quinta-feira,28 março 2024
ColunaDireito InternacionalHomologação de sentença estrangeira

Homologação de sentença estrangeira

A homologação de sentença estrangeira é um procedimento judicial que tem o objetivo de dar executoriedade interna e externa a sentenças proferidas em outro país.

No Brasil, a competência para a homologação de sentença estrangeira é do Superior Tribunal de Justiça, art.475, N, VI CPC (e o art. 483 CPC. De acordo com o que estabelece o artigo 105, I, i, da Constituição Federal, com as modificações decorrentes da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, passa-se a ser de competência do STJ. O artigo 15 da Lei de introdução ao Código Civil lista os requisitos necessários para que a sentença estrangeira seja homologada:

  • haver sido proferida por juiz competente;
  • terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificada à revelia;
  • ter transitada em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida;
  • estar traduzida por tradutor juramentado;
  • ter sido homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.

O artigo 15, parágrafo único, da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, foi expressamente revogado pela Lei 12.036/2009. Seu antigo conteúdo mencionava que “não dependem de homologação as sentenças meramente declaratórias do estado das pessoas”.

Há teorias que explicam, ou tentam explicar os argumentos e regimes pelos quais passam as “sentenças” a serem homologadas:

Sistema da revisão do mérito da sentença

Julga-se novamente a causa que inspirou a “sentença” como se essa não existisse, ensejando até nova produção de provas, reanalisando as preexistentes, somente após a decisão estrangeira poderá ou não ser ratificada.

Esse método é mais complexo, moroso, todavia torna o direito estrangeiro aplicado no exterior mais justo frente a jurisdição interna do país homologador; criando, inclusive, jurisprudência para resolução novas demandas relativas a tais Estados.

Sistema parcial de revisão do mérito

Sistema imposto com o fim de analisar a aplicação da lei do país em que irá ser executada a sentença. Ainda nesse sistema o que se busca distinguir se há a possibilidade de aplicação da lei embasadora da sentença estrangeira no Estado em cujo território a sentença estrangeira irá produzir efeitos.

Sistema de reciprocidade diplomática

Utilizam-se os tratados como base. Não havendo tratado entre os Estados, sequer será possível a homologação.

Sistema de reciprocidade de fato

Nesse sistema, a homologação só é possível se ambos os Estados envolvidos na relação protegerem os mesmos institutos; e.g., o casamento entre indivíduos do mesmo sexo é admitido na Holanda. Na hipótese de um casal de holandeses passar a residir em Portugal, e querer legalizar, neste país, sua união, será necessário que a autoridade lusitana competente homologue o ato judicial proferido pelo Poder Público holandês. Para tanto, seria necessário que o ordenamento jurídico português previsse o referido instituto jurídico.

Processo da delibação

Neste sistema, não é sequer aferido o mérito da sentença. Examinam-se, singularmente, as formalidades da sentença a luz de princípios fundamentais para se considerar justo um processo, tais como: respeito ao contraditório e a ampla defesa, legalidade dos atos processuais, respeito aos direitos fundamentais humanos, adequação aos bons costumes. Foi sempre consagrado pela Itália e é adotado pelo Brasil.

Delibar significa saborear, passar com os lábios, ou seja, o STJ somente observa os requisitos formais do processo e não se aprofunda ao mérito.

É um processo que visa a conferir eficácia a um ato judicial estrangeiro. Qualquer provimento, inclusive não judicial, proveniente de uma autoridade estrangeira, só terá eficácia no Brasil após sua homologação pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 216-B do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça).

O direito estrangeiro é aplicado de maneira direta e indireta.

Direta

O processo a ser observado é sempre o da lex fori, ou seja, as regras processuais da lei nacional.

Quanto as provas, os tribunais brasileiros não aceitam prova que sua lei desconheça.

O processo tem a devida tramitação perante o juiz do foro.

A primeira tarefa do juiz é identificar o elemento de conexão. Conhecido este saberá, consequentemente, qual a lei a ser aplicada ao caso sob exame, ou seja, se a nacional ou a estrangeira.

Em se tratando de lei estrangeira, passará à qualificação.

Distinguida a instituição estrangeira e, em havendo identidade desta com uma do nosso sistema jurídico, o juiz investiga o conflito da lei com a ordem pública.

O trabalho subsequente é interpretação que deve estar dentro dos critérios previstos pelo direito pátrio.

