quinta-feira,28 março 2024
TribunaisInformativo nº 950 do STF

Informativo nº 950 do STF

Resumo do Informativo nº 950 do STF – data de divulgação: 2 a 6 de setembro 2019.

SUMÁRIO
Plenário
Lei 11.442/2007: transportador autônomo de cargas e natureza da relação jurídica
Repercussão Geral
Responsabilidade civil objetiva e acidente de trabalho
1ª Turma
Sessão de julgamento: não comparecimento de defensor intimado e ausência de nulidade
Lei da Ficha Limpa: retroatividade e inelegibilidade – 2
Previsão legislativa e percepção de verbas remuneratórias
Competência: verbas rescisórias e servidores municipais
2ª Turma
Interrogatório de corréus: ausência de defesa técnica e acusado delator – 2
Assistente de acusação: tempestividade de recurso e coisa julgada
Execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado
Inovações Legislativas

PLENÁRIO

DIREITO CONSTITUCIONAL – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Lei 11.442/2007: transportador autônomo de cargas e natureza da relação jurídica –

O Plenário iniciou julgamento conjunto de ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e ação direta de inconstitucionalidade (ADI) relativas a diversos dispositivos, em especial os arts. 5º e 18 (1), da Lei 11.442/2007, que dispõe sobre o transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros e mediante remuneração.

Em 19.12.2017, o ministro Roberto Barroso (relator) deferiu cautelar nos autos da ADC, para determinar a imediata suspensão dos feitos que envolvam a aplicação do art. 1º, caput (2); art. 2º, §§ 1º e 2º (3); art. 4º, §§ 1º e 2º (4), e art. 5º, caput, todos do mencionado diploma legislativo.

Na presente assentada, o relator julgou improcedente o pedido formulado na ADI e procedente a pretensão contida na ADC, no que foi acompanhado pelo ministro Alexandre de Moraes.

Segundo o ministro Roberto Barroso, o mercado de transporte de cargas convive com três figuras: a Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC); o Transportador Autônomo de Cargas (TAC) e o motorista empregado. A Lei 11.442/2007 não se aplica a este último caso, ou seja, na situação em que o transportador de carga trabalha como empregado. O ato normativo regulamentou a contratação de transportadores autônomos de carga por proprietários de carga e por empresas transportadoras de carga; autorizou a terceirização da atividade-fim pelas empresas transportadoras; e afastou a configuração de vínculo de emprego nessa hipótese.

O relator afirmou ser legítima a terceirização das atividades-fim de uma empresa. Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a Constituição Federal (CF) não impõe uma única forma de estruturar a produção. Ao contrário, o princípio constitucional da livre iniciativa garante aos agentes econômicos liberdade para eleger suas estratégias empresariais dentro do marco vigente.

Ademais, a proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer prestação remunerada de serviços configure relação de emprego.

O ministro Roberto Barroso reputou constitucional o prazo prescricional, de um ano a contar da ciência do dano para a propositura de ação de reparação, previsto no art. 18 do aludido diploma legislativo à luz do art. 7º, XXIX, da CF (5). Isso, porque o dispositivo não cuida de relação trabalhista. Ao incidir sobre eventual dano de natureza comercial, o prazo prescricional não sofre as restrições impostas pela Constituição.

Ato contínuo, fixou os seguintes enunciados: (i) A Lei 11.442/2007 é constitucional, uma vez que a Constituição não veda a terceirização de atividade meio ou fim; (ii) O prazo prescricional estabelecido no art. 18 da Lei 11.442/2007 é válido, porque não se trata de créditos resultantes de relação de trabalho, mas de relação comercial, não incidindo na hipótese o art. 7º, XXIX, da CF; (iii) Uma vez preenchidos os requisitos dispostos na Lei 11.442/2007, estará configurada relação comercial de natureza civil e afastada a configuração de vínculo trabalhista.

Por fim, explicitou que, ao firmar a constitucionalidade da lei, não se está a chancelar sua burla. Não se aplica a legislação quando se estiver fraudando a norma e onde exista efetivamente relação de trabalho e não se estiver reconhecendo o vínculo.

O ministro Alexandre de Moraes salientou inexistir vedação constitucional, expressa ou implícita, relativa à possibilidade de terceirização, qualquer que seja. Além disso, observou que não se pode confundir o conceito de terceirização de atividade com intermediação de mão de obra.

Em divergência, o ministro Edson Fachin, considerou procedente a pretensão formulada na ADI e improcedente o pedido apresentado na ADC.

