quarta-feira,24 abril 2024
ColunaTrabalhista in focoAstreintes não devem ser confundidas com cláusula penal

Astreintes não devem ser confundidas com cláusula penal

Nos processos trabalhistas vemos muito a condenação em clausulas penais ou ainda em astreintes decorrentes de uma obrigação não cumprida, mas não é difícil ver alguma confusão entre esses institutos.

A cláusula penal, também chamada de pena convencional e multa contratual, são obrigação incidental que prevê uma multa ou sanção para evitar o descumprimento da obrigação principal, bem como perdas e danos adicionais.

Expõe o art. 408 do Código Civil “Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora”.

Pode ser compensatória, estipulada no caso de insolvabilidade, e moratória, para garantir o cumprimento de uma cláusula contratual, sendo aplicável em caso de atraso nas obrigações.

Já a astreinte é instituto de direito processual, e por isso, não estão vinculadas a obrigação contratual, mas existem para estimular o cumprimento de uma obrigação, como o pagamento de uma execução, e podem ser estipuladas de oficio pelo juízo.

Deste modo, as astreintes consistem em multa, de cunho judiciário, de natureza coercitiva ou inibitório, de acordo com a obrigação à qual é cominada, objetivando a impelir o réu ao seu cumprimento, de modo a dar efetividade à prestação jurisdicional.

Por sinal, o Superior Tribunal de Justiça já assentou que “as astreintes não têm caráter punitivo, mas coercitivo e têm a finalidade de pressionar o réu ao cumprimento da ordem judicial” (AgRg no AREsp 419.485/RS, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 04.12.2014, DJe 19.12.2014).

Por estas constatações, podemos dizer que a multa cominatória (astreinte) é um instituto de natureza jurídica processual, previsto no art. 537 do CPC/2015, que confere ao julgador a faculdade de compelir a parte ao cumprimento de determinada obrigação de fazer ou não fazer, ao passo que a cláusula penal, disciplinada nos arts. 408 a 416 do Código Civil possui natureza jurídica material e está relacionada ao cumprimento da indenização por perdas e danos.

Nesta linha, a OJ 54 SDI-I, discrimina que: “MULTA. CLÁUSULA PENAL. VALOR SUPERIOR AO PRINCIPAL. O valor da multa estipulada em cláusula penal, ainda que diária, não poderá ser superior à obrigação principal corrigida, em virtude da aplicação do artigo 412 do Código Civil de 2002 (art. 920 do Código Civil de 1916).

Mas veja que o entabulado na orientação apenas diz respeito a cláusula penal, e não a astreinte, como tentam fazer crer alguns advogados, e nem mesmo poderia, pois, esta última sequer há limitação.

Além disso, o legislador concedeu ao juiz a prerrogativa não somente de impor multa diária ao destinatário da ordem para cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer (§ 4º do art. 461), mas também de alterá-la, independentemente de pedido da parte interessada, quando se tornar insuficiente ou excessiva. Tal faculdade está predisposta no parágrafo 6º do artigo 461 do CPC.

E ainda a astreinte, não faz coisa julgada material, dada a sua natureza processual, e, portanto, a possibilidade do seu valor ser alterado, caso se mostre ineficiente em compelir a parte a cumprir a respectiva obrigação.

É o que podemos ver da atual jurisprudência do TST:

“RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. FIXAÇÃO DE ASTREINTES. LIMITAÇÃO QUANTITATIVA INDEVIDA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. No caso dos autos, o Hospital São Mateus foi condenado a “efetuar o pagamento dos salários de seus empregados até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido, nos termos do artigo 459, $1°, da CLT”, “sob pena de multa de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por dia, incidindo até o efetivo cumprimento da obrigação”. O Tribunal Regional deu parcial provimento ao recurso ordinário do reclamado para limitar a multa diária ao valor máximo de R$ 50.000,00, então arbitrado à condenação. A imposição de multa cominatória, conforme a própria previsão legal do art. 537, 94.°, do CPC, tem a natureza de forçar a parte ao cumprimento da obrigação imposta pelo juízo, e “incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.” Esta Corte Superior tem entendimento firmado no sentido de que as astreintes não se limitam ao valor da obrigação principal, bem como que o estabelecimento de teto desafia o 54.°, do art. 537, do CPC. No caso, tratando-se de penalidade processual imposta para compelir a parte ao cumprimento de determinação judicial consistente em obrigação de fazer (efetuar o pagamento dos salários no prazo legal), não há de se falar na limitação quantitativa imposta pelo Tribunal Regional. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido”. RR – 188-95.2019.5.10.0010. 8a Turma. Relatora: Delaide Alves Miranda Arantes. Publicação: 24/06/2022″

Além do supra citado, convém mencionar que tem sido pacífico no TST que não se há de cogitar em configuração de bis in idem em face da incidência de juros de mora sobre as astreintes fixadas com fundamento no art. 461, § 4º, do CPC/73, visto que a multa coercitiva destina-se a convencer o devedor ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer e ocorrendo a sua frustração cria-se um crédito em favor da parte ex adversa e os juros de mora, por sua vez, compensam o credor pelo atraso no adimplemento do pagamento da aludida multa.

Por derradeiro, o TST tem entendido que nem mesmo a cláusula penal e a astreinte quando aplicadas em conjunto, não podem gerar bis in idem, por esta última não se confundir com as disposições legais que regem o trabalho, tampouco com as multas administrativas decorrentes da atuação fiscalizatória do Ministério do Trabalho.

Coordenadora acadêmica da coluna "Trabalhista in foco" no Megajurídico.

Coordenadora acadêmica da coluna "Trabalhista in foco" no Megajuridico®. Advogada trabalhista, especialista em Direito e Processo do Trabalho (EPD), especialista em Direito Previdenciário (LEGALE) e especialista em Compliance, LGPD e Prática Trabalhista (IEPREV). Autora de artigos e livros jurídicos. Profissional Certificada com CPC-A.

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