sexta-feira,19 abril 2024
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A análise econômica do direito (law and economics – L&E) aplicada à jus trabalhista

Coordenação: Abel Lopes.

 

Ainda causa bastante surpresa no mundo jurídico quando se fala em análise econômica do direito, como se fosse algo de outro planeta.

E não deveria ser assim. A análise econômica, sob a ótica do direito como ciência, busca gerar conhecimentos e conclusões cada vez mais pragmáticas e objetivas. E, para tanto, esses conhecimentos e conclusões são fortemente sustentados por fatos e dados coletados por diferentes autores.[1]

Inicialmente, mais precisamente até 1960, esta análise era restrita ao Direito da Concorrência, mais conhecida como “Anti-trust Law”.

No entanto, o termo “Law and Economics”, após os artigos de Ronald Coase e Guido Calabresi em 1960, se expandiu e alcançou outras áreas, tais como as de propriedade, contratos, responsabilidade (danos), criminal, processual família e constitucional.

A análise econômica se difere das análises mais tradicionais e mais conhecidas, pois utiliza os elementos do mundo real, suas consequências, e não pode ser ignorada sob pena de afastar da justiça seu bem maior, que é a sua efetividade sob uma ótica transcendental.

Justamente por ser diferente que a análise econômica do direito (AED) se reveste de tão profunda utilidade, pois além de complementar, irá “medir” a real proficuidade das regras jurídicas.

Pensemos nas hipóteses do legislativo e dos juristas terem acesso aos prováveis efeitos decorrentes das medidas econômicas implementadas pelas normas jurídicas. Imaginemos que fosse possível avaliar os resultados das leis que estão postas. Importante, por certo!

E tal é a sua importância que o STF, em 39 acórdãos, utilizou o raciocínio econômico como fundamento nas decisões, tendo no Ministro Luiz Fux seu grande defensor e divulgador.

Mas, e na justiça do trabalho, como ponderar análises tão relevantes, levando em conta o antagonismo entre capital x mão-de-obra. Será uma realidade também para a jus laboral?

Capital x mão-de-obra

O Direito do trabalho nasceu com uma missão: suavizar o conflito entre capital versus mão-de-obra, ou, pelo menos, equilibrar essas forças sem extingui-las, sendo certo que para o hipossuficiente, aquele considerado mais fraco, os trabalhadores, ficou reservado o manto da sua proteção.

Nesta busca pelo equilíbrio, a Análise Econômica do Direito do Trabalho tenta considerar ambos os lados da visão, e ainda complementar com mais.

Compatibiliza as características de um modelo econômico de oferta e demanda de trabalho gerando uma equilibrada análise sob esse viés, pois reconhece que tanto trabalhadores quanto empregadores enfrentam vários incentivos e restrições que afetam sua tomada de decisão.

Porém, ao contrário da análise econômica pura e simples, confere a devida importância à formulação, aplicação e execução de contratos, regulamentos e outras regras no campo do trabalho.[2]

Reconhecendo que a relação entre empregadores e trabalhadores não é uma relação de cunho comercial, e diante de sua complexidade e abrangência, confere às relações humanas a importância e o destaque devido, essenciais para o equilíbrio perseguido.

E sob quais argumentos poderia se sustentar a análise econômica do direito do trabalho, senão no equilíbrio da satisfação da entrega daquilo que se buscou por meio do acesso à justiça e o meio pelo qual tal fim foi alcançado.

Vamos ao instituto do seguro fiança e seu papel na esfera recursal trabalhista.

Substituição do depósito recursal pelo seguro fiança – aplicação da análise econômica do direito na jus trabalhista

Seguro garantia judicial ou seguro fiança é o contrato pelo qual a seguradora se torna a garantidora da obrigação de pagar do devedor/executado no processo judicial, obedecidos os limites constantes da apólice.

O CPC de 2015 já tinha inserido essa “novidade” nas execuções, permitindo a substituição da penhora em dinheiro por fiança bancária ou seguro garantia, ao teor do §2º, do artigo 835.

A lei 13.467/2017, também conhecida como Lei da Reforma Trabalhista, permitiu a substituição do depósito recursal por fiança bancária ou seguro garantia, conforme artigo 899, §11, como também o fez com a garantia do juízo em execução por tal modalidade, presente no artigo 882, ambos da CLT.