A seu ver, na lógica vertida na lei, não se está diante do tema da terceirização. Sob a perspectiva principalmente dos arts. 5º e 18, o que se problematiza é a natureza da relação que se estabelece entre os contratantes de transporte de cargas, sobretudo pelo argumento de que a referida lei contraria a Constituição, notadamente os arts. 5º, LIV, que trata do devido processo legal; 7º, XXIX, que cuida da prescrição para demandas trabalhistas; e 114, I, que versa sobre a competência da Justiça do Trabalho.

O art. 5º do diploma legislativo consiste em formulação que substantiva na norma em abstrato o aprisionamento da realidade em concreto. Em sua dicção, a lei afasta a caracterização de vínculo de emprego mesmo nas hipóteses em que o vínculo, pelo princípio da realidade, caracterize-se. O tema diz respeito a essa ordem de ideias. Há a questão atinente à competência e ao prazo estipulado para a prescrição.

Para o ministro Edson Fachin, a controvérsia deve ser solucionada tendo como vetor hermenêutico o primado da realidade. A regulamentação infraconstitucional não pode, sem afrontar a Constituição, definir, de forma apriorística e generalizada, a natureza comercial do vínculo decorrente de contrato e transporte rodoviário de cargas. Ao fazê-lo, utilizando os vocábulos “sempre” e “em nenhuma hipótese”, exclui o regime de direitos fundamentais preconizado pela CF ao lado da livre iniciativa.

No âmbito das relações de mercado, o regime de direitos fundamentais também deve ser reconhecido se os elementos caracterizadores da relação de emprego estiverem presentes. O princípio da primazia da realidade se impõe, mormente para prestigiar o dever de tratar os sujeitos das relações como fins em si mesmos e nunca como meios para o que quer que seja. A dignidade dos trabalhadores atuantes no mercado de transporte rodoviário de cargas merece ser prestigiada em sua máxima potencialidade, especialmente quando se tratar do reconhecimento de direitos fundamentais decorrentes de relação para a qual a CF estabeleceu regime específico e regras próprias.

Por isso, em consonância com o princípio da primazia da realidade, o ministro Edson Fachin declarou a inconstitucionalidade das normas impugnadas no que afirmam peremptoriamente e de forma apriorística que o vínculo será sempre de natureza comercial, por afronta aos arts. 7º e 114, I, da CF. Uma vez caracterizados os elementos próprios de uma relação de emprego, assim deverá ser considerado o vínculo entre os sujeitos, incidindo todas as consequências do regime laboral constitucionalmente preconizado.

Em seguida, o julgamento foi suspenso.

(1) Lei 11.442/2007: “Art. 5º As relações decorrentes do contrato de transporte de cargas de que trata o art. 4º desta Lei são sempre de natureza comercial, não ensejando, em nenhuma hipótese, a caracterização de vínculo de emprego. Parágrafo único. Compete à Justiça Comum o julgamento de ações oriundas dos contratos de transporte de cargas. (…) Art. 18. Prescreve em 1 (um) ano a pretensão à reparação pelos danos relativos aos contratos de transporte, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano pela parte interessada.”
(2) Lei 11.442/2007: “Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o Transporte Rodoviário de Cargas – TRC realizado em vias públicas, no território nacional, por conta de terceiros e mediante remuneração, os mecanismos de sua operação e a responsabilidade do transportador.”
(3) Lei 11.442/2007: “Art. 2º A atividade econômica de que trata o art. 1º desta Lei é de natureza comercial, exercida por pessoa física ou jurídica em regime de livre concorrência, e depende de prévia inscrição do interessado em sua exploração no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas – RNTR-C da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, nas seguintes categorias: I – Transportador Autônomo de Cargas – TAC, pessoa física que tenha no transporte rodoviário de cargas a sua atividade profissional; II – Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas – ETC, pessoa jurídica constituída por qualquer forma prevista em lei que tenha no transporte rodoviário de cargas a sua atividade principal. § 1º O TAC deverá: I – comprovar ser proprietário, co-proprietário ou arrendatário de, pelo menos, 1 (um) veículo automotor de carga, registrado em seu nome no órgão de trânsito, como veículo de aluguel; II – comprovar ter experiência de, pelo menos, 3 (três) anos na atividade, ou ter sido aprovado em curso específico. § 2º A ETC deverá: I – ter sede no Brasil; II – comprovar ser proprietária ou arrendatária de, pelo menos, 1 (um) veículo automotor de carga, registrado no País; III – indicar e promover a substituição do Responsável Técnico, que deverá ter, pelo menos, 3 (três) anos de atividade ou ter sido aprovado em curso específico; IV – demonstrar capacidade financeira para o exercício da atividade e idoneidade de seus sócios e de seu responsável técnico. (…)”
(4) Lei 11.442/2007: “Art. 4º O contrato a ser celebrado entre a ETC e o TAC ou entre o dono ou embarcador da carga e o TAC definirá a forma de prestação de serviço desse último, como agregado ou independente. § 1º Denomina-se TAC-agregado aquele que coloca veículo de sua propriedade ou de sua posse, a ser dirigido por ele próprio ou por preposto seu, a serviço do contratante, com exclusividade, mediante remuneração certa. § 2º Denomina-se TAC-independente aquele que presta os serviços de transporte de carga de que trata esta Lei em caráter eventual e sem exclusividade, mediante frete ajustado a cada viagem.
(5) CF: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…) XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;”

