sexta-feira,19 abril 2024
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A falta do empregado ao trabalho em razão de alagamento e enchente é considerada justificada?

Coordenação: Ricardo Calcini.

As faltas do empregado ao trabalho consideradas justificadas são aquelas previstas em lei, em norma coletiva ou aquelas abonadas pelo empregador.

A CLT, em seu artigo 473, elenca diversas situações em que o empregado pode faltar ao trabalho sem prejuízo do seu salário. São as hipóteses de interrupção do contrato de trabalho – circunstâncias nas quais o caráter sinalagmático do contrato é flexibilizado, pois, embora não haja prestação de serviço e disponibilidade do trabalhador perante o empregador, que é a principal obrigação do contrato de trabalho – há pagamento de salário.

Traz o referido dispositivo legal, dentre outras, as situações de falecimento do cônjuge, casamento, nascimento de filho, doação de sangue, doença ou acidente de trabalho.

Situação diversa, contudo, é verificada quando se está a tratar das hipóteses de suspensão do contrato de trabalho, ocasião em que o salário não é devido pelo empregador ao empregado que não presta serviço. São exemplos de suspensão do contrato de trabalho a ocorrência de greve e o afastamento previdenciário superior a 15 dias.

Enquadrando-se, portanto, a situação vivenciada pelo empregado nas hipóteses do artigo 473 da CLT, não haverá, como dito, desconto no salário pelos dias não trabalhados.

Já a presente controvérsia do tema em análise é se a ocorrência de alagamento ou enchente que impeça o deslocamento do trabalhador até a empresa, por meio de condução própria ou através de transporte público, é justificativa suficiente para que o dia de trabalho não seja descontado.

De fato, a legislação em vigor não traz a hipótese de força maior como causa de interrupção do contrato de trabalho, sendo crível, de outro lado, a ponderação que ao empregador também não é lidimo transferir a responsabilidade e o prejuízo exclusivo pela enchente ou alagamento ocorrido.

Por esse motivo, há defensores de que o dia não trabalhado deve sim ser descontado, havendo, no entanto, o cuidado de que tal desconto não acarrete a perda do descanso semanal remunerado, aplicando-se, por analogia, o que vem previsto no artigo 12, § 3º do Decreto 27.048/1949, assim redigido:

“§ 3º As entradas no serviço, verificadas com atraso, em decorrência de acidentes de transportes, quando devidamente comprovados mediante atestado da empresa concessionária, não acarretarão, para o trabalhador, a aplicação do disposto no art. 11.”

Mas há entendimentos também que exsurgem no sentido da impossibilidade do desconto do dia não trabalhado, podendo ser citadas algumas soluções para essa celeuma.

De se ver ser importante verificar se não há previsão de abono de tal falta em norma coletivamente negociada, constatação que, por si só, impediria o desconto no salário do trabalhador que não consegue se deslocar até o local de trabalho.

Não havendo referida previsão, é salutar contar com o bom senso do empregador e ajustar, caso exista regime de compensação estabelecido entre as partes, a compensação posterior desse dia de trabalho perdido.

A permissão de trabalho em sistema home office também se mostra uma saída interessante para o dilema, já que, nos dias atuais, os meios de comunicação permitem essa modalidade de prestação de serviço à distância.

A jurisprudência trabalhista tem acenado no sentido da impossibilidade de desconto do dia não trabalhado por conta de desastre natural, recomendando a compensação posterior, de modo a que empregado e empregador não sejam prejudicados.

Em que pese a ocorrência de enchente ou alagamento não seja legalmente considerada falta justificada, por certo as alternativas apresentadas melhor atendem os objetivos do contrato de trabalho, já que o desconto no salário do trabalhador – que não deixou voluntariamente de comparecer à empresa, mas fora efetivamente impedido de se deslocar até o local de trabalho – é medida desproporcional e que endereça prejuízo à parte menos favorecida da relação empregatícia.

Não se olvide, em arremate, que os riscos da atividade empresarial correm por conta do empregador, destinatário dos lucros auferidos com a força de trabalho despendida pelo empregado.

Advogada. Graduada pela Universidade Camilo Castelo Branco – UNICASTELO. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Fatec/Facinter.

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