responsável tributário. O valor do tributo cobrado a título de ICMS não integra o patrimônio do contribuinte, que age com contornos semelhantes a de um depositário. Por coerência, a ausência de recolhimento não denota tão somente inadimplemento fiscal, mas também disposição de recurso de terceiro, a aproximar-se da espécie de apropriação tributária. No tocante ao ICMS, a conduta incrimina a ruptura, causada pelo contribuinte de direito, entre a atividade de tributação realizada pelo Fisco e o atingimento da riqueza concernente à capacidade contributiva do consumidor.

Por sua vez, a ministra Rosa Weber acentuou que a conduta eleita pelo legislador penal não exige, para sua perfectibilização, o emprego de fraude ou simulação pelo contribuinte, nem qualquer omissão.

Em divergência, o ministro Gilmar Mendes deu provimento ao recurso. No mesmo sentido, votaram os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.

Para o ministro, deve ser imperiosamente levado em conta o dolo com a imprescindível consideração do elemento subjetivo especial do injusto em comento, qual seja, a vontade de se apropriar dos valores retidos, omitindo o cumprimento do dever tributário com a intenção de não os recolher. O dolo de não recolher o tributo, de maneira genérica, não seria suficiente para preencher o tipo subjetivo do referido dispositivo. É necessária a presença de uma vontade de apropriação fraudulenta dos valores do Fisco para materializar o elemento subjetivo especial do tipo em comento. Esse ânimo se manifesta pelo ardil de omitir e/ou alterar os valores devidos e se exclui com a devida declaração da espécie tributária junto aos órgãos de administração fiscal. Na situação dos autos, inexiste imputação de fraude.

Em cotejo analítico de proporcionalidade entre os valores constitucionais da liberdade individual e da própria ordem jurídica tributária, na qualidade de bem jurídico tutelado pelo tipo em questão, a intervenção criminal somente se justifica na medida em que houver alguma forma de fraude por parte do agente. Isso, porque a fraude é objeto da norma penal, e não a dívida. A interpretação constitucional do dispositivo deve considerar o ânimo de fraude, sob pena de fomentar-se política criminal arrecadatória.

O ministro salientou que o instrumento hermenêutico de analogia não pode ser utilizado para suprir a necessária demonstração da vontade ardilosa de se apropriar dos valores devidos. Quando não é suficientemente levada a cabo, pela acusação, a clara demonstração do liame subjetivo entre autor e fato — como ocorre na espécie —, estar-se-á diante de verdadeira imputação criminal pelo mero inadimplemento de dívida fiscal.

Ponderou que a criminalização de mera dívida se equipara à prisão civil e fere de forma grave tanto a Constituição Federal (CF) quanto o Pacto de San José da Corta Rica. Na falta de demonstração do elemento determinante do tipo, é cristalino o vilipêndio da proibição constitucional à criminalização do simples inadimplemento, bem assim do próprio princípio da não culpabilidade.

Além da apontada ausência do elemento subjetivo especial do injusto — fraude —, o ministro Gilmar Mendes consignou a necessidade da análise dos elementos normativos do tipo penal, sem os quais não há que se falar em crime. Depreendeu do ensinamento doutrinário que os termos “descontado” e “cobrado” não devem ser aplicados às hipóteses em que, por simples repercussão econômica, o comerciante repassa o seu ônus tributário no preço final da mercadoria ao consumidor.

Segundo o ministro, é certo que, em notas fiscais, destaca-se o valor do ICMS do valor das mercadorias e serviços. No entanto, esta indicação, para fins de controle e de aplicação sistemática da não cumulatividade, não significa que o ICMS deixa de integrar o preço de venda das mercadorias. Outros custos, diretos e indiretos, também compõem o preço de venda das mercadorias.

O ICMS não funciona como imposto retido. Não é recolhido automaticamente com a ocorrência da operação. É recebido pelo vendedor e integra o seu caixa, o seu patrimônio. O contribuinte irá repassar o valor ao estado apenas ao término do período de apuração, depois de considerada a compensação de créditos. O comerciante não é mero intermediário. Ademais, o contribuinte de direito não é obrigado a repassar o gravame econômico do ICMS ao consumidor, contribuinte de fato. Não se pode confundir dever jurídico tributário, que recai sobre o empresário contribuinte, com o mero ônus econômico que é suportado pelo adquirente.

