Um dos francos problemas que investidores e empreendedores enfrentam no Brasil é a inconstância da jurisprudência, muitas vezes alterada em sede dos recursos perante os Tribunais Superiores em Brasília.
O investimento pressupõe uma análise de risco, um prognóstico de consequência financeira da atividade empresarial, em uma palavra, a previsibilidade de perda que possibilita a rentabilidade frente à infortunística do mundo jurídico.
Não são raras as situações que casos jurídicos submetidos ao crivo do Supremo Tribunal Federal lá permanecem durante anos e décadas enquanto se aguarda análise de sua compatibilidade constitucional.
Durante essa tramitação muitos projetos são engendrados, filiais são inauguradas, sócios são contratados, postos de trabalho são gerados, baseados em situação a quo, cuja modificação não se espera seja impactante.
Assim, ao lado do mal do tempo do processo, alinha-se outro efeito maléfico da justiça: o incentivo à especulação, a insegurança do investimento, o aumento do risco-País, dada a impossibilidade de se determinar e prever um estado de coisas.
A Comissão responsável pela elaboração do Código de Processo Civil de 2.015 emitiu declarações destacando a grande fragilidade de nossa jurisprudência, que muito se altera entre a instância ordinária e os Tribunais, e, ainda, no âmbito de seus órgãos fracionários.
Vários mecanismos foram adotados pela lei a fim de tornar prudente a utilização do processo, como ferramenta de aperfeiçoamento das leis do país e não meio de sobrevivência do economicamente mais forte.
Um autor português, Boaventura de Sousa Santos, em vários escritos, destacou a necessidade de que o Poder Judiciário seja enxergado neste novo século como verdadeira administração da justiça.
Assim, afasta-se a ideia daquele procedimento arcaico, de forma e ritos, quando qualquer deslize dos Advogados poderia implicar a perda da causa, o arquivamento do processo e a experimentação de prejuízos milionários.
Trouxemos de outras escolas jurídicas ferramentas de utilização dos precedentes, técnica do direito estadunidense que valoriza os fundamentos empregados por um Tribunal em questão anterior.
Objetiva-se neste sistema de common law garantir o tradicionalismo, a coerência do sistema.
Assim, a nossa lei processual prescreveu a necessidade de serem observadas as decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, não para coibir a interpretação do juiz, mas, para trazer certa paz de espírito ao aflito cidadão e empresário.
Do direito alemão copiamos a noção de procedimento-modelo. Nosso sistema atual prevê a possibilidade de que os juízes, Advogados, e Desembargadores provoquem a instauração do IRDR – Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.
Falemos desse instituto. Sua finalidade é, diante da multiplicação de processos, cujo pano de fundo seja a interpretação de determinada prescrição legal, levar ao Tribunal do Estado ou Regional Federal a discussão do tema.
Assim, o Tribunal, inclusive por meio de audiência pública, vai prolatar um acórdão fixando a interpretação correta a ser dada à hipótese. Essa determinação será, posteriormente, aplicada por cada juiz caso-a-caso.
Na década de 70, Mauro Cappelletti, professor da Universidade de Florença, encabeçou o projeto denominado Access to Justice: The Worldwide Movement to Make Rights Effective, no qual apontou uma série de óbices à efetividade da justiça.
Um deles era o valor, o preço do processo. Atualmente, diante do modelo capitalista mundialmente aceito, o preço da justiça não se resume nos gastos na promoção e no andamento do processo, mas, também em relação ao seu desfecho.
A população, o setor empresarial, e o próprio setor público, clamam por previsibilidade, que torne possível a realização de investimentos sem o risco de que lá na frente a jurisprudência que apoiava a interpretação legal sofra modulação de seus efeitos.
Não se clama por um juiz-robô, nem por um juiz Hércules que tudo sabe, mas, pela observância de certa coerência, obediência aos acórdãos e situações economicamente consolidadas que não surpreenda a sociedade.
Para alavancar o Brasil, é momento de a justiça ser exercida imediatamente, a priori, com medidas eficazes e de concretização material do direito, e não a postergação da decisão para uma indefinição que apenas suscita o caos no mundo corporativo.
Quem precisa acreditar no Brasil é, antes de ninguém, o próprio brasileiro. Para isso, é preciso que antes continuemos a acreditar na justiça e no funcionamento da jurisdição.
Obs. Na foto de destaque trago a Estação da Luz em São Paulo…quem sabe possamos iluminar o caminho para o avanço de nossa sociedade em rumo à efetividade de direitos e respeito ao próximo…