quinta-feira,28 março 2024
ColunaDireito da SaúdeA Telemedicina na Resolução CFM nº 2.314 de 2022

A Telemedicina na Resolução CFM nº 2.314 de 2022

 

O avanço tecnológico tem proporcionado à humanidade um grande número de benefícios, dos mais variados aspectos.

Os cuidados médicos estão evoluindo cada vez mais com o aprimoramento científico das pesquisas e isso é possível notar tanto pela evolução dos equipamentos médicos quanto pela qualidade dos novos medicamentos, tratamentos e dispositivos médicos colocados à disposição dos pacientes.

A telemedicina ainda enfrenta algumas barreiras no território nacional, que até mesmo foram expostas no artigo publicado neste Megajurídico em https://www.megajuridico.com/desafios-eticos-e-legais-da-telemedicina/, e ainda possuem dois projetos de lei que visam a sua regulamentação (PL 1998 de 2020 e o PL 4398 de 2021).

Para dar mais um passo no aperfeiçoamento do tema, e visando a maior segurança do médico e do paciente, o Conselho Federal de Medicina editou a Resolução nº 2.314, de 20 de abril de 2022, que define e regulamenta a telemedicina como forma de serviços médicos mediados por tecnologias de comunicação.

A telemedicina como podemos verificar do seu próprio termo é a medicina realizada à distância. Da expressão “tele” advém a ideia de distância, ou seja, é a prática da medicina à distância.

Como exposto no art. 1º da Resolução 2.314/2022, a telemedicina necessariamente ocorre com a mediação de Tecnologias Digitais, de Informação e de Comunicação (TDICs) e ela pode ocorrer tanto de forma on-line ou off-line.

O art. 5º da resolução é disposto que ela pode ser exercida nas seguintes modalidades: teleconsulta, teleinterconsulta, telediagnóstico, telecirurgia, telemonitoramento ou televigilância, teletriagem e teleconsultoria.

Em qualquer modalidade que ela seja adotada, devem ser observados os padrões normativos e éticos usuais do atendimento presencial, inclusive em relação à contraprestação financeira pelo serviço prestado (art. 16).

Neste aspecto, o médico deve ajustar previamente com o paciente e as prestadoras de saúde o valor do atendimento prestado, tal qual no atendimento presencial (parágrafo único do art. 16). A resolução neste aspecto traz a ideia de uma atuação semelhante ao que ocorre no ambiente presencial.

A autonomia do médico em usar ou não a telemedicina, deve respeitar a beneficência e a não maleficência do paciente, princípios bioéticos previstos no art. 4º da CLT e o profissional deve indicar o atendimento presencial sempre que entender necessário.

O art. 15 regulamenta que o paciente, ou seu representante legal, deve autorizar o atendimento por telemedicina e a transmissão das suas imagens e dados por meio de (termo de concordância e autorização) consentimento, livre e esclarecido, enviado por meios eletrônicos ou de gravação de leitura do texto com a concordância, devendo fazer parte do SRES do paciente.

É disposto ainda que em todo atendimento por telemedicina deve ser assegurado o consentimento explícito, no qual o paciente, ou seu representante legal, deve estar consciente de que suas informações pessoais podem ser compartilhadas e sobre o seu direito de negar permissão para isso, salvo em emergência médica.

A proteção dos dados do paciente é uma grande preocupação da telemedicina e o art. 3º da referida resolução dispõe que eles devem ser preservados, seja na guarda, no manuseio, na integridade, na veracidade, na confidencialidade, na privacidade, na irrefutabilidade e na garantia do sigilo profissional das informações, de acordo com a lei e com as normas regulamentadas pelo CFM.

O atendimento médico deve necessariamente ser registrado no Sistema de Registro Eletrônico de Saúde (SRES) do paciente, que deve possibilitar a captura, o armazenamento, a apresentação, a transmissão e a impressão da informação digital e identificada em saúde e atender integralmente aos requisitos do Nível de Garantia de Segurança 2 (NGS2), no padrão da infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) ou outro padrão legalmente aceito.

Esses dados devem ser preservados pelo médico responsável pelo atendimento em consultório próprio ou do diretor/responsável técnico, no caso de interveniência de empresa e/ou instituição. Caso haja terceirização do arquivamento desses documentos virtuais, a responsabilidade deve ser, contratualmente, compartilhada entre o médico e a empresa contratada.

