quinta-feira,28 março 2024
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Breves Considerações acerca da Decisão do STF Permitindo a Terceirização Irrestrita no Brasil

Coordenador: Ricardo Calcini.

 

 

Em julgamento da Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) nº 324, ajuizada pela Associação Brasileira do Agronegócio e do Recurso Extraordinário (RE) nº 958252, interposto pela Empresa Cenibra, com repercussão geral reconhecida, 07 ministros votaram a favor da terceirização irrestrita no Brasil.

O julgamento conjunto dos processos que discutiam a licitude da terceirização, com o exame das questões preliminares e os votos dos relatores, firmaram o entendimento de que a prática é lícita em todas as etapas do processo produtivo, inclusive nas atividades-fim.

A tese de repercussão geral aprovada no RE foi a seguinte:

“É licita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.

Antes de abordar o teor e os impactos da decisão do STF, é importante se fazer uma análise introdutória acerca do entendimento prevalecente até então.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), harmonizou sua jurisprudência em 1993, proferindo o enunciado nº 331, que tornava lícita a triangulação de serviços, desde que condicionada a alguns requisitos/condições, como a restrição a serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador. Vejamos seu conteúdo, in verbis:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE 
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

 

Assim, prevalecia que a terceirização da atividade-fim da empresa era ilegal, devendo haver, nesse caso, o reconhecimento de vínculo de emprego diretamente com o tomador dos serviços. Note-se que, por muito tempo, a referida Súmula 331 do TST era a única normatização acerca da terceirização no país, uma vez que não havia uma legislação específica para o tema.

Com o advento da Lei nº 13.429/2017 (Reforma Trabalhista), houve modificação da Lei nº 6.019/74 para que fosse abarcado o tema, permitindo que a subcontratação de serviços ocorra na atividade-fim, ou “atividade principal” da empresa, desde que a empresa interposta, ou “empresa prestadora de serviços”, contrate, remunere e dirija o trabalho realizado pelos trabalhadores terceirizados (art. 4º-A, §1º da Lei).

Todavia, instaurou-se um contexto de insegurança jurídica acerca do posicionamento do Judiciário Trabalhista, uma vez que muitos Juízos Laborais continuavam a aplicar a referida Súmula 331, obstando a terceirização irrestrita.

Assim, a temática foi endereçada ao STF e duas teses foram defendidas por seus ministros, quais sejam: (i) proteção social do trabalho impondo a limitação da terceirização como meio de evitar a precarização do trabalho, em respeito ao Direito Constitucional do Trabalho e a Sociologia do Trabalho, afirmando o caráter social da Constituição de 1988; e (ii) modernização da prestação laboral, liberdade de contratação e a terceirização irrestrita como meio de criação de empregos e, consequentemente, de aquecimento da economia brasileira, afirmando o caráter da livre iniciativa constitucional e o princípio da legalidade.

A Ministra Rosa Weber pontuou que “na atual tendência observada pela economia brasileira, a liberalização da terceirização em atividades fim, longe de interferir na curva de emprego, tenderá a nivelar por baixo nosso mercado de trabalho, expandindo a condição de precariedade hoje presente nos 26,4% de postos de trabalho terceirizados para a totalidade dos empregos formais.”

Ainda segundo a Ministra, a terceirização não é capaz de estimular o emprego no país, uma vez que a demanda e o desenvolvimento econômico que geram vagas de emprego, e não a precarização da força de trabalho.

O Presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, solicitou o ingresso da entidade como amicus curiae no processo perante o STF. Argumentava que “a terceirização das chamadas atividades-fim vulneraria o regime constitucional de proteção do emprego, atentaria contra a isonomia laboral no âmbito das empresas e, na esfera da administração pública, representaria sério risco à impessoalidade, uma vez que permite burlar o princípio da acessibilidade cargos, empregos e funções mediante concurso de prova de títulos”.

Em que pese o posicionamento da Anamatra e de outras entidades, entendimento do STF firmou que a terceirização da atividade-fim da empresa é possível no ordenamento jurídico brasileiro, motivo pelo qual se defende que a Súmula 331 deve ser cancelada ou alterada.

Advogada trabalhista graduada na Universidade Federal Fluminense (UFF), pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pelo IBMEC/RJ e pós-graduanda em Direito Empresarial do Trabalho pela FGV/RJ. Foi membro da Comissão OAB Mulher da Seccional do Rio de Janeiro. Articulista de temas trabalhistas.

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