Se conflitando com a ordem pública, não há mais o que fazer, a lei estrangeira não será adaptada.

Não sendo a instituição, cuja aplicação é prevista, conhecida, só restará ao juiz, através do mérito comparativo, buscar uma outra do direito interno semelhante.

Indireta

Nesta, a sentença é proferida por juiz estrangeiro.

Apenas a execução será no país homologador, ou seja, seus efeitos agirão no Estado homologador.

Somente após ser homologada pelo referido país mediante seu organismo competente para tal (no Brasil o STJ), será executada a sentença nos termos previstos.

Documentos estrangeiros

Embora as sentenças estrangeiras possam ser homologadas, seus demais atos produzidos não o são, e mais, precisam também passar pelo crivo da pessoa competente no direito interno do país a que se destinam os efeitos do ato ou demais decisões (oitiva de testemunhas, depoimentos pessoais, extradição…), ou seja, qualquer ato de jurisdição externa para ter efeito no Brasil é feito através de carta rogatória.

Inspirado pelo modelo italiano, o Brasil adotou o sistema da delibação moderada. Além da verificação dos requisitos formais e da potencial ofensa à soberania nacional ou aos bons costumes, há o principal exame, referente à observância da ordem pública. Para a verificação da ofensa ou não aos mencionados requisitos e, especialmente, de possível contrariedade à ordem pública, o mérito da questão é considerado de maneira superficial, de modo a analisar a adequação do ato estrangeiro em si, do seu conteúdo e da forma como foi produzido na jurisdição estrangeira.

Atualmente, é atribuição do Presidente do STJ homologar sentenças estrangeiras e conceder exequatur às cartas rogatórias. Porém, havendo contestação, o processo será submetido a julgamento da Corte Especial do STJ e distribuído a um dos Ministros que a compõem (Arts. 216-A e 216-O, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça).

Até 2004, esse processo era da competência do Supremo Tribunal Federal. Após a Emenda Constitucional n. 45/2004, o Superior Tribunal de Justiça passou a ter a competência para processar e julgar os feitos relativos à homologação de sentença estrangeira e à concessão de exequatur às cartas rogatórias.

No Brasil a carta rogatória para ser cumprida tem de receber o exequatur do superior Tribunal de Justiça, recebendo-o a carta será cumprida no juízo federal de primeira instância.

A legislação interna do Estado estrangeiro onde se deseje a homologação da sentença proferida no Brasil determinará o procedimento para a homologação de sentenças oriundas de autoridades brasileiras. Via de regra, será necessário requerer a homologação junto a um tribunal ou corte estrangeira. Vide o item 7, a seguir, onde constam as regras observadas pelo Brasil em casos semelhantes e que, geralmente, também são levadas em conta pelos outros países.

Outra forma de solicitar, no exterior, a homologação de sentenças brasileiras em matéria civil, é formular o pedido por meio de carta rogatória, desde que exista tratado prevendo tal procedimento. Até o momento, é possível realizar pedidos da natureza com base nos tratados bilaterais com a Espanha, a França e a Itália, bem como para Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, com base no Acordo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Comercial, Trabalhista e Administrativa entre os Estados Partes do MERCOSUL, a República da Bolívia e a República do Chile.

Sentenças passíveis de homologação

Embora a lei brasileira fale em sentença, a leitura já está superada, visto que é homologável, para exemplificar, acórdão, sentença de natureza cível, comercial, criminal, trabalhista…; decretos de reis, prefeitos, parlamento, assim como resoluções em processos arbitrais contanto que estejam revestidos das formalidades legais para que surtam efeito em seu país de origem.

O procedimento de homologação de uma sentença estrangeira segue o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Assim, a homologação deve ser requerida necessariamente por um advogado mediante petição endereçada ao Ministro Presidente do STJ e protocolada na Coordenadoria de Processos Originários.

Caso contenha todas as peças processuais e não haja contestação, o tempo médio de tramitação será de 2 meses. O provimento final será uma decisão, homologando ou não a sentença estrangeira. Se homologada, o advogado deverá proceder à sua execução que, no caso, se dará pela extração da Carta de Sentença.

Após transitada em julgado a decisão que homologar a sentença estrangeira, cumpre ao interessado requerer, independente de petição, a extração da “Carta de Sentença” (Art. 216-N do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça). Trata-se de um documento expedido pela Coordenadoria de Execução Judicial mediante o pagamento de uma taxa.