O direito do paciente em ter acesso ao seu prontuário é reforçado e o §6º do art. 3º dispõe que ele, ou seu representante legal, podem receber tanto o arquivo em mídia digital, ou impresso.

A Lei Geral de Proteção de Dados, por óbvio, é mencionada na resolução de modo que os dados devem ser preservados, devendo obedecer às suas disposições quanto aos dados pessoais e clínicos.

O §8º do art. 3º da CLT dispõe que o médico, ao utilizar plataformas institucionais (onde ele esteja atuando), deve dar acesso aos dados do paciente, sendo respeitado o período de preservação das informações.

Com relação às pessoas jurídicas, que prestarem serviços de telemedicina, e as plataformas de comunicação e arquivamento de dados, devem ter sede estabelecida em território brasileiro e estarem inscritas no Conselho Regional de Medicina do Estado onde estão sediadas, com a respectiva responsabilidade técnica de médico regularmente inscrito no mesmo Conselho, conforme disposto no art. 16 da Resolução nº 2.314.

Com relação à inscrição no Conselho Regional de Medicina, o médico deve ser devidamente inscrito no de sua jurisdição e informar a entidade a sua opção de uso de telemedicina (art. 17, 1º). A apuração de eventual infração ética a esta resolução será feita pelo CRM de jurisdição do paciente e julgada no CRM de jurisdição do médico responsável (art. 17 §2º).
Com relação à vigilância, fiscalização e avaliação das atividades de telemedicina, os Conselhos Regionais de Medicina deverão estabelecer vigilância, fiscalização e avaliação quanto à qualidade da atenção, relação médico-paciente e preservação do sigilo profissional.

Teleconsulta

Regulamenta o art. 6º da Resolução nº 2.314 de 2022 que teleconsulta é a consulta médica não presencial, mediada por TDICs, com médico e paciente localizados em diferentes espaços.

O atendimento presencial é ainda o chamado padrão ouro de referência e a telemedicina deve vir para somente complementar, mas sempre deve respeitar a autonomia do médico.

No uso da telemedicina o médico deverá informar ao paciente sobre as limitações inerentes ao uso da teleconsulta, pela impossibilidade de realização de exame físico completo, podendo o médico solicitar a presença do paciente para finalizá-la (§4º).

Tanto o paciente quanto o médico possuem o direito de optar pela interrupção do atendimento a distância, ou pela consulta presencial, sendo respeitado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pré-estabelecido entre o médico e o paciente (§5º).

Quanto à primeira consulta por telemedicina, ela pode ocorrer desde que atenda às condições físicas e técnicas dispostas na resolução, com obediência das boas práticas médicas, devendo dar seguimento ao acompanhamento com consulta médica presencial.

No entanto, em casos de atendimentos de doenças crônicas ou doenças que requeiram acompanhamento por longo tempo, deve ser realizada consulta presencial com o médico assistente do paciente, em intervalos não superiores a 180 dias (§2º).

Teleinterconsulta

Pela resolução, a teleinterconsulta é a troca de informações e opiniões entre médicos, com auxílio de TDICs, com ou sem a presença do paciente, para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico (art. 7º).
A responsabilidade pelo acompanhamento presencial é do médico assistente responsável e a responsabilidade dos demais médicos envolvidos deve ocorrer somente por seus atos.

Telediagnóstico

Outra definição trazida pela resolução é o telediagnóstico, que é o ato médico a distância, geográfica e/ou temporal, com a transmissão de gráficos, imagens e dados para emissão de laudo ou parecer por médico com registro de qualificação de especialista (RQE) na área relacionada ao procedimento, em atenção à solicitação do médico assistente (art. 8º).

Com o telediagnóstico ocorre a emissão de laudo ou avaliação de exames através de dados de imagens e gráficos enviados pela internet. É a possibilidade de uso de tecnologia para fornecer informação e atenção médica a pacientes e outros profissionais de saúde situados em locais distantes.

A imposição da resolução é, no entanto, que os serviços onde os exames estão sendo realizados devem contar com um responsável técnico médico.

Telecirurgia

A telecirurgia é a realização de procedimento cirúrgico a distância, com utilização de equipamento robótico e mediada por tecnologias interativas seguras e está disciplinada na Resolução nº 2.311 de 2022 do CFM e é definida como a modalidade de tratamento cirúrgico a ser utilizada por via minimamente invasiva, aberta ou combinada, para o tratamento de doenças em que já se tenha comprovado sua eficácia e segurança.