O ministro avaliou inexistir apropriação de tributo devido por terceiro, pois é devido pela própria empresa. Observou que a apropriação indébita tributária está estritamente relacionada à substituição tributária, e não a impostos indiretos, em que o custo é repassado somente do ponto de vista econômico. O consumidor não é contribuinte do ICMS, no sentido técnico, nem sujeito passivo da obrigação. Inexistente relação jurídica tributária, não correto, juridicamente, compreender que o valor do ICMS embutido no preço tenha sido “cobrado” ou “descontado” do consumidor.

Dessa maneira, concluiu que os recorrentes foram denunciados por conduta atípica, o não recolhimento de ICMS devidamente declarado por comerciante ou empresário, embutido no preço por mera repercussão econômica ao consumidor. Ou seja, sem a devida descrição de situação fática que esteja no espectro de alcance do preceito normativo previsto no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990.

O ministro Ricardo Lewandowski sublinhou estar em discussão a exata subsunção do fato à norma, não a constitucionalidade do dispositivo.

O ministro Marco Aurélio salientou que o contribuinte de direito não cobra do consumidor o tributo. O próprio contribuinte é obrigado a recolher o tributo na venda de mercadorias. A seu ver, deu-se interpretação elástica ao preceito.

Em seguida, o ministro Dias Toffoli pediu vista dos autos.

(1) Lei 8.137/1990: “Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: (…) II – deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;”

RHC 163334/SC, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 11 e 12.12.2019. (RHC-163334)

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL – AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

Audiência de custódia e espécies de prisão –

O Plenário iniciou julgamento de agravo regimental em reclamação na qual se aponta ofensa à autoridade da decisão, proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 347 MC, que determinou a realização de audiência de custódia no prazo máximo de 24 horas, contado a partir do momento da prisão (Informativo 930).

A reclamante sustenta que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) não observou o pronunciamento do STF, com eficácia erga omnes, ao restringir, por meio da Resolução 29/2015, a audiência de custódia às hipóteses de presos em flagrante delito. Alega que, independente do título prisional, o preso deve ser apresentado, no prazo de 24 horas, à autoridade judicial. Requer a procedência da reclamação a fim de que seja determinada, ao TJRJ, a realização da audiência de custódia para as demais hipóteses de prisão.

Na decisão agravada, o ministro Edson Fachin (relator) negou seguimento à reclamação, por compreender não configurada a imprescindível aderência estrita entre o ato reclamado e o paradigma invocado. Ponderou que o STF, ao julgar a ADPF 347 MC, fixou a obrigatoriedade da audiência de custódia apenas para os casos de prisão em flagrante. Além disso, embora o Colegiado tenha determinado “aos juízes e tribunais que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão”, não afirmou a necessidade dessa providência nos casos de prisão preventiva, temporária ou definitiva decretada por juízes ou tribunais.

Após a leitura do relatório e a realização das sustentações orais, o julgamento foi suspenso.

Rcl 29303 AgR/RJ, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 12.12.2019. (Rcl-29303)

 

 

PRIMEIRA TURMA

DIREITO ADMINISTRATIVO – SERVIÇOS PÚBLICOS

Acesso à educação para crianças com deficiência e inércia estatal –

A Primeira Turma retomou julgamento de agravo regimental em recurso extraordinário com agravo em que se discute a possibilidade de o Judiciário obrigar o Estado a contratar professores interlocutores de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) para assistir alunos com deficiência auditiva matriculados na rede pública de ensino.

No caso, foi ajuizada ação civil pública em face do governo estadual com o fim de suprir a demanda por intérpretes de LIBRAS, tendo em vista o número de alunos com deficiência auditiva e sua evasão escolar, dada a dificuldade em assimilar os conteúdos e conseguir aprovação nos exames. Em seu pedido, o Ministério Público requereu a contratação de professores especializados, sob pena de multa diária.

O ministro Alexandre de Moraes (relator) reiterou voto apresentado em assentada anterior, no sentido de negar provimento ao agravo.

Considerou que, muito embora exista extensa base legal (Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência) e convencional (Convenção de Nova Iorque) no sentido da necessidade inconteste de atendimento ao aluno com deficiência, no caso, não houve omissão por parte do Estado.

O governo estadual regulamentou a contratação de professores intérpretes de LIBRAS, seja por meio de concurso público, seja por meio de contratação em caráter emergencial, para atender situações urgentes. Entretanto, nenhum candidato se habilitou.

