quinta-feira,28 março 2024
ColunaCivilista de PlantãoA Posse no Direito Brasileiro

A Posse no Direito Brasileiro

Introdução
São várias teorias relativas à posse, mas as duas principais são: A Teoria Subjetiva da Posse e a Teoria Objetiva da Posse, que terminam se contrapondo no aspecto evolutivo acerca do instituto. A maior parte da doutrina se baseia na teoria objetiva como a adotada.

Teoria Subjetiva da posse foi idealizada por Savigny que diz: Para ser o possuidor, o sujeito deveria ter o corpus e o animus, conjunção cumulativa e o corpus está relacionado ao objeto, significa dizer que ele está apreendendo o bem sobre ele. O animus chamado de elemento anímico está voltado ao animus da pessoa, ou seja, é a intenção de ser dono. Saber do animus da pessoa é algo subjetivo.

Dessa forma, constata-se que é uma teoria com lacunas e abre espaço para a Teoria Objetiva da Posse, onde Ihering critica a teoria do Savigny, em um exemplo mais contemporâneo, tijolos no terreno qualquer, para construir, embora não esteja ninguém ao lado, se alguém pegar é furto. Ou seja, se perceber como proprietário, tem a posse. Não precisa ter o corpus, não precisa saber se tem animus ou não, precisa entender se está agindo como dono.

Posse é a exteriorização da propriedade, o possuidor é aquele que age como se fosse proprietário. O Artigo 1196 trata da posse no Código Civil e diz que: Possuidor é aquele que exerce, de fato ou não, algum (qualquer um) dos poderes inerentes à propriedade. O Artigo 1228 diz que o proprietário é aquele que pode usar, gozar, dispor ou pode reaver a coisa.

Usar é servir-se das utilidades da coisa, direito de uso; Gozar a coisa é receber os frutos; Dispor em regra é o direito de se desfazer da coisa: vender, doar, destruir, abandonar, dar em garantia ou pagamento e Reaver é o direito de ir atrás, o direito de retomar a coisa.

Nesse ponto, vale mencionar que dispor da coisa, tem suas ressalvas e uma delas é a função social, como exemplo a reserva legal da fazenda, o rodízio de veículos, que é uma limitação do direito de propriedade e o direito de reaver é um fundamental dos direitos reais acima dos outros.

2. Propriedade, Posse e Detenção

A Propriedade é plena quando o proprietário possui os três poderes nas mãos usar, gozar e dispor, um exemplo de propriedade limitada é o usufruto. São duas pessoas exercendo o direito: o usufrutuário tem o direito de usar e gozar da coisa e o nu-proprietário que só tem o direito de dispor da coisa. Usufruto é temporário.

Propriedade precisa de ato solene e a Posse é situação de fato. Como características do direito de propriedade a principal é a Faculdade de usar, gozar, a disposição e ainda o direito de reaver a coisa de quem injustamente a detenha. Direito absoluto, mas com as devidas ressalvas como exemplo a Função social e as limitações como o direito de vizinhança, servidões administrativas, parcelamento do solo, rodízio de veículos entre outros.

Direito exclusivo, até prova em contrário, com exceções como a figura do Condomínio, em que mais de uma pessoa exerce direito de propriedade sobre o mesmo bem.

Plena ou Alodial é a propriedade em que o proprietário concentra em suas mãos todos os poderes inerentes. Limitada ou Restrita, em que algum dos poderes inerentes a propriedade não está nas mãos do proprietário em razão de um ônus ou de um direito real sobre coisa alheia. Exemplo: Usufruto, já mencionado anteriormente, em que o nu- proprietário não pode usar e gozar ou o Titular de direito de habitação, que só poderá usar para moradia

A Propriedade Resolúvel está sujeita à termo ou à condição resolutiva, Artigo 1359 do Código Civil. Como Exemplo: Cláusula de Retrovenda, doação com cláusula de reversão e alienação fiduciária. A Retrovenda, pelo Artigo 505, tem que coisa imóvel pode recobrá-la no prazo máximo de decadência de 3 anos.

Exemplo: Vende casa por 100 mil reais e estabelece a retrovenda pelo prazo de um ano, vendeu e registrou o imóvel em seu nome, mas reserva o prazo de um ano para chegar com o montante que pagou mais despesas e benfeitorias, desfaz o negócio independente da vontade, não faz nova compra, desfaz o negócio. Nesse período quem comprou tem a propriedade resolúvel. A Doação com cláusula de reversão pelo Artigo 547, o doador pode estipular que o bem volte ao seu patrimônio se sobreviver ao donatário. A alienação fiduciária existe a posse indireta e propriedade resolúvel.