De posse da Carta de Sentença, o advogado poderá proceder à execução da sentença estrangeira na Justiça Federal competente.

As fontes de direito processual internacional são basicamente normas internas.  No Brasil podemos citar a Constituição Federal, a Lei de Introdução ao Código Civil, o Código de Processo Civil, o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça e outras leis processuais esparsas.

Existem também normas provenientes de tratados internacionais multilaterais e bilaterais. No âmbito do Mercosul, foi firmado o “Protocolo de Las Leñas” – de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa, concluído pelos governos da Argentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai, em 27 de junho de 1992, promulgado pelo Decreto nº. 2.067, de 12 de novembro de 1996, publicado no DOU de 13.11.96

De acordo com o art. 18 do Protocolo, as suas disposições são aplicáveis ao reconhecimento e à execução das sentenças e dos laudos arbitrais pronunciados nas jurisdições dos Estados Partes em matéria civil, comercial, trabalhista e administrativa, e serão igualmente aplicáveis às sentenças em matéria de reparação de danos e restituição de bens pronunciadas na esfera penal.

Ainda de acordo com o art.  19, determina o protocolo que o pedido de reconhecimento e execução de sentenças e de laudos arbitrais por parte das autoridades jurisdicionais será tramitado por via de cartas rogatórias e por intermédio da Autoridade Central.”

Assim, há que prevalecer o entendimento no sentido de que a homologação de sentença estrangeira proveniente do Mercosul tem procedimento facilitado, o que, entretanto, não elide a necessidade de procedimento próprio perante o Superior Tribunal de Justiça.

Nesse sentido o trecho a seguir transcrito, de decisão do STF, na Carta Rogatória n. 7618 da República da Argentina:

O Protocolo de Las Leñas (“Protocolo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista, Administrativa” entre os países do Mercosul) não afetou a exigência de que qualquer sentença estrangeira – à qual é de equiparar-se a decisão interlocutória concessiva de medida cautelar – para tornar-se exequível no Brasil, há de ser previamente submetida à homologação do Supremo Tribunal Federal, o que obsta a admissão de seu reconhecimento incidente, no foro brasileiro, pelo juízo a que se requeira a execução; inovou, entretanto, a convenção internacional referida, ao prescrever, no art. 19, que a homologação (dita reconhecimento) de sentença provinda dos Estados partes se faça mediante rogatória, o que importa admitir a iniciativa da autoridade judiciária  competente do foro de origem e que o exequatur se defira independentemente da citação do requerido, sem prejuízo da posterior manifestação do requerido, por meio de agravo à decisão concessiva ou de embargos ao seu cumprimento (CR-AgR 7613 / AT – ARGENTINA   AG.REG.NA CARTA ROGATÓRIA Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE Julgamento:  03/04/1997 Órgão Julgador:  Tribunal Pleno.)

Uma sentença penal estrangeira, assim como as sentenças penais em geral, poderá ser reconhecida pelo STJ de acordo com a processualística prevista para a chamada homologação de sentenças estrangeiras no Brasil. Entretanto, devido às especificidades das sentenças penais estrangeiras, isto não seria possível para qualquer sentença penal estrangeira. Por exigência do artigo 9º do Código Penal, somente na hipótese de homologação para reparação civil ex delicto ou para aplicação de medida de segurança no Brasil caberia o reconhecimento. E desde que atendidas as condições previstas no citado artigo.

O processo de execução das sentenças estrangeiras no Brasil é apenas empreendido após prévia homologação efetivada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.

A homologação não analisa o mérito da sentença estrangeira, ela apenas analisa os requisitos previstos no art. 5º da resolução 9/2005 e os limites estabelecidos no art. 17 do decreto-lei 4.657/1942. Vai daí que essa análise realizada pelo STJ consistente apenas na forma invés da análise de mérito da sentença estrangeira, é chamada de juízo de delibação ou sistema de delibação.

Tal exigência não é excluída pelo Protocolo de Las Leñas em relação às sentenças proferidas nos demais países do Mercosul, mas em razão do citado protocolo é formulado um processo simplificado, idêntico ao das cartas rogatórias, para que tais decisões possam ser cumpridas dentro do nosso país.

 


Referências

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 50 ed. Rio de Janeiro: Forense,2009. Pág.685.

MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil Interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. 8 ed. Barueri, SP: Manole, 2009. Pág. 611.

Vicente Greco Filho, “Direito Processual Civil Brasileiro”, v.2, p.375-376.

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