quarta-feira,17 abril 2024
ColunaCorporate LawImunidades, Isenções e não incidência tributária. Qual a diferença?

Imunidades, Isenções e não incidência tributária. Qual a diferença?

imunidade isenção e não incidência tributária

É comum a confusão entre os termos acima quando se trata de matéria tributária. Pelo menos, imunidade e isenção são semelhantes e causam dúvidas. O que, no fundo e de forma breve, podemos afirmar é que representam três hipóteses de impedimento ao Fisco em exercer sua atividade de tributação através dos entes federados (União, Estados membros, Distrito Federal e Municípios), ou seja, em qualquer hipótese, como veremos, de imunidade, isenção ou não incidência, não há tributação e o contribuinte não passa a recolher tributos.

Passemos, então, a análise dos termos e suas peculiaridades.

 

Imunidade tributária

O termo imunidade tem origem no latim Immunitas que significa “liberação” ou “isenção”.

A palavra latina immunitas se originou a partir do termo immunis, que quer dizer “livre” ou “dispensado”. Esta, pos sua vez, foi formada pela junção dos elementos in, que significa “sentido de negação”, mais múnus, que quer dizer “cargo” ou “ofício”.

Assim, o sentido literal de immunis seria “não cargo” ou um “não ofício”.

Atualmente, a palavra imunidade pode ser utilizada tanto no sentido de “isenção de uma atividade”, como “resistência natural ou adquirida de um organismo vivo”.

Tratar de imunidade em matéria de direito tributário é adaptar sua origem etimológica ao seu sentido jurídico. Fato relevante é que imunidade tributária somente é tratada pela Constituição Federal de 1988 não podendo se falar em imunidade que já não estejam previstas na CF.

Todo ente federado é dotado de competência tributária para criar tributos. A Constituição Federal os torna competente para tal. É o que diz o texto da Carta Magna no art.145:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I – impostos;
II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

A imunidade tributária surgirá como um freio, um obstáculo ao ente que queira instituir tributos. Como bem descreveu o mestre Roque Antônio Carraza, em sua obra, sobre o assunto:

“A imunidade tributária é um fenômeno de natureza constitucional. As normas constitucionais que, direta ou indiretamente, tratam do assunto fixam, por assim dizer, a incompetência das entidades tributantes para onerar, com exações, certas pessoas, seja em função de sua natureza jurídica, seja porque coligadas a determinados fatos, bens ou situações.”

Trata-se, portanto, de um impedimento constitucional e, por assim ser, é hierarquicamente superior. Qualquer lei que surgir no ordenamento jurídico a pretender criar o tributo sobre a pessoa ou situação imune será inconstitucional.

Na Constituição Federal, as hipóteses de imunidade estão previstas no art.150, inciso VI. Vejamos:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(…)

VI – instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

b) templos de qualquer culto;

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;

d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

e) fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil contendo obras musicais ou literomusicais de autores brasileiros e/ou obras em geral interpretadas por artistas brasileiros bem como os suportes materiais ou arquivos digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação industrial de mídias ópticas de leitura a laser. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 75, de 15.10.2013)”

A doutrina e a jurisprudência entendem que o art.150, VI da CF, aplica-se somente aos impostos e esta é a corrente majoritária que deve ser adotada em avaliações como OAB ou concursos.

O rol, por sua vez, não é taxativo. Pelo contrário, na própria Constituição, em outros dispositivos, dispõe sobre imunidades para outras espécies de tributos, por exemplo, o art.5º ao prever os direitos fundamentais, concede imunidades às taxas pelo serviço de recebimento de petição de órgãos administrativos e pelo fornecimento de certidões (inciso XXXIV); para as taxas judiciárias relativas ao processamento  da ação popular, habeas corpus e do habeas data (incisos LXXIII e LXXVII); taxas relativas ao serviço de registro de nascimento e certidão de óbito, aos reconhecidamente pobres (inciso LXXVI). A intenção do constituinte foi de desonerar serviços essenciais ao exercício da cidadania àqueles que não pudessem suportar os encargos administrativos.
Além destas hipóteses para taxas, podemos citar, com relação aos impostos, a previsão no art.153, §4º, CF que dispões sobre a imunidade do Imposto Territorial Rural – ITR, relativamente às pequenas glebas rurais, quando o proprietário a explorar sem que haja outro imóvel e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS sobre as operações que destinem mercadorias para o exterior e sobre serviços prestados e destinados no exterior, conforme o art. 155, §2º, X, a, CF). Por fim, o art.149,§2º, I, da CF concede imunidade para contribuições sociais e de domínio econômico quando oriundas do exterior.

Como vimos, quando há hipótese de imunidade, o Poder Público se abstém de cobrar tributos, sob pena de violar a Constituição Federal. Ademais, pelo fato das imunidades representarem direitos fundamentais, o legislador não pode revoga-las e, por óbvio, nem mesmo por emendas constitucionais por se tratarem das chamadas cláusulas pétreas (art.60,§4º, CF)

Não nos esqueçamos que imunidade não é só para impostos. Como vimos, existe, também para as outras espécies tributárias, como taxas e contribuições.