ADC 48/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 5.9.2019. (ADC-48)
ADI 3961/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 5.9.2019. (ADI-3961)

Vídeo

REPERCUSSÃO GERAL
DIREITO CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL

Responsabilidade civil objetiva e acidente de trabalho –

O Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 932 da repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão que, com base na teoria do risco inserta no art. 927, parágrafo único, do Código Civil (CC) (1), reconheceu o direito do empregado que desenvolve atividade de risco a ser indenizado pelo seu empregador, por danos morais e materiais decorrente de acidente de trabalho.

No caso, trabalhador contratado por empresa de transporte de valores passou a experimentar graves consequências psíquicas, com a consequente perda total e permanente de sua capacidade laborativa, em decorrência de sua participação em tiroteio verificado em ataque de assaltantes a supermercado no qual malotes de dinheiro estavam sendo acondicionados em carro-forte.

O colegiado inicialmente observou que a questão de direito debatida nos autos estaria em saber se a responsabilidade civil, na hipótese em apreciação, seria subjetiva, o que exige a demonstração de dolo ou culpa, ou objetiva, quando o dever de indenização independe dessa demonstração. Especificamente, questiona-se a compatibilidade do art. 927, parágrafo único, do CC — que tem aplicação geral, e não somente para os casos de acidente de trabalho — com o art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal (CF) (2), a permitir a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho.

A regra do Direito brasileiro é a da responsabilidade civil subjetiva. Portanto, aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo. Entretanto, para se evitar injustiças, previu que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, quando esta já prevê atividade perigosa, na hipótese de atividade com risco diferenciado ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos maiores, inerentes à própria atividade.

Além disso, o Código Civil estabeleceu a regra geral da responsabilidade civil e previu a responsabilidade objetiva no caso de risco para os direitos de outrem. “Outrem” abrange terceiros que não tenham qualquer tipo de vínculo com o empregador. Por conseguinte, seria absolutamente incoerente que, na mesma situação em relação ao trabalhador, a responsabilidade fosse subjetiva, e, em relação a terceiros, fosse objetiva.

A Constituição estabeleceu um sistema em que o empregador recolhe seguro (CF, art. 7º, XXVIII). Havendo acidente de trabalho, o sistema de previdência social irá pagar o benefício e o salário. Além do seguro que o empregado tem direito, há também a garantia de indenização, quando o empregador tenha incorrido em dolo ou culpa. Portanto, a Constituição, de uma maneira inequivocamente clara, previu a responsabilidade subjetiva.

Entretanto, o caput do art. 7º da CF, ao elencar uma série de direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, assenta a possibilidade de instituição “de outros que visem à melhoria de sua condição social”. Dessa forma, é certo que a Constituição assegurou a responsabilidade subjetiva (CF, art. 7º, XXVIII), mas não impediu que os direitos dos trabalhadores pudessem ser ampliados por normatização infraconstitucional. Assim, é possível à legislação ordinária estipular outros direitos sociais que melhorem e valorizem a vida do trabalhador. Em decorrência disso, o referido dispositivo do CC é plenamente compatível com a CF.

No caso concreto, a atividade exercida pelo recorrido já está enquadrada na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) como atividade perigosa [CLT, art. 193, II (3)]. Não há dúvida de que o risco é inerente à atividade do segurança patrimonial armado de carro-forte.

O ministro Roberto Barroso sublinhou que, em caso de atividade de risco, a responsabilidade do empregador por acidente de trabalho é objetiva, nos termos do art. 7º, caput, da CF, combinado com o art. 927, parágrafo único, do CC, sendo que se caracterizam como atividades de risco apenas aquelas definidas como tal por ato normativo válido, que observem os limites do art. 193 da CLT.

Vencidos os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, que deram provimento ao recurso extraordinário. Pontuaram não ser possível, diante da clareza do art. 7º, XXVIII, da CF, cogitar-se de responsabilidade objetiva do tomador dos serviços.

Em seguida, o Tribunal deliberou fixar a tese de repercussão geral em assentada posterior.

(1) CC: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
(2) CF: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…) XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;”
(3) CLT: “Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: (…)II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.”