Telemonitoramento ou Televigilância

O telemonitoramento ou a televigilancia cresceu muito na pandemia, quando o distanciamento social era uma das formas de cuidado das pessoas para que não ocorresse a disseminação do vírus.

Ele pode ocorrer por telefone, na situação em que o médico conversa com o paciente para verificar alguma alteração na sua saúde, como no uso de ferramentas que auxiliam o profissional para coleta e envio de dados em tempo real.

Geralmente as funções que realizam são as de medir a glicose de pessoas com diabetes monitorar os batimentos cardíacos, aferir a pressão arterial e a temperatura corporal.
O art. 10 da Resolução nº 2.314 dispõe que o telemonitoramento e a televigilância médica é o ato realizado sob coordenação, indicação, orientação e supervisão por médico para monitoramento ou vigilância a distância de parâmetros de saúde e/ou doença, por meio de avaliação clínica e/ou aquisição direta de imagens, sinais e dados de equipamentos e/ou dispositivos agregados ou implantáveis nos pacientes em domicílio, em clínica médica especializada em dependência química, em instituição de longa permanência de idosos, em regime de internação clínica ou domiciliar ou no translado de paciente até sua chegada ao estabelecimento de saúde.

O seu uso deve ocorrer por indicação e justificativa do médico assistente do paciente e deve haver garantia de segurança e confidencialidade, tanto na transmissão quanto no recebimento de dados. A responsabilidade técnica da transmissão dos dados deve ser da instituição de vinculação do paciente.

A interpretação dos dados e emissão de laudos deve ser feita por médico regularmente inscrito no CRM de sua jurisdição e com registro de qualificação de especialista (RQE) na área relacionada a exames especializados (§4º). Os dados devem ser adequadamente registrados no prontuário do paciente (§6º).

A intermediação do atendimento pode ser feita por pessoas contratadas pelo serviço médico, que deverá promover o devido treinamento de recursos humanos.

Teletriagem

A teletriagem médica é uma modalidade remota de avaliação, encaminhamento e priorização de atendimentos aos pacientes.

Com a teletriagem é possível dar efetividade na organização das unidades de saúde, direcionando os atendimentos com base naqueles que são prioritários, que precisam de encaminhamento ou que podem ser resolvidos de maneira não urgente.

Este serviço também ganhou importância com a COVID19.

A resolução mencionada dispõe que o médico deve destacar e registrar que se trata apenas de uma impressão diagnóstica e de gravidade, tendo autonomia da decisão de qual recurso será utilizado em benefício do paciente.

Teleconsultoria Médica

A teleconsultoria médica é uma consulta registrada e realizada entre trabalhadores, profissionais e gestores da área da saúde, com o intermédio das TDICs, com a finalidade de prestar esclarecimentos sobre procedimentos administrativos e ações de saúde (art. 12).

Relatório, Atestado ou Prescrição médica

Nos termos do art. 13 da Resolução 2.314, no caso de emissão à distância de relatório, atestado ou prescrição médica, deverá constar obrigatoriamente em prontuário:
a) Identificação do médico, incluindo nome, CRM, endereço profissional;
b) Identificação e dados do paciente (endereço e local informado do atendimento);
c) Registro de data e hora;
d) Assinatura com certificação digital do médico no padrão ICP-Brasil ou outro padrão legalmente aceito;
e) que foi emitido em modalidade de telemedicina.

Teleconferência Médica

A teleconferência médica é uma ferramenta que é realizada uma videotransmissão síncrona, de procedimento médico para fins de assistência, educação, pesquisa e treinamento, com autorização do paciente ou seu responsável legal.

O art. 14 da Resolução nº 2.314 de 2022 dispõe que o grupo de recepção de imagens, dados e áudios deve ser composto exclusivamente por médicos e/ou acadêmicos de medicina, todos devidamente identificados e acompanhados de seus tutores.

No caso de eventos multiprofissionais há necessidade de observância da Resolução CFM nº 1.718 de 2004, que veda o médico de transmitir conhecimento, ensinar procedimentos privativos de médico a profissionais não-médicos.

Advogado e professor. Doutorando em Ciências Farmacêuticas, Mestre em Direito da Saúde e especialista em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário.

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