sexta-feira,29 março 2024
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Flexibilização Trabalhista: um mal necessário ou ferramenta de manutenção de empregos?

Este trabalho tem o propósito elementar de destacar a importância da flexibilização de direitos trabalhistas em nome da manutenção do emprego e da atividade econômica. Por mais que o Direito do Trabalho tenha a cultura e essência de garantir ao máximo os direitos trabalhistas, reduzir ou relativizar direitos podem ser imprescindíveis para se resguardar a dignidade da pessoa humana e combater o desemprego no mercado de trabalho e a falência de empresas.

Embora o Direito do Trabalho seja historicamente protecionista, esta proteção exacerbada pode, muitas vezes, ser prejudicial á competitividade e sobrevivências das empresas, principalmente em função da globalização.

A flexibilização das normas trabalhistas surge, desta forma, como uma solução, adequando as normas à situação e às necessidades atuais. É cediço que ao legislador é impossível acompanhar todas as transformações e mudanças sociais e econômicas, destarte, a flexibilização surge como um método de adaptação à realidade social, desde que respeitados direitos e garantias fundamentais.

Assim, objetiva-se demonstrar que a flexibilização pode vir a ser um método hábil a minimizar a situação de desemprego no Brasil, que atualmente encontra-se em níveis alarmantes. Em outras palavras, é plenamente possível compatibilizar os interesses do empregado e do empregador, sem esquecer-se do que estabelece os princípios e direitos dos trabalhadores.

Por longos períodos, a legislação do trabalho no Brasil e na América Latina, em geral, era centrada na tendência de garantir condições mínimas de trabalho, sustentadas pelo princípio da irrenunciabilidade.

Contudo, as relações individuais de trabalho vêm sofrendo várias modificações nos últimos anos, em razão da conjugação de fatores múltiplos, tais como crises econômicas, inovações tecnológicas, modificações na organização da produção, a globalização, a competitividade acirrada de outros países e a necessidade de combater o desemprego, dentre outras motivações.

Todas essas mudanças fomentaram a discussão acerca da possibilidade da flexibilização do emprego. Historicamente, a flexibilização trabalhista tem sido uma reivindicação empresarial, conforme explica Alice Monteiro de Barros[1]:

A flexibilização no campo do trabalho, historicamente, tem sido uma reivindicação empresarial identificável com uma explícita solicitação de menores custos sociais e maior governabilidade do fator trabalho. Para a realização dessa reivindicação, reclama-se uma flexibilização normativa, que poderá ser atingida sob o prisma legal, regulamentar e convencional, mas assegurando-se garantias mínimas ao empregado.

A flexibilização teve dois momentos históricos: o primeiro coincide com o chamado “direito do trabalho da emergência” e corresponde a um processo temporário; o segundo coincide com a “instalação da crise” e corresponde a reivindicações patronais permanentes. (BARROS, 2016, p.65)

Inúmeros são os fatores que causam crises e transformam a economia mundial, impactando na política interna de cada país, aumentando o índice de desemprego mundial. Diante destes fatores, é necessário encontrar um modelo de Direito do Trabalho que se harmonize com a realidade.

A globalização, da mesma forma, contribuiu para que o mercado passe por uma profunda modificação em razão da volatilidade do mercado, do aumento da competição, da procura exacerbada pelo lucro, da necessidade de aumentar a produção, etc.

Diante deste cenário e desta crise, é imprescindível adotar e harmonizar os interesses empresariais com as necessidades do trabalhador, contudo, a flexibilização das normas trabalhistas somente se justifica em casos de manutenção da empresa e da fonte emprego.

Infere-se que cada vez mais a flexibilização dos direitos trabalhistas vem ganhando força, desde seu surgimento, até ganhar lugar na Constituição Federal de 1988. Em análise do regramento constitucional e infraconstitucional, podemos verificar as seguintes hipóteses legais de flexibilização trabalhista:

Art. 7º, VI, da CF – redução salarial (o art. 503 da CLT não foi recepcionado pela CF).

Art. 7º, XIII, da CF – redução de jornada e compensação de horas extras.

Art. 7º, XIV, da CF – aumento de jornada para os que trabalham em turnos ininterruptos de revezamento.

Art. 58, § 3º, da CLT – fixação de uma média de horas in itinere, exclusivamente para micro e pequenas empresas.

Art. 71, § 5º, da CLT – redução e/ou fragmentação do intervalo intrajornada para motoristas, cobradores e fiscais de ônibus.

Art. 476-A da CLT – suspensão contratual para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional.

Lei 9.601/1998 – contratação por prazo determinado.

Portanto, a flexibilização das normas trabalhistas nada mais é que uma forma de adaptação ao mercado de trabalho, respeitando, por lógica, garantias mínimas de trabalho, pertencentes aos direitos fundamentais.

Diante do cenário de crise econômica e ainda em razão do chamado “custo Brasil”, muitas empresas acabam não suportando os encargos e fechando suas portas, deixando a mercê inúmeros trabalhadores, e consequentemente, agravando o cenário da crise, diminuindo a arrecadação do Estado dentre outros fatores.

Neste diapasão, questiona-se: o que seria melhor, relativizar direitos trabalhistas e evitar a falência da empresa ou deixar o trabalhador desempregado?

Por óbvio vislumbra-se que a flexibilização das normas trabalhistas é um mal necessário. Por mais que pareça o contrário, ela tem dupla finalidade: manter a atividade econômica e o desenvolvimento social, ao mesmo tempo que garante direitos mínimos ao trabalhador e preserva sua dignidade, tendo em vista que o desemprego e a ausência de renda ferem muito mais à dignidade da pessoa humana do que qualquer relativização de direitos.

Não há dúvidas que a flexibilização atua como uma alternativa à rigidez das normas, tendo em vista que permite que empregados negociem, por meio de seus sindicatos as próprias condições de trabalho diretamente com o empregador.

Embora a realização de acordos e convenções possa reduzir ou relativizar diretos trabalhistas, em busca de outras vantagens, como a manutenção do emprego, a mesma não autoriza a simples redução das prerrogativas legais, haja vista que a flexibilização dos direitos do trabalho não é ilimitada, tampouco absoluta, devendo ser harmonizada com a proteção especial dispensada ao trabalhador e evitando que este seja tratado como mero objeto ou instrumento de trabalho.


BIBLIOGRAFIA

AMÉRICO, Lucas Carvalho. A possibilidade de flexibilização de direitos sociais trabalhistas face aos direitos e garantias fundamentais. In: TOMAZ, Alberto Simões de; GOMES, Marcia Pelissari; AMÉRICO, Lucas Carvalho. Democracia, Direitos fundamentais e Jurisdição. Vol.1. Pará de Minas: Virtual Books. 2016.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10 ed. São Paulo: LTr, 2016.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Coimbra: Almedina, 2004.

CASSAR, Bomfim Vólia. Direito do trabalho. – 9.ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.

[1] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10 ed. São Paulo: LTr, 2016.

 

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