Acontece, porém, que tal instituto nunca navegou sob águas calmas. Ao contrário, muito se debateu acerca dessa substituição no âmbito recursal trabalhista, e muitos desembargadores decidiram pelo não conhecimento dos recursos alegando que as apólices não se prestavam ao fim pretendido, eis que por (i) prazo determinado, não salvaguardando a entrega do bem da vida, ou, por (ii) deixarem de incluir o número do processo e, assim, poderiam ser usados indistintamente e nada garantir de fato.

Em entendimento favorável à substituição, com a devida venia às mudanças e adequações necessárias ao instituto em voga, como também tomando por análise a L&E, tanto o TST, quanto CSJT, se posicionaram em abarcar os princípios econômicos da AED, ao teor do aresto abaixo transcrito:

Tendo em vista que a possibilidade de substituição do depósito recursal pelo seguro fiança tem por escopo fomentar a economia e permitir que as empresas tenham liquidez, mutatis mutandis[3], a decisão do Conselho Nacional de Justiça repercute, inexoravelmente, na Resolução nº 221, de 21 de junho de 2018, embora esta não tenha sido seu objeto de análise direto.

Por isso, impende registrar que, independentemente de a decisão recorrida ter sido proferida antes ou após da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, será admitido o pleito de substituição do depósito recursal, sem restrições intertemporais.

Neste mesmo sentido, alguns acórdãos do TST: (1) AIRR 8238520165140005, (2) AIRR 210100920155040012, (3) ARR 12676320125030006, (4) RR 9975420135040013, (5) ARR 253251020135240072.

Todavia, nada é branco no preto, pois a relação entre empregador e trabalhador é revestida de falhas e tem nelas a regra e não a exceção, pela própria natureza que a reveste. Existe uma assimetria nas informações, mas também nos poderes oriundos dos polos envolvidos.

 

Conclusão

O mercado de trabalho é um mercado especial, um tanto quanto sui generis quando comparado a outros mercados, como por exemplo o mercado de capitais.  As relações humanas, que lhe conferem brilho próprio, têm presente seu principal componente: a falibilidade.

E o problema das externalidades[4], presente na análise econômica, também ocorre no ambiente laboral ante os desdobramentos e interações não contempladas, e, dessa forma, a preocupação com os efeitos que os agentes econômicos têm sobre terceiros e que não foram considerados inicialmente.

Ante a externalidade inconteste e falhas inerentes à relação empregado e empregador, a importância da Justiça do Trabalho vem a lume, justificando sua invencibilidade apesar de tantos revezes e profecias fúnebres. Ela permanece ao sabor e vontade do Teorema de Coase, o qual afirma que as regras legais têm um papel decisivo na determinação dos níveis de eficiência.

“Eficiência é a capacidade de produzir o melhor resultado pelo menor esforço.”

 


Bibliografia

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO DO TRABALHO E DA REFORMA TRABALHISTA (LEI Nº 13.467/2017), Luciana Luk-Tai Yeung, Professora de Direito e Economia e Coordenadora do Núcleo de Instituições e Ambiente de Negócios (NIAN) do Insper.

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO (AED) Autor: Antônio José Maristrello Porto, Colaborador: Guilherme Mello Graça (FGV).

EXTERNALIDADE, capítulo 4 – Universidade Federal do Rio Grande do Sul Faculdade de Ciências Econômicas Departamento de Economia Disciplina: Teoria Microeconômica II Autores: Luciano Marchese Silva e Camila Steffens.

 

[1] Luciana Luk-Tai Yeung, Professora de Direito e Economia e Coordenadora do Núcleo de Instituições e Ambiente de Negócios (NIAN) do Insper.

[2] Luciana Luk-Tai Yeung, Professora de Direito e Economia e Coordenadora do Núcleo de Instituições e Ambiente de Negócios (NIAN) do Insper. 

 [3] “uma vez efetuadas as necessárias mudanças”.

[4] Universidade Federal do Rio Grande do Sul Faculdade de Ciências Econômicas Departamento de Economia Disciplina: Teoria Microeconômica II Autores: Luciano Marchese Silva e Camila Steffens.

Administradora de empresas, palestrante e advogada trabalhista, com pós-graduação em Direito Empresarial e curso de extensão em contratos. Pós-graduanda em Direito Material e Processual do Trabalho, e Direito Previdenciário. É uma profissional com vasta experiência no consultivo e contencioso trabalhista. Diretora da Comissão de Direito Empresarial do Trabalho na 116ª subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) nos triênios 2016/2018 e 2019/2021.

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