RE 828040/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 4 e 5.9.2019. (RE-828040)

1ª Parte: Vídeo
2ª Parte: Vídeo

PRIMEIRA TURMA

DIREITO PROCESSUAL PENAL – NULIDADES

Sessão de julgamento: não comparecimento de defensor intimado e ausência de nulidade –

A ausência de defensor, devidamente intimado, à sessão de julgamento não implica, por si só, nulidade processual.

Com base nessa orientação, a Primeira Turma não conheceu de habeas corpus em que se alegava a nulidade do julgamento em que se condenou o paciente pela prática do crime de falsificação de documento público, previsto no art. 297 do Código Penal.

Os impetrantes sustentavam a existência de ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição Federal (CF), em face da ausência de comparecimento, à sessão de julgamento, do representante da Defensoria Pública, da falta de nomeação de defensor dativo para o ato e de intimação do paciente.

O colegiado esclareceu que o paciente é advogado e vinha exercendo sua própria defesa. Entretanto, quando intimado, por Diário Oficial e pessoalmente, para apresentar alegações finais, deixou de fazê-lo. Em decorrência disso, foi designado defensor público para representá-lo, o qual apresentou as alegações finais. Posteriormente, o defensor foi intimado pessoalmente para a sessão de julgamento, mas não compareceu.

Citou precedente da Corte (RHC 119.194) no qual fixado o entendimento de que, intimada a defesa para a sessão de julgamento da ação penal originária, a ausência da sustentação oral prevista no art. 12 da Lei 8.038/1990 não invalida a condenação.

Reputou, ademais, prejudicada a questão concernente ao direito do paciente de não ter a pena executada antes de esgotada a jurisdição ordinária, haja vista a pendência de embargos de declaração perante o tribunal de justiça. A providência a esse respeito já havia sido tomada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem para afastar a execução provisória do título condenatório formalizado. Asseverou que o pedido formulado na inicial do habeas corpus é no sentido de se aguardar o trânsito em julgado e não apenas o esgotamento da jurisdição ordinária.

HC 165534/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 3.9.2019. (HC-165534)

DIREITO ELEITORAL – INELEGIBILIDADE

Lei da Ficha Limpa: retroatividade e inelegibilidade – 2 –

A Primeira Turma retomou julgamento de agravo regimental em agravo em recurso extraordinário no qual se discute a incidência da Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa) em relação à eleição de candidato ao cargo de prefeito no pleito de 2016. O candidato foi condenado pela prática de abuso de poder e captação ilícita de votos, por sentença transitada em julgado em 10.9.2010, que decretou a sua inelegibilidade pelo prazo de três anos (Informativo 935).

Na espécie, o recurso extraordinário impugna acórdão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que reputou o candidato inelegível no pleito de 2016, em razão da aplicação da tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 929.670 (Tema 860 da repercussão geral). O TSE assentou que o candidato foi condenado por ter, na qualidade de prefeito, praticado abuso de poder em benefício de candidatos a prefeito e vice-prefeito nas eleições de 2008. Afirmou que o exaurimento do prazo da inelegibilidade, considerada a data da eleição em que praticado o abuso (5.10.2008), ocorreu no dia 5.10.2016. Portanto, o recorrido estava inelegível na data do pleito de 2016 (2.10.2016).

Em voto-vista, o ministro Roberto Barroso acompanhou a ministra Rosa Weber e deu provimento ao agravo. Considerou que a Lei da Ficha Limpa, ao prever oito anos de inelegibilidade para quem tivesse tido o mandato cassado por abuso de poder, seria aplicável inclusive para eleições subsequentes. A inelegibilidade não é uma sanção, mas um requisito estabelecido pela lei. Assim, quem não cumprisse o prazo de oito anos, em razão da aplicabilidade da lei, não preencheria pressuposto necessário para voltar a ser elegível. Dessa forma, não há que se falar em ofensa à coisa julgada.

Por sua vez, o ministro Marco Aurélio acompanhou o ministro Alexandre de Moraes (relator) para negar provimento ao recurso, ao fundamento de que a candidatura foi lastreada em decisões judiciais, e que, portanto, a reversão da situação com base nos mesmos fatos implica ofensa à coisa julgada.

Em seguida, deliberou-se suspender o julgamento para aguardar o voto de desempate do ministro Luiz Fux.

ARE 1180658 AgR/RN, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 3.9.2019. (ARE-1180658)

DIREITO CONSTITUCIONAL – SERVIDORES PÚBLICOS

Previsão legislativa e percepção de verbas remuneratórias –

O art. 39, § 4º, da Constituição Federal (CF) (1) não é incompatível com o pagamento de terço de férias e décimo terceiro salário (Tema 484 da Repercussão Geral). A definição sobre a adequação de percepção dessas verbas está inserida no espaço de liberdade de conformação do legislador infraconstitucional.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que, ao julgar procedente reclamação, cassou acórdão que assegurou a ex-vereador o recebimento de indenização por férias não gozadas, acrescidas do terço constitucional, e décimo terceiro salário.

