quinta-feira,28 março 2024
ColunaDiálogos ConstitucionaisEm busca da harmonia entre a Constituição e o Novo CPC

Em busca da harmonia entre a Constituição e o Novo CPC

A origem dos sistemas precedentalista (common law) e da supremacia do legislativo (civil law), remonta há séculos de história, de independência das colônias inglesas, das dinastias superiores da França e da família canônica praticada na Itália e na Alemanha.

Não é um problema de Processo, de Sistema Judiciário, mas, sim de Teoria Geral do Direito, é dizer, de como determinada sociedade e em dada época concebe o poder de inovar na ordem normativa de regulação intersubjetiva. Não se relaciona, assim, com a forma como a justiça é exercida pelos juízes e tribunais, se a partir da lei ou de determinada decisão, mas, como se inaugura a ordem, como se conhece a ordem que é dada: se pela validade da estrutura normativa ou pela estrutura hierárquica judicial.

A pergunta a ser respondida é: Quem tem o poder de dar ordem? Quem pode inaugurar a ordem? Na tradição do common law o direito é concebido pela prática dos tribunais que, ao longo dos séculos, concebeu a forma originária, de organização da sociedade; já no civil law o direito é aquilo decidido pelo parlamento. Altera-se, assim, a forma pela qual se relacionam os poderes.

Por isso não se afigura correto criticar o positivismo pela sua função de separar o direito de outras ciências, porque foi uma decorrência científica da necessidade de se outorgar independência ao uso da lei como veículo normativo.

A vinculação da produção da norma jurídica a outros poderes que não jurídico acarreta a contaminação, o risco de cair em subjetivismos e em análises que façam ruir as bases epistemológicas da ciência jurídica.

Quando o direito passa a ser analisado como resultado de operação no qual implica em prejuízo econômico ao Estado ou ao particular, ou no momento em que se busca a estabilidade jurídica em detrimento da aplicação do comando legal, há uma quebra de paradigma.

Nesses casos saímos do sistema de civil law e, bem ou mal, vamos abeberar do sistema de common law atribundo ao comando jurisdicional uma eficácia ultra legem, como se o judiciário agisse como o último guardião e refúgio.

Se essa migração vai ocorrer, então é preciso que o devido processo legal seja observado. Como assim? O sistema de jurisdição constitucional, isto é, que regula a forma como é exercido o controle de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal e a guarda da lei federal pelo Superior Tribunal de Justiça precisam observar os parâmetros previstos no Código de Processo Civil.

A discricionariedade é exceção. A regra vale para toda a administração pública e está calcada nas regras contidas no caput do art. 37 da Constituição Federal. Com isso quer-se dizer que a adoção da decisão judicial como fonte do direito não implica o abandono dos dispositivos legais, sua desconsideração, superação, ou completa ignorância.

O sistema common law não implica no reconhecimento da legitimidade da decisão judicial qualquer que seja ela. A técnica de precedente que foi trazida para o Brasil busca, sobretudo, eliminar o grave problema da divergência interpretativa.

Leis não faltam para serem interpretadas. O problema não são as lacunas, mas os desafios.

Vozes na doutrina sustentam, por esse e outros argumentos, que a vinculação das decisões judiciais sem prévia emenda constitucional se afigura incompatível com o texto, em razão do que dispõe o art. 5º, inciso II (princípio da legalidade: ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa sem previsão legal).

O ponto de equilíbrio diz respeito em reconhecer-se qual a função que o precedente desempenha em nosso sistema. Se interpretativo ou criativo. Qualquer das posições encontram respeitadíssimas correntes doutrinárias.

Refletindo a partir da disposição constitucional, a leitura que se faz dos artigos 926 e 927 não é no sentido de que a decisão inove, mas que estabeleça a correta interpretação a nível regional ou federal.

Significa dizer, o Código de Processo Civil não professa o abandono ao texto legal, nem confere poder criativo total ao Poder Judiciário. É no embate entre os dispositivos existentes que o órgão incumbido de dizer a última palavra – STF ou STJ – deve encontrar a saída, a solução que melhor compraz ao que previsto em lei.

A divergência, realmente, é a ruína do Poder Judiciário. Porém, a ignorância ao que previsto em lei implica a ruína do direito. É um caminho sem volta. Este ano a Constituição Federal completará trinta anos de vigência, e nada melhor para comemorá-la do que pensar quais as reais causas de uma crise do sistema jurídico.

Se o Legislativo tem falhado, cabe-nos exercer prudentemente o direito ao voto, assim como o Executivo. A falência dos demais poderes não pode significar em concessão de carta branca a que o Judiciário, e, sobretudo, o Supremo Tribunal Federal, inove e crie sem observar as balizas existentes no ordenamento jurídico.

A segurança e estabilidade a que alude o artigo 926 do Código de Processo Civil precisa ser pensada internamente (dentre os órgãos do Judiciário) e externamente (na relação do Judiciário com o Legislativo).

 

 

Cristiano Quinaia

Mestre em Direito - Sistema Constitucional de Garantia de Direitos (Centro Universitário de Bauru). Especialista LLM em Direito Civil e Processual Civil. Advogado.

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