quinta-feira,28 março 2024
ColunaSoberania: princípio fundamental da Constituição

Soberania: princípio fundamental da Constituição

Por: Helen Dibout*

A Constituição Federal de 1988 contempla em seu primeiro artigo e primeiro inciso o principio fundamental que talvez seja o mais importante a ser protegido e que garante o poder de decisão estatal: a soberania.

Ante as notícias recentes de espionagens e desrespeito à soberania de outros Estados, nada mais justo do conhecer a fundo o conceito e sua origem.

 

Soberania: princípio fundamental da constituição e da formação de um Estado

 

Soberania é um atributo do Estado que confere a ele poder de decisão. É uma das características estatais que é sempre acompanhada de dois requisitos básicos: o povo e o território, sem os quais não conseguiria exercer sua soberania.

“A origem do termo soberania é duvidosa”[1] . Para alguns vem do latim “superanitas” ou no latim vulgar “superanus”. Porém, para Henriques Jr. veio do latim “super omnia”, depois ganhou uma versão medieval “superanus”, e, após, “souverainete”, vocábulo francês que deu origem a expressão[2].

 

Na antiguidade, enquanto se desconhecia o conceito de Estado e ainda se formavam os primeiros grupos de pessoas, o termo soberania sequer existia, ainda não havia elementos para que tal conceito fosse, mesmo que primariamente, formulado. Os gregos e os romanos também não tinham ciência deste conceito, porém em Roma notou-se um pequeno avanço. Os gregos não tinham um conceito de Estado, quanto mais de soberania. Já os romanos exibem certo avanço, visto que mesmo sem um conceito de Estado, eles já se organizavam em graus diferenciados de poder. Além disso, existia um poder denominado Imperium Populi Romani, que significa que o povo romano concedia o poder de governar para seu imperador, tudo isso sem sequer desenvolver um conceito sobre Estado ou soberania. Essa falta de conceituação se deve “à inexistência da oposição do poder do Estado a outros poderes.”[3] Ainda para Henriques Jr., o mundo greco-romano jamais poderia desenvolver o conceito de soberania, pois a “autoridade do Estado era indisputável”[4].

 

Com a chegada da Idade Média, surge um conceito de soberania arcaico, diferente do que conhecemos hoje: tinha ligação com a relação feudal entre súdito versus soberano, aliás, a palavra ‘soberano’ surgiu antes da palavra ‘soberania’ para designar o poder que o senhor feudal tinha sob seus trabalhadores, logo, este conceito não estava relacionado a um Estado, mas sim à relação feudal, sendo este um conceito muito primário e distante do atual.
São Tomas de Aquino desenvolveu na Idade Média um princípio, a primeira luz do que seria o conceito. Henriques Jr. o cita:

“(…) a elaboração das leis cabe ao povo, ou a seus justos representantes, originariamente, podendo o poder ser exercido sem qualquer forma de dependência a mandatos ou ratificações populares, desde que em proveito da comunidade.”[5].

O autor não faz comentários a cerca do trecho de Tomas de Aquino, porém, a meu ver, o desenvolvimento do conceito de soberania de Tomas de Aquino ainda estava embaralhado com outros conceitos, o que não extrai uma ideia pura do conceito de soberania.

No século XIII os monarcas começam a ampliar suas esferas de competências exclusivas e se firmam como soberanos. No fim da Idade Média, século XVI, os monarcas já têm supremacia e o conceito de soberania aparece “plenamente amadurecido”[6] .

 

principio fundamental O conceito de soberania como conhecemos hoje só passou a ser utilizado com o surgimento dos Estados, mais precisamente com a publicação da obra “Os seis livros da República” em 1576, por Jean Bodin[7]. Após este, Thomas Hobbes atribui ao conceito de soberania uma visão jusnaturalista. Também se destaca Locke por fazer uma interpretação diferenciada do poder.

Posteriormente, surgem duas vertentes: a corrente francesa, onde seus principais autores são Léon Duguit e Rousseau, e, a corrente alemã com Jellinek e Herman Heller. A partir do debate entre elas, o conceito de soberania foi se consolidando até chegarmos à atualidade, onde este conceito tenta se moldar as diferentes relações estatais (tanto econômica quanto jurídico-política).

 

No Brasil, apesar da existência de pactos internacionais como o MERCOSUL, não há perda da soberania, sendo que o Congresso Nacional aprecia e aprova, ou não, a ratificação da assinatura dos tratados e pactos internacionais dos quais deseja fazer parte. Tais tratados devem estar de acordo com o texto constitucional e são recebidos como leis infraconstitucionais, salvo se o tratado versar sobre direitos humanos, que será recepcionado como emenda constitucional conforme prescreve o artigo 5°, § 3° da Constituição Federal.

 

Assim, a Constituição de 1988, trouxe como princípio basilar do Estado a soberania, pois sem ela não haveria como formar um Estado pleno.
___________________________________________

[1] BERARDO, Telma. “Soberania, um novo conceito?” Revista de Direito Constitucional e Internacional, n°40, p.22.
[2] HENRIQUES JR, Fernando do Couto. Soberania: das origens ao fenômeno de integração econômica, o conceito legitimador do sistema. São Paulo, FDUSP (tese), 2006.
[3] Idem nota 1.
[4] Idem nota 2.
[5] HENRIQUES JR.. Fernando do Couto. Soberania: das origens ao fenômeno de integração econômica, o conceito legitimador do sistema. São Paulo: FDUSP, 2006.
[6] DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, p.76, “No final da Idade Média os monarcas já têm supremacia, ninguém lhes disputa o poder, sua vontade não sofre qualquer limitação, tornando-se patente o atributo que os teóricos logo iriam perceber, a soberania, que no século XVI aparece como um conceito plenamente amadurecido, recebendo um tratamento teórico sistemático e praticamente completo”, p.76.
[7]Boa parte dos doutrinadores atribui o feito a este autor.

*Helen Dibout,bacharel em Direito na FAAT- Faculdades Atibaia, Pós Graduanda em Constitucional pela Damásio de Jesus, Graduanda em Filosofia pela USP. Advogada especialista em Constitucional.

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