O ministro Roberto Barroso (relator) esclareceu que, em sede de repercussão geral, a Corte concluiu pela possibilidade de pagamento de terço de férias e décimo terceiro salário a vereadores e a parlamentares em geral, mas desde que a percepção de tais verbas esteja prevista em lei municipal, o que não ocorre no caso concreto.

(1) CF: “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. § 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.”

Rcl 32483 AgR/SP, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 3.9.2019. (Rcl-32483)

DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA

Competência: verbas rescisórias e servidores municipais –

A Primeira Turma retomou julgamento de agravo regimental em reclamação, em que se discute a Justiça competente — comum ou trabalhista — para julgar ação trabalhista em que servidora municipal pleiteia o pagamento de verbas rescisórias.

O município recorrente sustenta a competência da Justiça comum para o exame da causa e aponta a ocorrência de desrespeito ao que decidido na ADI 3.395 MC.

O ministro Marco Aurélio (relator), na sessão de 28.5.2019, negou provimento ao agravo e manteve a decisão pela qual negou seguimento à reclamação. A ministra Rosa Weber, na ocasião, acompanhou o voto do relator. O relator entendeu que a medida acauteladora implementada na ADI 3.395 ficou restrita ao afastamento de interpretação do inciso I do art. 114 da Constituição Federal (CF) (1), na redação dada pela Emenda Constitucional 45/2004, que implique admissão da competência da justiça do trabalho para apreciar questões atinentes a regime especial, de caráter jurídico-administrativo.

Observou, então, que, no caso, a interessada pretende, na demanda trabalhista, o pagamento de verbas de natureza celetista. Considerou que a competência é definida conforme a ação proposta. Se a causa de pedir é a relação de natureza celetista, pretendendo-se parcelas trabalhistas, a análise do tema cabe à Justiça do trabalho, e não à Justiça comum.

Na presente assentada, o ministro Alexandre de Moraes, em voto-vista, divergiu do relator e deu provimento ao agravo. Determinou a cassação de todos os atos decisórios proferidos na Justiça do trabalho e a remessa dos autos à Justiça comum.

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, a competência para julgamento da matéria pertence à Justiça comum, em razão da existência de lei do município recorrente (Lei 1.299/2004) que disciplina o vínculo entre a administração pública e seus servidores. Isso permite concluir, independentemente da regularidade do concurso público, pelo caráter estatutário da relação firmada entre as partes envolvidas.

Após o voto do ministro Roberto Barroso, que acompanhou a divergência, o julgamento foi suspenso para aguardar o voto de desempate do ministro Luiz Fux.

(1) CF: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;”

Rcl 31299-AgR/MA, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 3.9.2019. (Rcl-31299)

SEGUNDA TURMA

DIREITO PROCESSUAL PENAL – ATOS PROCESSUAIS

Interrogatório de corréus: ausência de defesa técnica e acusado delator – 2 –

Em conclusão de julgamento, a Segunda Turma deu parcial provimento a ação originária em que apreciados recursos de apelação interpostos de sentença que condenou vários réus pela prática de delitos de inexigência indevida de licitação; falsificação de documento público; e/ou peculato. Na ocasião em que proferido o édito condenatório, o magistrado declarou extinta a punibilidade, pelo perdão judicial, do acusado colaborador [Lei 9.807/1999, art. 13 (1) c/c o Código Penal (CP), art. 107, IX (2)] (Informativo 949).

As condutas ilícitas a eles atribuídas relacionam-se: i) à aquisição, sem licitação, de livros de educação para o trânsito, por Departamento de Trânsito (Detran) estadual, com inexigência atestada fora das hipóteses legais, preço superfaturado e sem o fornecimento da quantidade integral de exemplares acordada; ii) à falsificação de assinatura aposta sobre o carimbo da empresa contratada em cheque emitido para o pagamento da fatura correspondente.

Os autos vieram ao Supremo Tribunal Federal em decorrência do impedimento/suspeição de mais da metade da composição do tribunal de justiça [Constituição Federal (CF), art. 102, I, n (3)].

O colegiado, por maioria, rejeitou preliminar de nulidade consubstanciada na ausência de defesa técnica de acusados durante o interrogatório de alguns corréus, entre os quais o delator a quem concedido perdão judicial.