Em artigos futuros iremos desmembrar cada uma das modalidades de imunidade para que o conteúdo fique didaticamente melhor.

Isenção Tributária

A palavra isenção no dicionário Michaelis quer dizer: ato de eximir; privação; estado ou condição do que é isento.

Ao contrário das hipóteses de imunidades, as isenções tributárias são concedidas por lei. É o próprio ente tributante (União, Estados, DF, Municípios) que, ao exercer sua competência determinada pela CF, prevê por lei específica uma determinada isenção, ou seja, o ente competente para instituir um determinado tributo, por lei específica, determina exceções nas quais o tributo não será devido.

Para a doutrina existem várias teorias que buscam explicar este fenômeno jurídico. Mas, creio ser pertinente trazermos o conceito de Amílcar de Araújo Falcão apud Roque Antônio Carraza, na obra de Curso de Direito Constitucional Tributário:

“Na isenção, diversa é a hipótese. Nela, há incidência, ocorre o fato gerador. O legislador, todavia, seja por motivos relacionados com a apreciação da capacidade econômica do contribuinte, seja por considerações extrafiscais, determina a inexigibilidade do débito tributário”

Fato relevante é que a isenção por ser sempre concedida por lei, assim, deve estar prevista. Isto porque, na ausência de lei que concede isenção ou é revogada, o tributo passa a ser devido automaticamente. Assim, nesta hipótese, os fatos que seriam “isentos” passam a ser devidos.
Diferentemente, ocorre com as imunidades: é desnecessária a presença de lei para tratar de imunidades, pois, como visto, devem estar previstas na Constituição. Como esclarece e ilustra, Hugo de Brito Machado Segundo, em sua obra “Primeiras Linhas de Direito Financeiro e Tributário”:

“Se a Constituição concede imunidade aos templos religiosos, por exemplo, e a lei municipal determina a tributação dos imóveis pelo IPTU, sem fazer ressalvas, está implícito que os imóveis pertencentes aos templos de qualquer culto não podem ser tributados. A lei deve ser interpretada conforme a Constituição, sob pena de se tornar inconstitucional por violação à imunidade.”

As isenções tributárias, no Brasil, podem ser concedidas por lei ordinária, lei complementar, tratado internacional (aprovado, ratificado e promulgado), por decreto legislativo estadual ou do DF quando em matéria de ICMS.

O Imposto de Renda, tributo federal, por administração da Receita Federal do Brasil, prevê hipótese de isenção para portadores de moléstia grave, por exemplo: AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; Alienação Mental; Cardiopatia Grave; Cegueira; Contaminação por Radiação; Doença de Paget em estados avançados (Osteíte Deformante); Doença de Parkinson; Esclerose Múltipla entre outros. (Lei n.7.713 de 1988: Altera a legislação do imposto de renda e dá outras providências.)

Perceba que: uma pessoa portadora de alguma das moléstias acima é capaz de ter renda e estar na margem de tributação. Porém, o legislador retira a obrigação de pagar o Imposto, ainda que pudessem faze-lo. É diferente da imunidade, pois nesta, a própria Constituição iria prever que os portadores das doenças que ela dispusesse seriam imunes, sem precisar lei ou disposição da Receita Federal.
É uma linha de diferença bastante tênue, mas que existe: nas imunidades, a vedação de tributação é decorrente da CF e não permite se quer que o contribuinte seja notificado a pagar impostos, taxas ou contribuições, pois seria inconstitucional. O Padre de uma capela no interior da cidade, por exemplo, não pode receber uma notificação de IPTU; nas isenções, o contribuinte é devedor do tributo, mas o legislador por meio de lei dispensa seu pagamento. Por isso, é comum a necessidade de comprovação de uma moléstia grave, por exemplo. Isto porque, cabe ao contribuinte enquadrar-se na norma isentiva diante de um débito tributário.

 

Não incidência tributária

A não incidência é um raciocínio lógico por exclusão ao compreendermos que, o que não está descrito na CF como imunidade e nem em lei como isenção é devido. Ainda assim, não precisaria, mas para fins didáticos, é comum que tais hipóteses estejam dispostas em lei. É o exemplo da legislação do IPVA que prevê que este imposto não incide sobre a propriedade de veículos de propulsão humana (bicicletas) ou animal. Não seria óbvio imaginarmos que não incide IPVA em uma charrete? Pois bem. O legislador quis ser claro e didático. Alias, seria bem contraditório, por exemplo, nós moradores de SP com o intuito de diminuir a frota de veículos, tivéssemos que pagar IPVA para andarmos de bicicleta aos domingos no Parque Ibirapuera ou nas inúmeras ciclovias, não é mesmo? Mas, não vamos dar ideia, vai que…


Referências:

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 16ºEd., São Paulo, Saraiva, 2010.

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 21ºEd., São Paulo, Malheiros, 2005.

FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato Gerador da Obrigação Tributária, 1ºEd., Rio de Janeiro, Financeiras, 1964.

MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Primeiras Linhas de Direito Financeiro e Tributário, 8ºEd., São Paulo, Atlas, 2014.

http://www.dicionarioetimologico.com.br/imunidade/

 

Andressa Gomes

Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo; Tributarista Júnior pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação.

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