sexta-feira,29 março 2024
ColunaTrabalhista in focoA Cyber Regulamentação Empresarial no Ambiente de Trabalho

A Cyber Regulamentação Empresarial no Ambiente de Trabalho

Coordenador: Ricardo Calcini.

 

Normalmente escutamos pessoas que nos fazem alguma afirmação com o seguinte sentido: Mas que revolução estamos presenciando?

Essa percepção se dá em razão dos grandes avanços tecnológicos, que nos faz ter a sensação de que todas as informações chegam com uma rapidez absoluta. Tudo ocorre ao mesmo tempo e o ontem nos parece tão longínquo quanto a semana passada.

E, de fato, atualmente vivemos uma revolução. No século V a. C., a humanidade foi revolucionada pela escrita; no século XV, isso ocorreu com a imprensa; e, nos séculos XIX e XX, a revolução se deu pela divulgação da cultura em massa.

O mundo atual vive a revolução avinda do ambiente digital.

As relações sociais foram fortemente impactadas com a cultura do contato on-line por meio das redes sociais. Os amigos das visitas nas casas, nos encontros em restaurantes e nos bares, se encontram cada vez menos em tais locais e mais vezes por meio de grupos de conversa pelas redes sociais.
O fenômeno das redes sociais e a sua popularidade no Brasil fazem com que a opinião de alguém, que antes ficava restrita ao número de pessoas que estava ao seu entorno, chegasse a um número infindável de pessoas.

Dessa forma, um desabafo realizado em rede social chega ao conhecimento do empregador e isso pode trazer grandes repercussões no contrato de trabalho.

Diante da força das redes sociais, está se desenvolvendo no seio das empresas a chamada Regulamentação Cibernética do empregador, que estabelece as regras de conduta dos empregados no ambiente cibernético.

A possibilidade de impor regras de conduta advém do poder diretivo do empregador, pois é ele que assume os riscos da atividade econômica, nos termos do art. 2º da CLT. Dessa forma, poderá estabelecer as regras de como se desenvolverá a sua atividade empresarial.

Essas regras podem abranger o acesso a redes sociais pelo empregado, ou seja, se elas poderão ser ou não acessadas durante a jornada de trabalho, ou mesmo, se isso está proibido. A vedação pode até mesmo abranger o uso de aparelho celular no horário de trabalho.

Neste sentido, é o julgado abaixo em que o empregado foi demitido por justa causa, por indisciplina, ao violar a regra da empresa que proibia o uso de aparelho celular durante a jornada de trabalho:

JUSTA CAUSA. PROIBIÇÃO DO USO DE APARELHO CELULAR. LICITUDE DA REGRA. DESCUMPRIMENTO REITERADO PELO EMPREGADO. INDISCIPLINA CONFIGURADA. Inclui-se no poder diretivo do empregador o estabelecimento de regras e padrões de conduta a serem seguidos pelos seus empregados durante os horários de trabalho, dentre os quais a lícita proibição do uso de aparelho celular. Licitude que decorre justamente do fato de não ser um direito do empregado o uso de celular durante a jornada. Há diversos aspectos da contratualidade envolvidos nesse uso de aparelho pessoal do empregado. Evidentemente, enquanto utiliza o celular, o empregado está deixando de trabalhar, ou seja, direcionando seu tempo para atividade diversa daquela para a qual foi contratado – e remunerado. Além da questão do tempo suprimido do trabalho, com seus efeitos diretos e indiretos intra partes – como produtividade, segurança, qualidade do serviço – não há como se olvidar o reflexo coletivo que o uso pode vir a gerar sobre a conduta dos demais empregados, que podem, evidentemente, sentirem-se autorizados a também utilizar o aparelho, gerando, tal circunstância, um padrão comportamental que ultrapassaria o interesse meramente individual de cada trabalhador (…) (0001751-80.2015.5.09.0661).

No entanto, destaca-se ser abusiva a conduta do empregador quando proíbe o uso de celular e acesso a redes sociais quando o empregado está em seu período de descanso. Nestes períodos, o trabalhador não poderá ser tolhido, pois não está à disposição do empregador.

Outro elemento possível de constar na regulamentação cibernética empresarial é a vedação de compartilhamento de material de cunho religioso, ofensivos ao empregador, aos colegas de trabalho e a demais pessoas.

Logicamente que o dever de urbanidade está implícito na relação de emprego, mas, em se tratando de um ambiente virtual, distinto do local de trabalho, é recomendável que a regra venha estabelecer condutas neste sentido.

Assim, eventual ofensa praticada pelo trabalhador a um terceiro pode repercutir até mesmo na esfera do empregador, pois esse poderá ser chamado a responder por atitudes do empregado ou preposto, nos termos da Súmula 341 do STF c/c o art. 932, III, do Código Civil.

As mensagens de privadas entre trabalhadores, mesmo em equipamentos da empresa, não podem ser monitoradas, considerando a inviolabilidade do sigilo da correspondência, nos termos do inciso XII do art. 5º da Constituição Federal e, ainda, conforme previsão expressa nos incisos II e III do art. 7º da Lei nº 12.965/14 (Marco Civil da Internet).

Esta lei estabelece até mesmo que há nulidade das cláusulas contratuais que impliquem ofensa à inviolabilidade e ao sigilo das comunicações privadas, pela internet (inciso I do parágrafo único do art. 8º).

O empregador pode, por outro lado, realizar o monitoramento do fluxo de dados dos aparelhos de trabalho concedidos por ele e utilizados pelo empregado. Isso implica no controle dos sites visitados, às redes sociais que acessa, aos arquivos que baixa, etc.

Há de se destacar, no entanto, que a vistoria a ser feita pelo empregador deve ocorrer uniformemente a todos os empregados, e não ocorrer de forma direcionada a algum trabalhador, sob pena de se ficar evidente uma perseguição.

Caso a atividade realizada pelo empregado seja o contato com clientes ou a gestão das redes sociais do empregador, este poderá realizar o monitoramento das mensagens. Porém, recomenda-se que, mesmo neste caso, o trabalhador seja cientificado a esse respeito.

O empregador poderá ainda impor regras para proibir ou regulamentar a publicação do empregado sobre imagens do seu local de trabalho, considerando que muitas empresas precisam resguardar o sigilo de sua produção. Dessa forma, se o empregado não obedecer e causar prejuízo à empresa, ele poderá ser chamado para reparo desse dano e até mesmo ter a sua rescisão por justa causa.
As regras a serem estabelecidos aos empregados devem ser claras para que sua compreensão seja total e que o trabalhador conte com uma plataforma onde ele possa esclarecer eventuais dúvidas.

Em arremate, os temas devem ser abordados desde a contratação do empregado e serem alvo de reciclagem periódica por meio de aludidas regras, acompanhando os avanços tecnológicos que ocorrerão ao longo do contrato de trabalho.

Advogado e professor. Doutorando em Ciências Farmacêuticas, Mestre em Direito da Saúde e especialista em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário.

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