Observou que os atos combatidos ocorreram antes do advento da Lei de Colaboração Premiada. Registrou que as oitivas questionadas eram de réus, e não de testemunhas. Os advogados dos recorrentes foram comunicados previamente sobre a data e o horário dos interrogatórios. Ainda que regularmente intimados, não compareceram. Nesse sentido, o art. 565 do Código de Processo Penal (CPP) estabelece que nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

O estudo dos autos deixou patente a combatividade dos advogados dos recorrentes no processo. Inúmeras teses e nulidades foram alegadas e diversos requerimentos apresentados, com participação ativa em várias audiências. Ademais, o interrogatório de todos os acusados, inclusive o dos apelantes que arguiram a nulidade, foram realizados no mesmo dia e pelo mesmo juiz. E os patronos atuaram no interrogatório de seus clientes e compareceram a outras oitivas. Diante disso, a Turma concluiu que os advogados dos recorrentes não participaram dos interrogatórios porque entenderam ser a ausência estratégia adequada no momento. Contudo, a estratégia de defesa não pode ser algo que torne inefetiva a prestação jurisdicional e, portanto, não pode constituir nulidade.

Sublinhou que, em um dos casos, a nulidade foi suscitada em questão de ordem pelo causídico nove anos depois das audiências, quando os autos já estavam no tribunal de justiça.

Além disso, o interrogatório de corréu é ato do juiz, que propicia à defesa dos demais denunciados mera faculdade de participação. A imprescindibilidade da presença de defesa técnica ocorre durante o interrogatório do réu por ela representado, não quanto aos demais. No tocante aos corréus, há obrigatoriedade de intimação da data de interrogatório, a permitir o comparecimento do advogado, o que comprovado na espécie.

Ao final, o colegiado assinalou que a sentença não se alicerça apenas em indícios e que subsistem outros elementos capazes de manter sua higidez.

O ministro Edson Fachin enfatizou que, na situação em apreço, foram exercitados o contraditório e as garantias constitucionais. A todos foi permitido enfrentar as imputações e infirmar as declarações de corréu antes da própria sentença condenatória no trâmite processual.

Vencidos, em parte, os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. No tocante às preliminares, o ministro Ricardo Lewandowski acolheu questão de ordem inicialmente formulada no tribunal de justiça e decretou a nulidade do interrogatório do delator para que seja refeito em relação a um dos recorrentes. A seu ver, deveria ter-lhe sido nomeado defensor ad hoc, em face da ausência de advogado constituído naquele ato processual. No ponto, o ministro Gilmar Mendes reconheceu a nulidade em menor grau. Assentou a imprestabilidade do interrogatório do colaborador no que diz respeito ao mesmo acusado. Todavia, manteve a condenação com base em outras provas autônomas e independentes [CPP, arts. 563 e 566 (4)].

(1) Lei 9.807/1999: “Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I – a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.”
(2) CP: “Art. 107 – Extingue-se a punibilidade: (…) IX – pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.”
(3) CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: (…) n) a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados;”
(4) CPP: “Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. (…) Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.”

AO 2093/RN, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 3.9.2019. (AO-2093)

O correto teor da matéria referente à AO 2.093 foi divulgada no Informativo 955.

Em conclusão de julgamento, a Segunda Turma deu parcial provimento a ação originária em que apreciados recursos de apelação interpostos de sentença que condenou vários réus pela prática de delitos de inexigência indevida de licitação; falsificação de documento público; e/ou peculato. Na ocasião em que proferido o édito condenatório, o magistrado declarou extinta a punibilidade, pelo perdão judicial, do acusado colaborador [Lei 9.807/1999, art. 13 (1) c/c o Código Penal (CP), art. 107, IX (2)] (Informativo 949).

As condutas ilícitas a eles atribuídas relacionam-se: i) à aquisição, sem licitação, de livros de educação para o trânsito, por Departamento de Trânsito (Detran) estadual, com inexigência atestada fora das hipóteses legais, preço superfaturado e sem o fornecimento da quantidade integral de exemplares acordada; ii) à falsificação de assinatura aposta sobre o carimbo da empresa contratada em cheque emitido para o pagamento da fatura correspondente.

Os autos vieram ao Supremo Tribunal Federal em decorrência do impedimento/suspeição de mais da metade da composição do tribunal de justiça [Constituição Federal (CF), art. 102, I, n (3)].

A defesa de um dos apelantes apresentou questão de ordem no tribunal de justiça, na qual arguiu que o acusado esteve desprovido de defesa técnica quando do interrogatório de alguns corréus, entre os quais o delator a quem concedido perdão judicial. Dessa maneira, requereu a declaração de nulidade do processo desde as audiências em que ouvidos os corréus.

No que pertine ao mencionado apelante, o colegiado acolheu, em parte, preliminar de nulidade, consistente na ausência de defesa técnica do recorrente durante o interrogatório do corréu colaborador, nos termos do voto médio do ministro Gilmar Mendes. Nulidade reconhecida, com base nos arts. 563 e 566 do Código de Processo Penal (CPP) (4), apenas para declarar a imprestabilidade do interrogatório do delator em relação ao recorrente, sem determinação de repetição dos atos do processo, decisão tomada, no ponto, por maioria.