Outras características do direito de propriedade podem ser listadas como: Direito perpétuo, diferencia da maior parte dos direitos reais e perpétuo não é o mesmo que vitalício, maior parte dos direitos reais não é perpétuo, é temporário. Direito elástico, Direito complexo, tudo isso faz com que a propriedade seja um direito complexo. E por fim um Direito fundamental estabelecido no Artigo 5° da Constituição da República.

Distinção entre Posse e Detenção se faz necessário pois termina por causar confusão entre os dois institutos. O detentor não tem posse, ou seja, ele não pode se valer a defesa possessória. Falta legitimidade e não vai conseguir adquirir a propriedade pela usucapião o exemplo clássico da detenção é o caseiro, ou legalmente chamado de fâmulos da posse pelo artigo 1198, que ainda menciona os atos de mera permissão ou tolerância e os atos violentos ou clandestinos, como formas que não são possíveis adquirir a propriedade pela usucapião.

Sendo assim o primeiro caso mostra uma relação de dependência em nome de outro, ele recebe ordens e instruções de outras pessoas, fâmulos da posse são os servos da posse aquele que conserva a posse em nome de outro, podem se valer da nomeação em autoria. A permissão pressupõe uma autorização enquanto que a tolerância ocorre sem autorização, mas ciente que está sendo tolerada.

Ato violento é o uso da força e ato clandestino, entende-se como ocultos, as escusas. Cessada a violência ou a clandestinidade terá a posse. Quando a posse ficar velha cessa a violência. A posse fica velha quando ela atinge mais de um ano e um dia.

Usucapião, por exemplo, depois de cessada a violência e a clandestinidade que vai contar o prazo. Vale mencionar que como bem público não pode ser objeto de usucapião, a invasão de bem público não vai caracterizar posse.

Nesses casos, não cabe retenção por benfeitorias e nem por acessões. Um efeito da posse de boa-fé é o direito de ser indenizado por benfeitorias úteis ou necessárias. Acessões são as
construções ou plantações em imóvel alheio. Existe para a posse de boa-fé o direito de retenção até receber a indenização. Nos casos mencionados, não há esse direito.

3.Classificação da posse

Quanto aos vícios subjetivos: Posse de boa-fé e Posse de má-fé. Pelo Artigo 1201, posse de boa-fé, quando o possuidor ignora o vício da posse ou obstáculo que impede a aquisição da coisa. A posse de má-fé é aquela que o possuidor tem ciência de seus vícios.

Hipótese de boa-fé subjetiva no código civil de 2002, porque para provar que ele está de má-fé tem que provar que ele sabe. Exceção à regra do código civil que usa o princípio da boa-fé objetiva. Para o caso existe a presunção, ou seja, admite prova em contrário, estamos diante de uma presunção relativa.

Quanto aos vícios objetivos: Posse Justa, a que não é violenta, clandestina ou precária e a Posse Injusta é violenta, clandestina ou precária.

Posse precária é uma posse que começa justa e depois passa a ser injusta. Exemplo: amparada em um contrato de comodato, começa com promessa de compra e venda de bem imóvel, um contrato solene a partir da primeira parcela do sinal já tomaria posse e depois não paga o restante acordado, se torna posse injusta por ser precária. O que caracteriza a posse precária é uma posse obtida por abuso da confiança. Não convalesce em usucapião, ela não se torna justa.

A Posse Nova e Posse Velha pelo Artigo 924 do CPC que diz quando a ação for ajuizada dentro de um ano e um dia segue o rito especial, segue tal prazo para distinção. Dentro de um ano e um dia posse nova e passado esse prazo, posse velha.

A Posse Ad Usucapionem é a posse mansa ou pacífica, ininterrupta e com animus domini. A Posse mansa não é posse de boa-fé ou posse justa, é a posse que não sofreu oposição, ela pode até ser de má-fé desde que não tenha oposição. Ininterrupta tem que ser contínua com a possibilidade de somar a posse através da acessio possessionis e sucessio possessionis.

Sendo acessio possessionis por ato inter vivos e sucessio possessionis mortis causa. Para cumprir o requisito da usucapião extraordinária pode somar a posse do antecessor. O Animus domini ou ânimo de dono se caracteriza como a intenção de ser dono ou agir como dono. Aqui tem como lógica, impedir o locatário de adquirir a propriedade por usucapião, impede também o comandatário, tem um contrato no imóvel.

A Interversão da posse é a inversão da natureza da posse, exemplo: A posse de boa-fé passa a ser uma posse de má-fé ou a posse justa passa ser uma posse injusta.