Dessa maneira, o Judiciário não pode obrigar o Estado, se não houve inércia.

Em divergência, o ministro Roberto Barroso deu provimento ao agravo.

Ressaltou que, tendo em vista a existência da ação civil pública, o governo estadual realizou parceria com organizações não governamentais e conseguiu contratar professores habilitados. Nesse sentido, a mera regulamentação para contratar professores não é suficiente para considerar que o Estado agiu plenamente. Na prática, faltou empenho necessário para garantir o acesso à educação para as crianças com deficiência, que é o que a lei exige.

Em seguida, o ministro Luiz Fux pediu vista dos autos.

ARE 759755 AgR/SP, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 10.12.2019. (ARE-759755)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – PROCESSO EM GERAL

Homicídio qualificado e policial rodoviário federal – 2 –

A Primeira Turma, em conclusão, denegou a ordem em habeas corpus no qual se pleiteava o deslocamento, para a Justiça Federal, da competência para julgamento de policial rodoviário federal acusado da prática do crime de homicídio qualificado (Informativo 938).

O requerente sustentou ser considerado em efetivo serviço o servidor que se encontra em deslocamento no trajeto de sua residência para o local de trabalho. Além disso, alegou que o paciente tinha o dever de proceder ao flagrante das vítimas, ante a constatação da suposta prática dos crimes de embriaguez ao volante e desacato.

O Colegiado asseverou que o fato em análise não tem vinculação com o ofício de policial rodoviário federal. Apesar da constatação de embriaguez da vítima ao volante, a suspeita veio a ocorrer somente após iniciada a interpelação pelo paciente, não havendo que se falar em dever de ofício ou em flagrante obrigatório.

Acrescentou que a competência da Justiça Federal pressupõe a demonstração concreta das situações veiculadas no art. 109 da Constituição Federal (CF). A mera condição de servidor público não basta para atraí-la, na medida em que o interesse da União há de sobressair das funções institucionais, não da pessoa do paciente.

Além disso, a circunstância de receber, em decorrência da condição de policial rodoviário federal, verba a título de auxílio-transporte mostra-se neutra, considerada a competência da Justiça Federal. Embora tenham sido cometidas infrações penais no deslocamento até o local de trabalho, estas não guardam qualquer vinculação com o exercício das funções de policial rodoviário federal.

HC 157012/MS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 10.12.2019. (HC-157012)

 

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Ato de CNJ e competência do STF –

A Primeira Turma decidiu afetar ao Plenário o julgamento de agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu de ação originária e determinou a remessa dos autos ao juízo de primeiro grau.

No caso, a ação foi ajuizada com o objetivo de desconstituir ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que afastou magistrado do exercício da jurisdição.

AO 2415 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 10.12.2019. (AO-2415)

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

MS: CNJ e cálculo de precatórios – 2 –

A Primeira Turma retomou julgamento de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado em face de ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que suspendeu o pagamento de precatórios e determinou a realização de auditoria técnica e a revisão nos cálculos dos precatórios, com abatimento dos valores pagos por determinado Município (Informativo 944).

Na situação em apreço, o Município firmou contrato de abertura de crédito, por antecipação de receita orçamentária, com instituição bancária. Aproximadamente um ano depois, celebrou acordo judicial com o banco para solver a dívida. Posteriormente, a municipalidade opôs embargos à execução. Além disso, foram manejadas diversas ações cuja causa de pedir era a abusividade das cláusulas contratuais. A maioria dos feitos transitou em julgado.

O impetrante sustenta que o ato impugnado excedeu a competência administrativa do CNJ. Aponta a violação ao art. 1º-E da Lei 9.494/1997 (1), pois o CNJ teria invadido a competência do presidente do Tribunal de Justiça ao ordenar a revisão de cálculo dos precatórios. De igual modo, defende haver afronta à coisa julgada, em virtude de processos decididos de maneira favorável ao impetrante.

O ministro Alexandre de Moraes, em voto-vista, divergiu do relator e concedeu a ordem.

Afirmou que o CNJ, ao determinar a suspensão de pagamento de precatório, invadiu a atividade jurisdicional.

O precatório tem como base decisão transitada em julgado e só pode ser alterada por ação rescisória. Além disso, é equivocado o entendimento de que o cumprimento de precatório é ato administrativo.

Ressaltou que o CNJ pode determinar a realização de auditoria e apurar a desídia funcional. Porém, para desconstituir decisões judiciais transitadas em julgado, se comprovadas irregularidades, só a atividade jurisdicional.