Segundo o ministro Gilmar Mendes, os patronos estavam cientes da data designada para o interrogatório de todos os corréus e compareceram inclusive no horário do depoimento de seu constituinte, no mesmo dia, porém em turno diferente. Logo, inexiste nulidade por ausência de intimação.

A imprescindibilidade da participação da defesa técnica, sob pena de nulidade, restringe-se ao acusado que é interrogado. Entretanto, excepciona-se a regra da faculdade da participação quando há a imputação de crimes pelo interrogado aos demais réus, como nos casos de colaboração premiada.

Nessas hipóteses, deve-se exigir a presença dos advogados dos réus delatados, pois, na colaboração premiada, o delator adere à acusação em troca de um benefício acordado entre as partes e homologado pelo julgador natural. Em regra, o delator presta contribuições à persecução penal incriminando eventuais corréus.

O ministro não vislumbrou nulidade pela falta de participação de advogado no interrogatório dos corréus que se limitaram a negar a autoria da acusação e a materialidade dos fatos durantes seus interrogatórios. No entanto, entendeu ser indispensável a presença de defesa técnica no interrogatório do colaborador, que confessou a prática dos crimes e indicou quem seriam os participantes. Este corréu atuou como colaborador premiado. Apesar disso, as peculiaridades do caso levaram o ministro à solução distinta.

A primeira particularidade é que o interrogatório do colaborador ocorreu antes da consolidação da jurisprudência no sentido da imprescindibilidade da participação da defesa técnica na inquirição e confronto das declarações do colaborador ou do corréu acusador. A própria colaboração prestada é anterior ao advento da norma que instituiu o procedimento e as cláusulas do acordo de colaboração premiada (Lei 12.850/2013). Portanto, o ato foi praticado consoante o entendimento legal e jurisprudencial da época.

Além disso, as imputações do colaborador ocorreram no início do processo. O interrogatório do delator foi realizado antes do advento da Lei 11.719/2008, que transferiu o ato para a parte final da instrução. Isso possibilitou à defesa realizar a devida contraposição das imputações durante toda a fase probatória. Poderia inclusive ter solicitado o reinterrogatório, mas não o fez e somente arguiu a nulidade nove anos após as audiências.

O ministro Gilmar Mendes ponderou que, mesmo que se considere a ineficácia absoluta do depoimento prestado em juízo para produzir efeitos sobre a esfera jurídica do apelante, há provas autônomas e independentes que, além de qualquer dúvida razoável, sustentam a acusação. Subsistem elementos suficientes a permitir a condenação, que está amparada em diversos outros elementos de prova material e testemunhal desvinculados das alegações do colaborador.

No ponto, destacou que o CPP prevê a admissibilidade de provas decorrentes de fontes independentes, sem nexo de causalidade com eventuais provas ilícitas, a fim de embasar decretos condenatórios (CPP, art. 157, §1º). Ademais, a tese da fonte independente também tem sido acolhida pela jurisprudência do STF como exceção à teoria dos frutos da árvore envenenada.

Em conclusão, o ministro reconheceu a nulidade em menor grau, com base nos arts. 563 e 566 do CPP. Aduziu inexistir sentido em se renovar o interrogatório em relação ao recorrente quando inúmeras outras provas justificam a condenação e foram devidamente fundamentadas pelo magistrado de piso.

Vencido o ministro Ricardo Lewandowski, que decretou a nulidade do interrogatório do colaborador para que seja refeito em relação ao recorrente. A seu ver, deveria ter-lhe sido nomeado defensor ad hoc, em face da ausência do advogado constituído naquele ato processual.

De igual modo, vencidos os ministros Cármen Lúcia (relatora) e Edson Fachin (revisor), que rejeitaram a preliminar. A relatora aduziu que a ausência dos advogados nos interrogatórios seria estratégia que a defesa entendeu ser adequada no momento. Contudo, a estratégia não pode ser algo que torne inefetiva a prestação jurisdicional e, logo, não pode constituir nulidade. Os ministros ressaltaram que o advogado se fazia presente no mesmo dia. Além disso, subsistem outros elementos capazes de manter a higidez da sentença.

(1) Lei 9.807/1999: “Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I – a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa; (…) Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.”
(2) CP: “Art. 107 – Extingue-se a punibilidade: (…) IX – pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.”
(3) CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: (…) n) a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados;”
(4) CPP: “Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. (…) Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.”