4. Efeitos da Posse

É a faculdade de invocar os interditos possessórios, efeito da defesa possessória. Como exemplo as ações de manutenção e reintegração da posse. Para tanto precisamos diferenciar tais possibilidades e hipóteses que permitem a utilização das ações acima mencionadas.

Turbação é a agressão que não priva o possuidor da posse, ou seja, continua na posse ele vai ingressar com ação de manutenção da posse. Esbulho é agressão que priva o possuidor da posse, aqui ocorre a perda da posse e a ação que será ajuizada será a ação de reintegração de posse, uma ação para retomar a posse.

O esbulho pode ser total ou parcial, se alguém invadiu uma parte é esbulho parcial se invadiu tudo é esbulho total. A diferença é que na turbação não é privado da posse, existe uma perturbação quanto ao direito do possuidor.

A ameaça ainda não houve agressão, mas existe o justo receio de que ela venha ocorrer. Para agressão em potencial será a ação de interdito proibitório.

O Artigo 1210 do Código Civil menciona que: O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

Por fim, existe a chamada autotutela da posse que consiste em uma defesa extrajudicial da posse, realizada pela própria força. Legítima defesa da posse na hipótese de turbação e desforço direto, imediato para caso de esbulho. Para ser legítima será proporcional à agressão e tem que ser feita logo, em regra é entendido como imediato.

A Súmula 228 do STJ diz que: É inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral.

Em relação aos efeitos da Posse com relação aos frutos, tem-se que: Frutos são utilidades produzidas periodicamente pela coisa que quando colhidas não alteram sua substância. São bem acessórios e periódicos.

A diferença do produto que não é periódico e altera a substância da coisa. O possuidor de boa-fé tem direito enquanto durar aos frutos percebidos, os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé, devem ser restituídos.

Os Frutos Pendentes ainda não foram colhidos os Percebidos são aqueles que já foram colhidos e os Percipiendos não foram colhidos, mas já deveriam ter sido. Os artigos 1214 e 1216 do código civil tratam desta questão.

Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.

Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.

Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.

Sobre os efeitos da posse com relação às benfeitorias, entende-se como Benfeitorias Necessárias as obras ou despesas para a conservação, Benfeitorias úteis, a melhoria e como Benfeitorias voluptuárias as de mero deleite. O Possuidor de boa-fé tem direito de retenção para benfeitorias necessárias e úteis, voluptuária pode retirar desde que não afete a coisa.

O possuidor de má-fé tem direito apenas a indenização pelas benfeitorias necessárias. Não cabe retenção para o possuidor de má-fé.

A Súmula 335 do STJ menciona que nos contratos de locação cláusula que impede a retenção da coisa para recebimento de benfeitoria é válida. A doutrina diz que se o contrato for de adesão, esta seria abusiva, nesse caso poderia invalidá-la. Posição que seguimos, pois se trata de cláusula abusiva e em contrato de adesão se estabeleceria em não equânime para as partes.

5. Função social da posse

Muito se fala em função social da propriedade, mas esquecem da figura da função social da posse que também é estabelecida no ordenamento jurídico brasileiro. Como exemplo o Artigo 1228 §4° que trata da desapropriação por posse trabalho ou por posse pró-labore. Como requisitos: Imóvel de extensa área e considerável número de pessoas por mais de 5 anos, com posse ininterrupta e de boa-fé realizando nessa área obras e serviços de interesse social.

Não é espécie de usucapião, em virtude do artigo 1228 §5° falar em pagamento. Posição majoritária que o instituto deve ser aplicado em virtude da função social da posse. Se os possuidores são de baixa renda a indenização deve ser paga pelo estado e não se aplica a bem público, depois com novo entendimento, aplica-se à bens públicos dominicais.

Outro exemplo de função social da posse, é o Artigo 1238 que trata da Usucapião Extraordinário, onde traz a redução do prazo para 10 anos se o possuidor usar o imóvel como moradia ou realizar obras ou serviços de caráter produtivo. O Artigo 1242, parágrafo único também tem redução do prazo de 10 para 5 anos a usucapião ordinário pela destinação ao bem. Sendo assim, se consagra tal possibilidade de atribuir função social ao instituto da posse.


Referências
BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 1a edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 4º volume: direito das coisas. 22 ed. revista e atualizada de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva: 2007.

GOLÇALVES, Carlos Roberto. DIREITO CIVIL BRASILEIRO – Direito das Coisas. 7ª ed. vol. 5. São Paulo: Editora Saraiva. 2012.

SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 4ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. São Paulo: Editora Método, 2011.

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