Rememorou que a via judicial ainda está aberta. Enfatizou, entretanto, que não é possível ao CNJ, ainda mais por liminar da corregedoria, afastar a continuidade do exercício da função jurisdicional, que, no caso, é a execução por precatórios.

Em seguida, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista do ministro Roberto Barroso.

(1) Lei 9.494/1997: “Art. 1º-E. São passíveis de revisão, pelo Presidente do Tribunal, de ofício ou a requerimento das partes, as contas elaboradas para aferir o valor dos precatórios antes de seu pagamento ao credor.”

MS 34057/DF, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 10.12.2019. (MS-34057)

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Arquivamento de procedimento investigatório criminal e submissão ao Poder Judiciário – 2 –

A Primeira Turma, em conclusão, concedeu a ordem em mandado de segurança para anular determinação contida em decisão exarada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), no sentido de submeter decisão de arquivamento de Procedimento de Investigação Criminal (PIC) ao tribunal de justiça local, nos termos do art. 28 do Código de Processo Penal (CPP) (1) (Informativo 951).

O colegiado entendeu que o arquivamento do PIC, promovido pelo Procurador-Geral de Justiça, em hipótese de sua atribuição, não reclama prévia submissão ao Poder Judiciário, pois o arquivamento não acarreta coisa julgada material. O chefe do Ministério Público estadual é a autoridade própria para aferir a legitimidade do arquivamento do PIC, por isso descabe a submissão da decisão de arquivamento ao Poder Judiciário.

Não obstante a desnecessidade dessa submissão, a decisão do Procurador-Geral de Justiça não fica imune ao controle de outra instância revisora. Isso porque é possível a apreciação de recurso pelo órgão superior, no âmbito do próprio Ministério Público, em caso de requerimento pelos legítimos interessados, conforme dispõe o art. 12, XI, da Lei 8.625/1993 (2).

Portanto, o art. 28 do CPP é plenamente aplicável ao PIC, mas nas hipóteses que não configuram competência originária do Procurador-Geral de Justiça.

(1) CPP: “Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.”
(2) Lei 8.625/1993: ““Art. 12. O Colégio de Procuradores de Justiça é composto por todos os Procuradores de Justiça, competindo-lhe: (…) XI – rever, mediante requerimento de legítimo interessado, nos termos da Lei Orgânica, decisão de arquivamento de inquérito policial ou peças de informações determinada pelo Procurador-Geral de Justiça, nos casos de sua atribuição originária”.

MS 34730/DF, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 10.12.2019. (MS-34730)

DIREITO ADMINISTRTIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Redução de alíquota de Imposto de Importação e dever de indenizar – 2 –

A Primeira Turma, em conclusão, negou provimento a agravo interno em recurso extraordinário com agravo em que se discutia a responsabilidade da União pelos prejuízos supostamente causados a indústria de brinquedos nacional pela redução do imposto de importação de brinquedos na década de 1990 (Informativo 959).

No caso, o acórdão recorrido decidiu que a possibilidade de alteração da alíquota do imposto de importação por ato do poder público, como instrumento de política economia, não gera direito à indenização por se caracterizar como ato legislativo, com efeito geral e abstrato. Isso porque seria inerente à política econômica a possibilidade de alteração para atender a circunstâncias internas e externas, como é inerente ao risco empresarial a necessidade de adaptação a tais mudanças. Não haveria, dessa forma, direito subjetivo à manutenção de determinada política econômica, desde que estabelecida genericamente e sem compromisso de sua permanência por determinado prazo. Ademais, não haveria afronta ao princípio da boa-fé ou quebra de confiança a legitimar a expectativa sólida no sentido de manutenção das alíquotas do imposto de importação. Portanto, não se configuraria a responsabilidade civil do Estado pelos prejuízos resultantes da queda dos níveis de venda dos produtos nacionais.

O Colegiado concluiu que o entendimento da corte de origem não divergiu da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal (STF) (RE 225.655 e RE 224.285). Ademais, o tribunal a quo se lastreou na prova produzida para firmar seu convencimento no sentido da inviabilidade de ser atribuída à conduta da ré – comissiva ou omissiva – a responsabilidade pelos danos patrimoniais eventualmente sofridos pela autora. Compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no acórdão impugnado, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário.

ARE 1175599 AgR/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 10.12.2019. (ARE-1175599)

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