AO 2093/RN, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 3.9.2019. (AO-2093)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – NULIDADES E RECURSOS EM GERAL

Assistente de acusação: tempestividade de recurso e coisa julgada –

A Segunda Turma iniciou julgamento de agravo regimental em habeas corpus em que se discute a tempestividade de recurso de agravo manejado pelo assistente de acusação, por meio do qual deferiu-se seguimento a Recurso Especial (REsp); bem assim a possibilidade de esse agravo obstar a ocorrência do trânsito em julgado para a acusação.

No caso, o Ministério Público e o assistente de acusação insurgiram-se contra a absolvição do agravante por meio de recursos especiais, que não foram admitidos na origem. Ambos agravaram da decisão de inadmissibilidade. O prazo de cinco dias para agravar (Lei 8.038/1990, art. 28) (1), para o MP, se encerrou em 12.11.2012. Por sua vez, o assistente da acusação protocolou seu recurso de agravo em 19.11.2012.

O ministro Edson Fachin (relator), inicialmente ressalvou seu entendimento pessoal quanto ao não cabimento de habeas corpus para reexame de pressupostos de admissibilidade de recurso interposto no STJ. Não obstante, reconheceu que a jurisprudência da Corte tem evoluído no sentido de ampliar as hipóteses de admissibilidade do writ, razão pela qual passou ao exame do mérito.

No mérito, negou provimento ao recurso. Apontou que o ato coator deixou consignado que a questão da tempestividade do agravo do assistente da acusação estava preclusa. Registrou que o prazo recursal esgotou-se, para o MP, em 12.11.2012, e que o parquet protocolou seu recurso em 19.11.2012, intempestivamente, portanto.

É cediço que a inércia do órgão ministerial faz nascer para o assistente da acusação o direito de atuar na ação penal, inclusive para interpor recursos excepcionais (Enunciado 210 da Súmula do STF) (2). A manifestação do promotor de justiça pela absolvição do réu, inclusive, não altera nem anula o direito de o assistente de acusação requerer a condenação.

Ademais, o prazo para o assistente de acusação interpor recurso começa a correr do encerramento, in albis, do prazo ministerial (Enunciado 448 da Súmula do STF) (3). No caso, o prazo do assistente de acusação se iniciou em 13.11.2012, e o recurso foi protocolado em 19.11.2012 (segunda-feira), de modo que foi respeitado o quinquídio legal.

Assim, se o acórdão absolutório foi combatido tempestivamente pelo assistente de acusação, não houve formação de coisa julgada em favor do réu.

Em seguida, o ministro Ricardo Lewandowski pediu vista dos autos.

(1) Lei 8.038/1990: “Art. 28. Denegado o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo de instrumento, no prazo de cinco dias, para o Supremo Tribunal Federal ou para o Superior Tribunal de Justiça, conforme o caso”.
(2) Enunciado 210: “O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598 do Cód. de Proc. Penal.”
(3) Enunciado 448: “O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público.”

HC 154076 AgR/PA, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 3.9.2019. (HC-154076)

DIREITO PROCESSUAL PENAL – EXECUÇÃO DA PENA

Execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado –

A Segunda Turma, diante do empate na votação, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão monocrática que concedeu habeas corpus ao paciente, para lhe assegurar o direito de aguardar em liberdade até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Prevaleceu o voto do ministro Ricardo Lewandowski (relator), segundo o qual o princípio da presunção de inocência se estende até o trânsito em julgado da condenação, nos termos do que previsto na Constituição Federal (CF, art. 5º, LVII).

O relator registrou uma particularidade do caso concreto: o fato de o Ministério Público não ter apelado do trecho da sentença que garantiu ao réu o direito de recorrer em liberdade. Portanto, quanto a esse ponto, houve trânsito em julgado.

Vencidos os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia, que deram provimento ao agravo para denegar o writ.

Para o ministro Edson Fachin deve ser observada, em deferência ao princípio da colegialidade, a jurisprudência atual e majoritária do Plenário da Corte (HC 126.292, ADC 43 MC e ADC 44 MC) que admite o início do cumprimento da pena em caso de título condenatório não passível de impugnação por recursos que possuam automática eficácia suspensiva. Salientou que a matéria pode vir a ser reexaminada em sede própria, contudo não por órgão fracionário do tribunal.

Quanto à exigência de fundamentação concreta para fins de legitimação da execução provisória, asseverou que esse argumento foi expressamente rechaçado pela mencionada jurisprudência formada pelo Pleno.

Citou, por fim, o que decidido no HC 152.752, no sentido de não configurar reforma prejudicial a determinação do imediato cumprimento da pena mesmo com comando sentencial que garanta ao réu, de forma genérica, o direito de recorrer em liberdade.

HC 151430 AgR-segundo/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 3.9.2019. (HC-151430)

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